Tribunal de Justiça do Estado da Bahia PODER JUDICIÁRIO QUINTA TURMA RECURSAL - PROJUDI PADRE CASIMIRO QUIROGA, LT. RIO DAS PEDRAS, QD 01, SALVADOR - BA ssa-turmasrecursais@tjba.jus.br - Tel.: 71 3372-7460 RECURSO INOMINADO. JUIZADOS ESPECIAIS. DECISÃO MONOCRÁTICA (ART. 15, XII, DO REGIMENTO INTERNO DAS TURMAS RECURSAIS E ART. 932 DO CPC ) DEFESA DO CONSUMIDOR. PLANO DE SAÚDE. REVISIONAL. PLANO INDIVIDUAL ANTIGO, ANTERIOR À LEI 9.656 /98. REAJUSTE EM DECORRÊNCIA DE MUDANÇA NA FAIXA ETÁRIA DO IDOSO, APÓS 60 ANOS. IMPOSSIBILIDADE. APLICABILIDADE DO CDC . TEMA 952: IMPOSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DE PERCENTUAIS DESARRAZOADOS OU ALEATÓRIOS QUE, CONCRETAMENTE E SEM BASE ATUARIAL IDÔNEA, ONEREM EXCESSIVAMENTE O CONSUMIDOR OU DISCRIMINEM O IDOSO. OPERADORA DE SAÚDE NÃO PRODUZIU QUALQUER PROVA NO SENTIDO DE JUSTIFICAR OS ÍNDICES ADOTADOS PARA O REAJUSTE DO PLANO DE SAÚDE DA RECORRIDA NOS PERÍODOS IMPUGNADOS (AUSÊNCIA DE CONTRATO), LIMITANDO-SE A ALEGAR A LIBERDADE DE REAJUSTAMENTO DOS PLANOS ANTIGOS. RECONHECIMENTO DA ABUSIVIDADE DOS AUMENTOS IMPOSTOS. ONEROSIDADE EXCESSIVA. SENTENÇA DE PRIMEIRO GRAU QUE JULGOU IMPROCEDENTE A PRETENSÃO. REFORMA DA SENTENÇA PARA DECLARAR A ABUSIVIDADE DOS REAJUSTES ANUAL E POR MUDANÇA DE FAIXA ETÁRIA, DETERMINANDO À RÉ QUE EXCLUA O REAJUSTE OBJETO DOS AUTOS. CONDENANDO A ACIONADA AO DEVER DE RESTITUIR NA FORMA SIMPLES OS VALORES PAGOS A MAIOR, OBSERVADA A PRESCRIÇÃO TRIENAL PARA A RESTITUIÇÃO, NOS TERMOS DO ART. 206 , § 3º , INCISO IV , DO CÓDIGO CIVIL . DECISÃO MONOCRÁTICA Trata-se de ação proposta em face da SUL AMERICA COMPANHIA DE SEGURO SAÚDE. Na exordial, a parte autora alega que é idosa, possui 67 anos de idade. Relata que mantém contrato de plano de saúde, na categoria individual, com a Acionada, desde 1994, contudo, percebeu a presença de constantes aumentos no seu plano de saúde, com índices distintos do previsto pela ANS (Agência Nacional de Saúde). Aduz que que no ano de 2017 o valor pago no Plano em questão chegou à R$ 1.991,38 (hum mil, novecentos e noventa e um reais e trinta e oito centavos), bem como, o reajuste aplicado foi de 14,73% no ano em comento. No entanto, o aumento permitido pela ANS foi de 13,55% no ano de 2017, que em 2018 o reajuste aplicado foi de 11,14% e em 2019 o reajuste aplicado foi de 8,47%, enquanto que o permitido pela ANS nesses anos era de, respectivamente, 10% e 7,35%. Salienta, outrossim, que foi aplicado reajuste por faixa etária (60 anos). Pelo exposto, requereu a declaração da nulidade do reajuste por faixa etária, a aplicação do índice da ANS para o reajuste anual e a restituição em dobro dos valores pagos a maior, além de indenização por danos morais. Devidamente citada, a ré apresentou contestação ao argumento de que o reajuste do prêmio da Autora se deu de forma legal e contratual, não havendo que se falar em abusividade/ilegalidade desta empresa Ré em atuar de acordo com a lei e com os ditames expostos no regulamento da ANS, pelo que refuta a pretensão indenizatória formulada. Salienta que trata-se de relação entre beneficiário e seguro saúde antigo e não adaptado à Lei Federal n.º 9.656 /1998, de modo que cabe à Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) apenas a fiscalização destes pactos que não sofrem regulamentação quanto à contratação, coberturas e reajustes, permanecendo válidas as regras previstas nos instrumentos contratuais, Ao final, pugnou pela improcedência da ação. O Juízo a quo prolatou sentença de mérito nos seguintes termos do dispositivo (sic): Posto isto, e por mais que consta dos autos, nos termos do Art. 6º da lei nº 9.099 /95 c/c Art. 487 , I , do CPC , JULGO, POR SENTENÇA, IMPROCEDENTE a ação, conforme fundamentação acima. Inconformada com a sentença lançada nos autos, a Autora interpôs recurso inominado (evento 79). Contrarrazões devidamente apresentadas (ev. 