TJ-MG - Apelação Cível XXXXX20218130329 1.0000.24.147768-6/001
EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - DIREITO DE FAMÍLIA E DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE - PEDIDO DE DESTITUIÇÃO DO PODER FAMILIAR DO PAI BIOLÓGICO C/C ADOÇÃO UNILATERAL DA CRIANÇA PELO PADRASTO - QUADRO PROBATÓRIO QUE NÃO REVELA O INADIMPLEMENTO DOS DEVERES INERENTES À AUTORIDADE PARENTAL COM A GRAVIDADE, EXTENSÃO E IRREVERSIBILIDADE SUFICIENTES PARA A TIPIFICAÇÃO DO ABANDONO - POSSIBILIDADE DE RETOMADA DA PATERNIDADE RESPONSÁVEL AINDA NÃO DESCARTADA - MANUTENÇÃO DO PODER FAMILIAR DO PAI BIOLÓGICO QUE OBSTA O DEFERIMENTO DA ADOÇÃO UNILATERAL PRETENDIDA - POSSE DE ESTADO DE FILIAÇÃO ENTRE REQUERENTE E ADOTANDO ESTREME DE DÚVIDAS - RECONHECIMENTO DA FILIAÇÃO SOCIOAFETIVA, ENQUANTO QUESTÃO PREJUDICIAL ABARCADA PELO PEDIDO PRINCIPAL - MULTIPARENTALIDADE - CONCOMITÂNCIA DA PATERNIDADE BIOLÓGICA E SOCIOAFETIVA QUE MELHOR ATENDE AO SUPERIOR INTERESSE DA CRIANÇA - RECURSO PROVIDO EM PARTE. 1 - Em consonância com o disposto no art. 1.638 , II , do Código Civil , o abandono da criança ou adolescente decorrente da inobservância dos deveres próprios da autoridade parental, sobremodo aqueles relativos ao sustento e à convivência familiar, que acabam por formatar e viabilizar o próprio afeto, autorizam a perda do poder familiar. 2 - Caderno probatório que embora indique a inobservância pelo genitor biológico dos deveres próprios do poder familiar, na medida em que descumpridas prestações materiais e morais devidas ao filho, por força da cessação do pagamento dos alimentos e da própria ausência de convivência, ainda não se afigura suficiente para, dada a sua gravidade, extensão e irreversibilidade, desaguar na destituição da autoridade parental. Quadro probatório formado por um único estudo social realizado na casa da genitora da criança em momento anterior à citação e por prova testemunhal que não autoriza, por exemplo, a pacificação, com algum grau de certeza, do ponto controvertido relativo à gênese do afastamento entre pai e filho, se se tra ta da resistência da genitora ou apenas do desinteresse do pai biológico. 3 - Inadimplemento parcial dos deveres inerentes ao poder familiar que, dado os elementos dos autos, com destaque para a vontade do pai biológico em reverter a situação de descumprimento e retomar o vínculo com o seu filho, que desautoriza a tipificação do abandono como pressuposto para a perda do poder familiar. Medida extrema cuja configuração deve ser analisada com cautela e, ainda, reconhecida após exauridas as possiblidades de efetivação prática do princípio da paternidade responsável. 4 - Mantido o poder familiar do pai biológico, se afigura inviável o reconhecimento da adoção unilateral da criança pretendida pelo atual companheiro da genitora do menor (art. 41 , § 3º, do Estatuto da Criança e do Adolescente ). 5 - Posse de estado de filiação entre o requerente e o adotando que por ter sido revelada estreme de dúvidas deve ensejar o reconhecimento da filiação socioafetiva; questão prejudicial ao pedido principal, na medida em que configura premissa inarredável para a análise e deferimento do pedido de adoção unilateral pelo atual companheiro da mãe da criança, fundado no vínculo de cuidado e afeto previamente constituído com o adotando. 6 - Melhor interesse da criança que no momento é atendido pelo reconhecimento da multiparentalidade, com a existência simultânea da paternidade socioafetiva e da biológica, com todos os efeitos daí decorrentes, materiais, morais e até mesmo sucessórios.