Página 957 do Diário de Justiça do Estado de Pernambuco (DJPE) de 18 de Dezembro de 2014

que constatada a manipulação do aparelho de aferição, fez-se necessária a imposição dos valores decorrentes do consumo não medido ao longo do lapso temporal em que perdurou a mencionada incorreção do medidor, tomando-se por base os equipamentos elétricos existentes na unidade consumidora, em plena conformidade com o que determina a legislação pertinente. Junta documentos e pede a improcedência do pedido. Réplica à contestação às fls. 89/96. Às fls. 99, a autora requereu a produção de prova pericial, que foi deferida às fls. 108/108v. Intimada para comprovar a efetivação do depósito dos honorários do perito, sob pena de indeferimento da prova solicitada, a demandante optou por silenciar (certidão de fls. 141). Vieram os autos conclusos. É o relatório. Passo a decidir. Conforme explicitado no relatório, trata-se de julgamento simultâneo de feitos, reunidos por força da conexão. Inicialmente, ante o silêncio da demandante diante de sua intimação para efetuar o pagamento dos honorários periciais, indefiro a produção da prova por ela requerida nos autos da ação principal, razão pela qual destituo o perito nomeado, devendo a Secretaria cientificá-lo desta decisão. Quanto à preliminar de cessação da eficácia da medida liminar argüida na defesa oferecida na ação principal, não merece prosperar, uma vez que a demandada não juntou aos autos documentos aptos a comprovar a data em que a medida foi realmente efetivada, sendo importante ressaltar que a data em que foi proferida a decisão de concessão da liminar não deve ser tomada como base para o início do prazo previsto no art. 806 do CPC. Assim, rejeito a preliminar. No tocante ao mérito, entendo que a irregularidade do medidor se encontra sobejamente comprovada. Note-se que a ré lavrou Termo de Ocorrência de Irregularidade, nele ficando registrado que na inspeção perpetrada foi constatado que "havia inversão dos condutores fase e neutro nos bornes de linha do medidor, ligado ao neutro desviado de carga do contrato nº 0420949022 celpe, conforme fotos 2417 a 2428 da máquina 134, fazendo com que o consumo de energia elétrica não fosse registrado" e que os "selos da tampa dos blocos de terminais e da caixa de mufla" se encontravam "pressados com alicate nas laterais (selos de policarbonato danificados)". Ficou ainda registrado que "todas as irregularidades foram constatadas pelos peritos do instituto de criminalística". Além disso, foram colacionadas fotos pela demandada que respaldam a conclusão da inspeção realizada no tocante à fraude do medidor. Os documentos citados acima são suficientes para a comprovação da irregularidade do medidor, mas há outra prova que escancara a existência da fraude, prova esta que foi produzida às fls. 79 dos autos da ação ordinária. Trata-se de histórico de consumo do período anterior e posterior à troca do medidor ocorrida em abril de 2008. Percebe-se claramente que antes da troca do medidor irregular o consumo médio mensal de energia era bem inferior ao registrado após a retirada do medidor adulterado, evidenciando que a autora pagava bem menos energia do que efetivamente consumia. Comprovada a irregularidade, resta analisar se o valor cobrado pela ré está de acordo com a norma de regência. Não interessa, no presente caso, saber quem praticou a fraude, mas sim quem se beneficiou da medição a menor. Não restam dúvidas de que a demandante foi quem se beneficiou ao consumir mais energia do que vinha pagando, razão por que deve ser responsabilizada pelo pagamento do consumo não medido segundo os critérios estabelecidos pela legislação de regência. Nesse sentido: 53177594 - APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÍVIDA C/C PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA. FRAUDE NO MEDIDOR DE ENERGIA ELÉTRICA. FATO INCONTROVERSO. REVISÃO DO DÉBITO. POSSIBILIDADE. LIMITADA À MÉDIA ARITMÉTICA DOS 12 (DOZE) ÚLTIMOS MESES DE CONSUMO QUE ANTECEDEM A IRREGULARIDADE. APLICAÇÃO DA RESOLUÇÃO Nº 456/2000 DA ANEEL. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. Inobstante não demonstrado nos autos que o consumidor teve culpa pela fraude no relógio medidor de energia, não há que ser declarada a inexigibilidade do débito cobrado, devendo ela pagar pelo que consumiu sendo licito à concessionária a revisão da divida com base nos 12 (Doze) meses imediatamente anteriores a data da constatação da irregularidade, a fim de evitar o enriquecimento ilícito da parte consumidora. (TJ-MS; AC-Or 2011.007695-5/0000-00; Dourados; Segunda Turma Cível; Rel. Des. Paulo Alfeu Puccinelli; DJEMS 02/05/2011; Pág. 18) A Celpe elaborou uma planilha de consumo não medido de acordo com os dados obtidos com o levantamento de carga instalada e estabeleceu o valor do kWh/mês devido (fls. 70/74 da Ação Cautelar e fls. 65/69 da Ação Ordinária). Com isso chegou ao valor devido, utilizandose dos critérios estabelecidos nos arts. 72 e seguintes da Resolução nº 456/2000 da Aneel. Resta claro que a Celpe agiu de forma regular ao apurar o consumo não medido de acordo com a legislação pertinente. Por outro lado, a autora se beneficiou ao consumir mais energia do que pagou, devendo ser destacado que o valor cobrado pela ré não é uma multa em razão da fraude no medidor, mas sim a mera cobrança