DIREITO PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO ORDINÁRIA DE REPARAÇÃO POR DANOS MORAIS. PACIENTE COM CÂNCER DE TIREOIDE. PRELIMINAR DE AUSÊNCIA DE DIALETICIDADE RECURSAL. REJEITADA. CERCEAMENTO DE DEFESA. JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE. VENIRE CONTRA FACTUM PROPRIUM. RECORRENTE REQUEREU O JULGAMENTO ANTECIPADO EM SEDE DE RÉPLICA. MÉRITO. ATRASO NA REALIZAÇÃO DO EXAME EM 4 DIAS. NECESSIDADE DE SUSPENSÃO DA MEDICAÇÃO POR 30 DIAS. RECORRENTE TENTOU FAZER O PROCEDIMENTO, POR DUAS VEZES, DE FORMA INFRUTÍFERA. MAQUINÁRIO DEFEITUOSO. FORTUITO INTERNO. DANO MORAL DEVIDO. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. SENTENÇA MODIFICADA. 1. Trata-se de apelação interposta por Mônica Maria Benício de Oliveira , em face da sentença proferida às fls. 164/169, pelo Mmº Juiz da 21ª Vara Cível da Comarca de Fortaleza, que julgou improcedente o pedido formulado pela recorrente. 2. Da preliminar de ofensa a dialeticidade. Na contraminuta apresentada pelo apelado, aduz-se que a recorrente não impugna especificamente a sentença guerreada e que apenas repete pleitos já apreciados quando da prolatação do r. decisum, violando, assim, o princípio da dialeticidade. A irresignação do recorrido não prospera, pois, em exame à peça recursal, confere-se que a apelante tenta convencer este juízo ad quem dos seus argumentos, no sentido de que o atraso na realização do exame enseja dano moral. 3. Da preliminar de cerceamento de defesa. A propósito, o art. 355 do Código de Processo Civil ( CPC ) possibilita o julgamento antecipado da lide, ou seja, sem a realização da fase probatória prevista nos artigos 369 e seguintes da norma processual, em duas hipóteses: quando não houver necessidade de produção de outras provas ou o réu for revel. No caso concreto, o nobre juiz sentenciante não oportunizou a manifestação das partes a respeito do interesse na produção de provas, inexistindo despacho/decisão anunciado o julgamento antecipado da lide. Tal fato, em regra, afronta o princípio da não surpresa, com fundamento em questões não submetidas ao prévio contraditório, cerceando o direito de ambas as partes. Porém, no caso dos autos, verifico que a parte autora expressamente em sua réplica requereu o julgamento antecipado da lide (fl. 161), entendo que ao assim proceder, a recorrente não pode requerer a nulidade pelo julgamento antecipado do feito (venire contra factum proprium), por violar a boa-fé objetiva. 4. No mérito, cinge-se a controvérsia em examinar o acerto ou desacerto da sentença que entendeu por julgar improcedente o feito diante da ausência de comprovação de que o atraso em 4 dias na realização no exame da parte autora e da injeção da substância conhecida como ¿contraste¿ tenha causado quaisquer prejuízos a sua saúde. 5. No caso dos autos, diante dos fatos narrados por ambas as partes, resta incontroverso que a recorrente teve câncer e necessitou realizar um exame, o qual demandava a suspensão medicamentosa prévia por 30 dias. Assim, a apelante marcou a realização do exame para o dia 09/10/2017, porém, não foi possível por inoperância do maquinário responsável pela sua realização, de modo que foi remarcado para 11/10/2017. Todavia, o exame novamente não ocorreu porque a máquina estava em manutenção. Então, apenas em 13/10/2017 foi possível proceder com o exame. 6. O atraso na realização do exame, indubitavelmente, se deu por ato do demandado. A necessidade de possuir, ou ter redes credenciadas que tenham máquinas em perfeitas condições de uso é risco integrante da própria atividade, fortuito interno, e, dessa maneira, não é capaz de romper o nexo de causalidade. No cenário dos autos, a suspensão da medicação por 30 dias se deu justamente devido ao contraste e, na primeira data marcada para o exame, a requerida fez a aplicação do contraste, ainda que a máquina estivesse inoperante. Logo, a recorrente não realizou o exame, mesmo após ter sido totalmente preparada, inclusive com a aplicação do constraste, em 09/10/2017, e, após o reagendamento em 11/10/2017, voltou a ser impossibilitada de realizar o exame, sem saber quando poderia voltar a tomar sua medicação e com receio do que a sua ausência causaria em seu corpo, após ser acometida com uma doença de tamanha gravidade (câncer). 7. Dessa maneira, verifica que houve falha na prestação do serviço e no dever de informação, ocasião em que a situação narrada ultrapassa mero aborrecimento,de modo que o dano moral restou configurado. 8.No caso concreto, considerando que não houve recusa no serviço, e sim atraso na realização do exame, que ocasionou a paralisação do medicamento necessário para o tratamento de saúde da parte autora por mais tempo do que previsto, ensejando agravamento do seu estado psiquíco, verifico como proporcional e adequada a fixação de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) a título de danos morais. 9. Recurso conhecido e provido. ACÓRDÃO: Vistos, relatados e discutidos estes autos, acorda a 1ª Câmara Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, em conhecer do recurso de apelação, para dar-lhe provimento. Fortaleza, 17 de abril de 2024 FRANCISCO MAURO FERREIRA LIBERATO Presidente do Órgão Julgador DESEMBARGADOR CARLOS AUGUSTO GOMES CORREIA Relator