AGRAVO DE INSTRUMENTO INTERPOSTO PELO RECLAMADO. 1. RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467 /2017. TRANSCENDÊNCIA POLÍTICA RECONHECIDA. De acordo com o artigo 896-A da CLT , a esta colenda Corte Superior, em sede de recurso de revista, compete examinar previamente a transcendência da causa em relação aos reflexos gerais de natureza econômica, política, social ou jurídica. Nessa perspectiva, por meio do aludido instrumento recursal extraordinário, apenas serão objeto de exame as matérias controvertidas que ultrapassem a esfera dos interesses subjetivos das partes litigantes. Não se pode olvidar que os artigos 926 e 927 do CPC , plenamente aplicáveis nesta Justiça Especializada, reconheceram a função nomofilácica dos Tribunais Superiores, aos quais compete garantir a unidade do Direito, a partir da uniformização da interpretação dos enunciados normativos aplicáveis às demandas de sua competência. Desse modo, ao Tribunal Superior do Trabalho é atribuído o encargo de uniformizar a interpretação dos enunciados legais e constitucionais em matéria de sua competência, de modo que os precedentes por ele editados deverão ser aplicados pelos demais julgadores e Tribunais Regionais do Trabalho aos casos semelhantes ou idênticos. Cumpre destacar, por oportuno, que, a despeito de esta Corte deter competência para examinar questões constitucionais em sede recursal extraordinária, ao Supremo Tribunal Federal cabe proferir a última palavra acerca da matéria, tendo em vista que o Poder Constituinte originário a ele outorgou a função de guarda da Constituição Federal . No caso do instituto da transcendência, o Tribunal Superior do Trabalho foi autorizado, pelo legislador, a selecionar as matérias relevantes e de interesse público, conferindo-lhes meios para o exercício de seu mister, deixando evidente que esta não se trata de mera Corte de revisão. O § 1º do artigo 896-A da CLT estabelece os parâmetros em que é possível reconhecer o interesse público no julgamento da causa e, por conseguinte, a sua transcendência, ao prever os indicadores de ordem econômica, política, jurídica e social. Com relação ao critério político, cumpre salientar que este estará evidenciado nas hipóteses em que o Tribunal Regional de origem deixar de observar as decisões proferidas em controle concentrado de constitucionalidade, as súmulas vinculantes do excelso Supremo Tribunal Federal, os acórdãos proferidos em incidente de recurso repetitivo ou em repercussão geral, bem como os verbetes jurisprudenciais desta colenda Corte Superior ou a sua jurisprudência atual, iterativa e notória. Na hipótese , o acórdão regional destoa da jurisprudência atual, iterativa e notória desta Corte Superior, no tocante à ausência de responsabilidade civil quando demonstrada a culpa exclusiva da vítima. Nesse contexto, resta evidenciada a transcendência política da causa. 2. RESPONSABILIDADE CIVIL. ACIDENTE DE TRABALHO. CULPA EXCLUSIVA DA VÍTIMA EVIDENCIADA. PROVIMENTO. Por prudência, ante possível afronta aos artigos 186 e 927 do CC , o destrancamento do recurso de revista é medida que se impõe. Agravo de instrumento a que se dá provimento . RECURSO DE REVISTA. RESPONSABILIDADE CIVIL. ACIDENTE DE TRABALHO. CULPA EXCLUSIVA DA VÍTIMA EVIDENCIADA. PROVIMENTO. A responsabilidade civil do empregador pressupõe a comprovação do dano e do nexo causal, admitindo, igualmente, a oposição de excludentes capazes de elidir o nexo de causalidade (culpa exclusiva da vítima, caso fortuito ou força maior e fato de terceiro). Com efeito, a existência de culpa exclusiva da vítima rompe o próprio nexo causal, pois não se pode imputar ao empregador, porquanto não decorrente do exercício das funções desempenhadas pelo empregado, acidente resultante da imprudência deste. Na mesma linha, rompem o nexo causal o caso fortuito e a força maior. Em tais circunstâncias, não há dever de reparar, uma vez que inaplicável à seara trabalhista a teoria do risco integral, salvo nos casos constitucionalmente previstos, como os danos nucleares (artigo 21 , XXIII , d e 225 , § 3º , da Constituição Federal ). No caso em exame, o reclamante foi vitimado por acidente de trabalho quando, no exercício da função de tratorista, resolveu retirar as folhas que entupiam a máquina denominada "varre-tudo", sem desligar o equipamento, e acabou tendo a sua mão direita sugada, resultando na amputação traumática total da falange distal, média e proximal e parte média dos 2º, 3º, 4º e 5º metacarpos. Conforme as premissas fáticas fixadas no acórdão regional, o reclamante foi devidamente instruído sobre a utilização do implemento agrícola, visto que recebeu treinamento específico; além de estar expresso no aparelho o seguinte aviso: "Não dê manutenção e não faça qualquer ajuste neste conjunto com a máquina em funcionamento. Risco de acontecer graves acidentes". Infere-se, portanto, que o acidente decorreu de culpa exclusiva do empregado, porquanto, apesar de ter recebido o necessário e específico treinamento para operar o equipamento, optou por descumprir a norma de segurança e, principalmente, ignorar o alerta expresso contido na máquina quanto à necessidade de desligá-la antes de proceder à sua limpeza. Tratando-se de iniciativa que foi adotada por conta e risco do próprio empregado - que, frise-se, detinha todas as condições para prever a ocorrência do acidente - , o empregador não poderia ter evitado o infortúnio. Não se sustenta, dessa forma, o fundamento do Tribunal Regional quanto à "ausência de efetiva fiscalização", mormente porque, embora esteja amparado no fato de que "era prática dos funcionários efetuarem a limpeza da máquina sem desligá-la, a despeito do aviso quanto a possibilidade de sinistro", não há registro no acórdão de que o reclamado tinha ciência dessa prática insegura, o que reforça a culpa exclusiva do reclamante. Com efeito, sem a ciência do empregador acerca da deliberação arriscada do empregado, este deve ser o único responsável pelo dano que ele próprio causou. Nesse sentido, o AIRR-XXXXX-04.2013.5.20.0001 (7ª Turma, Relator Ministro Claudio Mascarenhas Brandão, DEJT 18/2/2022). Ademais, não se pode dizer que a função exercida pelo autor desta ação seja considerada de risco extremo, a ponto de se exigir supervisão constante e ininterrupta, sobretudo porque demonstrado que o empregador adotou todas as medidas de segurança necessárias ao treinamento e conhecimento do empregado sobre o equipamento a ser utilizado. Estando o empregado habilitado para o trabalho, como restou evidenciado no acórdão recorrido, é o que basta para que ele possa exercer suas funções, sendo cabível o acompanhamento apenas se o empregado estiver em fase de treinamento, não sendo esse o caso dos autos. Desse modo, considerando haver o reclamante, deliberadamente, desobedecido às normas de segurança, assumindo, por consequência, o risco de se lesionar, não se mostra plausível atribuir ao reclamado, ainda que de forma concorrente, a responsabilidade por um dano ao qual não deu causa, tampouco contribuiu para a sua ocorrência. Há precedentes em casos semelhantes. Recurso de revista de que se conhece e a que se dá provimento, confirmando-se a concessão de efeito suspensivo ao recurso.