RECURSO EXTRORDINÁRIO. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. INCIDÊNCIA. VALE-TRANSPORTE. MOEDA. CURSO LEGAL E CURSO FORÇADO. CARÁTER NÃO SALARIAL DO BENEFÍCIO. ARTIGO 150 , I , DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL . CONSTITUIÇÃO COMO TOTALIDADE NORMATIVA. 1. Pago o benefício de que se cuida neste recurso extraordinário em vale-transporte ou em moeda, isso não afeta o caráter não salarial do benefício. 2. A admitirmos não possa esse benefício ser pago em dinheiro sem que seu caráter seja afetado, estaríamos a relativizar o curso legal da moeda nacional. 3. A funcionalidade do conceito de moeda revela-se em sua utilização no plano das relações jurídicas. O instrumento monetário válido é padrão de valor, enquanto instrumento de pagamento sendo dotado de poder liberatório: sua entrega ao credor libera o devedor. Poder liberatório é qualidade, da moeda enquanto instrumento de pagamento, que se manifesta exclusivamente no plano jurídico: somente ela permite essa liberação indiscriminada, a todo sujeito de direito, no que tange a débitos de caráter patrimonial. 4. A aptidão da moeda para o cumprimento dessas funções decorre da circunstância de ser ela tocada pelos atributos do curso legal e do curso forçado. 5. A exclusividade de circulação da moeda está relacionada ao curso legal, que respeita ao instrumento monetário enquanto em circulação; não decorre do curso forçado, dado que este atinge o instrumento monetário enquanto valor e a sua instituição [do curso forçado] importa apenas em que não possa ser exigida do poder emissor sua conversão em outro valor. 6. A cobrança de contribuição previdenciária sobre o valor pago, em dinheiro, a título de vales-transporte, pelo recorrente aos seus empregados afronta a Constituição , sim, em sua totalidade normativa. Recurso Extraordinário a que se dá provimento.
AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. INGRESSO FORÇADO NA RESIDÊNCIA A PARTIR DE DENÚNCIA ANÔNIMA. POSSÍVEL ILEGALIDADE. PRISÃO PREVENTIVA. TRÁFICO DE DROGAS ILÍCITAS. QUANTIDADE DE SUBSTÂNCIAS APREENDIDAS COMO ÚNICO ELEMENTO ADOTADO PARA AFERIR O PERICULUM LIBERTATIS. INIDONEIDADE. AGRAVO REGIMENTAL DO MPF NÃO PROVIDO. 1. Conforme registrado na decisão ora impugnada, que nesta oportunidade se confirma, estava configurada a ilegalidade flagrante que autoriza a excepcional cognição de ofício da matéria posta nestes autos. 2. Consta que policiais ingressaram na residência do ora paciente depois de receberem denúncia anônima de que ali haveria drogas ilícitas; e constatarem que uma pessoa teria entrado correndo na casa depois de avistar a viatura. 3. Não se extrai informação de outros indícios de traficância além da denúncia anônima ou anteriores à apreensão das drogas, nem de que a entrada no imóvel tenha acontecido sob a égide de mandado judicial. 4. Em casos análogos, esta Corte tem declarado ilícitas as provas derivadas da prisão em flagrante, registrando expressamente que a denúncia anônima e o fato de alguém "correr depois de avistar policiais" não configura justa causa para a violação de domicílio, à míngua de fundadas razões para a convicção de que esteja em curso algum delito. 5. Isso porque a sabida permanência do delito de tráfico de drogas ilícitas, cuja execução se protrai no tempo, não torna justo o ingresso forçado no domicílio fora das hipóteses registradas no art. 5º , XI , da CF/88 : a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial. 6. Ainda que assim não fosse, o único indício de periculum libertatis apontado pelas instâncias ordinárias foi a quantidade de substâncias apreendidas. 7. Na esteira de incontáveis precedentes desta Corte, a prisão cautelar é invariavelmente excepcional, subordinando-se à demonstração de sua criteriosa imprescindibilidade, à luz dos fatos concretos da causa, e não em relação à percepção do julgador a respeito da gravidade abstrata do tipo penal. 