Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro Primeira Turma Recursal Apelação nº XXXXX-79.2012.8.19.0305 Apelante: Adauto Costa Lima Apelado: Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro Relator: Juiz FÁBIO UCHÔA PINTO DE MIRANDA MONTENEGRO Art. 47 da LCP . Exercício ilegal da profissão de professor de educação física. Prova segura da autoria. Fato que não se restringe a mera infração administrativa, eis que existente lei específica regulamentando a profissão e exigindo o respectivo diploma para registro no CREF (Lei 9.696 /98). Conduta que gera perigo concreto à saúde de quem é orientado por pessoa sem capacidade técnica para tanto. Regularidade na conduta dos fiscais. Não provimento do recurso. V O T O Trata-se de Recurso de Apelação interposto por Adauto Costa Lima, inconformado com a sentença de fls. 62/70, do XVIII JECRIM da Comarca da Capital, que julgou procedente a pretensão punitiva estatal e condenou o Apelante como incurso no Art. 47 do Decreto-Lei 3.688 /41, à pena 15 (quinze) dias de prisão simples, em regime aberto, sendo a pena privativa de liberdade substituída por restritiva de direitos, consistente no pagamento de 10 (dez) cestas básicas no valor de R$ 300,00 (trezentos reais) cada, a serem entregues mensalmente a instituição "Lar de Otávio". Aduz o Apelante, em síntese, que a sentença apelada merece ser reformada, uma vez que a academia de ginástica onde ocorreram os fatos tem professor de educação física habilitado e que no dia dos fatos o Apelante não se passou por professor de educação física, apenas se identificou como o dono da academia, não tendo o Ministério Público logrado comprovar a acusação constante da denúncia (fls. 84/86). Em Contrarrazões, o Ministério Público junto ao JECRIM prestigiou a sentença apelada, reiterando que as provas dos autos trouxeram a certeza necessária para a condenação do Apelante na contravenção penal que lhe foi imputada, não havendo que se falar em flagrante preparado, eis que os fiscais do Conselho Regional de Educação Física agiram de forma regular (fls. 98/103). O órgão do Parquet junto a esta Turma Recursal manifestou-se a fls. 107/110, corroborando as razões do decisum e ressaltando que a conduta do Apelante não se trata de mera infração administrativa, mas, sim, configura a contravenção penal que lhe foi imputada. É o relatório. Passo a proferir o voto. Conheço do recurso, eis que tempestivo e presentes os demais requisitos subjetivos e objetivos para sua admissibilidade. No mérito, voto pelo não provimento da Apelação. Com efeito, as provas dos autos trouxeram a certeza quanto à autoria. O réu, ao ser interrogado, negou os fatos que lhe foram imputados, aduzindo que a academia estava irregular, mas que havia professor habilitado para fazer as avaliações físicas e para dar as aulas, mas que tinha saído no momento dos fatos. A negativa do Apelante, entretanto, restou isolada das demais provas dos autos, especialmente a prova oral produzida sob o crivo do contraditório. Com efeito, os depoimentos das testemunhas Viviam Machado da Silva Ramos, Rodrigo Damasceno de Oliveira, Tatiana Ramos da Silveira e Claudio Pinto Pereira mostram-se firmes e harmoniosos e conferem a certeza de que antes da abordagem, o Apelante estava irregularmente exercendo a atividade de professor de educação física, eis que supervisionava os alunos que se encontravam no local, inclusive orientando-os em relação aos exercícios praticados. Destarte, deve-se ressaltar que no local sequer havia um professor habilitado ou responsável pelas atividades físicas em andamento, sendo certo que nem mesmo a testemunha arrolada pela defesa Renato de Sá Freitas - trouxe algum fato que pudesse corroborar as alegações defensivas ou afastar a certeza da autoria. Outrossim, não prospera a alegação de que a ocorrência tratar-se-ia de uma mera infração