95). É o breve relatório. DECIDO O art. 15 do novo Regimento Interno das Turmas Recursais (Resolução nº 02/2021 do TJ BA), em seu inciso XII, estabelece a competência do relator para julgar monocraticamente as matérias em que já estiver sedimentado entendimento pelo colegiado ou já com uniformização de jurisprudência, em consonância com o permissivo do artigo 932 do Código de Processo Civil . Conheço do recurso interposto, porquanto preenchidos os seus pressupostos de admissibilidade. Passemos ao mérito. Analisados os autos, observa-se que a matéria de se encontra sedimentada no âmbito da 5ª Turma Recursal. Precedentes desta turma: Processo: XXXXX-58.2020.8.05.0001 . A sentença recorrida, data máxima vênia, merece reparos. Preambularmente, quanto à devolução reconhece-se a incidência, no caso dos autos, da prescrição trienal. Isso porque houve recente prolação de acórdão nos recursos especiais repetitivos componentes do tema 610 ( REsp 1.361.182-RS e REsp 1.360.969-RS ), julgados em 10/08/2016 pela Segunda Seção do E. Superior Tribunal de Justiça, publicados em 19/09/2016, pelos quais restou pacificada a aplicação, à hipótese dos autos, da prescrição trienal, a qual atinge somente o pleito de devolução dos valores pagos a maior, conforme inteligência do art. 206 , § 3º , inc. IV do CC/2002, mas não atinge o pleito revisional, posto que a prescrição que o regula é de 10 anos, pois tem-se socorrido do CC desde que nele se entreveja regra mais favorável a quem, na relação, ocupe posição vulnerável, portanto alguém a cuja proteção se volta o sistema. Pelo que a prescrição aplicável mais favorável ao consumidor, no tocante à revisão é a decenal prevista como regra geral no art. 205 CC . A ideia de aumento anual de mensalidade de planos de saúde, seja coletivo ou individual, estabelecido unilateralmente, em contrato de adesão, sem prévio esclarecimento e participação dos consumidores, seja atuando pessoalmente ou mediante representação, é de toda abusiva, por conferir vantagem excessiva em favor da operadora do plano, colocando, por outro lado, os consumidores em posição de desvantagem acentuada, além de se mostrar incompatível com a boa-fé, encontrando vedação no art. 51 , X , do CDC , impondo-se sua desconsideração nos termos do inciso V de seu art. 6º . O repúdio ao reajuste de mensalidade de plano de saúde com base em critério unilateral se encontra pacificado na jurisprudência: - RECURSO INOMINADO - CONSUMIDOR - PLANO DE SAÚDE COLETIVO - Reajustes anuais por aumento de sinistralidade relativos aos anos de 2003, 2004 e 2005. Preliminar de prescrição suscitada de ofício. Matéria de ordem pública. Prescrito o direito de questionar o aumento ocorrido no ano de 2003 e 2004. Inteligência do art. 206 , II, b), do código civil . Reajustes unilateralmente definidos pela seguradora, sem que seja possibilitado ao consumidor o conhecimento prévio dos critérios de reajuste ao longo da execução do contrato. A cláusula de reajuste baseada no aumento da sinistralidade elimina a aleatoriedade própria do contrato de seguro, gerando vantagem exagerada para a seguradora e onerosidade excessiva ao consumidor. Abusividade da cláusula contratual autorizadora ante o que estatui o arts. 51, IV e X, e parágrafo 3º, do cdc. Reajuste limitado ao percentual anualmente fixado pela ANS para os contratos individuais, à falta de outro parâmetro específico. Sentença parcialmente reformada. Recurso conhecido parcialmente provido. (TJBA - RIn XXXXX-0/2005-1 - 1ª T. - Relª Maria Lucia Coelho Matos - DJe 31.08.2009 - p. 457) - AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER - SEGURO SAÚDE - PLANO COLETIVO - Reajuste financeiro do prêmio e reajuste em razão de sinistralidade. Imposição unilateral dos índices. Falta de aclaramento da gênese dos índices. Afronta ao disposto nos artigos 6º , inciso II , e 51 , inciso X , da