8. Desse modo, o cometimento do delito, por si só, não evidencia "periculosidade" exacerbada do agente ou "abalo da ordem pública", a demandar a sua segregação antes de qualquer condenação definitiva. 9. Sobre o reflexo da quantidade de substâncias apreendidas na prisão preventiva, colhem-se diversos julgados, de ambas as turmas especializadas em Direito Penal, dos quais se depreende que determinadas porções de tóxicos ilegais, ainda que não possam ser consideradas insignificantes, não autorizam, isoladamente, a conclusão de que o réu apresenta periculum libertatis. 10. A rigor, a quantidade de drogas ilícitas, por si só, não inviabiliza sequer a configuração do tráfico privilegiado, aquele em que, segundo a dicção legal, não há dedicação a atividades criminosas. 11. Com efeito, não há notícia de vínculo com organização criminosa nos autos, tratando-se ainda de réu primário, menor de 21 anos e com carteira de trabalho assinada, tudo a evidenciar a desproporcionalidade do cárcere. 12. Por fim, a teor do art. 8º, § 1º, I, c, e mais explicitamente do art. 4º, I, c, ambos da Recomendação/CNJ n. 62, de 17/3/2020 - a qual foi editada em resposta à pandemia do covid-19 -, o reconhecimento de que o suposto crime em tela não envolve violência ou grave ameaça, associado ao fato de que a prisão processual dura mais de 90 dias, reforça a necessidade de relaxamento desta custódia cautelar. 13. Agravo regimental não provido.
REEXAME NECESSÁRIO E APELAÇÕES CÍVEIS EM AÇÃO DE COBRANÇA. SERVIDORA PÚBLICA. PRELIMINAR: AUSÊNCIA DO INTERESSE DE AGIR. INEXISTÊNCIA DE INSTÂNCIA ADMINISTRATIVA DE CURSO FORÇADO. REJEITADA. MÉRITO: ADICIONAL POR TEMPO DE SERVIÇO ("ANUÊNIOS"). AUTOAPLICABILIDADE DA NORMA LOCAL INSTITUIDORA DE TAL VANTAGEM. REQUISITOS LEGAIS ATENDIDOS. PAGAMENTO DEVIDO. PRECEDENTES DESTE TRIBUNAL. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. CONDENAÇÃO ILÍQUIDA. FIXAÇÃO SOMENTE NA FASE DE LIQUIDAÇÃO. RECURSOS CONHECIDOS E DESPROVIDOS. SENTENÇA REFORMADA EM PARTE, TÃO SOMENTE NO QUE SE REFERE À VERBA SUCUMBENCIAL. 1. Trata o caso de reexame necessário e apelações cíveis buscando a reforma de sentença proferida pelo Juízo da Vara Única da Comarca de Varjota que decidiu pela parcial procedência de ação de cobrança movida por servidora pública. - Preliminar: 2. Afasto a alegativa de ausência de interesse de agir, uma vez que, como sabido, em nosso ordenamento jurídico inexiste a instância administrativa de curso forçado, de maneira que nada impede que a alegada violação de um direito seja submetida diretamente à apreciação do Poder Judiciário, independentemente de prévio requerimento administrativo neste sentido (art. 5º , inciso XXXV da CF/88 ). - Mérito: 3. O Superior Tribunal de Justiça é firme no entendimento de ser devida a conversão em pecúnia da licença-prêmio não gozada, quando da aposentadoria do servidor, sob pena de indevido locupletamento por parte da Administração Pública. Precedentes do STJ e desta Corte de Justiça que, recentemente, editou o enunciado sumular 51, segundo o qual "é devida ao servidor público aposentado a conversão em pecúnia da licença-prêmio não gozada, sob pena de enriquecimento ilícito do Poder Público". 4. In casu, constata-se pela inicial e pelo requerimento administrativo que a autora da demanda ainda se encontra em atividade, vinculada à administração municipal de Varjota, razão pela qual não possui direito à conversão pleiteada. 5. Já no que se refere ao adicional por tempo de serviço (anuênio), a Lei nº 162/1997, em seu art. 68, assegurava aos servidores públicos do Município de Varjota o direito ao recebimento de tal vantagem, à razão de 1% (um por cento) para cada ano efetivamente trabalhado. 