Página 1241 do Diário de Justiça do Estado do Pará (DJPA) de 17 de Julho de 2017

comprador, titular de direito real". Ora, somente dada a quitação adquire o comprador tal poder. Na lição de Carlos Roberto Gonçalves:" porque seu resultado prático é adiar a transferência do domínio do bem compromissado até que o preço seja totalmente pago ". (Carlos Roberto Gonçalves. Direito Civil Brasileiro. Vol. 5. Direito das Coisas. São Paulo - Saraiva, 2015, p. 517). O requerido alega inexistir provas do cumprimento da obrigação. Apesar de relativamente confusa, entendo que a documentação trazida aos autos pelo autor ilide a tese da parte ré. Às fls. 22/23, leemse recibos assinados pelo sr. Dirso Sperafico, cuja autenticidade não fora, em momento algum, posta em questão. Além do mais, em todas as oportunidades em que o sr. Dirso Sperafico veio aos autos, em nenhuma delas alegou falta de pagamento por parte do promissário comprador. Por fim, resta prejudicada a análise da exceptio non adimpleti contratos. Por todo o exposto, restam devidamente afastadas as preliminares arguidas. Procedo à análise do mérito. Do mérito Trata-se de pedido de adjudicação de bem imóvel formulado pelo promissário comprador Ancelmo Rui Gabriel, ante a resistência dos promissários vendedores, os sres. Dirso Sperafico e Itacir Sperfico, em promoverem a transferência da titularidade do bem. Antes de entrar propriamente na lide, convém breve digressão acerca do instituto da hipoteca. Segundo a doutrina, a hipoteca é um direito real de garantia consistente"em sujeitar um imóvel, preferentemente, ao pagamento de uma dívida de outrem, sem retirá-lo da posse do dono. Inocorrendo a solutio, o credor pode excuti-lo, alienando-o judicialmente e tendo primazia sobre o produto da arrematação, para cobrarse da totalidade da dívida e de seus acessórios"(idem, p. 595). O instituto se perfaz pela presença de três requisitos jurídicos: a. objetivo; b. subjetivo e c. formal. O requisito objetivo diz respeito à natureza do bem. Não é todo e qualquer bem que poderá servir à garantia, mas apenas aqueles arrolados no art. 1473, do Código Civil. Tangente ao requisito subjetivo, apenas aqueles que tem a capacidade para alienar o bem podem sujeita-lo a hipoteca. Cuida-se, assim, de característica do sujeito titular do direito. No caso, o sr. Sperafico era o legítimo proprietário do bem, quando da feitura da hipoteca. Isto é, apresentou em garantia um bem do qual era titular. O sr. Ancelmo não era o proprietário do bem, haja vista até então não ter saldado integralmente o débito. Dessarte, satisfeito o requisito. Por fim, o requisito formal. Este, por sua vez, divide-se em título, especialização e registro. O título remete à necessidade de um instrumento escrito contendo o acordo de vontade entre as partes. A especialização consiste na identificação das partes, na determinação do crédito e do imóvel que serve de garantia. O registro do gravame na matrícula do imóvel confere publicidade à hipoteca, fazendo-a oponível perante terceiros. Em lendo os autos, concluo que a hipoteca firmada entre os requeridos Dirso Sperafico e Itair Sperafico e a requerida IMCOPA atende aos requisitos legais. Em especial, esta foi registrada na matrícula do imóvel, gozando, então, de efeitos erga omnes. Todavia, o autor sustenta que o compromisso de compra e venda, realizado anteriormente, tem o condão de desfazer a hipoteca. Impende analisar o instituto. Do compromisso de compra e venda O instituto recebe disciplina legal nos arts. 1417 e 1418, do Código Civil, que assim dispõem:"Art. 1.417. Mediante promessa de compra e venda, em que se não pactuou arrependimento, celebrada por instrumento público ou particular, e registrada no Cartório de Registro de Imóveis, adquire o promitente comprador direito real à aquisição do imóvel. Art. 1.418. O promitente comprador, titular de direito real, pode exigir do promitente vendedor, ou de terceiros, a quem os direitos deste forem cedidos, a outorga da escritura definitiva de compra e venda, conforme o disposto no instrumento preliminar; e, se houver recusa, requerer ao juiz a adjudicação do imóvel."Trata-se, conforme doutrina, de direito de natureza de direito real, conferindo direito à aquisição do imóvel, para o futuro (idem, p. 520). Tendo o promissário comprador honrado integralmente o débito, e o contrato de promessa de compra e venda sido registrado no Cartório de Registro de Imóveis, pode o promissário comprador exigir a outorga da escritura definitiva. No caso dos autos, o autor e os requeridos Dirso Sperafico e Itair Sperafico entabularam a indigitada avença, contudo, não procederam ao registro no cartório de imóveis. Todavia, tal ausência não tem o condão de deletar a natureza de direito real que perpassa o contrato. A desatenção dos contraentes, neste ponto, o torna desprovido de efeitos erga omnes, mas ainda preserva os efeitos inter pars. Veja-se o teor da súmula 239 do Superior Tribunal de Justiça:"O direito à adjudicação compulsória não se condiciona ao registro do compromisso de compra e venda no cartório de imóveis". Esse é também o entendimento da doutrina:"O caráter real do compromisso de compra e venda decorre de sua irretratabilidade, e não do registro no Cartório de Imóveis. Levando-o a registro, impede-se que o bem seja alienado e terceiro. Ou seja, o registro só é necessário para a sua validade contra terceiros, produzindo efeitos no entanto, sem ele, entre as partes."