META 2 do CNJ EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE DISSOLUÇÃO DE SOCIEDADE LIMITADA. IRRESIGNAÇÃO CONTRA SENTENÇA QUE DETERMINOU COMO DATA-BASE PARA A APURAÇÃO DE HAVERES, EM RELAÇÃO A TODOS OS SÓCIOS, A DATA DA CONVENÇÃO DE DISSOLUÇÃO. SÓCIO APELANTE QUE JÁ HAVIA MANIFESTADO PRETENSÃO DE RETIRADA EM MOMENTO ANTERIOR, POR MEIO DO ENVIO DE NOTIFICAÇÃO EXTRAJUDICIAL. INCIDÊNCIA DOS ARTS. 1.029 DO CÓDIGO CIVIL E 605 , II , DO CPC . EM RELAÇÃO AO SÓCIO DISSIDENTE, A APURAÇÃO DE HAVERES DEVE TER COMO DATA-BASE O SEXAGÉSIMO DIA APÓS O RECEBIMENTO DA NOTIFICAÇÃO DE RETIRADA PELOS DEMAIS SÓCIOS. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. 1. O presente apelatório foi manejado contra a sentença de Primeiro Grau prolatada nos autos da ação de dissolução de sociedade originária, irresignando-se o ora Recorrente quanto à data-base apontada pelo Juízo a quo para fins de apuração de haveres. 2. Segundo registrado pelo d. Juízo a quo em sentença, considerou-se o termo inicial da apuração de haveres como sendo a data da convenção de dissolução, conforme ata de fls. 14/15, ou seja, 21 de julho de 2014. (fl. 349). Assim, o marco determinado para a referida data-base foi a data da reunião de sócios em que se decidiu pela liquidação da sociedade, que não contou, entretanto, com a presença do sócio dissidente. 3. Discorda o Apelante da escolha da data em questão, ressaltando que notificou os Apelados de sua vontade de sair do quadro societário da empresa ainda no ano de 2009. Defende, assim, que a data-base da dissolução parcial da sociedade deve corresponder ao dia em que os Recorridos tomaram ciência ou quando da notificação do juízo arbitral. Diante disso, pleiteia a reforma da sentença, para que se declare a data-base para apuração dos haveres, no que concerne à responsabilidade do Apelante, como sendo em março de 2009. 4. Vale registrar que há duas datas a serem analisadas na situação posta em Juízo: aquela em que se considera parcialmente dissolvida a sociedade, com a retirada do sócio dissidente; e a data da dissolução total, desfazendo-se o quadro societário remanescente. Tal cenário é apto a ensejar duas datas diferentes para a apuração de haveres: uma relacionada ao sócio retirante e outra referente aos demais sócios. 5. Indicam os autos que não há divergências quanto à quebra da affectio societatis e à necessidade de dissolução da sociedade em questão. Entretanto, observa-se que o desejo inequívoco do ora Apelante de se retirar da sociedade é anterior à propositura da ação em tela e à convenção de dissolução materializada em 21 de julho de 2014, havendo sido manifestado tanto por meio do envio de notificações extrajudiciais como pelo acionamento da Justiça Arbitral. 6. O direito de retirada do sócio se traduz em um direito potestativo, uma vez que ninguém é obrigado a permanecer em uma sociedade contra a sua vontade. Sob essa linha de raciocínio, o Código Civil estabelece a forma e o marco temporal relativos ao exercício desse direito, consignando que "além dos casos previstos na lei ou no contrato, qualquer sócio pode retirar-se da sociedade; se de prazo indeterminado, mediante notificação aos demais sócios, com antecedência mínima de sessenta dias; se de prazo determinado, provando judicialmente justa causa" (art. 1.029). 7. Dessa forma, dispõe o ordenamento que a retirada de sócio de sociedade de prazo indeterminado pode ser efetuada por meio de notificação aos demais sócios, concretizando-se a dissolução parcial 60 (sessenta) dias após o recebimento da referida comunicação, independentemente de qualquer medida judicial. Sobre o assunto, é clara e sólida a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, segundo o qual "o contrato societário fica resolvido, em relação ao sócio retirante, após o transcurso de tal lapso temporal, devendo a data-base para apuração dos haveres levar em conta seu termo final" (STJ - REsp n. 1.735.360/MG , rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 12/3/2019). 8. No caso, verifica-se que o ora Apelante encaminhou aos Recorridos, em março de 2009, notificação extrajudicial cujo teor se traduz na alegação da quebra do affectio societatis, em face de suposta violação de deveres contratuais por parte dos Notificados. Ao fim do documento, denunciou o Notificante sua intenção de retirar-se da sociedade em questão, o que se tornou da ciência dos sócios quando do recebimento da notificação, quase todos ainda no mesmo mês (fls. 216/227). Posteriormente, entendeu o Apelante pela necessidade de mover uma ação de dissolução parcial de sociedade, acionando o Juízo Arbitral para fins de dirimir a situação em comento. No ensejo, restou designada audiência de instrução e julgamento para o dia 10/11/2009, à qual não compareceram os requeridos, apesar de devidamente citados (fls. 228/244). 9. Tais circunstâncias evidenciam que o Recorrente vem tentando retirar-se da sociedade desde março de 2009, restando sua situação judicializada desde então, no intuito de se formalizar a dissolução parcial requestada e se proceder à solução das pendências contábeis. É verdade que, como já dito, a sentença arbitral em que se pautou o sócio retirante restou invalidada na ação de execução de nº XXXXX-34.2010.8.06.0071 , com fundamento no art. 32 , III , da Lei de Arbitragem . Ocorre que, apesar de não surtir efeitos o citado decisum arbitral, o contexto e as circunstâncias demonstradas nos autos apontam a inequívoca pretensão do sócio Apelante em retirar-se da sociedade em questão ainda em março de 2009. Na realidade, conforme determinam as normas supracitadas e a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, há de se considerar o exercício do direito de retirada do Recorrente quando do envio da respectiva notificação extrajudicial aos demais sócios, no referido mês. Nesse raciocínio, considerando que o último sócio a ser comunicado recebeu a notificação em 1º de abril de 2009 (fl. 225), a partir daí deve se iniciar a contagem do prazo sexagesimal para a efetiva retirada do sócio Apelante (e não do envio da notificação, como é por ele defendido). 10. Diante disso, o recurso em apreço merece parcial provimento, para se adequar a data-base da apuração de haveres relativa ao sócio dissidente às diretrizes legais incidentes sobre a matéria. No que pertine aos demais sócios, não merece reparos a sentença vergastada. 11. Recurso conhecido e parcialmente provido, reformando-se a sentença vergastada para determinar como data-base para apuração de haveres, em relação ao sócio Apelante, o termo final do prazo de sessenta dias após o recebimento da notificação extrajudicial pelos demais sócios a respeito do intento de retirada do Recorrente da sociedade. ACÓRDÃO: Vistos, relatados e discutidos estes autos, acorda a 1ª Câmara Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, por unanimidade, em conhecer do recurso de apelação para lhe dar parcial provimento, nos termos do voto do Desembargador Relator. Fortaleza, data e assinatura digital registradas no sistema processual eletrônico.