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24 de Abril de 2024
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    Palma busca expiar pecados originais

    Tailândia, Pará, 14/9/2010 Melhor o dendê do que o gado, diz a camponesa Violeta dos Reis, que cozinha e serve refeições no bar que mantém com seu marido no povoado de Arauaí. Nos arredores, abre-se um novo mundo para pequenos agricultores pobres do Brasil. O motivo é econômico. O dendê nome brasileiro da palma africana dá mais futuro, afirma Violeta. Por isso seu marido, Florisvaldo, comprou, por R$ 14 mil, dez hectares plantados com palma em um projeto de agricultura familiar integrado à empresa Agropalma.

    O argumento também poderia ser ambiental. Ao longo da rodovia PA 150, entre as cidades de Moju e Tailândia, as plantações de palma constituem uma monótona paisagem em dezenas de quilômetros do nordeste do Pará. A monocultura causa impacto em quem espera ver a exuberância e a diversidade da selva neste pedaço da Amazônia oriental. Antes e depois das plantações de palma, o panorama tampouco é amazônico.

    Extensas pastagens e terras degradadas comprovam que a palma está se expandindo em uma área que já sofria amplo desmatamento. A extração de madeira e a pecuária, além da exploração de carvão vegetal, destruíram muitas florestas por estes lados. É a região escolhida pela Agropalma, a maior produtora de óleo de palma da América Latina, para plantar, desde 1982, uma das três espécies de palma, a africana (Elaeis guineensis), em 39 mil hectares.

    Na primeira década, a monocultura avançou sobre florestas nativas, reconhece seu diretor comercial, Marcello Brito. Depois, a empresa adotou princípios de responsabilidade social e ambiental. Além de manter 64 mil hectares de reserva florestal, destina 10,5% de sua área plantada ao cultivo orgânico certificado e mantém várias iniciativas a favor da biodiversidade e contra o desmatamento.

    A Agropalma é membro ativo da Mesa Redonda do Óleo de Palma Sustentável (RSPO, sigla em inglês), um fórum fundado em 2004 por empresas produtoras, comerciantes e consumidoras de óleo, organizações ecologistas e investimentos, para promover e certificar a sustentabilidade ambiental e social do produto. Como vice-presidente da RSPO, Marcello foi o anfitrião da sua II Conferência Latino-Americana em Belém, capital do Estado do Pará, realizada de 24 a 27 de agosto, quando foi defendida a expansão sustentável deste vegetal na região, evitando os erros cometidos na Indonésia e na Malásia.

    Esses dois países asiáticos concentram 85% da produção mundial de óleo de palma, que acaba de se converter no mais consumido, superando o da soja, e com múltiplos usos na alimentação, cosmetologia e energia. Mas ali esse crescimento foi obtido à custa de um vasto desmatamento e da invasão e remoção dos depósitos naturais de carvão fóssil, que liberaram grandes emissões de gases-estufa. A RSPO tem a difícil missão de expiar esse pecado, com uma limitada adesão asiática.

    A primeira conferência latino-americana da RSPO, em 2008, na Colômbia, país que é o maior produtor regional, provocou uma declaração assinada por 259 organizações sociais e ambientais de todo o mundo, condenando a monocultura da palma como ameaça às florestas e ao clima, a milhões de indígenas e camponeses e à segurança alimentar. A RSPO é um instrumento do negócio e não está destinada a conter seus impactos ambientais e sociais, critica essa declaração.

    Por outro lado, na Amazônia brasileira, a palma tem funções bioquímicas similares às florestas naturais, além de reduzir a erosão e o gás carbônico, afirmam cientistas brasileiros. É um cultivo complexo mas benéfico para o meio ambiente e mais barato do que restaurar as florestas nas terras já degradadas, disse Marcos Ximenes, ex-reitor da Universidade Federal do Pará e diretor do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia. Muito melhor do que o boi, disse, concordando com Violeta dos Reis.