Lei nº 8.078 /90. Razoabilidade, à falta de demonstração da origem do índice relacionado ao reajuste financeiro do prêmio, da adoção do índice utilizado nos contratos individuais (11,75%). Verba honorária. Natureza declaratória da sentença. Necessidade de arbitramento em consonância com o disposto no artigo 20 , parágrafo 4º, do CPC . Verba arbitrada em 15% sobre o valor atualizado da causa. Sentença reformada nesta parte. APELO dos AUTORES PARCIALMENTE PROVIDO, com DESPROVIMENTO do RECURSO INTENTADO PELA RÉ SUL AMÉRICA. (TJSP - Ap-Rev 559.706.4/9 - (0002385214) - São Paulo - 3ª CDPriv. - Rel. Donegá Morandini - DJe 13.07.2009 - p. 735) - PLANO DE SAÚDE - Mensalidade - Critério de reajustamento anual - Expressão indecifrável que o sujeita ao arbítrio do segurador - Condição potestativa - Nulidade pronunciada - Restituição devida - Ação civil pública julgada procedente - Provimento parcial ao recurso - Aplicação do artigo 115 , 2ª alínea e 964, 1ª alínea do Código Civil . É nula cláusula que, em contrato de plano de saúde, estabelece critério indecifrável de reajuste das mensalidades, subordinando-o ao arbítrio do segurador` (Apelação Cível nº 67.750-4 - São Paulo - 2ª Câmara de Direito Privado - Relator: Cezar Peluso - 02.03.99 ¿ V.U.). - APELAÇÃO CÍVEL - CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO - PLANO DE SAÚDE COLETIVO - AUSÊNCIA DE INTERFERÊNCIA DA AGÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE (ANS) QUANTO AOS ÍNDICES DE REAJUSTE ANUAL DA MENSALIDADE - DEMANDA CONSIGNATÓRIA IMPROCEDENTE - LEGALIDADE DOS AUMENTOS ANUAIS - AUSÊNCIA DE VALOR A DEVOLVER PELO PLANO DE SAÚDE - DEVOLUÇÃO DAS TAXAS PAGAS AO SINDICATO DPS EMPREGADOS NO COMÉRCIO EM GERAL DE TANGARÁ DA SERRA (SECGTS) - AUTORA SINDICALIZADA - SENTENÇA EXTRA E ULTRA PETITA - AUSÊNCIA DE INTERESSE-NECESSIDADE QUANTO A ANÁLISE DOS REFERIDOS VÍCIOS - RECURSO PROVIDO - 1- Na modalidade de contratos de plano de saúde coletivo, a fixação dos índices de reajuste anual não sofre interferência da ANS - Agência Nacional de Saúde, devendo, por isso, ser julgada improcedente a demanda consignatória ajuizada com base na alegação de que os reajustes na mensalidade não obedeceram aos limites impostos pela respectiva agência. 2- Não sendo reconhecida a ilegalidade dos aumentos praticados pela Unimed, quanto a mensalidade do plano de saúde, não há que se falar em devolução de valores indevidamente pagos pela beneficiária do plano de saúde. 3- Uma vez estando comprovado nos autos que a autora é sindicalizada ao SECGTS, deve ser afastado o seu pedido de devolução das taxas pagas a esta. 4- É desnecessário reconhecer vícios na sentença recorrida, quando o recurso interposto contra aquela está reformando totalmente os capítulos decisórios tachados de defeituosos. (TJMT - Ap 28456/2011 - Rel. Des. José Ferreira Leite - DJe 27.01.2012 - p. 27) - APELAÇAO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL. PLANO DE SAÚDE COLETIVO. UNIMED. REAJUSTES ANUAIS. RESTITUIÇÃO DOS VALORES INDEVIDAMENTE COBRADOS. 1. Não se mostra abusivo o reajuste anual dos planos de saúde coletivo em percentual superior ao fixado pela ANS aos planos de saúde individual ou familiar, pois a agência reguladora não define teto para os planos coletivos. Em se tratando de contrato coletivo, o reajuste deve ser comunicado à ANS. Resolução Normativa 156/2007 da Diretoria Colegiada da ANS e Instrução Normativa 13/2006 da Diretoria de Normas e Habilitação dos Produtos da ANS. 2. Devida a repetição dos valores, na forma simples, evitando enriquecimento sem causa da ré. Ausência de causa para repetição em dobro, pois não evidenciada má-fé da ré na cobrança dos valores relativamente aos reajustes decorrentes da mudança da faixa etária. 3. Prequestionamento. O Julgador não está obrigado a enfrentar todos os dispositivos legais suscitados no processo. (TJRS ¿ Apelação Cível XXXXX-54.2014.8.21.7000 - 5ª C. Cível - Relª Des.