6. Importante destacar que tal dispositivo legal era autoaplicável, isto é, prescindia de regulamentação por outro ato normativo para produzir efeitos, e estabelecia como único requisito para a concessão de tal vantagem o efetivo exercício no serviço público pelo prazo de 01 (um) ano. 7. Com base nisso, é possível se inferir dos autos que, até a revogação do art. 68 da Lei nº 162/1997, a autora exerceu seu cargo público por mais de 14 (quatorze) anos consecutivos, sem, entretanto, nada perceber relativamente aos anuênios que lhe seriam devidos neste interregno. Incumbia, assim, ao Município demonstrar a existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito vindicado ( CPC , art. 373 , II ), o que não ocorreu. 8. Permanecem, portanto, inabalados os fundamentos da decisão a quo no tocante à condenação do Município de Varjota à implementação e ao pagamento em favor da servidora pública da parcela referente ao adicional por tempo de serviço, observada a prescrição quinquenal. 9. Merece, contudo, ser reformada a sentença em parte, apenas para excluir da condenação o percentual arbitrado a título de honorários advocatícios, o qual deverá ser definido somente a posteriori, na fase de liquidação, a teor do que preconiza o art. 85 , § 4º , inciso II do CPC . - Precedentes. - Reexame necessário conhecido. - Apelações conhecidas e desprovidas. - Sentença reformada em parte, apenas no que se refere à verba honorária sucumbencial. ACORDÃO Vistos, relatados e discutidos os presentes autos de Reexame Necessário e Apelações Cíveis nº 0000805-26.2018.8.06.0180, em que figuram as partes acima indicadas. Acorda a 3ª Câmara de Direito Público do egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, por unanimidade, em conhecer do reexame necessário e das apelações interpostas, para afastar a preliminar suscitada e, no mérito, negar provimento a estas últimas, reformando em parte a sentença proferida pelo magistrado de primeiro grau, apenas no que se refere aos honorários advocatícios sucumbenciais, nos termos do voto da Relatora. Fortaleza, 06 de dezembro de 2021. DESEMBARGADORA MARIA IRACEMA MARTINS DO VALE Relatora
REEXAME NECESSÁRIO E APELAÇÕES CÍVEIS EM AÇÃO DE COBRANÇA. SERVIDORA PÚBLICA. PRELIMINAR: AUSÊNCIA DO INTERESSE DE AGIR. INEXISTÊNCIA DE INSTÂNCIA ADMINISTRATIVA DE CURSO FORÇADO. REJEITADA. MÉRITO: ADICIONAL POR TEMPO DE SERVIÇO ("ANUÊNIOS"). AUTOAPLICABILIDADE DA NORMA LOCAL INSTITUIDORA DE TAL VANTAGEM. REQUISITOS LEGAIS ATENDIDOS. PAGAMENTO DEVIDO. LICENÇA-PRÊMIO. SERVIDOR DA ATIVA. IMPOSSIBILIDADE DE CONVERSÃO EM PECÚNIA. PRECEDENTES DESTE TRIBUNAL. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. CONDENAÇÃO ILÍQUIDA. FIXAÇÃO SOMENTE NA FASE DE LIQUIDAÇÃO. RECURSOS CONHECIDOS E DESPROVIDOS. SENTENÇA REFORMADA EM PARTE, TÃO SOMENTE NO QUE SE REFERE À VERBA SUCUMBENCIAL. 1. Trata o caso de reexame necessário e apelações cíveis buscando reformar sentença proferida pelo Juízo da Vara Única da Comarca de Varjota que decidiu pela parcial procedência de ação de cobrança movida por servidora pública. - Preliminar: 2. Deve ser afastada a alegativa de ausência de interesse de agir, uma vez que, como sabido, em nosso ordenamento jurídico inexiste a instância administrativa de curso forçado, de maneira que nada impede que a alegada violação de um direito seja submetida diretamente à apreciação do Poder Judiciário, independentemente de prévio requerimento administrativo neste sentido (art. 5º, inciso XXXV da CF/88). - Mérito: 3. O Superior Tribunal de Justiça é firme no entendimento de ser devida a conversão em pecúnia da licença-prêmio não gozada, quando da aposentadoria do servidor, sob pena de indevido locupletamento por parte da Administração Pública. Precedentes do STJ e desta Corte de Justiça que, recentemente, editou o enunciado sumular 51, segundo o qual "é devida ao servidor público aposentado a conversão em pecúnia da licença-prêmio não gozada, sob pena de enriquecimento ilícito do Poder Público". 4. In casu, constata-se pela inicial e pelo requerimento administrativo que a autora da demanda ainda se encontra em atividade, vinculada à administração municipal de Varjota, razão pela qual não possui direito à conversão pleiteada. 5. Já no que se refere ao adicional por tempo de serviço (anuênio), a Lei nº 162/1997, em seu art. 68, assegurava aos servidores públicos do Município de Varjota o direito ao recebimento de tal vantagem, à razão de 1% (um por cento) para cada ano efetivamente trabalhado. 6. Importante destacar que tal dispositivo legal era autoaplicável, isto é, prescindia de regulamentação por outro ato normativo para produzir efeitos, e estabelecia como único requisito para a concessão de tal vantagem o efetivo exercício no serviço público pelo prazo de 01 (um) ano. 7. Com base nisso, é possível se inferir dos autos que, até a revogação do art. 68 da Lei nº 162/1997, a autora exerceu seu cargo público por mais de 10 (dez) anos consecutivos, sem, entretanto, nada perceber relativamente aos anuênios que lhe seriam devidos neste interregno. Incumbia, assim, ao Município demonstrar a existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito vindicado (CPC, art. 373, II), o que não ocorreu. 8. Permanecem, portanto, inabalados os fundamentos da decisão a quo no tocante à condenação do Município de Varjota à implementação e ao pagamento em favor da servidora pública da parcela referente ao adicional por tempo de serviço, observada a prescrição quinquenal. 9. Merece, contudo, ser reformada a sentença em parte, apenas para excluir da condenação o percentual arbitrado a título de honorários advocatícios, o qual deverá ser definido somente a posteriori, na fase de liquidação, a teor do que preconiza o art. 85, § 4º, inciso II, do CPC. - Precedentes. - Reexame necessário conhecido. - Apelações conhecidas e desprovidas. - Sentença reformada em parte, apenas no que se refere à verba honorária sucumbencial. ACORDÃO Vistos, relatados e discutidos os presentes autos de Reexame Necessário e Apelações Cíveis nº 0000791-42.2018.8.06.0180, em que figuram as partes acima indicadas. Acorda a 3ª Câmara de Direito Público do egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, por unanimidade, em conhecer do reexame necessário e das apelações interpostas, para afastar a preliminar suscitada e, no mérito, negar provimento a estas últimas, reformando em parte a sentença proferida pelo magistrado de primeiro grau, apenas no que se refere aos honorários advocatícios sucumbenciais, nos termos do voto da Relatora. Fortaleza, 9 de maio de 2022. DESEMBARGADORA MARIA IRACEMA MARTINS DO VALE Relatora
HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS, PORTE DE ARMA DE FOGO DE USO PERMITIDO E FALSA IDENTIDADE. FLAGRANTE. DOMICÍLIO COMO EXPRESSÃO DO DIREITO À INTIMIDADE. ASILO INVIOLÁVEL. EXCEÇÕES CONSTITUCIONAIS. INTERPRETAÇÃO RESTRITIVA. AUSÊNCIA DE FUNDADAS RAZÕES. DESVIO DE FINALIDADE E FISHING EXPEDITION. AUSÊNCIA DE CONSENTIMENTO VÁLIDO DO MORADOR. NULIDADE DAS PROVAS OBTIDAS. TEORIA DOS FRUTOS DA ÁRVORE ENVENENADA. ABSOLVIÇÃO. ORDEM PARCIALMENTE CONCEDIDA. 1. O art. 5º, XI, da Constituição Federal consagrou o direito fundamental à inviolabilidade do domicílio, ao dispor que a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial. 2. O Supremo Tribunal Federal definiu, em repercussão geral (Tema 280), que o ingresso forçado em domicílio sem mandado judicial apenas se revela legítimo - a qualquer hora do dia, inclusive durante o período noturno - quando amparado em fundadas razões, devidamente justificadas pelas circunstâncias do caso concreto, que indiquem estar ocorrendo, no interior da casa, situação de flagrante delito. 