ELEIÇÕES 2020. RECURSO ELEITORAL. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL - AIJE. ABUSO DE PODER POLÍTICO E ABUSO DE PODER ECONÔMICO. INAUGURAÇÃO DE OBRAS INACABADAS E DIVULGAÇÃO EM SITE DA PREFEITURA, NO FACEBOOK. REALIZAÇÃO DE OBRAS, COM MAQUINÁRIO PÚBLICO, EM PROPRIEDADES PARTICULARES. PAGAMENTOS DE CIRURGIAS E EXAMES MÉDICOS. DISTRIBUIÇÃO DE CESTAS BÁSICAS. COMPRA DE VOTOS POR MEIO DE EMPREGOS. PREFEITO E VICE-PREFEITO ELEITOS. PROCEDÊNCIA PARCIAL DOS PEDIDOS. CASSAÇÃO DOS DIPLOMAS. DECRETAÇÃO DE INELEGIBILIDADE. RECURSO CONHECIDO. 1 - Inauguração de obras inacabadas e publicação em perfil da Prefeitura Municipal no Facebook Consta em vídeo as inaugurações realizadas pelo recorrente, então prefeito e candidato à reeleição, nas eleições municipais de 2020. O referido vídeo seria uma "live" para entrega de obras e nele o recorrente deixa claro estar "inaugurando" as seguintes obras: praça pública em distrito; Estação de tratamento de água (ETA), em distrito; entrega de casas do programa "Minha casa, Minha vida"; vestiário em campo de futebol em distrito; substituição de iluminação pública em ruas do município; benfeitorias e substituição da iluminação, em balneário localizado na cidade; entrega de um Distrito Industrial que funcionará com sistema de parcerias firmadas com empresários interessados, sendo que nele já estava instalada uma fábrica de blocos para construção civil; praça pública; e, por fim, um muro de arrimo em escola pública da municipalidade. De todas as obras mencionadas pelo recorrente no vídeo, somente é possível afirmar, com certeza, que houve inauguração de obra inacabada, com relação à praça. Chega-se a essa conclusão ao cotejar as imagens que consta em vídeo, com as imagens que constam de outros vídeos. 1º) Entendeu o Magistrado de primeiro grau não estar concluída a ETA, baseada em Ata Notarial, contudo, o escrevente da ata, ao prestar depoimento em Juízo como testemunha do investigante, confirmou não ter formação na área de engenharia. Afirmou que já foi "servente de pedreiro" e que as afirmações feitas na ata teriam como base a "experiência de vida e documentários assistidos". Face à impossibilidade de se afirmar, com a certeza necessária, se a ETA estaria ou não funcionando, e face ao impedimento legal de se presumir a inoperabilidade dela, a prova é inconclusiva e inservível para um juízo de condenação. 2º) Diante das informações constantes nos autos (contraditórias entre si), concluo que a afirmação de que inexiste um Distrito Industrial e que nele funcione uma fábrica de blocos se baseia em presunção. Assim, a prova é inconclusiva e inservível para um juízo de condenação. 3º) Diante da falibilidade das provas, a conclusão a que se chegou, em sentença, de que a publicação teve como único objetivo promoção política e econômica, é um claro raciocínio baseado unicamente na presunção de má-fé. Mais uma vez, a prova é inconclusiva e inservível para um juízo de condenação. 4º) O Juízo concluiu ter sido abusiva a publicação de vídeo, em página oficial da Prefeitura , na rede social Facebook, e mencionou decisão em representação contra os recorrentes por propaganda irregular na internet, na tentativa de demonstrar serem eles reincidentes em tal ilícito eleitoral. Não obstante isso, assistindo ao vídeo, não se verifica afronta às normas contidas nos artigos 36-A e 73 , inciso VI , alínea b , ambos da Lei nº 9.504 /1997, isso porque, apesar de o referido vídeo ter como protagonista o recorrente, que à época ocupava o cargo de Prefeito Municipal, não há naquele nenhum pedido explícito, ou implícito, de votos, não se configurando propaganda eleitoral extemporânea. E ficou comprovado nos autos que o vídeo foi publicado no dia 12 de agosto de 2020, ou seja, fora do período vedado (período eleitoral) que, em 2020, iniciou-se no dia 15 de agosto de 2020 (três meses antes do pleito que, naquele ano, em razão da pandemia, teve o Primeiro Turno remarcado para 15 de novembro). Assim, a publicação, por si só, não configurou ilícito eleitoral. 5º) Apesar de os recorrentes afirmarem que se pretendeu inaugurar apenas a jardinagem da praça, não é isso que se depreende do referido vídeo, em que foi afirmado estar inaugurando a jardinagem, reforma e revitalização da praça. Inobstante essa constatação, a questão é mais complexa e envolve a valoração da gravidade do ato, isso porque inexiste no ordenamento uma proibição expressa que veda a inauguração de obra inacabada. E, do ponto de vista da gravidade, verifica-se que o ato aqui analisado não teve força suficiente para desequilibrar o pleito. Assim, diante das constatações acima, conclui-se que a divulgação de vídeo, em que é inaugurada praça pública inacabada, NÃO se mostrou grave o suficiente para caracterizar abuso de poder político. 