ª Isabel Dias Almeida ¿ Julgado em 27.08.2014). - APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO REVISIONAL - PLANO DE SAÚDE COLETIVO - REAJUSTES - POSSIBILIDADE - FAIXA ETÁRIA - NULIDADE - RESTITUIÇÃO DE VALORES - PRESCRIÇÃO DECENAL - Não se mostram abusivos os aumentos anuais no valor da prestação do plano de saúde, mesmo em percentual superior ao fixado pela ANS aos planos de saúde individual ou familiar, tratando-se de plano de saúde coletivo. A ANS não define teto para os planos de saúde coletivos, devendo os reajustes apenas ser comunicados àquela Agência. Abusiva é a cláusula que prevê reajuste exclusivamente em razão da faixa etária, devendo ser decretada sua nulidade. Inteligência do art. 15 , § 3º do Estatuto do Idoso e art. 51 , IV , do Código de Defesa do Consumidor . Reconhecida a nulidade da cláusula, impõe-se a restituição dos valores pagos a maior pela demandada, de forma simples, alcançando-se os dez últimos anos. NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO DA RÉ E DERAM PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO DA PARTE AUTORA. VENCIDA EM PARTE A RELATORA. (TJRS - AC XXXXX - 5ª C.Cív. - Relª Maria Cláudia Mércio Cachapuz - J. 24.09.2014 ) JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS. DIREITO DO CONSUMIDOR. PLANO DE SAÚDE COLETIVO. AUTOGESTÃO. REAJUSTE DE MENSALIDADES. EQUILÍBRIO ATUARIAL. PERCENTUAL DE AUMENTO AUTORIZADO PELA ANS PARA PLANOS INDIVIDUAIS. INAPLICABILIDADE (ANS, RN Nº 171/2008, ARTIGO 2º). DESNECESSIDADE DE AUTORIZAÇÃO. REAJUSTE BASEADO NOS CUSTOS DOS SERVIÇOS PRESTADOS NOS 12 MESES ANTERIORES. POSSIBILIDADE. NECESSIDADE DE MANUTENÇÃO DO EQUILIBRIO FINANCEIRO DO CONTRATO. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. SENTENÇA MANTIDA. ( Apelação Cível Nº XXXXX-83.2014.8.07.0004 , 3ª Turma Recursal, Tribunal de Justiça do DF, Juiz Marco Antonio do Amaral, Julgado em 11/11/2014, publicado em 13/11/2014, p. 296). No caso, a parte ré não trouxe cópia do contrato subscrito pelas partes constando os termos da avença firmada, o que exclui a possibilidade de prevalência das cláusulas e condições elaboradas unilateralmente no instrumento padrão apresentado, desobrigando, em consequência, a Autora do cumprimento de qualquer aspecto do contrato que não tenha sido levado ao seu conhecimento de forma clara e induvidosa, por força do art. 46 do CDC . Ademais, não fora colacionado qualquer documento assinado pelo autor, que especifique o percentual de reajuste a ser aplicado, apto a corroborar os argumentos apresentados. Inicialmente, convém lembrar, por oportuno, que os contratos de plano de saúde, de qualquer espécie, estão subordinados ao regramento legal do Código de Defesa do Consumidor , consoante estabelece a Súmula nº 469 do STJ, in verbis: Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos contratos de plano de saúde. O referido Diploma estabelece, como direito básico do consumidor, a informação adequada e clara acerca do preço de produtos e serviços. No caso dos autos, vê-se, sem embargos, que foi aplicado significativo reajustes no prêmio do seguro de saúde da parte autora, à míngua de qualquer demonstração das circunstâncias fáticas motivadoras de tais reajustes. A justificativa apresentada gravita, exclusivamente, no campo da abstração. Sequer é esclarecido acerca dos percentuais desses reajustes, tampouco o valor necessário para enfrentar o suposto incremento de sinistralidade da apólice. Frise-se que esses dois fatos: aumento da sinistralidade e aumento dos custos hospitalares, são fatos geradores do incremento do valor do prêmio, que devem ser conhecidos e individualizados, não se concebendo abstrações, como ocorreu no caso em apreço. Com efeito, o Superior Tribunal de Justiça, que detém a função de uniformizar jurisprudência no âmbito dos Juizados