TRIBUTÁRIO. ADMINISTRATIVO. AÇÃO ANULATÓRIA DE DÉBITO FISCAL. CONTRIBUIÇÕES DEVIDAS AO FGTS. LEGITIMIDADE DA CAIXA E DA UNIÃO. FISCALIZAÇÃO DE AUDITOR FISCAL DO TRABALHO. IRREGULARIDADE DE CONTRATAÇÃO MUNICIPAL PELO REGIME JURÍDICO ADMINISTRATIVO TEMPORÁRIO. NECESSIDADE DE DECLARAÇÃO JUDICIAL. AUTUAÇÃO NULA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. EXCESSIVO DESEQUILÍBRIO. REFORMA DA CONDENAÇÃO. FIXAÇÃO DA VERBA POR ARBITRAMENTO. APELAÇÃO DA FAZENDA E REMESSA NECESSÁRIA PROVIDAS EM PARTE. PARCIAL PROVIMENTO AO APELO DA CAIXA. 1. Trata-se de remessa necessária e de apelações cíveis interpostas pela CAIXA ECONÔMICA FEDERAL e pela FAZENDA NACIONAL contra a sentença proferida pelo Juízo da 8ª Vara Federal da Seção Judiciária do Ceará (id. XXXXX.29827307, integrada pela sentença de embargos do id. XXXXX.30858073), que julgou procedente os pedidos deduzidos pelo Município de Fortaleza em ação anulatória de débito, reconhecendo a nulidade das seguintes notificações de débito de FGTS: NDFC 201.070.618 e NDFC 201.070.600, respectivamente nos valores de R$ 12.984.315,98 e R$ 19.566.748,45. O julgado deferiu, ainda, medida liminar determinando a exclusão do registro dos débitos referente às NDFCs da dívida ativa, da inscrição do Município no CAUC ou quaisquer outros cadastros restritivos. 2. Em suas razões recursais (id. XXXXX.31003553), a Fazenda Nacional defende, em síntese, que: 1) contrariamente ao que restou decidido na sentença apelada, a União seria parte ilegítima para figurar no polo passivo das ações que versem sobre inscrição e cobrança judicial de dívida de FGTS (NDFC - Notificação de Débito do Fundo de Garantia e da Contribuição Social); 2) é da competência dos Auditores Fiscais do Trabalho a aferição dos fatos que conduziram à lavratura das autuações impugnadas na presenta ação, pois lhes cumpriria fiscalizar as relações de trabalho, com a consequente lavratura de auto de infração quando constatadas irregularidades, não se confundindo a citada atribuição com o julgamento, pelo Poder Judiciário, quanto à validade dos vínculos jurídicos-estatutários; e 3) deve ser anulada a sentença, a partir do reconhecimento da competência do Auditor- Fiscal do Trabalho para a lavratura dos autos de infração objetos do feito. Por sua vez, a CAIXA ECONÔMICA FEDERAL também pugna pela reforma do julgado, sob os seguintes fundamentos: 1) não possui legitimidade para compor o polo passivo da demanda, haja vista não tratar de inscrição na Dívida Ativa ou de cobrança judicial ou extrajudicial de contribuições do FGTS, mas de pretensão anulatória ajuizada em face de procedimento administrativo que tramitou na SRTE-CE, de modo que a tramitação do feito deve se dar unicamente contra União, a quem compete a defesa do Ministério do Trabalho e Previdência; 2) a obrigação de fazer postulada na inicial, consistente na emissão do certificado de regularidade de FGTS, embora seja de competência da apelante, não consistiria fundamento para o reconhecimento de sua legitimidade passiva, já que, no caso de anulação judicial dos débitos, bastar-lhe-ia apenas receber ofício da vara de origem determinando o cancelamento da NDFC em seus sistemas; e 3) deve ser revisada a condenação ao pagamento de verba honorária, para que a verba de sucumbência seja fixada de forma equitativa, mediante a aplicação da regra prevista no art. 85 , § 8º , do CPC (id. XXXXX.31062208). 3. O cerne da controvérsia se cinge à delimitação da competência do Auditor Fiscal do Trabalho, questionando-se no feito se cabe à mencionada autoridade administrativa, no exercício do seu Poder de Polícia, autuar município para a cobrança de FGTS quanto a vínculo de trabalho entendido como irregular. Além disso, cabe decidir sobre a legitimidade da União e da Caixa Econômica Federal para figurarem no polo passivo da presente ação anulatória de débito. 5. Relativamente à legitimidade passiva da CAIXA ECONÔMICA FEDERAL e da União, não merece reparo o julgado que lhes declarou legitimados a figurarem no polo passivo da demanda. No tocante à CAIXA ECONÔMICA FEDERAL, o art. 7º da Lei 8.036 /90 dispõe que lhe cabe, na qualidade de agente operador, emitir o Certificado de Regularidade do FGTS. Assim, diante do pedido de exclusão do nome do município ora apelado de eventuais inscrições em cadastros de inadimplentes, resta confirmada a legitimidade da empresa pública para figurar no polo passivo da demanda. Ademais, em relação à União, como o feito trata de ação anulatória de notificação fiscal gerada a partir de autuação realizada por Auditores-Fiscais do Trabalho, evidente que o ente federal deve compor o polo passivo da demanda, cabendo-lhe a defesa das atribuições da autoridade administrativa a si vinculada. 