(idem, p. 524). No mesmo sentido:"Daí a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, cristalizada (..) nos jugados que proclamam: ´A pretensão de adjudicação compulsória é de caráter pessoal, restrita assim aos contraentes, não podendo prejudicar os direitos de terceiros que entrementes haja adquirido o imóvel e obtido o devido registro, em seu nome, no ofício imobiliário´". (ibidem.) Igualmente:"O Código de Processo Civil (art. 639, atual art. 466-B [do CPC/73]) não exige o registro do contrato para o comprador ter o direito de obter do juiz uma sentença que produza o mesmo efeito do contrato firmado"(idem, p. 523). Com a revogação do Código de Processo Civil de 1973, aplica-se a disciplina dos arts. 1417 e 1418, ambos do Código Civil. Em suma, embora não averbado na matrícula do imóvel o compromisso de compra e venda, o promissário comprador ainda detém o direito de obter a adjudicação do imóvel. Hipoteca x Promessa de compra e venda Transposta essa questão, urge averiguar se a promessa entabulada atinge, de alguma forma, a hipoteca firmada, ou se esta afeta aquela. Restou claro nos autos que a hipoteca fora firmada, e levada a registro, em data de 16.10.2007. Isto é, após a celebração do contrato de promessa de compra e venda, e antes de sua conclusão com o pagamento integral do débito. Tal qual encimado, o contrato de promessa de compra e venda não fora registrado, razão pela qual está destituído de efeitos erga omnes. A requerida IMCOPA, quando da confecção do contrato de hipoteca, desconhecia a existência daquele. Logo, estava de boa-fé e o contrato particular firmado entre o autor e o requerido Sperafico é ineficaz perante ela. Portanto, a hipoteca tem preferência sobre a simples promessa de compra e venda. Inexistem elementos a macular a hipoteca firmada entre o sr. Sperafico e a empresa IMCOPA. O ato permanece íntegro, perfeito e válido. De outro lado, a hipoteca não elide a pretensão do autor. O ordenamento pátrio não veda a alienação de bem imóvel hipotecado. Pelo contrário, impede tal vedação:"Art. 1475. É nula a cláusula que proíbe ao proprietário alienar imóvel hipotecado". No mesmo sentido, tem-se o art. 1479, CC:"O adquirente do imóvel hipotecado, desde que não se tenha obrigado pessoalmente a pagar as dívidas aos credores hipotecários, poderá exonerar-se da hipoteca, abandonando-lhes o imóvel."Adiante, a doutrina, discorrendo sobre a hipoteca:"O registro confere a indispensável publicidade à hipoteca. A partir da sua efetivação todos terão ciência de que o bem especificado está sujeito ao ônus hipotecário. Desse modo, se alguém tiver interesse em sua aquisição, ou em recebê-lo em subipoteca, poderá consultar o cartório respectivo para cientificar-se da existência do aludido ônus real"(grifou-se) (idem, p. 611). Ocorre que a hipoteca é direito de natureza real: apesar de alienado, o bem continua a servir de garantia da dívida. O comprador assume o risco de ter seu bem excutido pelo credor hipotecário. Observe-se:"Não perde ele, com efeito, em virtude da hipoteca o jus disponendi. A alienação transfere o domínio, mas este passa ao adquirente com o ônus hipotecário". (Idem, p. 624). Ora, e eis o ponto nerval, se é lícita a alienação de bem imóvel hipotecado, por analogia, é permitida a adjudicação compulsória; em ambos, operase a transferência da propriedade, seja por adjudicação compulsória, seja por alienação. O credor hipotecário tem à sua disposição a garantia para assegurar o pagamento da dívida, isto é, seus interesses continuam preservados. À guisa de conclusão, tem-se o seguinte: a. A promessa de compra e venda firmada entre o sr. Ancelmo Rui Gabriel não fora levada a registro, e não possui efeitos erga omnes. Contudo, irradia efeitos inter pars, o que viabiliza a adjudicação compulsória do bem, nos termos do art. 1417 e 1418, ambos do Código Civil; b. A hipoteca celebrada entre o sr. Sperafico, promissário vendedor, e a empresa IMCOPA subsiste válida; c. Uma vez ser juridicamente possível a alienação de bem hipotecado, igualmente viável é a adjudicação compulsória. Da reparação de danos O autor pleiteou ressarcimento por danos materiais e morais por conta dos transtornos advindos com a constituição de hipoteca sobre o imóvel. Todavia, não há razões que ensejam o deferimento do pedido. Os supostos danos não foram especificados. Por todo o exposto, restou claro que os requeridos atuaram conforme a legalidade. O sr. Sperafico, pois alienou bem imóvel do qual era proprietário; a empresa IMCOPA, pois desconhecia que o bem era objeto de promessa de compra e venda. No mais, o pedido veio desacompanhado de quaisquer elementos fáticos que o amparasse. Trata-se de mera alegação. Citação da Empresa Brasileira de Distribuição Neste tocante, entendo que houve desistência. O autor, em manifestação de fl. 43 e alegações finais de fls. 445 e ss., pugnou pelo julgamento do feito, mesmo ciente de a Empresa Brasileira de Distribuição não ter sido citada. Da recuperação judicial da requerida IMCOPA Após as explanações acima, a recuperação judicial da empresa IMCOPA é indiferente. Em permanecendo válida a hipoteca, caso o sr. Sperafico não honre sua dívida para com a referida empresa, esta ainda pode excutir o bem. Dos honorários advocatícios Tendo em vista os critérios arrolados no art. 85, do Código de Processo Civil, e que houve sucumbência reciproca, condeno o autor ao pagamento de verbas sucumbenciais em 10% (dez por cento) do valor da causa, sendo 5% (cinco por cento) para cada um dos requeridos, nos termos do art. 87, § 1º,

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