APELAÇÃO CÍVEL EM AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS. SEGURO VEICULAR. NEGATIVA DE PAGAMENTO DA INDENIZAÇÃO RELATIVA AO SINISTRO COM FUNDAMENTO NA OCORRÊNCIA DE HIPÓTESE DE EXCLUSÃO DA COBERTURA CONTRATUAL (CLÁUSULA DE PERFIL). NÃO CONTRATAÇÃO DE COBERTURA PARA CONDUTOR DE 18 A 25 ANOS. AUSÊNCIA DE CLAREZA QUANTO À INCLUSÃO DO INDIVÍDUO COM 26 ANOS INCOMPLETOS. REDAÇÃO DÚBIA. APLICAÇÃO DA INTERPRETAÇÃO MAIS FAVORÁVEL AO CONSUMIDOR (ART. 47 , CDC ). DEVER DE INFORMAÇÃO NÃO OBSERVADO PELA SEGURADORA. OBRIGAÇÃO DE PAGAMENTO DA INDENIZAÇÃO CABÍVEL. DANOS MORAIS CONSTATADOS. RECURSO PROVIDO. 1. O presente recurso de apelação visa a combater o decisum de Primeiro Grau que julgou improcedente a ação originária, afastando o dever de pagamento da indenização securitária à parte autora ao considerar legítima a recusa da seguradora Promovida de cobertura do sinistro apontado. Argumenta o Apelante que atuou de boa-fé, defendendo que a cláusula contratual relativa à extensão da cobertura securitária a condutores de faixa etária entre 18 e 25 anos é ambígua, levando o consumidor a crer, através de uma interpretação literal, que o jovem de 25 anos e 4 meses não se enquadraria na faixa etária de 18 a 25 anos. Em outras palavras, explanou o Autor/Recorrente que a interpretação por ele dada à dita cláusula foi no sentido de que a condução do veículo por seu filho não demandaria a contratação dessa cobertura adicional, pois este já possuía mais de 25 (vinte e cinco) anos de idade. Dessa forma, defende que foi induzido a erro pelo instrumento de contrato em tela, que é de adesão. 2. O caso não trata propriamente de apresentação de informações inconsistentes pelo consumidor no momento da contratação, e sim da análise de possível enquadramento do sinistro em hipótese de exclusão da cobertura securitária. Refere-se à cláusula que prevê a necessidade de se aderir a uma cobertura adicional em caso de condutores situados faixa etária entre 18 (dezoito) e 25 (vinte e cinco) anos de idade, sob pena de perda do direito à indenização. 3. Analisando-se os autos, é possível constatar que, na ocasião do acidente de trânsito relatado (22/01/2022), o veículo segurado era conduzido pelo filho do Autor/Apelante, que tinha, à época, 25 (vinte e cinco) anos e 8 (oito) meses de idade. Registrou-se, ainda, que, quando da renovação do seguro, o Recorrente optou por não contratar essa cobertura adicional, uma vez que não a considerou necessária, já que o seu filho já contava, naquela data, com 25 (vinte e cinco) anos e 4 (quatro) meses de idade. 4. A interpretação contratual dada pelo Apelante mostra-se razoável, tendo em vista que a redação da cláusula não especifica se o indivíduo com idade superior a 25 (vinte e cinco) anos completos estaria incluído na exclusão de cobertura. Considerando-se que esse indivíduo, na realidade, possui idade equivalente a 26 (vinte e seis) anos incompletos, mostra-se plenamente aceitável a interpretação no sentido que estaria incluído na faixa etária de cobertura contratual, o que revelaria a desnecessidade da adesão à cobertura para condutores de 18 a 25 anos. 5. A redação da cláusula contratual favorece o surgimento de dúvidas, dando abertura a diferentes interpretações no que diz respeito à abrangência da faixa etária do condutor resguardado e à consequente necessidade de uma contratação da cobertura adicional. Nesse cenário, não se admite que o consumidor seja prejudicado por conferir ao contrato uma interpretação razoável e plenamente aplicável à avença, sobretudo se considerando a natureza do pacto (contrato de adesão). 6. A Apelada detinha dever de informar adequadamente o consumidor a respeito do objeto do contrato em liça, de modo que restassem claras e precisas, em especial, as hipóteses em que a cobertura não seria devida. Trata-se de obrigação decorrente da norma do art. 6º , III , do Código de Defesa do Consumidor . Não se olvide, ainda, que, segundo a previsão do art. 47 da Lei Consumerista, ¿as cláusulas contratuais serão interpretadas de maneira mais favorável ao consumidor¿, não podendo o Apelado ser prejudicada em face da ausência de clareza suficiente no instrumento do contrato. 7. Não restou comprovado, nos autos, que a previsão contratual em exame foi devidamente informada ao consumidor, de modo a garantir o prévio conhecimento de seu conteúdo pelo segurado. Conclui-se, diante disso, que houve inobservância de determinação expressa do CDC , no sentido de que ¿as cláusulas que implicarem limitação de direito do consumidor deverão ser redigidas com destaque, permitindo sua imediata e fácil compreensão¿ (art. 54, § 4º). 8. Não há indícios de má-fé do consumidor, que, inclusive, informou adequadamente as informações do condutor no momento da abertura do sinistro e revelou acreditar estar regularmente seguro pela cobertura securitária. Da mesma forma, não há elementos que evidenciem o agravamento do risco pelo condutor no sinistro em questão, havendo a seguradora se pautado exclusivamente na idade daquele, o que é insuficiente à negativa em apreço. 9. Nesse contexto, a Apelada deve ser obrigada a pagar o valor correspondente à indenização cabível para situação em comento (perda total do bem, conforme concluiu a própria seguradora ¿ v. fl. 48), nos parâmetros contratualmente previstos para tanto (valor referenciado na Tabela FIPE, com avaliação correspondente à data do sinistro). Entendimento diverso resultaria na frustração indevida do próprio objeto do contrato como consequência de conduta atribuída exclusivamente à seguradora, em dissonância dos preceitos inerentes ao sistema jurídico de proteção ao consumidor. 10. Constatada a conduta abusiva da Promovida, mostra-se devida a reparação pelos desgastes causados à parte autora. O transtorno provocado pela seguradora ao Demandante ultrapassou o mero aborrecimento, resultando de negativa abusiva de pagamento da indenização securitária, por consequência de falha no dever de informação e da aplicação arbitrária de uma interpretação contratual excessiva e gravosa em desfavor do consumidor de boa-fé. 11. A gravidade do fato, a intensidade do sofrimento padecido pelo ofendido e a situação econômica do ofensor (função preventiva e punitiva da indenização por dano moral) são as principais circunstâncias a serem consideradas como elementos objetivos e subjetivos de concreção do dano moral, em tudo observando-se, ainda, os critérios de razoabilidade e proporcionalidade. Por tais fundamentos, mostra-se pertinente a fixação de indenização por danos morais no montante equivalente a R$ 5.000,00 (cinco mil reais), o qual se mostra condizente com o contexto exposto e se insere nos limites da proporcionalidade e razoabilidade. 12. Recurso conhecido e provido ACÓRDÃO: Vistos, relatados e discutidos estes autos, acorda a 1ª Câmara Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, por unanimidade, em conhecer do recurso de apelação para lhe dar provimento, nos termos do voto do Desembargador Relator.