APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO ILÍCITO DE DROGAS. PORTE DE ARMA DE FOGO. ABSOLVIÇÃO POR AUSÊNCIA DE PROVAS. INDICATIVO DE TORTURA NA CONFISSÃO TOMADA PELA AUTORIDADE POLICIAL. LAUDO DE EXAME DE CORPO DE DELITO POSITIVO. NEGATIVA DE AUTORIA EM JUÍZO. INFORMES DOS POLICAIS NÃO COESOS. BUSCA DOMICILIAR. ILEGALIDADE. PRECEDENTES. INTELIGÊNCIA DO ART. 386 , VII , DO CPP . PREJUDICADOS OS DEMAIS ELEMENTOS DE DEFESA. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. 01 - Neste caso concreto, a competente Defensoria Pública argui a ausência de prova para a condenação do apelante pelos crimes dos quais é acusado. No ponto, informa que os depoimentos dos policiais militares não é coeso. Ademais, prova inquisitorial não restou confirmada judicialmente, dado que decorrente de tortura, conforme exame de corpo de delito nos autos, à fl. 86. De fato, o réu, quando ouvido sob o contraditório, afirmou que nenhum dos apetrechos dos crimes lhe pertenciam. E, ainda, teria sido espancado pelos policiais, de modo que a confissão resultou de medo, segundo se infere da audiência, à fl. 172, (mídia digital). Na sequência, nada obstante este conjunto probatório nos autos, a sentença, à fl. 220, proclamou: "(...) a confissão do réu, na fase inquisitorial, constitui prova inafastável, indiferentemente da retratação em Juízo, principalmente quando não há provas de que foi realizada mediante expediente fraudulento, coação ou ameaça (...)". (Sublinhado no original). 02 De plano, pelas consignações do decisorium litis, em contrariedade aos elementos probantes, infere-se que o decreto condenatório não pode ser coonestado, até porque verifico que a versão esposada pelos policiais, que participaram do flagrante do incriminado, não pode ser admitida, dada a ausência de verossimilhança, quando afirmam que o réu teria, espontaneamente, os levado até sua residência onde teria sido encontrada a droga. Sobre o tema, segue excerto de aresto do c. STJ: "(...) 6. "Segundo a nova orientação jurisprudencial, o ônus de comprovar a higidez dessa autorização, com prova da voluntariedade do consentimento, recai sobre o estado acusador" ( HC n. 685.593/SP , relator Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, SEXTA TURMA, julgado em 14/10/2021, DJe 19/10/2021). 7. Agravo regimental desprovido. ( AgRg no REsp n. 1.994.151/MG , relator Ministro Antônio Saldanha Palheiro, Sexta Turma, julgado em 16/8/2022, DJe de 19/8/2022.)". 03 - Como se sabe, a tortura para se obter confissão resulta na ilicitude probatória, cujo evento contamina as demais prova dela resultante, porquanto são frutos de uma árvore envenenada, de modo que não se prestam ao embasamento do sustentado pelo órgão de acusação. Na seara, o art. 5º , III , da Constituição da Republica Federativa do Brasil , prescreve:"ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante". Nesse cenário, a absolvição é medida que se impõe ( CPP , art. 386 , VII ). Essa é orientação desta Terceira Câmara Criminal deste Tribunal de Justiça que, inclusive, admite a declaração de nulidade de ofício, uma vez constatada a tortura, como se infere de trecho da seguinte deliberação:"DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. TRÁFICO ILÍCITO DE DROGAS. SENTENÇA CONDENATÓRIA. APELAÇÃO CRIMINAL EXCLUSIVA DA DEFESA. PLEITO ABSOLUTÓRIO. POSSIBILIDADE. PROVA DECLARADA ILÍCITA, DE OFÍCIO. PROVA POTENCIALMENTE OBTIDA MEDIANTE TORTURA. LAUDO PERICIAL. PRESENÇA DE MÚLTIPLAS LESÕES INCOMPATÍVEIS COM SIMPLES QUEDA. TEORIA DOS FRUTOS DA ÁRVORE ENVENENADA. IMPRESTABILIDADE DAS PROVAS DERIVADAS DA PROVA ILÍCITA. RECURSO CONHECIDO. MÉRITO RECURSAL NÃO APRECIADO. QUESTÃO DE ORDEM PÚBLICA PREJUDICIAL DE MÉRITO. PROVAS DECLARADAS ILÍCITAS, DE OFÍCIO. RÉU ABSOLVIDO. (...) 5. É cediço que os depoimentos de agentes policiais são de suma importância para elucidar as circunstâncias dos fatos, sendo considerado meio de prova idôneo, quando colhidos sob o crivo do contraditório e da ampla defesa. Na ordem jurídica brasileira inexiste barreira legal ao reconhecimento da validade das declarações prestadas por policiais. (...) 8. Importante relembrar, ainda, a questão das provas ilícitas por derivação, que são aquelas provas que em si mesmas são lícitas, mas que foram captadas de forma ilícita. É a conhecida teoria dos "frutos da árvore envenenada", segundo a qual o vício da planta se transmite a todos os seus frutos. Assim, verificando-se que somente foi possível encontrar determinada prova (drogas ilícitas), laudos periciais, depoimento de policiais militares, mediante uma possível abordagem mediante tortura, resulta inquestionável que as provas subsequentes somente vieram à tona em razão da ilicitude inicialmente praticada e, portanto, são igualmente inadmissíveis, de modo que impõe-se a absolvição do apelante, haja vista a ausência de provas independentes e suficientes para condenação (art. 386 , VII , do CPP ). (...) ( Apelação Criminal - XXXXX-57.2020.8.06.0001 , Rel. Desembargador (a) MARLÚCIA DE ARAÚJO BEZERRA, 3ª Câmara Criminal, data do julgamento: 26/04/2022, data da publicação: 26/04/2022)". 04 - Recurso conhecido e provido, para, reconhecida a nulidade da prova, absolver o réu, com base no art. 386 , VII , do CPP (inexistência de prova suficiente para condenação). Reputo prejudicadas as demais teses contidas no apelo. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acorda a 3ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, em conhecer, para prover o recurso, nos termos do voto do Relator. Fortaleza, 13 de setembro de 2022 Desembargador Francisco Darival Beserra Primo Relator