Especiais, já consolidou o entendimento no sentido que: Não se desconsidera, de forma apriorística, a importância do princípio da equivalência das prestações dos contratos comutativo; porém, é de se reconhecer que a aplicação desse cânone depende da verificação de um substrato fático específico que aponte para uma real desproporção entre as prestações, não se admitindo que a tutela constitucional dos direitos do consumidor seja limitada com base em meras suposições. (STJ - Resp. XXXXX/RJ , Relatora Ministra Nancy Andrighi, 3ª Turma, Julgado em 15/10/2009) Assim, na absoluta ausência de demonstração desse substrato fático específico, no caso concreto, impõe-se a interferência do Poder Judiciário, exatamente para que não haja o desequilíbrio do contrato, de modo a evitar, inclusive, a auto exclusão da beneficiária, em decorrência de reajustes indevidos e aleatórios. Neste particular, o CDC , em seu art. 51 , X , veda a variação do preço de maneira unilateral, quer seja direta ou indiretamente, mediante cláusula contratual. Também o art. 46, da referida legislação, estabelece que os contratos que regulam as relações de consumo não obrigarão os consumidores se os respectivos instrumentos forem redigidos de modo a dificultarem a compreensão de seu sentido e alcance. Aplica-se ao caso o seguinte julgado do Superior Tribunal de Justiça: AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE REVISÃO CONTRATUAL. PLANO DE SAÚDE. INCIDÊNCIA DO CDC . POSSIBILIDADE. REAJUSTE ABUSIVO CONFIGURADO. MATÉRIA JÁ PACIFICADA NESTA CORTE. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 83. I - A variação unilateral de mensalidades, pela transferência dos valores de aumento de custos, enseja o enriquecimento sem causa da empresa prestadora de serviços de saúde, criando uma situação de desequilíbrio na relação contratual, ferindo o princípio da igualdade entre partes. O reajuste da contribuição mensal do plano de saúde em percentual exorbitante e sem respaldo contratual, deixado ao arbítrio exclusivo da parte hipersuficiente, merece ser taxado de abusivo e ilegal. Incidência da Súmula XXXXX/STJ. Agravo improvido. (STJ - T3 - TERCEIRA TURMA ¿ Relator: Ministro SIDNEI BENETI - DJ 03/06/2009). Ademais, a alegação da parte ré, no sentido de que o reajuste perpetrado tem expressa previsão contratual, não pode prosperar, pois, o contrato relacional é de longa duração, em que o aderente se vincula com a legítima expectativa de permanecer vinculado àquele plano por prolongado período de tempo, sendo absolutamente inconcebível que o reajuste do contrato signifique uma verdadeira cláusula barreira, cuja finalidade é justamente fazer com que o contratante se auto exclua do plano, por não conseguir suportar o aumento das contribuições. Com efeito, em relação ao reajuste por faixa etária, cumpre ressaltar que o STJ, em decisão do Resp. Nº 1.568.244 ¿ RJ, decidiu pela validade da cobrança do reajuste por faixa etária, desde que atendidos certos critérios, fixando a seguinte tese: Assim, o consumidor que atingiu a idade de 60 anos, quer seja antes da vigência do Estatuto do Idoso , quer seja a partir de sua vigência (1º de janeiro de 2004), está sempre amparado contra a abusividade de reajustes das mensalidades com base exclusivamente no alçar da idade de 60 anos, pela própria proteção oferecida pela Lei dos Planos de Saúde e, ainda, por efeito reflexo da Constituição Federal que estabelece norma de defesa do idoso no art. 230. Em que pese ser desnecessária a prévia autorização da ANS para os reajustes em planos antigos, tal conclusão não afasta a possibilidade de reconhecimento de onerosidade excessiva e de abusividade do reajuste praticado, ante a incidência das regras consumeristas à hipótese. Segundo disposição constante do Tema 952, o reajuste de mensalidade de plano de saúde individual ou familiar fundado na mudança de