PROCESSO Nº: XXXXX-61.2018.4.05.8100 - APELAÇÃO CÍVEL APELANTE: JANAINA GONCALVES DE GOIS FERREIRA e outro ADVOGADO: Janaina Goncalves De Gois Ferreira APELADO: CAIXA ECONOMICA FEDERAL - CEF e outro ADVOGADO: Janaina Goncalves De Gois Ferreira RELATOR (A): Desembargador (a) Federal Leonardo Carvalho - 2ª Turma JUIZ PROLATOR DA SENTENÇA (1º GRAU): Juiz (a) Federal Alcides Saldanha Lima EMENTA: CIVIL. CONTRATOS BANCÁRIOS. AÇÃO REVISIONAL. CAPITALIZAÇÃO DE JUROS MENSAL. AUSÊNCIA DE PREVISÃO CONTRATUAL. CDC . APLICABILIDADE. DEPÓSITO DOS VALORES INCONTROVERSOS. 1. Apelações interpostas contra sentença que julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados no bojo de ação revisional, para condenar a CEF na obrigação de afastar a cobrança de capitalização mensal de juros do contrato e a devolver a diferença dos valores pagos e incluídos nas prestações mensais desde a sua incidência, devidamente corrigido pela TR, a ser apurado em liquidação de sentença. (Valor da causa - R$ R$ 184.000,00). Honorários advocatícios fixados em 10% (dez por cento) do valor atribuído à causa, nos termos da norma do § 2º do art. 85 do CPC/2015 , sob condição suspensiva de exigibilidade ( § 3º do art. 98 do CPC/2015 ). 2. JANAINA GONCALVES DE GOIS FERREIRA alega que, inobstante alguns atrasos pontuais, sempre quitou as parcelas do financiamento. Contudo, após o pagamento da 60ª parcela, ou seja, após pagar mais de R$ 100.000,00 (cem mil reais), verificou que o saldo devedor reduziu apenas R$ 10.000,00 (dez mil reais). Afirma que apesar de reconhecer a capitalização mensal indevida, a sentença não afastou a mora no pagamento. Afirma que vem depositando os valores das prestações em conta aberta na CEF à disposição do Juízo. Pede que seja determinada a inversão do ônus da prova, a proibição de inscrição em cadastros restritivos ou de qualquer ato de execução extrajudicial. Pede a concessão da tutela antecipada a fim de; a) permitir o depósito os valores incontroversos das parcelas do financiamento habitacional; b) obstar qualquer procedimento de execução extrajudicial do débito, enquanto tramitar a presente ação revisional, e c) a proibição de inclusão de seu nome no SPC, SERASA e CADIN. 3. A CEF, por sua vez, assevera que não procede a alegação de cobrança de juros de forma capitalizada. Defende a inépcia da inicial, aduz que a apelada depositou os valores incontroversos sem que houvesse decisão judicial neste sentido. Sustenta que aplica o sistema SAC previsto no contrato e que não há anatocismo na espécie. Defende a força vinculante dos contratos, refuta a aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor ( CDC ) e a inversão do ônus da prova. 4. De plano, rejeita-se a alegação de inépcia da inicial, visto que na peça atrial a autora descreve e especifica claramente os pontos do contrato contra os quais demonstra irresignação (capitalização mensal de juros, onerosidade excessiva das parcelas, etc..), quantifica o valor incontroverso, e apresenta o pedido, preenchendo as exigências previstas no art. 330 , parágrafo 2º do CPC . 5. É tranquila a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, inclusive sumulada no enunciado 297, de que o CDC se aplica às instituições financeiras. 6. Quanto à inversão do ônus da prova, o juiz pode determinar sempre que achar necessário, diante da necessidade de produção da prova e da hipossuficiência do consumidor. Ocorre que as provas trazidas aos autos são suficientes para apreciação da matéria, exclusivamente de direito, mostrando-se desarrazoada a discussão. Ademais, o ônus probatório sequer foi abordado na sentença. 7. O presente feito versa sobre revisão contratual de financiamento imobiliário com a utilização do Sistema de Amortização - SAC, modelo que é incompatível com o anatocismo, dado que, por ele, o valor de cada prestação mensal resulta da soma da amortização do valor financiado, mais os juros que tenham sido pactuados, de forma que os acréscimos são pagos mensalmente, jamais se incorporando ao principal. 8. O Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp XXXXX/PR , sob a égide dos recursos repetitivos, sedimentou o entendimento de que "nos contratos de mútuo bancário, celebrados após a edição da MP XXXXX-17/00 (reeditada sob o nº 2.170-36/01), admite-se a capitalização mensal de juros, desde que expressamente pactuada". Na hipótese, o contrato firmado (nº 1.4444.0185331-7) não prevê a capitalização mensal de juros, pelo que não poderia a Caixa aplicar esse sistema. A própria Caixa confessa em seu recurso que vem aplicando juros mensais, de 0,7709175% ao mês, quando o contrato prevê que a capitalização deve ser anual, em 8,51% ao ano. 9. No que concerne às parcelas em atraso e aos depósitos em consignação, observa-se que a autora, na inicial, pediu para realizar o depósito em juízo dos valores incontroversos e de R$ 6.152,16 (seis mil, cento e cinquenta e dois reais e dezesseis centavos), montante referente aos valores da 66ª à 69ª parcelas. Tal requerimento foi apenas apreciado por ocasião da prolação da sentença e embora não tenha havido decisão anterior neste sentido, desde o início a apelante vem acostando aos autos as guias com os valores depositados na CEF em conta à disposição do Juízo. 10. Com a edição da Lei nº 10.931 /2004, (§§ 1º e 2º do seu art. 50), para concessão da tutela antecipada nas demandas concernentes à empréstimo, financiamento ou alienação imobiliária, a parte tem que continuar pagando o valor incontroverso, sendo certo que a suspensão da exigibilidade da dívida controvertida está condicionada ao depósito do respectivo montante, nos termos em que contratado. 11. