PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE. SEGURADA URBANA. CUMPRIMENTO DOS REQUISITOS ETÁRIO E DA CARÊNCIA LEGAL. CONTRIBUINTE EM DOBRO. ARTIGO 9º DA LEI 3.807 /60 ( LOPS ). SERVIDORA MUNICIPAL. PERÍODOS DE RECOLHIMENTO EM DOBRO NÃO COMPUTADOS PARA CONCESSÃO DA APOSENTADORIA NO REGIME PRÓPRIO. CÔMPUTO NO REGIME GERAL. DIREITO RECONHECIDO. VENIRE CONTRA FACTUM PROPRIUM. PROTEÇÃO DA BOA-FÉ OBJETIVA E DA CONFIANÇA. 1. Nos termos do disposto no art. 48 , caput, da Lei de Benefícios da Previdência Social , o segurado urbano tem direito ao benefício de aposentadoria por idade desde que atenda aos seguintes requisitos: a) idade mínima de 65 (sessenta e cinco) anos, se homem, ou 60 (sessenta) anos, se mulher; b) cumprimento da carência correspondente a 180 contribuições (art. 25 , inciso II , da Lei 8.213 /1991). 2. Em relação aos trabalhadores inscritos na Previdência Social Urbana até 24 de julho de 1991, ou cobertos pela Previdência Social Rural até então, o período de carência a ser observado é o estabelecido na norma de transição apontada pelo art. 142 da Lei de Benefícios , devendo ser levado em conta o ano em que o segurado tenha implementado todas as condições exigidas à obtenção da aposentadoria. 3. Encontra-se sedimentada a orientação jurisprudencial no sentido de que não se exige que os requisitos para a obtenção da aposentadoria por idade do trabalhador urbano sejampreenchidos simultaneamente, sendo devido o benefício quando a parte requerente completa a idade após ter perdido a qualidade de segurado, desde que tenha vertido as contribuições correspondentes à carência, consoante a regra de transição traçada no art. 142 da Lei 8.213 /1991 (STJ, EDREsp. n. XXXXX, rel. p. ac. Min. Gilson Dipp, 3ª Seção, DJ 11/04/2005; AgRg no REsp XXXXX/RS , Rel. Ministro GILSON DIPP, QUINTA TURMA, julgado em 21/03/2006, DJ 10/04/2006, p. 292). 4. A autora, nascida em 27/10/1942, cumpriu o requisito etário - 60 anos - em 2002, ano em que a carência prevista para a concessão do benefício corresponde a 126 meses (10 anos e 6 meses), nos termos do art. 142 da Lei 8.213 /1991. 5. O cerne da lide recursal está em verificar se os períodos em que a autora verteu contribuições na qualidade de contribuinte em dobro (08/1972 a 08/1989 e 09/1989 a 04/1990), conforme previsão contida no art. 9º da Lei 3.807 /1960, poderão ser computados como carência para percepção do benefício da aposentadoria por idade no Regime Geral da Previdência Social (RGPS), mesmo tendo ela se vinculado posteriormente a Regime Próprio de Previdência, na condição de servidora pública do Município de Formiga, além de ter computado para aposentadoria neste último os vínculos celetistas mantidos nos períodos de 01/01/1961 a 20/01/1969 e de 01/08/1969 a 31/12/1971. 6. No regime jurídicoanterior às Leis 8.212 /91 e 8.213 /91, o segurado que deixasse de exercer atividade vinculada à Previdência Social poderia manter a sua qualidade de segurado para todos os efeitos, por meio do recolhimento de contribuições ao Regime Geral, na condição de contribuinte em dobro, consoante a previsão contida no art. 9º da Lei 3.807 /1960 ( LOPS ) e também nos Decretos 83.081/1979 e 89.312 /1984, que vigoraram às épocas dos recolhimentos. 7. A Certidão de Tempo de Serviço emitida pelo INSS, anexada à f. 33, comprova que a autora trabalhou na empresa Waldivino Ribeiro/Hotel Central no período de 01/01/1961 a 20/01/1969 e na empresa Hélio de Oliveira/Dist. Peças Máqs. Costuras "Sol", no período de 01/08/1969 a 31/12/1971, além de ter vertido contribuições, na condição de contribuinte em dobro, no período de 08/1972 a 08/1989, encontrando-se vinculado ao Regime Geral da Previdência Social, nessa qualidade (isto é, como contribuinte em dobro), na data em que emitida a Certidão. O início do pagamento como contribuinte em dobro se deu quando a autora se encontrava, de fato, desempregada e também no "período de graça", conservando a qualidade de segurada do RGPS. 8. A declaração emitida pela Prefeitura Municipal de Formiga anexada à f. 28 informa, por sua vez, que a autora iniciou suas atividades no cargo de professora em escola do referido município em 01/02/1973, tendocontribuído para o IPSEMG - Instituto de Previdência dos Servidores do Estado de Minas Gerais. 9. A Certidão de Contagem de Tempo de Serviço emitida pela Prefeitura Municipal de Formiga, anexada à f. 44, confirma a utilização, no âmbito do Regime Próprio de Previdência, para fins de aposentadoria, dos períodos de 01/01/1959 a 30/12/1960, 01/01/1961 a 20/01/1969 e de 01/08/1969 a 31/12/1971. Portanto, o período de recolhimento em dobro, no qual a autora permaneceu vinculada ao RGPS não foi computado para percepção da aposentadoria no âmbito do Regime Próprio de Previdência da Prefeitura Municipal de Formiga. 