faixa etária do beneficiário é válido desde que (i) haja previsão contratual, (ii) sejam observadas as normas expedidas pelos órgãos governamentais reguladores e (iii) não sejam aplicados percentuais desarrazoados ou aleatórios que, concretamente e sem base atuarial idônea, onerem excessivamente o consumidor ou discriminem o idoso. A Segunda Seção, no julgamento do tema, definiu (acórdão publicado no DJe de 19/12/2016): a) No tocante aos contratos antigos e não adaptados, isto é, aos seguros e planos de saúde firmados antes da entrada em vigor da Lei nº 9.656 /1998, deve-se seguir o que consta no contrato, respeitadas, quanto à abusividade dos percentuais de aumento, as normas da legislação consumerista e, quanto à validade formal da cláusula, as diretrizes da Súmula Normativa nº 3/2001 da ANS. Destaca-se, ainda, que não houve a indicação por parte da demandada, em contrato assinado, sobre os critérios utilizados para determinar o reajuste da mensalidade do plano de saúde em valor tão expressivo, aumento que se implementou em apenas um mês, rompendo com o equilíbrio contratual, princípio elementar das relações de consumo, a teor do que estabelece o artigo 4º , inciso III , do CDC , inviabilizando a continuidade do contrato. Nesse contexto, verifica-se que um dos argumentos ressaltados pelo STJ, é o de que a cláusula que reajusta a mensalidade de plano de saúde por mudança de faixa etária deve obedecer ao mutualismo e a solidariedade, além de ser regra atuarial e asseguradora de riscos. A operadora de saúde não produziu qualquer prova no sentido de justificar os índices adotados para o reajuste do plano de saúde da recorrida nos períodos impugnados, limitando-se a alegar a liberdade de reajustamento dos planos antigos, os quais não estão vinculados aos índices fixados pela ANS aos planos individuais. Assim, visando o equilíbrio financeiro do plano de saúde, foram estabelecidos preços fracionados em grupos etários a fim de que tanto os jovens quanto os de idade mais avançada paguem um valor compatível com os seus perfis de utilização dos serviços de atenção à saúde. Portanto, no caso em tela, é possível concluir que o plano de saúde não obedeceu às premissas impostas pelo STJ, restando indevido o reajuste aplicado ao consumidor. Quanto à repetição do indébito no caso dos autos, esta deve se dar na forma simples, conforme decisão do Ministro Raul Araújo, do STJ, nos autos da Reclamação nº 4.892/PR (2010/XXXXX-4), na qual se fixou o entendimento de que ¿a devolução em dobro dos valores pagos pelo consumidor somente é possível quando demonstrada a má-fé do credor¿ (STJ - Rcl: 4892/PR XXXXX/XXXXX-4, Relator: Ministro RAUL ARAÚJO, Data de Julgamento: 27/04/2011, S2 - SEGUNDA SEÇÃO, Data de Publicação: DJe 11/05/2011). Todavia, os fatos ocorridos, de cobrança indevida, sem qualquer outra circunstância que tenha causado ofensa a direitos da personalidade ou à dignidade humana, não ensejam danos morais in re ipsa, motivo pelo qual a pretensão indenizatória a título de danos morais resta afastada. Por tudo que consta dos autos, julgo no sentido de DAR PARCIAL PROVIMENTO ao recurso, para (a) DECLARAR a nulidade dos reajustes por faixa etária aplicados após 60 anos, com a condenação da demandada na devolução simples dos valores pagos a maior, respeitada a prescrição trienal para a devolução; (b) DECLARAR a abusividade dos reajustes anuais, objetos da lide, relativos aos anos de 2017, 2018 e 2019 , devendo ser aplicado o índices de reajuste anual definido pela ANS no período, com o consequente recálculo da mensalidade e devolução dos valores pagos a maior, na forma simples, respeitadas as prescrições decenais para revisão e trienal para a devolução. Sem custas ou honorários advocatícios, ante a ausência de recorrente vencido. Salvador, data registrada no sistema. ROSALVO AUGUSTO VIEIRA DA SILVA Juiz Relator