3. Por ocasião do julgamento do HC n. 598.051/SP (Rel. Ministro Rogerio Schietti), a Sexta Turma desta Corte Superior de Justiça, à unanimidade, propôs nova e criteriosa abordagem sobre o controle do alegado consentimento do morador para o ingresso em seu domicílio por agentes estatais. Na ocasião, foram apresentadas as seguintes conclusões: a) Na hipótese de suspeita de crime em flagrante, exige-se, em termos de standard probatório para ingresso no domicílio do suspeito sem mandado judicial, a existência de fundadas razões (justa causa), aferidas de modo objetivo e devidamente justificadas, de maneira a indicar que dentro da casa ocorre situação de flagrante delito; b) O tráfico ilícito de entorpecentes, em que pese ser classificado como crime de natureza permanente, nem sempre autoriza a entrada sem mandado no domicílio onde supostamente se encontra a droga. Apenas será permitido o ingresso em situações de urgência, quando se concluir que do atraso decorrente da obtenção de mandado judicial se possa objetiva e concretamente inferir que a prova do crime (ou a própria droga) será destruída ou ocultada; c) O consentimento do morador, para validar o ingresso de agentes estatais em sua casa e a busca e apreensão de objetos relacionados ao crime, precisa ser voluntário e livre de qualquer tipo de constrangimento ou coação; d) A prova da legalidade e da voluntariedade do consentimento para o ingresso na residência do suspeito incumbe, em caso de dúvida, ao Estado, e deve ser feita com declaração assinada pela pessoa que autorizou o ingresso domiciliar, indicando-se, sempre que possível, testemunhas do ato. Em todo caso, a operação deve ser registrada em áudio-vídeo e preservada tal prova enquanto durar o processo; e) A violação a essas regras e condições legais e constitucionais para o ingresso no domicílio alheio resulta na ilicitude das provas obtidas em decorrência da medida, bem como das demais provas que dela decorrerem em relação de causalidade, sem prejuízo de eventual responsabilização penal do(s) agente(s) público(s) que tenha(m) realizado a diligência. 4. Sobre a gravação audiovisual, o plenário do Supremo Tribunal Federal, em recente julgamento dos Embargos de Declaração na Medida Cautelar da ADPF n. 635 ("ADPF das Favelas"), reconheceu a imprescindibilidade de tal forma de monitoração da atividade policial e determinou, entre outros, que "o Estado do Rio de Janeiro, no prazo máximo de 180 (cento e oitenta) dias, instale equipamentos de GPS e sistemas de gravação de áudio e vídeo nas viaturas policiais e nas fardas dos agentes de segurança, com o posterior armazenamento digital dos respectivos arquivos". 5. Por se tratar de medida invasiva e que restringe sobremaneira o direito fundamental à intimidade, o ingresso em morada alheia deve se circunscrever apenas ao estritamente necessário para cumprir a finalidade da diligência, conforme se extrai da exegese do art. 248 do CPP, segundo o qual, "Em casa habitada, a busca será feita de modo que não moleste os moradores mais do que o indispensável para o êxito da diligência". 6. É ilícita a prova colhida em caso de desvio de finalidade após o ingresso em domicílio, seja no cumprimento de mandado de prisão ou de busca e apreensão expedido pelo Poder Judiciário, seja na hipótese de ingresso sem prévia autorização judicial, como ocorre em situação de flagrante delito. O agente responsável pela diligência deve sempre se ater aos limites do escopo - vinculado à justa causa - para o qual excepcionalmente se restringiu o direito fundamental à intimidade, ressalvada a possibilidade de encontro fortuito de provas. 7. Admitir a entrada na residência especificamente para efetuar uma prisão não significa conceder um salvo-conduto para que todo o seu interior seja vasculhado indistintamente, em verdadeira pescaria probatória (fishing expedition), sob pena de nulidade das provas colhidas por desvio de finalidade. 