ELEIÇÕES 2018. RECURSOS ORDINÁRIOS. REPRESENTAÇÃO. CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO. AIJE. ABUSO DE PODER. DEPUTADO ESTADUAL. IMPROCEDÊNCIA NA ORIGEM. AUSÊNCIA DE PROVAS ROBUSTAS. NEGADO PROVIMENTO AOS RECURSOS ORDINÁRIOS. 1. Segundo a firme jurisprudência deste Tribunal, para configurar a captação ilícita de sufrágio, fundada no art. 41–A da Lei nº 9.504 /1997, devem estar presentes os seguintes requisitos: (a) a realização de quaisquer das condutas enumeradas pelo dispositivo – doar, oferecer, prometer ou entregar bem ou vantagem pessoal de qualquer natureza a eleitor, inclusive emprego ou função pública; (b) o dolo específico de obter o voto do eleitor; (c) a participação ou anuência do candidato beneficiado; e (d) a ocorrência dos fatos desde o registro da candidatura até o dia da eleição. Precedentes. 2. Na linha da jurisprudência deste Tribunal Superior, os requisitos para a configuração da prática de captação ilícita de sufrágio devem ser comprovados nos autos por robusto conjunto probatório, sobretudo porque a procedência da ação implica a cassação do registro ou do mandato do representado, além de lhe ser aplicada multa, sem prejuízo, ainda, de que, reflexamente, incida a inelegibilidade do art. 1º , I , j , da LC nº 64 /1990. 3. De pronto, ressalta–se a validade dos elementos de prova oriundos da busca e apreensão – regularmente autorizada na fase investigativa –, notadamente o laudo pericial elaborado pela Polícia Federal acerca dos dados contidos nos celulares apreendidos, tendo em vista a natureza cautelar da referida prova, a qual se submete ao contraditório diferido, a ser realizado apenas na fase judicial. Nesse sentido: RHC nº 0600025–11/RO, rel. Min. Mauro Campbell Marques, DJe de 3.2.2022. 4. Entretanto, embora tenha havido a apreensão de documentos com dados pessoais de supostos eleitores e de dinheiro em espécie no interior do veículo de um dos cabos eleitorais da candidata, logo após deixar uma reunião política de apoio à candidata investigada, as demais conclusões do inquérito policial no sentido da prática do ilícito não foram confirmadas em Juízo. Na instrução do feito, não houve a oitiva dos servidores do MPE que participaram da busca e apreensão, do cabo eleitoral que estava em posse dos documentos relacionados ao ilícito, dos eleitores supostamente corrompidos ou, ainda, de quaisquer outras provas capazes confirmar o que apurado na fase inquisitorial. 5. Não são admitidos como prova depoimentos colhidos em inquérito policial, não confirmados em juízo, com a observância do contraditório e da ampla defesa. Precedentes. 6. Da análise do conjunto probatório, é cabível afirmar que a narrativa relacionando os documentos apreendidos pelo MPE na referida busca e apreensão perderam força probatória, na medida em que, na fase judicial, nenhuma outra prova veio aos autos a fim de confirmar o fim ilícito descrito na inicial dos autos. 7. "Para a comprovação da captação ilícita de sufrágio pelo candidato é indispensável a existência de provas suficientes dos atos praticados" (RCED nº 705/RJ, rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgado em 15.10.2009, DJe de 19.11.2009). A prova robusta a que alude a jurisprudência deste Tribunal é, evidentemente, a prova judicial. Aquela na qual se verifica a possibilidade do contraditório e da ampla defesa, e não aquela extraída exclusivamente da fase inquisitiva do inquérito policial. 8. Na espécie, é inconclusivo o laudo da Polícia Federal confeccionado com base nos dados extraídos do celular do servidor público que supostamente teria praticado os atos de captação ilícita de sufrágio, seja porque do documento pericial não é possível extrair conclusões acerca da entrega ou mesmo promessa de benesses em troca de votos, seja porque as imagens nele contidas não são capazes de confirmar que os nomes das pessoas constantes das listas apreendidas referem–se a eleitores. Destarte, as transcrições de diálogos entre pretensos eleitores e o cabo eleitoral da candidata, extraídas do celular apreendido no momento da fiscalização, não são suficientes para configurar o cometimento do ilícito 9. Não merece reparo o acórdão unânime da Corte regional que julgou improcedentes os pedidos formulados na representação ajuizada com base no art. 41 –A da Lei das Eleicoes , ao fundamento de que não ficou comprovado por meio de um conjunto probatório robusto a prática do ilícito. 10. No que concerne ao abuso de poder, a jurisprudência deste Tribunal entende que o viés econômico se caracteriza "[...] pelo uso desmedido de aporte patrimonial que, por sua vultosidade e gravidade, é capaz de viciar a vontade do eleitor, desequilibrando a lisura do pleito. Precedentes" (AIJE nº 0601771–28/DF, rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgada em 28.10.2021, DJe de 18.8.2022), enquanto o aspecto político se revela quando "[...] o agente público, valendo–se de condição funcional e em manifesto desvio de finalidade, desequilibra disputa em benefício de sua candidatura ou de terceiros" (AgR–REspEl nº 238–54/BA, rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 20.5.2021, DJe de 4.6.2021). 11. Para se caracterizar o abuso de poder, impõe–se a comprovação, de forma segura, da gravidade dos fatos imputados, demonstrada a partir da verificação do alto grau de reprovabilidade da conduta (aspecto qualitativo) e de sua significativa repercussão a fim de influenciar o equilíbrio da disputa eleitoral (aspecto quantitativo). (AIJE nº 0601823–24/DF, rel. Min. Jorge Mussi, julgada em 8.8.2019, DJe de 26.9.2019). 12. Argumenta o MPE que a suposta prática abusiva ocorreu por meio do recolhimento de dados de eleitores para posterior cadastramento deles em programas sociais operados pela Secretaria de Estado de Inclusão e Mobilização Social (SIMS) em evento alegadamente realizado para o propósito ilícito. 13. Contudo, o caderno probatório dos autos somente revela a presença, na reunião, da secretária da pasta e da investigada e imagens de um helicóptero da polícia no local. Não há elementos informativos que indiquem o montante gasto com a realização do evento e nem provas de que os eventuais eleitores presentes foram beneficiados por programas sociais. O contexto fático–probatório é insuficiente para demonstrar, quantitativa e qualitativamente, a prática do abuso dos poderes econômico e político. 14. Ademais, a narrativa dos fatos pelo investigante não ultrapassa os limites temporal e geográfico da multicitada reunião de campanha da candidata investigada, sendo, portanto, meras ilações a indigitada disseminação da prática de oferecimento das benesses. 15. É imprescindível a existência de provas robustas e incontestes para a configuração da conduta vedada e da prática de abuso do poder. Embora seja possível o uso de indícios para comprovar os ilícitos, a condenação não pode se fundar em frágeis ilações ou em presunções, especialmente em razão da gravidade das sanções impostas. ( RO nº 1788 –49/MT, rel. Min. Luís Roberto Barroso, julgado em 7.11.2018, DJe de 28.3.2019). 16. É escorreito o entendimento esposado no acórdão recorrido, que, diante do caderno probatório dos autos, não reconheceu na narrativa dos fatos a ocorrência de abuso do poder econômico ou político. 17. Recursos ordinários desprovidos.