6. Quanto ao cerne do presente recurso, relacionado à competência do Auditor Fiscal do Trabalho para a lavratura dos autos de infração objeto do feito, embora seja sua atribuição fiscalizar as relações de trabalho (art. 11 da Lei nº 10.593 /2002), no caso dos autos, os débitos de FGTS executados são relativos a autuação realizada por ocasião de fiscalização da municipalidade, advindos do reconhecimento da nulidade de determinadas contratações temporárias, por reputá-las submetidas ao regime trabalhista. Sobre o ponto, não se ignora a norma insculpida no Art. 19-A da Lei 8.036 /90, incluída pela Medida Provisória nº 2.164-41 de 2001 ("É devido o depósito do FGTS na conta vinculada do trabalhador cujo contrato de trabalho seja declarado nulo nas hipóteses previstas no art. 37, § 2º, da Constituição Federal, quando mantido o direito ao salário"). No entanto, igualmente não se pode olvidar que, mesmo diante da constatação da existência de nulidade de contratações temporárias pelo regime próprio, até que venha a ocorrer a declaração judicial de tal nulidade, deve ser mantida a regular produção de efeitos da referida contratação. 7. Desse modo, a correta aplicação do Art. 19-A da Lei 8.036 /90 exige a prévia declaração da nulidade dos vínculos temporários mantidos pela municipalidade, sendo pertinente consignar, nesse tocante, que tal declaração de nulidade deve passar pelo necessário crivo do Poder Judiciário. Dito de outro modo: extrapola as atribuições do Auditor Fiscal do Trabalho a autuação da Municipalidade, relativamente ao pagamento de FGTS, em face de vínculos temporários não declarados nulos pela autoridade judicial competente. Isso porque, a autuação por auditor fiscal, com a fixação de valor a ser pago a título de FGTS, pressupõe que os vínculos tenham sido anulados, o que somente pode ser feito pela autoridade competente para tanto (administrativa municipal ou juízo comum estadual). Precedentes deste tribunal: PROCESSO: XXXXX-47.2021.4.00580000, APELAÇÃO/ REMESSA NECESSÁRIA, DESEMBARGADORA FEDERAL JOANA CAROLINA LINS PEREIRA , 5ª TURMA, 09/03/2023; PROCESSO: XXXXX20204050000 , AGRAVO DE INSTRUMENTO, DESEMBARGADOR FEDERAL LEONARDO AUGUSTO NUNES COUTINHO , 3ª TURMA, 18/11/2021. 8. Por fim, no tocante à condenação ao pagamento de honorários advocatícios, fixados na origem nos percentuais mínimos previstos no § 3º do art. 85 do CPC sobre o total cobrado nas notificações de débito declaradas nulas (NDFC 201.070.618 e NDFC 201.070.600 - R$ 12.984.315,98 e R$ 19.566.748,45, respectivamente), tem-se que o montante estipulado se mostra absolutamente desproporcional ao esforço despendido na causa. Acerca do tema honorários advocatícios de sucumbência, é certo que a sua fixação deve ter como parâmetro, sucessivamente (art. 85 , § 2º , do CPC e Tema 1.076 do STJ): 1) o valor da condenação; 2) o montante do proveito econômico obtido; 3) o valor da causa. No entanto, no caso, a condenação em honorários advocatícios, nos moldes em que estipulada, resultaria no pagamento de montante superior a R$ 2.000.000,00 (dois milhões de reais), mostrando-se absolutamente desproporcional em relação - em que pese o zelo dos causídicos que atuaram no feito - ao esforço despendido na causa (discussão de uma tese jurídica, sem que tenha havido aprofundamento da instrução, ou prática de atos processuais além de inicial, réplica e contrarrazões), e o que é pior, a onerar um ente estatal em benefício de outro (ou de seus Procuradores). Ainda sobre o ponto, vale mencionar o que decidido pelo Supremo Tribunal Federal por ocasião do julgamento da ACO XXXXX/DF (acórdão publicado em 11/03/2022), em que restou acolhida a tese de possibilidade de fixação de honorários advocatícios por equidade quando o arbitramento em percentual sobre o valor da causa gerar à parte sucumbente condenação desproporcional e injusta, exatamente como se dá no caso ora sob exame. Desse modo, cabe a aplicação de solução jurídica que assegure, a um só tempo: a) aos procuradores judiciais do vencedor, o direito ao pagamento de honorários em patamar compatível com a atividade desenvolvida no processo; b) ao vencido, não ter a obrigação de arcar com o pagamento de verba honorária manifestamente desproporcional ao trabalho realizado pelo advogado da parte adversa. 9. Assim, tendo em conta aspectos relacionados ao grau de esforço para acompanhamento da causa, tempo exigido, lugar da prestação do serviço e natureza, importância da causa e, principalmente, a fim de evitar a imposição de gravame injusto e desproporcional à sucumbente, fixo os honorários advocatícios de sucumbência em R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais), devidos exclusivamente pela UNIÃO em favor do MUNICÍPIO DE FORTALEZA, não havendo sido constatada razão jurídica para a fixação de honorários advocatícios em desfavor da CAIXA ECONÔMICA FEDERAL, que não praticou qualquer ato material tendente à defesa da subsistência da cobrança, além do que, tanto a autuação quanto a notificação fiscal, foram realizadas por Auditor Fiscal do Trabalho, autoridade vinculada à União. 10. Remessa necessária e apelação da Fazenda Nacional parcialmente providas. Apelação da CAIXA provida em parte, isentando-a da condenação em honorários de sucumbência.