8. Segundo Alexandre Morais da Rosa, "Fishing Expedition ou Pescaria Probatória é a procura especulativa, no ambiente físico ou digital, sem 'causa provável', alvo definido, finalidade tangível ou para além dos limites autorizados (desvio de finalidade), de elementos capazes de atribuir responsabilidade penal a alguém. [É] a prática relativamente comum de se aproveitar dos espaços de exercício de poder para subverter a lógica das garantias constitucionais, vasculhando-se a intimidade, a vida privada, enfim, violando-se direitos fundamentais, para além dos limites legais. O termo se refere à incerteza própria das expedições de pesca, em que não se sabe, antecipadamente, se haverá peixe, nem os espécimes que podem ser fisgados, muito menos a quantidade" (ROSA, Alexandre Morais da, Guia do Processo Penal Estratégico: de acordo com a Teoria dos Jogos, 1ª ed., Santa Catarina: Emais, 2021, p. 389-390). 9. Sobre o desvio de finalidade no Direito Administrativo, Celso Antonio Bandeira de Mello ensina: "Em rigor, o princípio da finalidade não é uma decorrência do princípio da legalidade. É mais que isto: é uma inerência dele; está nele contido, pois corresponde à aplicação da lei tal qual é; ou seja, na conformidade de sua razão de ser, do objetivo em vista do qual foi editada. Por isso se pode dizer que tomar uma lei como suporte para a prática de ato desconforme com sua finalidade não é aplicar a lei; é desvirtuá-la; é burlar a lei sob pretexto de cumpri-la. Daí por que os atos incursos neste vício denominado 'desvio de poder' ou 'desvio de finalidade' são nulos. Quem desatende ao fim legal desatende à própria lei" (BANDEIRA DE MELLO, Celso Antonio, Curso de Direito Administrativo, 27 ed., São Paulo: Malheiros, 2010, p. 106). 10. No caso dos autos, o ingresso em domicílio foi amparado na possível prática de crime de falsa identidade, na existência de mandado de prisão e na suposta autorização da esposa do acusado para a realização das buscas. 10.1 O primeiro fundamento - crime de falsa identidade - não justificava a entrada na casa do réu, porque, no momento em que ingressaram no lar, os militares ainda não sabiam que o acusado havia fornecido anteriormente à guarnição os dados pessoais do seu irmão, o que somente depois veio a ser constatado. Não existia, portanto, situação fática, conhecida pelos policiais, a legitimar o ingresso domiciliar para efetuar-se a prisão do paciente por flagrante do crime de falsa identidade, porquanto nem sequer tinham os agentes públicos conhecimento da ocorrência de tal delito na ocasião. 10.2 No tocante ao segundo fundamento, releva notar que, além de não haver sido seguido o procedimento legal previsto no art. 293 do CPP, não se sabia - com segurança - se o réu estava na casa, visto que não fugiu da guarnição para dentro do imóvel com acompanhamento imediato em seu encalço; na verdade, o acusado tomou rumo ignorado, com notícia de que provavelmente estaria escondido dentro do cemitério, mas os agentes foram até a residência dele "colher mais informações". 10.3 Mesmo se admitida a possibilidade de ingresso no domicílio para captura do acusado - em cumprimento ao mandado de prisão ou até por eventual flagrante do crime de falsa identidade -, a partir das premissas teóricas acima fundadas, nota-se, com clareza, a ocorrência de desvirtuamento da finalidade no cumprimento do ato. Isso porque os objetos ilícitos (drogas e uma munição calibre .32) foram apreendidos no chão de um dos quartos, dentro de uma caixa de papelão, a evidenciar que não houve mero encontro fortuito enquanto se procurava pelo réu - certamente portador de dimensões físicas muito superiores às do referido recipiente -, mas sim verdadeira pescaria probatória dentro do lar, totalmente desvinculada da finalidade de apenas capturar o paciente. 