APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO ANULATÓRIA DE COMPRA E VENDA DE BEM IMÓVEL. VENDA DE ASCENDENTE PARA DESCENDENTE (AVÔ PARA NETO). AUSÊNCIA DE ANUÊNCIA DOS DEMAIS DESCENDENTES. ALEGAÇÃO DE DECADÊNCIA. FALTA DE INTERESSE RECURSAL NO PONTO. SIMULAÇÃO. RECONHECIMENTO. PRESENÇA DOS REQUISITOS. AUSÊNCIA DE PROVA DO EFETIVO PAGAMENTO. CAUSA DE NULIDADE DO NEGÓCIO JURÍDICO. RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESSA EXTENSÃO, IMPROVIDO. SENTENÇA MANTIDA. 1. Cuida-se de Apelação interposta com o fim de reformar sentença que julgou procedente o pedido autoral nos autos da Ação Anulatória de Compra e Venda, reconhecendo a simulação do negócio jurídico. 2. A princípio, destaco que o pedido inicial visou à anulação do negócio jurídico com base em 3 alegações: a) simulação, haja vista a ausência de prova do pagamento do preço de R$227.500,00 (duzentos e vinte e sete mil e quinhentos reis); b) ausência de capacidade civil dos vendedores, porquanto são portadores do Mal de Alzheimer; c) ausência de anuência dos demais descendentes dos vendedores, uma vez que se trata de venda de ascendente para descendente (de avô para neto). Entretanto, a sentença hostilizada anulou o negócio jurídico ao fundamento de que se tratou de ato simulado, configurado pela intenção de enganar e pela ausência de prova do pagamento do preço. Nesse contexto, os apelantes não têm interesse recursal quanto à alegação de que a pretensão anulatória se encontra fulminada pela prescrição e/ou decadência de 2 (dois) anos quanto à anuência dos descendentes, haja vista que o decisum combatido não se baseou nessa tese. Recurso não conhecido no ponto. 3. São requisitos da simulação (1) a criação de um ato jurídico inverídico em si (quanto aos sujeitos, quanto ao objeto, quanto à data ou quanto às disposições negociais), (2) a vontade declarada diversa da vontade interna, (3) que todos os sujeitos da relação tenham conhecimento pleno do ato de simulação. Assim, a simulação é composta por três elementos: intencionalidade da divergência entre a vontade interna e a declarada; intuito de enganar; e conluio entre os contratantes. 4. No caso em tela, tem-se que o avô (autor) teria vendido para seu neto (promovido) o imóvel descrito nos autos, nos termos da escritura de compra e venda acostada aos fólios, datada de 15/12/2015. 5. Do acervo probatório juntado aos autos não é possível extrair a prova do pagamento do valor de R$227.500,00 (duzentos e vinte e sete mil e quinhentos reais) aos recorridos. Ao revés, no seu próprio depoimento pessoal, o apelante afirmou que até o ano de 2015 não tinha sequer uma conta bancária e que trabalhou com seu avô ate 2014, alegando que juntou referida quantia em casa, fazendo economias, mas não sabendo explicar a sua origem. Impende destacar que nem mesmo suas declarações de imposto de renda foram suficientes para corroborar a compra e venda, haja vista diversas incongruências constatadas pelo Juízo a quo. 6. Some-se, ainda, o fato de que é pouco crível que uma pessoa mediana, mesmo havendo relação de parentesco e confiança entre os contratantes, não formalizasse o pagamento de um bem imóvel no valor expressivo de R$227.500,00 (duzentos e vinte e sete mil reais e quinhentos reais), ficando sem qualquer prova concreta do adimplemento, seja um recibo ou um comprovante de depósito ou transferência bancária, ainda mais sabendo-se que possivelmente os demais descendentes do autor poderiam contestar o negócio, como, de fato, aconteceu. 7. No que tange ao áudio à fl. 116, o mesmo não é bastante para corroborar o pagamento do preço do imóvel objeto da ação, vez que dele não é possível extrair quem são os interlocutores, quando ocorreu a interlocução, qual imóvel que foi vendido para o apelante, nem o valor da negociação. 8. Na espécie, a prova dos autos, ou a falta dela, leva a crer que o presente caso se insere na hipótese do inciso II do art. 167 do Código Civil , na medida em que o negócio jurídico de compra e venda firmado entre avô e neto se encontra eivado por declaração/cláusula não verdadeira. Diz-se isto porque a escritura pública não declara a verdade ao dispor que o pagamento já foi realizado, posto que não há prova desse pagamento nos autos. Com efeito, as circunstâncias apontam que os contratantes, na verdade, praticaram uma doação, simulando-a como se compra e venda fosse, havendo uma combinação de vontades das partes para realizar o negócio jurídico simulado, em detrimento do direito sucessório dos demais herdeiros. 9. Não subsistem, portanto, dúvidas de que a Escritura Pública traz em si a aparência de um negócio jurídico contrário à realidade nele estampada e à vontade realmente declarada, posto que a compra e venda de fato não existiu, haja vista a circunstância de que o valor da suposta negociação nunca ter sido repassado aos autores, conforme amplamente demonstrado nos autos, inobstante assim ter constado no instrumento público. 10. Nessa perspectiva, importa destacar que a simulação é tratada no atual Código Civil como hipótese de nulidade do ato, de modo que, uma vez constatada pelo Magistrado, este há de declará-la, pois impossível a sua convalidação, a teor dos artigos 167 a 169 do citado diploma legal. 11. Recurso conhecido em parte e, nessa extensão, improvido. Sentença mantida. ACÓRDÃO: Vistos, relatados e discutidos estes autos, acorda a 2ª Câmara Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, unanimemente, em conhecer parcialmente do recurso interposto e, nessa extensão, negar-lhe provimento, nos termos do voto da relatora.