TJ-AC - Apelação Cível: AC XXXXX20188010002 AC XXXXX-95.2018.8.01.0002
DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. APLICAÇÃO DA LEI 8.429 /92 AOS AGENTES POLÍTICOS. POSSIBILIDADE. DIREITO ADMINISTRATIVO SANCIONADOR. LEI N.º 14.230 /2021. NOVATIO LEGIS IN MELLIUS. RETROATIVIDADE. DISPENSA INDEVIDA DE LICITAÇÃO ( LIA , ART. 10 , VIII ). ELEMENTOS OBJETIVOS. PROVA DO EFETIVO PREJUÍZO. NECESSIDADE. ELEMENTOS SUBJETIVOS. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA CULPOSA. IMPOSSIBILIDADE. DOLO ESPECÍFICO. OVERRIDING DOS PRECEDENTES DO STJ E TJAC SOBRE A MATÉRIA. APELO DESPROVIDO. 1. Consoante fixado pelo Supremo Tribunal Federal em mérito de Repercussão Geral, "independentemente de as condutas dos Prefeitos e Vereadores serem tipificadas como infração penal (artigo 1º) ou infração político-administrativa (artigo 4º), previstas no DL 201 /67, a responsabilidade civil por ato de improbidade administrativa é autônoma e deve ser apurada em instância diversa" (STF. RE XXXXX , Rel. Min. Alexandre de Moraes, Tribunal Pleno, j. 13.9.2019. Mérito de Repercussão Geral). 2. Nos termos do § 4º do art. 1º da Lei Federal n.º 8.429 /92, aplicam-se ao sistema de responsabilidade por improbidade os princípios constitucionais de direito administrativo sancionador, dentre os quais se inclui a retroatividade da lei material mais benéfica (novatio legis in mellius). Precedentes do Superior Tribunal de Justiça a respeito da retroatividade de normas benéficas supervenientes no âmbito da responsabilidade disciplinar de servidores públicos, espécie do gênero direito administrativo sancionador ( AgInt no RMS XXXXX/RO , Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, j. 17.8.2021; RMS XXXXX/SP , Rel. Ministra Regina Helena Costa, Primeira Turma, j. 8.2.2018). 3. Por veicular normas de caráter benéfico aos réus em ações de improbidade administrativa, a Lei Federal n.º 14.230 /2021 há de retroagir para alcançar condutas praticadas antes de sua vigência. Precedente desta Primeira Câmara Cível ( Apelação Cível n.º XXXXX-92.2017.8.01.0003 . Rel. Des. Laudivon Nogueira. J. 9.3.2022). 4. Com a vigência da Lei 14.230 /2021, a configuração da improbidade administrativa prevista no inciso VIII do art. 10 da LIA passou a exigir dois elementos materiais, a dispensa indevida de licitação e o efetivo prejuízo aos cofres públicos. Este prejuízo não há de ser presumido, mas efetivamente comprovado nos autos, e caso o objeto da contratação tenha sido efetivamente entregue ou prestado à administração se consubstancia na diferença entre o valor mais alto despendido pelo ente público e o inferior preço de mercado do produto ou serviço contratado sem licitação. Desta forma, o ato de improbidade descrito no inciso VIII do art. 10 da LIA não mais é um ilícito de mera conduta, exigindo a prova do resultado danoso ao erário. Overriding dos precedentes do Superior Tribunal de Justiça e do TJAC que tratavam da matéria. 5. À luz da nova redação dos §§ 1º a 3º do art. 1º e § 2º do art. 10 , todos da Lei 8.429 /1992, deixou de existir, no âmbito do sistema de direito sancionador brasileiro, a figura da improbidade administrativa culposa, passando os danos ao erário decorrentes de condutas culposas a ser coibidos mediante outras modalidades de responsabilidade, a exemplo das ações judiciais de indenização (responsabilidade civil) ou mesmo as multas e obrigações de ressarcimento cominadas pelos Tribunais de Contas (responsabilidade administrativa). Overriding dos precedentes do Superior Tribunal de Justiça e do TJAC que tratavam da matéria. 6. Igualmente, da nova redação dos §§ 1º a 3º do art. 1º , da Lei 8.429 /1992, se depreende a ocorrência de overriding dos precedentes do Superior Tribunal de Justiça e do TJAC a respeito da suficiência de dolo genérico para a configuração do ato de improbidade administrativa. Doravante, faz-se necessária a prova do dolo específico. 7. Especificamente em relação à improbidade prevista na parte final do inciso VIII do art. 10 da Lei 8.429 /1992 dano ao erário por dispensa indevida de licitação "essa hipótese de improbidade exige a presença de um elemento subjetivo reprovável relativo a essa situação de causalidade material. Deve existir a consciência não apenas de que a licitação era necessária. Mais ainda, é indispensável a vontade de praticar uma conduta indevida apta a causar o resultado antijurídico. Se o sujeito tinha consciência e vontade de praticar a conduta (contratação sem a necessária licitação), mas sem se orientar a produzir o resultado específico (prejuízo para o erário ou benefício a um particular), então a improbidade não está configurada." (JUSTEN FILHO, Marçal. Reforma da lei de improbidade administrativa comparada e comentada: Lei 14.230 , de 25 de outubro de 2021. 1. Ed. Rio de Janeiro: Forense, 2022. Edição digital). 8. Caso dos autos: imputada ao apelado a prática do ato de improbidade descrito na parte final do inciso VIII do art. 10 da LIA , sem, contudo, prova da ocorrência de efetivo prejuízo decorrente de pagamento de preço superior ao valor de mercado pelos serviços com licitação indevidamente dispensada. Parecer do TCE indicando a ausência de superfaturamento ou dano ao erário. Ausência do segundo elemento material da improbidade com dano ao erário ( LIA , art. 10 ). 9. Apelo desprovido. Sentença de improcedência mantida.