10.4 Por fim, quanto ao último fundamento, as regras de experiência e o senso comum, somados às peculiaridades do caso concreto, não conferem verossimilhança à afirmação dos agentes policiais de que a esposa do paciente - adolescente de apenas 16 anos de idade - teria autorizado, livre e voluntariamente, o ingresso no domicílio do casal, franqueando àqueles a apreensão de drogas e, consequentemente, a formação de prova incriminatória em desfavor de seu cônjuge. Ademais, não se demonstrou preocupação em documentar esse suposto consentimento, quer por escrito, quer por testemunhas, quer, ainda e especialmente, por registro de áudio-vídeo. 10.5 A descoberta a posteriori de uma situação de flagrante decorreu de ingresso ilícito na moradia do acusado, em violação da norma constitucional que consagra direito fundamental à inviolabilidade do domicílio, o que torna imprestável, no caso concreto, a prova ilicitamente obtida e, por conseguinte, todos os atos dela derivados, porque decorrentes diretamente dessa diligência policial. É preciso ressalvar, contudo, que a condenação pelo crime do art. 307 do CP (falsa identidade) não é atingida pela declaração de ilicitude das provas colhidas a partir da invasão de domicílio, eis que a prática do delito, ao que consta, foi anterior ao ingresso dos agentes no lar do acusado. 11. Ordem parcialmente concedida para reconhecer a ilicitude das provas obtidas a partir da violação do domicílio do acusado, bem como de todas as que delas decorreram, e, por conseguinte, absolvê-lo das imputações relativas aos crimes do art. 33, caput , da Lei n. 11.343/2006 e 14 da Lei n. 10.826/2003.
PRESENÇA DE JUSTA CAUSA PARA O INGRESSO FORÇADO. INVESTIGAÇÃO EM CURSO PARA DEBELAR TRÁFICO DE DROGAS NA REGIÃO....PRESENÇA DE JUSTA CAUSA PARA O INGRESSO FORÇADO. INVESTIGAÇÃO EM CURSO PARA DEBELAR TRÁFICO DE DROGAS NA REGIÃO....Os elementos constantes nos autos demonstram, em verdade, não existirem indicações de constrangimento legal perpetrado em desfavor do paciente. Ante o exposto, nego provimento ao agravo regimental.
Muito embora o flagrante delito legitime o ingresso forçado em casa sem determinação judicial, a medida deve ser controlada judicialmente....Normas internacionais de caráter judicial que se incorporam à cláusula do devido processo legal. 5. Justa causa....AÇÕES PENAIS EM CURSO. FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO. I - A Terceira Seção desta Corte, seguindo entendimento firmado pela Primeira Turma do col.
Muito embora o flagrante delito legitime o ingresso forçado em casa sem determinação judicial, a medida deve ser controlada judicialmente....Normas internacionais de caráter judicial que se incorporam à cláusula do devido processo legal. 5. Justa causa....AÇÕES PENAIS EM CURSO. FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO. I - A Terceira Seção desta Corte, seguindo entendimento firmado pela Primeira Turma do col.
Muito embora o flagrante delito legitime o ingresso forçado em casa sem determinação judicial, a medida deve ser controlada judicialmente....Normas internacionais de caráter judicial que se incorporam à cláusula do devido processo legal. 5. Justa causa....AÇÕES PENAIS EM CURSO. FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO. I - A Terceira Seção desta Corte, seguindo entendimento firmado pela Primeira Turma do col.
Muito embora o flagrante delito legitime o ingresso forçado em casa sem determinação judicial, a medida deve ser controlada judicialmente....Normas internacionais de caráter judicial que se incorporam à cláusula do devido processo legal. 5. Justa causa....AÇÕES PENAIS EM CURSO. FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO. I - A Terceira Seção desta Corte, seguindo entendimento firmado pela Primeira Turma do col.