TJ-GO - XXXXX20218090091
EMENTA: RECURSO INOMINADO. JUIZADO ESPECIAL DA FAZENDA PÚBLICA. AÇÃO DE COBRANÇA. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA DE APOSENTADO. ARTIGO 40 , § 18 , DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL . REFORMA TRAZIDA PELA EC 103 /2019. NOVA HIPÓTESE TRIBUTÁRIA. EC 65/2019. BASE DE CÁLCULO E ALÍQUOTA. AUSÊNCIA DE LEGISLAÇÃO ESPECÍFICA. INVIABILIDADE DE COBRANÇA. PRINCÍPIO DA LEGALIDADE DESCUMPRIDO. IMPOSSIBILIDADE DE TRIBUTAR POR ANALOGIA. SENTENÇA MANTIDA. 1. Trata-se de recurso inominado interposto por Goiás Previdência (GOIASPREV), em face de sentença proferida pela MM. Juíza de Direito do Juizado Especial Cível da Comarca de Jaraguá - GO, a qual julgou parcialmente procedentes os pleitos iniciais, condenando a GOIASPREV a devolver à parte autora os valores descontados dos proventos de sua aposentadoria, entre abril e dezembro de 2020, provenientes de contribuições previdenciárias de servidor inativo (art. 101, § 4º-A, da CE), ressalvados os descontos amparados pelo art. 40 , § 18 , da CF (art. 23, II, da LC 77/2010 e art. 18, II, da LC 161/2020), conforme fichas financeiras juntadas aos autos. 2. Em resumo dos fatos, declara a autora que é servidora pública estadual aposentada no cargo de Técnico Fazendário Estadual, Classe I, Padrão 3, da Carreira de Apoio Fiscal-Fazendário da Secretária da Fazenda, com proventos integrais. Sustenta ter sido surpreendida com descontos previdenciários em seus contracheques, no importe de 14,25%, referentemente às alterações constitucionais advindas pelas emendas federal (EC 103 /19) e estadual (EC 65/2019), as quais não fixaram a alíquota a ser imposta ao novel tributo que incide sobre os seus proventos de aposentadoria. Diante de tais narrativas, pugna pela declaração de ilegalidade da cobrança nos períodos entre abril de 2020 a dezembro de 2020 da alíquota de 14,25%, e, consequentemente, restituição de todos os valores referentes à contribuição previdenciária ? civil ? inativo, descontados em folha com juros e correção monetária. 3. Cumpre esclarecer que a parte Autora fora aposentada pelo Regime Próprio da Previdência Social por integrar os quadros do funcionalismo público estadual, gozando do benefício trazido pelo § 18 , do artigo 40 , da Constituição Federal , não inserindo-se na imunidade tributária concedida aos aposentados por doença incapacitante prevista no § 21 da mencionada norma, revogado pela Emenda Constitucional 103 /2019. 4. De acordo com o artigo 40 , § 18 , da Constituição Federal , incidirá contribuição sobre os proventos de aposentadorias e pensões que superem o limite máximo estabelecido para os benefícios do regime geral de previdência social de que trata o art. 201, com percentual igual ao estabelecido para os servidores titulares de cargos efetivos. 5. Com a edição da Emenda Constitucional 103 /2019 ? que incluiu no texto constitucional o § 1º-A ao artigo 149 ?, tornou-se possível a exigência de contribuição previdenciária dos aposentados e pensionista sobre os valores que ultrapassarem um salário-mínimo, nos seguintes termos: ?Quando houver deficit atuarial, a contribuição ordinária dos aposentados e pensionistas poderá incidir sobre o valor dos proventos de aposentadoria e pensões que supere o salário-mínimo?. 6. A aplicabilidade da mencionada disposição constitucional pelos regimes próprios de aposentadoria dos Estados, Municípios e Distrito Federal ficou condicionada a criação de lei de iniciativa privativa do Poder Executivo respectivo referendando-a, consoante disposição do artigo 36, da dita emenda. 7. O Poder Executivo do Estado de Goiás, visando endossar a nova medida previdenciária, editou a Emenda à Constituição Estadual 65/2019, reproduzindo a norma constitucional contida no artigo 101, § 4º-A da Constituição Estadual, in verbis: ?Art. 101: O Estado e os Municípios poderão instituir os seguintes tributos: § 4º-A A contribuição ordinária dos aposentados e pensionistas do Estado e dos Municípios incidirá sobre o valor dos proventos de aposentadoria e de pensões que superem o salário-mínimo, quando houver deficit atuarial no RPPS?. 8. Considerando a contextualização exposta, torna-se evidente que a cobrança, em si, de contribuição previdenciária sobre proventos de aposentadoria que ultrapassem o valor de um salário-mínimo é viável e constitucionalmente prevista. Logo, cinge-se a controvérsia quanto a exigência de tal tributo pelo Estado de Goiás, bem como, a alíquota aplicável. 9. Observa-se que a disposição trazida pelo artigo 1º da EC 103 /2019, que introduziu o § 1º-A ao artigo 149 da CF , possui eficácia normativa limitada em relação aos Estados-membros, uma vez que condiciona seus efeitos a atuação do legislador infraconstitucional no tocante a edição de lei de iniciativa privativa do Poder Executivo. 