    Neste país, seguindo os critérios da RSPO, a ambição da expansão do dendê da mão da pequena agricultura conta com apoio oficial, especialmente em créditos brandos do Programa de Produção Sustentável de Palma de Óleo no Brasil, anunciado em maio pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A meta é duplicar a área plantada e incorporar 12 mil agricultores familiares à atividade nos próximos quatro anos.

    Entretanto, fala-se em um milhão de hectares, mais de dez vezes a superfície atual, porém, quase nada em comparação aos 31,8 milhões de hectares considerados aptos para este cultivo por um recente estudo nacional. Em todo o mundo, estima-se que a palma ocupe hoje em dia 12 milhões de hectares. O Brasil produz pouco mais de 200 mil toneladas anuais de óleo de palma, 0,5% do total mundial, e importa uma quantidade similar para atender o consumo interno.

    A Petrobras implementou dois projetos para produzir biodiesel de óleo, um deles em Portugal. O plano prevê 2.250 famílias cultivando palma, além de médios e grandes agricultores, todos assentados no Pará, que já concentra 90% da produção brasileira desse óleo. A Vale, uma das maiores exportadoras mundiais de minério de ferro, também anunciou que implantará seis polos de palma no Pará, para obter biodiesel destinado ao consumo de seus meios de transporte, que incluem várias ferrovias e portos.

    Os planos de incluir agricultores familiares baseiam-se na experiência da Agropalma. Entre 2002 e 2006, a empresa incorporou 185 famílias como produtoras associadas, em lotes de seis a dez hectares cedidos por órgãos governamentais. Os beneficiados são pequenos produtores locais que devem manter suas plantações tradicionais, como milho e mandioca, já que a colheita de palma ocupa apenas entre quatro e seis dias de trabalho por mês. O casal Reis entrou no projeto há três anos, adquirindo o contrato de um sócio original para a venda de sua colheita à Agropalma durante 25 anos, tempo de vida da palmeira. Além disso, cultivam outras terras e exploram o comércio em Arauaí.

    Este esquema muda a vida dos camponeses, proporcionando uma renda mensal, mas eles precisam ter visão de longo prazo. A palma exige muitos cuidados e não produz nada nos três primeiros anos, durante os quais só cresce a dívida do produtor associado, somando gastos com sementes, fertilizantes e equipamentos, que deverá pagar mensalmente quando começarem as colheitas. Há quem não consegue se adaptar a este sistema e quebra.

    Não planejam o tempo destinado à palma e a outros cultivos, deixam crescer o mato e desanimam, resumiu Francisco Damião, supervisor de campo na agricultura familiar. De fato, há plantações quase abandonadas em algumas áreas. Mas a maioria dos camponeses associados elevou sua renda, mesmo pagando suas dívidas. Benedita Nascimento, a quem a Agropalma tem como exemplo de sucesso, garante que sua renda mensal passa de R$ 2 mil, soma inimaginável para uma família camponesa local. Violeta disse que a palma rende R$ 1,5 mil líquidos.

    Em suas próprias plantações e unidades industriais, cinco de extração do óleo bruto e uma de refino, a empresa tem 4.748 empregados. Aqui também houve pecados: cerca de 3.500 trabalhadores eram subcontratados, como forma de evitar os direitos trabalhistas, até que o Ministério Público interveio em 2007 e conseguiu um acordo para a contratação direta, disse à IPS o sindicalista Manoel Evangelista da Silva, diretor de assalariados do Sindicato de Trabalhadores Rurais de Tailândia, o município onde fica a sede da Agropalma.

    Apesar de tudo, trata-se de uma excelente companhia que trouxe benefícios diretos e indiretos para as comunidades locais, aumentando a renda e, ultimamente, a atenção com seus trabalhadores, disse o sindicalista. Envolverde/IPS

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    Crédito: Mario Osava/IPS

    Legenda: Um jovem transporta em um burro sua colheita de frutos e racimos de palma.

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    Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/noticias/palma-busca-expiar-pecados-originais/2373152

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