TJ-CE - Apelação/Remessa Necessária: APL XXXXX20008060001 CE XXXXX-15.2000.8.06.0001
CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. REMESSA OFICIAL E APELAÇÃO CÍVEL EM AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA. APOSSAMENTO ADMINISTRATIVO COMPROVADO MEDIANTE LAUDO PERICIAL. IMÓVEL SUBMETIDO AO REGIME DA ENFITEUSE. TERRENO DE MARINHA. INDENIZAÇÃO QUE DEVE INCIDIR SOBRE 83% DO DOMINÍO ÚTIL. JUROS COMPENSATÓRIOS E MORATÓRIOS FIXADOS EM 6% AO ANO. CORREÇÃO MONETÁRIA. INCIDÊNCIA DESDE A DATA DO LAUDO PERICIAL ATÉ O EFETIVO PAGAMENTO. VERBA HONORÁRIA APLICADA EM DESACORDO COM OS DITAMES DO DECRETO-LEI Nº 3.365 /41. REDUÇÃO DO PATAMAR FIXADO EM 1º GRAU. REMESSA OFICIAL E RECURSOS VOLUNTÁRIOS CONHECIDOS E PARCIALMENTE PROVIDOS. 1. A demanda em análise traz ao exame desta instância revisora cinco questões controvertidas principais: a) a ocorrência ou não da desapropriação indireta; b) valor do bem objeto da desapropriação; c) o percentual que recai sobre a indenização pela desapropriação do domínio útil; d) os juros e a correção monetária aplicados ao caso; e) os honorários advocatícios. 2. Na hipótese, o espólio autor afirma que o Município de Fortaleza teria se apossado indevidamente do imóvel, lá passando a construir uma obra para alargamento da Avenida Beira-Mar, fato que caracteriza o instituto da desapropriação indireta e dá ensejo ao pagamento de indenização pelo ente expropriante. 3. Na desapropriação indireta, a administração pública se apropria de bem particular, sem que para tanto tenha havido prévio acordo ou processo judicial, sem a devida declaração de utilidade, e nem mesmo o pagamento da justa e prévia indenização. 4. De fato, a desapropriação indireta restou caracterizada, pois a prova pericial demonstrou que, no momento do apossamento do imóvel pela Municipalidade, estavam ali encravadas duas casas residenciais de nº 1701 e 1705, com área construída de 240 m2. Apontou o expert que o imóvel em questão foi totalmente ocupado pelo Município de Fortaleza, inexistindo área de terreno remanescente, apontando como valor de mercado do imóvel a quantia de R$ 1.110.732,98 (um milhão, cento e dez mil, setecentos e trinta e dois reais, e noventa e oito centavos). 5. Com efeito, o valor atribuído pelo perito mostra-se razoável, considerando as amostras de terrenos por ele utilizadas para calcular o preço do e o valor de mercado de outros imóveis localizados na mesma região em que está situado o imóvel objeto dos presentes autos. 6. No tocante ao valor da indenização, importante esclarecer que, tratando-se de terreno de marinha submetido ao regime da enfiteuse, a União possui o domínio direto do bem, enquanto o espólio autor, na condição de foreiro ou enfiteuta, possui o domínio útil do bem. Tal distinção mostra-se, por conseguinte, essencial para analisar qual o percentual da indenização receberá o detentor do domínio útil, no caso, o espólio apelante. 7. No caso dos autos, no que tange à indenização pela perda do domínio útil, não se trata do direito de resgate da enfiteuse pelo senhorio, mas de efetiva desapropriação, pelo Município, do domínio útil que o particular tinha e passou a integrar o patrimônio jurídico municipal. 8. Contudo, o valor da indenização não deve corresponder ao valor integral da área, mas ao percentual de 83% do domínio pleno, merecendo, pois, reforma a sentença, no capítulo em que considerou o percentual de 17% sobre o valor da avaliação do imóvel como devido ao espólio apelante. 9. No caso dos autos, ademais, pode-se observar que a perícia estimou o valor total do terreno desapropriado (R$ 1.110.732,98). Logo, por cálculo aritmético simples, considerando o percentual de 83% referente ao domínio útil devido ao espólio recorrente, deve este ser indenizado no valor de R$ 921.908,37 (novecentos e vinte um mil, novecentos e oito reais e trinta e sete centavos). 10. Quantos aos juros compensatórios, tratando-se de demanda não definitivamente julgada e submetida ao reexame necessário, mostra-se imperiosa a sua adequação ao entendimento que hoje vigora no Supremo Tribunal Federal, acerca da constitucionalidade da fixação dos juros compensatórios no patamar de 6% (seis por cento), conforme restou decidido na ADI nº 2332 . 11. Por sua vez, considerado o escopo de recomposição do valor da moeda definido quando da avaliação do imóvel, deve a correção monetária incidir pelo IPCA-E, nos termos da Lei n. 11.960 /2009, desde a data do laudo pericial (02/03/2016), até a data do efetivo pagamento, conforme restou decidido na sentença. 12. No que tange aos juros de mora, a sentença merece reparo, eis que devem incidir no percentual de 6% ao ano, a partir de 01 de janeiro do exercício seguinte àquele em que o pagamento deveria ser feito, nos termos do artigo 100 da Constituição Federal , consoante determina o artigo 15-B do Decreto-lei 3.365 /41, acrescido pela Medida Provisória XXXXX-56/01. 13. Por fim, quanto aos honorários advocatícios, tem-se que a lei especial que rege o procedimento de desapropriação possui uma limitação quanto à verba honorária, que não poderá ultrapassar o montante de 5% (cinco por cento) sobre o valor da condenação. 14. No caso em julgamento, verifica-se que a sentença utilizou lei geral - o Código de Processo Civil de 2015 , para arbitrar os honorários advocatícios, em detrimento da norma especial, o Decreto-Lei nº 3.365 /41, que deve ser aplicado para regular a matéria, pois, havendo antinomia entre normas, a lei especial prevalece sobre a lei geral. 15. Desse modo, a sentença deve ser reformada para reduzir a verba honorária ao montante de 5% (cinco por cento) sobre o valor da condenação, justificando-se a aplicação do patamar máximo em razão da antiguidade e complexidade da demanda, bem como pelo trabalho realizado pelos causídicos. 16. Reexame necessário e recursos voluntários conhecidos e parcialmente providos. ACÓRDÃO Vistos, discutidos e relatados os presentes autos de apelação cível em que são partes as pessoas acima indicadas, acorda a Segunda Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, à unanimidade, em conhecer da remessa oficial e dos recursos apelatórios, para dar-lhes parcial provimento, tudo nos termos do voto do Relator. Fortaleza, data e hora indicadas pelo sistema. Presidente do Órgão Julgador DESEMBARGADOR LUIZ EVALDO GONÇALVES LEITE Relator