da energia efetivamente consumida e não paga. Deste modo, é legítima a cobrança efetuada pela Celpe, referente ao período em que a suplicante consumiu energia elétrica de forma clandestina, apurada de acordo com a Resolução nº 456/2000 da Aneel, devendo ser julgado improcedente o pedido de declaração de nulidade da fatura no valor de R$ 5.864,14 e improcedente o pedido de suspensão da cobrança formulado nos autos da medida cautelar. No tocante ao pedido de não interrupção do fornecimento de energia em face do débito apurado por consumo não medido, a solução é distinta. Conforme já decidiu o Superior Tribunal de justiça, o princípio da continuidade do serviço público assegurado pelo art. 22 do Código de Defesa do Consumidor deve ser temperado, ante a exegese do art. , § 3º, II, da Lei nº 8.987/95, que prevê a possibilidade de interrupção do fornecimento de energia elétrica quando, após aviso, permanecer inadimplente o usuário, considerado o interesse da coletividade. Todavia, a hipótese discutida nos autos não se refere ao inadimplemento das contas mensais e habituais de energia, mas sim de uma conta específica decorrente da apuração de irregularidades no fornecimento de energia. Percebe-se claramente que a ré ameaçou suspender o fornecimento de energia da autora em face da não quitação da fatura correspondente ao que apurou por consumo não registrado. É certo que a Celpe pode suspender o fornecimento de energia se o consumidor não vem adimplindo com suas obrigações mensais, todavia não pode ela cortar o fornecimento de energia para forçar o consumidor a pagar um débito relativo a um fato passado e que pode usar os meios ordinários de cobrança. Devo ressaltar que não se trata de negar à Celpe o direito de suspender o fornecimento de energia no caso de inadimplência contumaz do consumidor. Como bem ressaltado, a Celpe apenas pode exercer esse direito quando o consumidor não vem pagando as faturas mensais correntes, vez que não pode ser obrigada a continuar fornecendo energia para um cliente que não paga suas contas. Porém, o que não pode é a concessionária de serviço público distorcer o sentido da lei para utilizar o corte de energia como meio de cobrança em todos os casos em que entenda haver débitos em atraso, inclusive quando se trata de débito não relacionado às cobranças mensais habituais. Deve, nesses casos, utilizar-se dos meios ordinários de cobrança. É nesse sentido a jurisprudência atual do Superior Tribunal de Justiça: ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. ENERGIA ELÉTRICA. DÉBITOS PRETÉRITOS. FRAUDE NO MEDIDOR DE CONSUMO. RECUPERAÇÃO DE CONSUMO. SUSPENSÃO DO FORNECIMENTO DO SERVIÇO. IMPOSSIBILIDADE. 1. O entendimento desta Corte é firme no sentido de que não é lícito à concessionária interromper o serviço de fornecimento de energia elétrica por débitos consolidados pelo tempo ainda que oriundos de recuperação de consumo em face da existência de outros meios legítimos de cobrança de débitos antigos não-pagos. Precedentes: AgRg no REsp 1351546/MG, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, Primeira Turma, DJe 07/05/2014; AgRg no AREsp 324.970/RS, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, DJe 31/03/2014; AgRg no AREsp 412.849/RJ, Rel. Min. Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 10/12/2013. 2. Agravo regimental não provido. (STJ - AgRg no AREsp: 276453 ES 2012/0270960-7, Relator: Ministro BENEDITO GONÇALVES, Data de Julgamento: 02/09/2014, T1 - PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 08/09/2014) O Tribunal de Justiça de Pernambuco já pacificou entendimento sobre a questão que, inclusive, foi objeto de súmula daquela Corte: Súmula 13: "É abusiva a suspensão do fornecimento de energia elétrica, quando motivada pelo inadimplemento de débito unilateralmente arbitrado pela concessionária, pelo critério de estimativa de carga, após a constatação de suspeita de fraude." Por fim, no tocante ao pedido de indenização por danos morais, observo que a autora não sofreu quaisquer danos desta natureza, mormente quando evidenciado que de fato consumia energia elétrica sem por ela pagar. Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES OS PEDIDOS ELABORADOS NA MEDIDA CAUTELAR Nº 001XXXX-90.2008.8.17.0001, para deferir o pleito de restabelecimento do fornecimento de energia interrompido por motivo de não pagamento da fatura relativa ao consumo não medido ora discutida e indeferir o pleito de suspensão da cobrança em razão regularidade do débito. Em face da sucumbência recíproca, as partes repartirão igualmente as custas processuais e arcarão com os honorários de seus advogados. JULGO IMPROCEDENTES OS PEDIDOS de desconstituição do débito apurado em decorrência do consumo não medido e de indenização por danos morais, ambos FORMULADOS NA AÇÃO PRINCIPAL (processo nº 002XXXX-19.2008.8.17.0001). Intime-se o perito nomeado de sua destituição do encargo. Condeno a demandante no pagamento das custas processuais, já adiantadas, e no pagamento de honorários de sucumbência, estes fixados em 20% sobre o valor atribuído à causa, devidamente atualizado. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Após o trânsito em julgado, arquivem-se os autos. Recife, 02 de outubro de 2014. Isaías Andrade Lins NetoJuiz de Direito

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