10. Dessa forma, tendo a autora, mesmo vinculada a Regime Próprio de Previdência, mantido a filiação ao Regime Geral, exercendo direito subjetivo previsto pela legislação vigente à época em que figurou como contribuinte em dobro, não se afigura cabível desconsiderar este período contributivo para fins de percepção da aposentadoria por idade no âmbito do Regime Geral. 11. O que a legislação previdenciária veda (art. 96 , inciso I , da Lei 8.213 /1991)é o cômputo em duplicidade de períodos contributivos em mais de um regime de previdência, situação de que não se cuida na espécie, pois o período de recolhimento em dobro não foi considerado, repita-se, no âmbito do Regime Próprio para fins de percepção de aposentadoria pela Prefeitura Municipal de Formiga.12. Não era vedado ao segurado filiado ao Regime Geral da Previdência Social, na condição de contribuinte em dobro, vincular-se, posteriormente, a Regime Próprio de Previdência Social, em decorrência do exercício de atividade que determinasse filiação a este último. 13. A situação jurídica do contribuinte em dobro, sob a perspectiva do custeio, equiparava-se à do segurado que se encontrava em exercício de atividade vinculada à Previdência Social Urbana (RGPS), o que não impedia, em virtude da ausência de vedação no sistema, a vinculação a Regime Próprio de Previdência em decorrência do exercício de outra atividade que determinasse a filiação a este último. Os vínculos da autora em cada um dos regimes eram distintos: na Prefeitura Municipal de Formiga, a vinculação se estabeleceu em consequência do exercício do cargo efetivo de Professora; no âmbito do Regime Geral da Previdência Social, em consequência da conservação da qualidade de segurada por força do recolhimento das contribuições em dobro não computadas no âmbito do Regime Próprio. 14. Com a superveniência das Leis 8.213 /1991 e 8.212 /1991 o contribuinte em dobro foi equiparado ao segurado facultativo, desaparecendo, em relação a este, a necessidade de que tivesse mantido vinculação anterior ao Regime Geral da Previdência Social, tal como se exigia para o contribuinte em dobro. Somente com o advento daEmenda Constitucional n. 20/1998, que alterou a redação do § 5º do art. 201 da Constituição Federal de 1988, é que foi introduzida no sistema a vedação de filiação ao regime geral da previdência social, na qualidade de segurado facultativo, de pessoa vinculada a regime próprio de previdência. 15. A desconstituição da situação jurídica de filiação válida da autora ao RGPS, na condição de contribuinte em dobro, mais de 20 (vinte) anos após os recolhimentos, quando já consumada a decadência do direito de repetição das contribuições - a repetição seria consequência natural da desconsideração do período contributivo -, além de contrariar os cânones da segurança jurídica e da certeza do direito, viola os princípios da boa-fé objetiva, da confiança, da eticidade e o subprincípio expresso na máxima "nemo potest venire contra factum proprium." 16. Em suma, os períodos em que a autora verteu contribuições na qualidade de contribuinte em dobro (08/1972 a 08/1989 e 09/1989 a 04/1990), conforme previsão contida no art. 9º da Lei 3.807 /1960, poderão ser computados para fins de carência e, consequentemente, para obtenção da aposentadoria por idade urbana. E, tendo a autora cumprido o requisito etário e o da carência legal, conforme contagem de tempo anexada à f. 248, faz jus à percepção do benefício. 17. Correção monetária e juros de mora deacordo com a versão mais atualizada do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal, devendo ser observada, quanto à atualização monetária, a orientação do Supremo Tribunal Federal no julgamento do RE 870.947 (repercussão geral, tema 810), que declarou a inconstitucionalidade da TR para esse fim. 18. A matéria relativa a juros e correção monetária é de ordem pública e cognoscível, portanto, de ofício, inclusive em reexame necessário, razão por que se afasta eventual alegação de reformatio in pejus contra a Fazenda nesses casos, tampouco se pode falar em ofensa ao princípio da inércia da jurisdição. Precedentes citados no voto. 19. Quanto aos honorários, cumpre frisar que "Somente nos recursos interpostos contra decisão publicada a partir de 18 de março de 2016, será possível o arbitramento de honorários sucumbenciais recursais, na forma do art. 85 , § 11 , do novo CPC " (Enunciado Administrativo STJ nº 7). Assim, os honorários advocatícios em desfavor da autarquia-previdenciária devem ser fixados, em regra, no percentual de 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação na data de prolação da sentença de procedência do pedido inicial (Súmula nº 111 do STJ). 20. Em se tratando de causas ajuizadas perante a Justiça Federal, o INSS está isento de custas (inclusive despesas com oficial de justiça) por força do art. 4º , I da Lei 9.289 /1996, o que se repete nos Estados onde houver lei estadual assim prescrevendo, como é o caso de Minas Gerais (Lei nº 14.939/2003). 21. Apelação a que se nega provimento. Remessa necessária parcialmente provida.