administrativa, pois além da exigência legal do diploma, para exercer a profissão, a prova dos autos é no sentido de que o Apelante ministrava aulas de musculação com habitualidade e sem o devido registro, gerando, assim, um efetivo perigo concreto para as pessoas que recebiam suas orientações, sem que possuísse qualquer capacidade técnica para tanto. Realmente a LCP buscou garantir que determinadas profissões sejam exercidas por profissionais habilitados, coibindo o risco especial que o exercício dessas profissões por terceiros, leigos, poderia trazer para aqueles que inadvertidamente recebessem tais orientações. Nesse sentido, a contrario sensu é o entendimento que se depreende do recente aresto da Colenda Quinta Turma do E. Superior Tribunal de Justiça, a seguir elencado: "HABEAS CORPUS IMPETRADO EM SUBSTITUIÇÃO AO RECURSO PREVISTO NO ORDENAMENTO JURÍDICO. 1. NÃO CABIMENTO. MODIFICAÇÃO DE ENTENDIMENTO JURISPRUDENCIAL. RESTRIÇÃO DO REMÉDIO CONSTITUCIONAL. EXAME EXCEPCIONAL QUE VISA PRIVILEGIAR A AMPLA DEFESA E O DEVIDO PROCESSO LEGAL. 2. CONTRAVENÇÃO PENAL. EXERCÍCIO IRREGULAR DE PROFISSÃO. GUARDADOR DE AUTOMÓVEIS. FALTA DE JUSTA CAUSA PARA A AÇÃO PENAL. AUSÊNCIA DE OFENSA AO BEM JURÍDICO TUTELADO PELA NORMA. PRINCÍPIO DA INTERVENÇÃO MÍNIMA DO DIREITO PENAL. 3. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO. ORDEM CONCEDIDA DE OFÍCIO. 1. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, buscando a racionalidade do ordenamento jurídico e a funcionalidade do sistema recursal, vinha se firmando, mais recentemente, no sentido de ser imperiosa a restrição do cabimento do remédio constitucional às hipóteses previstas na Constituição Federal e no Código de Processo Penal . Nessa linha de evolução hermenêutica, o Supremo Tribunal Federal passou a não mais admitir habeas corpus que tenha por objetivo substituir o recurso ordinariamente cabível para a espécie. Precedentes. Contudo, devem ser analisadas as questões suscitadas na inicial no intuito de verificar a existência de constrangimento ilegal evidente a ser sanado mediante a concessão de habeas corpus de ofício, evitando-se prejuízos à ampla defesa e ao devido processo legal. 2. De acordo com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, é imperativa, na fase de controle prévio de admissibilidade da denúncia, a constatação da existência ou não de elementos de convicção mínimos que possam autorizar a abertura do procedimento judicial de persecução penal. Precedentes. 3. Segundo a melhor doutrina, o art. 47 do Decreto-Lei n.º 3.688 /41 busca garantir sejam determinadas profissões exercidas por profissionais habilitados, coibindo, desse modo, o abuso e a dissimulação em desfavor daqueles que acreditam estar diante de profissionais aptos. Assim, a simples ausência de inscrição no órgão competente, em casos como o presente, em que não se exige do profissional conhecimento especial ou habilitação específica, não tipifica o delito, inexistindo justificativa para a intervenção do Direito Penal. 4. Habeas corpus não conhecido. Ordem concedida de ofício para extinguir a Ação Penal n.º XXXXX-75.2010.8.21.0033 - Terceira Vara Criminal da Comarca da São Leopoldo"( HC XXXXX/RS HABEAS CORPUS XXXXX/XXXXX-7. Relator Ministro Marco Aurélio Bellizze. Órgão julgador: Quinta Turma. Data do Julgamento 06/06/2013. Data da Publicação/Fonte Dje 14/06/2013). Finalmente, deve ser afastada a alegação de" flagrante preparado ", visto que os fiscais do CREF agiram de forma absolutamente escorreita, diante das notícias recebidas de que no local o Apelante exercia irregularmente a profissão de professor de educação física, não podendo lhes ser imputada qualquer atitude capaz de induzir o Apelante à prática do delito. Isto posto, voto pelo NÃO PROVIMENTO do recurso. Rio de Janeiro, 29 de janeiro de 2014. Juiz Fábio Uchôa Pinto de Miranda Montenegro Relator