2 - Obras realizadas em propriedades particulares Ao analisar o capítulo da sentença dedicado a este tópico, verifica–se que a fundamentação nele expendida se baseou, principalmente, na presunção de que os recorrentes teriam se utilizado da divulgação dessas obras, às vésperas das eleições, para se autopromoverem. Contudo, após detida análise do conjunto probatório, não se consta nenhuma divulgação das referidas obras ocorrido "às vésperas das eleições", como entendeu o Juízo de Primeira Instância. Assim, não há que se falar de autopromoção ocorrida às vésperas da eleição. Junte–se a isso o fato de os únicos vídeos que tiveram o escopo de tentar comprovar a suposta utilização da máquina pública para angariar apoio político foram gravados e juntados pelo próprio investigante, tratando–se de prova unilateral, não confirmada posteriormente por testemunha ou documento capaz de demonstrar a ilicitude eleitoral daqueles atos, ou abusos político e econômico. A exceção diz respeito a um vídeo, que faz referência à limpeza de um "poço de peixe", obra realizada em propriedade, e confirmada pelo proprietário, em depoimento prestado perante Juízo. O deponente também informou que o mesmo serviço tinha sido prestado pelo município em ano "retrasado", e que não houve pedido de votos para realização da referida limpeza. Informou, ainda, desconhecer se houve algum tipo de cobrança pelo serviço prestado e que não viu máquinas da prefeitura realizando obras em propriedade de outros sitiantes. O depoimento não ratifica as informações prestadas pelo locutor anônimo de vídeo, nem as alegações feitas pelo investigante/recorrido, ao longo do processo. Tão pouco ratifica as deduções que fundamentaram a sentença, nesse tópico. Ainda, os recorrentes juntaram aos autos cópias de legislação e atos normativos municipais que confirmam a existência de amparo legal para a prestação de vários tipos serviços, pela administração pública municipal, a agricultores do município. Dessa forma, face à fragilidade das provas, não se configurou ilícito eleitoral, nem abuso de poder político e econômico, quanto às obras realizadas em propriedades particulares. 3 - Pagamentos de exames e cirurgias Nesse tópico, a sentença se fundamentou, basicamente, em manifestação do Ministério Público Eleitoral (MPE) sobre o assunto. Razão não assiste, nem ao Juízo de Primeira Instância, nem ao MPE, porque a documentação juntada pelo próprio investigante, em que se buscou comprovar o alegado abuso, dá conta de que os maiores valores pagos por exames, deram-se fora do período eleitoral. E nesses mesmos documentos é possível verificar que houve uma regularidade dessa espécie de gasto, durante o período compreendido entre janeiro e novembro de 2020. Da mesma forma, com relação ao fornecimento de remédios . Quanto às cirurgias, o investigante juntou apenas documento, dando conta de três notas de empenho para o pagamento de três procedimentos cirúrgicos, no valor total de R$5.200,00. O investigante não se desincumbiu da obrigação de demonstrar as supostas ilegalidades e desvios dos atos e, ao analisar os documentos por ele juntados, apenas foi possível aferir o normal funcionamento da administração pública municipal, durante o ano de 2020, sem a alegada concentração de gastos durante o período eleitoral, ou às vésperas das eleições. Assim, inexistente a comprovação de irregularidades que confirme a tese de ocorrência de abuso de poder político e econômico, nesse ponto. 4 - Distribuição de cestas básicas Documento juntado pelo investigante para comprovar o suposto desvio não demonstrou ter havido concentração de gastos com distribuição de cestas básicas, no período eleitoral. São totalmente aceitáveis as justificativas apresentadas pelos recorrentes, acerca do aumento de gastos do município com todo tipo de auxílio social, face à pandemia de coronavírus. E, diante da excepcionalidade gerada pela pandemia, o aumento de gastos com auxílios, por si só, não é motivo suficiente para considerar configurado abuso de poder. Para tanto, deveria ter sido cabalmente demonstrado o desvio de finalidade na distribuição das tais cestas básicas, o que de fato não ocorreu nos autos, pois não foi ouvida uma testemunha sequer que pudesse corroborar a tese defendida pelo recorrido. Assim, concluo pela ausência de comprovação acerca de abuso, quanto à distribuição de cestas básicas. 5 - Compra de votos por meio de promessa de emprego Todas as contratações realizadas pelo município, no ano de 2020, constam em documento. As contratações estão compreendidas entre 23/12/2019 a 14/08/2020, ou seja, foram realizadas fora do período eleitoral, enquadrando-se na legalidade estrita exigida pela norma do art. 73 , inciso V , da Lei nº 9.504 /1997. Nesse ponto, caberia ao recorrido demonstrar a ocorrência de abuso de poder, quanto as contratações, porém, sequer há nos autos a demonstração de que no ano de 2020 o município contratou mais do que nos anos anteriores. Existente contradição intransponível em depoimento prestado por testemunha entre o que ela afirma em juízo e o diálogo a ela atribuído em áudio. Em princípio, a testemunha negou ter recebido proposta e depois afirmou que a fala do áudio era invenção dela.Tenho como certo que essa prova é inservível para se emitir um juízo de condenação, visto ser contraditória e não confirmar suposta promessa de emprego. Assim, ausente a demonstração de que as contratações foram realizadas com desvio de finalidade, e que houve efetiva promessa de emprego em troca de votos. Dessa forma, diante da ausência de ilegalidade dos atos atribuídos aos recorrentes e diante da insuficiência de provas que demonstrassem o desvio de finalidade desses mesmos atos, não há falar em ocorrência de abuso de poder político e econômico. RECURSO PROVIDO PARA JULGAR IMPROCEDENTES OS PEDIDOS CONTIDOS NA PETIÇÃO INICIAL.