10. Dispõe o Código Tributário Nacional , em seu artigo 97 , que somente mediante lei poderá se estabelecer a majoração de tributos ou sua redução, a definição do fato gerador da obrigação tributária principal e a fixação de alíquota do tributo e da sua base de cálculo. 11. Apesar de a EC Estadual n. 65, de 21 de dezembro de 2019, referendar a possibilidade da cobrança de tributo dos aposentados e pensionistas que recebam acima de um salário-mínimo, inexistia norma ordinária regulamentando a forma desta cobrança, independentemente das arguições trazidas pela parte Recorrente. 12. No caso em apreço, estava sendo aplicada a Lei Complementar n. 77/2010 aos servidores inativos, a qual previa a alíquota de 14,25% para a contribuição dos inativos cujos proventos superassem o teto do INSS, não havendo previsão do valor da alíquota no caso de segurado inativo e pensionista que auferisse entre um salário- mínimo e teto da previdência. 13. Desse modo, em que pese inexistisse qualquer óbice legal à incidência de contribuição previdenciária nos proventos que superassem um salário-mínimo, após a EC estadual n. 65, de 21 de dezembro de 2019, havia necessidade de lei prevendo a base de cálculo e a alíquota, a qual inexistia. 14. Observa-se que a Lei Complementar n. 161/2020, que dispõe sobre o Regime Próprio de Previdência Social do Estado de Goias RPPS/GO, revogou as disposições trazidas pela Lei Complementar n. 77/2010, estabelecendo que a contribuição previdenciária mensal e compulsória será devida pelos aposentados e pensionistas, nos termos estabelecidos anteriormente pela norma revogada. Contudo, acrescentou que ?Art. 18. § 2º Nos termos do § 4º-A do art. 101 da Constituição Estadual, enquanto houver deficit atuarial no âmbito do Regime Próprio de Previdência Social do Estado de Goiás, comprovado por meio de avaliações atuariais apresentadas ao órgão federal fiscalizador, a contribuição previdenciária paga pelos aposentados e pensionistas de que trata o inciso II do caput deste artigo, incidirá sobre o montante dos proventos de aposentadoria e de pensões que supere o salário mínimo nacional?. 15. A mencionada disposição legal regulamentou, por norma específica, a alíquota a incidir sobre os proventos de aposentadoria que ultrapassem o valor do salário-mínimo, no montante de 14,25%, consoante ao artigo 18, inciso II, § 2º da Lei Complementar n. 161/2020, em respeito ao Princípio da Legalidade Estrita, o que não ocorria com a Lei Complementar n. 77/2010. 16. Entretanto, a Lei Complementar 161/2020 passou a produzir seus efeitos apenas a partir de se sua entrada entrou em vigor, que ocorreu em 31 de março de 2021, considerando sua publicação em 30 de dezembro de 2020 e o princípio da noventena, motivo pelo qual no período anterior a março de 2021, inexistia lei específica regulamentando a alíquota a incidir sobre os proventos de aposentadoria que superassem o valor do salário-mínimo, nos moldes da reforma previdenciária ocorrida no ano de 2019. 17. Desse modo, inviável o emprego da regra estabelecida na Lei Complementar n. 77/2010, por tratar-se de hipótese tributária distinta e frente a vedação de utilização da analogia na imposição de obrigação de pagamento de tributo, conforme já mencionado, em respeito ao Princípio da Legalidade Estrita, norte de atuação para todos os Poderes, e a vedação da utilização da analogia em matéria tributária no tocante a imposição de tributos (STF, RE 80744 ). 18. Na espécie, não merece reparos a sentença singular, vez que os descontos efetuados encontravam-se eivados de ilegalidade, devido à ausência de norma regulamentar específica a época dos fatos, tornando legítima a determinação de devolução destes (Precedentes: 1ª Turma Recursal dos Juizados Especiais, processo n. XXXXX-68.2020.8.09.0146 , Relatora: Alice Teles De Oliveira, publicado em 08/06/2021; 1ª Turma Recursal dos Juizados Especiais, processo n. XXXXX- 47.2020.8.09.0010, Relatora: Alice Teles De Oliveira, publicado em 28/04/2021; e 2ª Turma Recursal dos Juizados Especiais, processo n. XXXXX-11.2020.8.09.0010 , Relatora: Rozana Fernandes Camapum, publicado em 01/06/2021). 19. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. 20. Fica o ente fazendário condenado ao pagamento dos honorários advocatícios, estes arbitrados no patamar de 15% (quinze por cento) sobre o valor da condenação, nos termos do art. 55 da Lei n. 9.099 /95. 21. Sem custas, por expressa determinação legal, conforme depreende-se do artigo 36, inciso III, da Lei Estadual n. 14.376/02 c/c o artigo 40, inciso I, da Lei Federal n. 9.289 /96.