E M E N T A PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. DÉBITO FISCAL. PESSOA JURÍDICA. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA. SÓCIOS E/OU DIRETORES. ARROLAMENTO DE BENS. CABIMENTO. SUFICIÊNCIA PATRIMONIAL DO DEVEDOR PRINCIPAL. IRRELEVÂNCIA. DISCUSSÃO DO DÉBITO NO ÂMBITO ADMINISTRATIVO. OFERECIMENTO DE SEGURO-GARANTIA. MEDIDA CAUTELAR ANTECEDENTE. COISA JULGADA. OBSERVÂNCIA. PRECEDENTES. PORTARIA RFB Nº 315/2023. ACEITAÇÃO DE FIANÇA BANCÁRIA. SUBSTITUIÇÃO. POSSIBILIDADE. RECURSOS DE APELAÇÃO PROVIDOS. SENTENÇA REFORMADA. 1 – Em decorrência de débito apurado em desfavor da pessoa jurídica COMGÁS – CIA. DE GÁS DE SÃO PAULO, mediante regular processo administrativo (nº 17459-XXXXX/2021-14), referente a suposto crédito tributário do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), relativos aos anos de 2017 e 2018, foram expedidos os “Termos de Arrolamento de Bens e Direitos” em nome dos administradores. 2 - O arrolamento de bens vem disciplinado pelos arts. 64 e 64-A da Lei nº 9.532 , de 10 de dezembro de 1997, e consubstancia mecanismo por meio do qual a Fazenda Pública promove apenas um cadastro destinado a viabilizar o monitoramento da evolução patrimonial (individualmente considerada) do sujeito passivo da obrigação tributária, sem que exsurja, com isso, qualquer embaraço à gestão dos bens, inclusive com possibilidade plena de alienação, razão pela qual, longe de implicar indisponibilidade dos ativos, afigura-se como medida preventiva, com o escopo de garantir a dívida fiscal e tem sua aplicação circunscrita a hipóteses excepcionais, quando o valor quando o valor cobrado exceda a 30% (trinta por cento) do patrimônio do devedor e seja superior a R$500.000,00 (quinhentos mil reais), quantia alterada para R$2.000.000,00 (dois milhões de reais) pelo Decreto 7.573 /11. 3 - A definição de sujeito passivo da obrigação tributária inclui, também, o responsável tributário, na exata compreensão dos artigos 121 e seguintes do Código Tributário Nacional , e, sendo vedada a invocação do benefício de ordem na hipótese de solidariedade passiva do crédito tributário, afigura-se irrelevante o fato de a empresa, na condição de devedora principal, apresentar patrimônio suficiente à liquidação do débito apurado, sendo perfeitamente cabível o direcionamento do arrolamento aos sócios. Precedentes do STJ e desta Corte. 4 - A pendência de constituição definitiva do crédito tributário, decorrente do não esgotamento da discussão administrativa do débito fiscal, não constitui óbice à lavratura do termo de arrolamento de bens, na medida em que, como adrede referenciado, este afigura-se como mera garantia. 5 – Esta 3ª Turma, por ocasião do julgamento da Apelação Cível nº XXXXX-09.2022.4.03.6182 , em que se discutia, em sede de tutela cautelar antecedente, acerca da possibilidade de oferecimento de apólice de “seguro garantia” relativa à discussão fiscal travada no âmbito do mesmo processo administrativo afeto a esta impetração (17459.720028/2021-14), assentou entendimento no sentido de que “o pleito autoral procede para permitir, face aos débitos apurados no PA 17459.720028/2021-14, a antecipação da respectiva garantia, na forma da apólice de seguro garantia juntada aos autos, por cuja idoneidade e suficiência responde a autora, ficando, nos limites do apurado e coberto, assegurado o direito à emissão de certidão de regularidade fiscal; afastado o valor, a que se refere a apólice de seguro garantia, no cômputo do passivo fiscal para eventual arrolamento administrativo; e obstada a inscrição no CADIN, quanto ao valor garantido, em caso de inscrição em dívida ativa e ajuizamento da execução fiscal”. 6 - Como se vê, o pronunciamento judicial transitado em julgado aceitou o oferecimento, pela devedora principal (COMGÁS), de garantia do débito, materializada por meio da Apólice nº XXXXX07750010241 – “Seguro Garantia Judicial”, emitida pela instituição financeira “BTG Pactual” em favor da União – Fazenda Nacional, no importe de R$1.042.549.996,92 (um bilhão, quarenta e dois milhões, quinhentos e quarenta e nove mil, novecentos e noventa e seis reais e noventa e dois centavos), com vigência até às 24:00 horas do dia 08 de dezembro de 2027, constando, expressamente, no documento que “visa garantir ao Segurado o pagamento dos créditos tributários lançados de ofício nos autos do Procedimento Administrativo nº 17459.720028/2021-14”. 7 - Dessa forma, e em respeito aos efeitos preclusivos da coisa julgada, verifica-se que o débito fiscal – mesmo ainda não constituído em definitivo – se encontra devidamente garantido por meio de fiança bancária prestada pela devedora principal, do que sobressai inequívoca a desnecessidade da manutenção dos Termos de Arrolamento de Bens. 8 - Ainda que tal possibilidade – oferecimento de seguro garantia – não estivesse, como no caso, assegurada por meio do título executivo judicial formado naquela demanda, ressalte-se que a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, a propósito do tema, caminha nesse mesmo sentido, ao equiparar tal instrumento a dinheiro, para efeito de garantia do débito. Precedente. 9 - O Secretário Especial da Receita Federal do Brasil, no âmbito de suas atribuições legais, editou a Portaria RFB nº 315, de 14 de abril de 2023, que estabelece a forma e as condições para o oferecimento e a aceitação de fiança bancária e seguro-garantia no âmbito da Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil (RFB), contemplando, especificamente para o que aqui interessa, a garantia do débito tributário por meio da fiança bancária, na exata compreensão do disposto em seu art. 1º, parágrafo único. 10 - A fiança bancária serve, inclusive, para o propósito de substituição do arrolamento de bens, a contento do disposto no art. 10 da norma citada. 11 - Ainda, a Instrução Normativa RFB n.º 2.0891/2022, em seu artigo 15, regulamenta a possibilidade de substituição do arrolamento de bens por fiança bancária ou seguro garantia. 12 - Tudo somado, entende-se plenamente válida a pretensão viabilizada no presente mandado de segurança, no sentido da desconstituição dos Termos de Arrolamento de Bens, uma vez oferecida fiança bancária idônea e suficiente à garantia do débito, cuja regularidade deverá ser aferida pela Receita Federal. 13 – Sem condenação em honorários advocatícios (Súmula nº 105 /STJ). 14 – Apelações providas. Sentença reformada. Segurança concedida.