TJ-CE - Habeas Corpus: HC XXXXX20198060000 CE XXXXX-90.2019.8.06.0000
PETIÇÃO RECEBIDA COMO HABEAS CORPUS. VICE-PREFEITO DE APUIARÉS/CE. MEDIDA CAUTELAR DE AFASTAMENTO DO CARGO. GRAVES SUSPEITAS DE CORRUPÇÃO. NECESSIDADE DE MANUTENÇÃO DA MEDIDA. ASSEGURAMENTO DA APLICAÇÃO DA LEI PENAL. PRAZO MÁXIMO DE AFASTAMENTO QUE DEVE SER FIXADO EM 180 (CENTO E OITENTA) DIAS, SALVO POR IMPERIOSA NECESSIDADE DE PRORROGAÇÃO, CONCEDENDO-SE, NESSE PARTICULAR, A ORDEM. 1. De início, na esteira do entendimento da Procuradoria-Geral de Justiça e com fulcro na fungibilidade, recebo a Petição como habeas corpus, vez que, consoante já decidiu o STJ, "segundo o entendimento desta Corte, é admissível a impetração de habeas corpus para impugnar a imposição da medida cautelar de suspensão do exercício de função pública, prevista no inciso VI do art. 319 do Código de Processo Penal , já que, em caso de descumprimento das obrigações impostas por força de outras medidas cautelares alternativas, poderá ser decretada a prisão preventiva, conforme previsto nos arts. 312 , parágrafo único , e 282 , § 4.º , ambos do CPP " (STJ, HC XXXXX/ES , Rel. Min. Laurita Vaz, 6ª Turma, julgamento em 02.10.2018, DJe 23.10.2018). 2. Na espécie, havia sido decretada a prisão preventiva do paciente e de Raimundo Nonato Alves Soares, os quais, "soltos, poderiam investir contra testemunhas e destruir documentos, comprometendo as investigações, dada a manifesta afeição pelo cometimento de ilícitos" (fls. 28), havendo o Juiz a quo asseverado que eles passaram a contribuir com as investigações, demonstrando boa-fé e auxiliando o Estado na persecução penal, não subsistindo a suspeita originária de que poderiam prejudicar a instrução processual, a qual existia à época em que foi decretada a custódia cautelar, circunstâncias que levou o Magistrado de 1º Grau a revogar o ergástulo preventivo, substituindo-o por medidas cautelares alternativas, dentre elas, em relação ao paciente, o afastamento do cargo que ocupa (vice-prefeito de Apuiarés/CE). 3. Extrai-se dos autos que o paciente, supostamente, recebeu, para si, diretamente, em razão da sua função (vice-prefeito de Apuiarés/CE que havia assumido interinamente o cargo de prefeito, após o afastamento do titular), vantagem indevida (dinheiro), prorrogando os contratos de prestação de serviços com a empresa PATROL, praticando atos que infringiram o seu dever funcional de zelar pelo erário. 4. A prisão preventiva do paciente foi decretada em 13.11.2018 (fls. 57/67) e, posteriormente, substituída por medidas cautelares alternativas, dentre elas o afastamento do cargo (fls. 26/32). 5. Em verdade, a situação narrada nos autos é grave e, conforme narrado pelo Ministério Público (fls. 35/49), "com o afastamento do então Prefeito Roberto, o seu vice assumiu interinamente o referido cargo, vindo este a procurar o então empresário para saber como funcionava as tratativas", sendo que, "nessa oportunidade, Darlan esclareceu a situação supracitada, tendo Abidias determinado que o esquema deveria continuar" (fls. 35), além do que "na ocasião do seu depoimento, Sr. Darlan forneceu ao Ministério Público cópia de uma filmagem em que é possível ver Darlan entregando dinheiro a Abidias e este recebendo e guardando em seus bolsos" e que "o Sr. Darlan, ainda acrescentou em seu depoimento que o pagamento fora feito durante todo o período em que Abidias Ferreira esteve prefeito, ou seja, 06 (seis) meses, configurando, desta forma, crime continuado" (fls. 35 e 37), de maneira que o vice-prefeito de Apuiarés/CE, se permanecer no exercício do cargo, poderá, concretamente, destruir provas e intimidar testemunhas e investigados, prosseguindo, enfim, em sua empreitada criminosa. 6. Assim sendo, é de rigor a manutenção do afastamento do cargo, determinada pelo Juiz a quo, na medida em que vice-prefeito de Apuiarés/CE, considerando o seu poder político e social, poderá perturbar a coleta de provas e tumultuar a instrução processual, desvencilhando-se de documentos que, eventualmente, possam embasar a tese acusatória ou mesmo influenciar/pressionar testemunhas e investigados, o que coloca em risco a própria aplicação da lei penal, "diante da incompatibilidade dos graves atos de corrupção patrocinados pelo mesmo com o eventual exercício da administração municipal" (fls. 32), tendo já decidido o STJ que "demonstrado o nexo entre o delito praticado e a atividade funcional desenvolvida pelo agente, além de sua imprescindibilidade para evitar a continuidade da utilização indevida do cargo e mandato, encontra a medida aplicada [afastamento cautelar do cargo] amparo justamente na finalidade de evitar-se a reiteração delitiva, não havendo falar-se, portanto, em ausência de fundamentação" (STJ, HC XXXXX/MG , Rel. Min. Nefi Cordeiro, 6ª Turma, julgamento em 17.04.2018, DJe 27.04.2018). 7. Por outro lado, o afastamento não poderá ultrapassar 180 (cento e oitenta) dias, a contar da data do decisum que aplicou as medidas cautelares, sob pena de haver cassação indireta do mandato e em respeito ao art. 9º da Resolução nº 213/2015 do CNJ, devendo, nesse particular, ser concedida a ordem, fixando-se em 180 (cento e oitenta) dias o prazo máximo de afastamento do cargo, salvo por imperiosa necessidade de prorrogação. 8. Petição recebida como habeas corpus. Ordem concedida para fixar em 180 (cento e oitenta) dias o prazo máximo de afastamento do cargo, a contar da data do decisum que aplicou as medidas cautelares, sob pena de haver cassação indireta do mandato e em respeito ao art. 9º da Resolução nº 213/2015 do CNJ, salvo por imperiosa necessidade de prorrogação. ACÓRDÃO: Vistos, relatados e discutidos estes autos, acorda a 3ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará em receber a Petição como habeas corpus e conceder a ordem, apenas para fixar em 180 (cento e oitenta) dias o prazo máximo de afastamento do cargo, a contar da data do decisum que aplicou as medidas cautelares, sob pena de haver cassação indireta do mandato e em respeito ao art. 9º da Resolução nº 213/2015 do CNJ, salvo por imperiosa necessidade de prorrogação, nos termos do voto do Relator. Fortaleza, 02 de julho de 2019. Francisco Lincoln Araújo e Silva Presidente do Órgão Julgador DESEMBARGADOR HENRIQUE JORGE HOLANDA SILVEIRA Relator Procurador (a) de Justiça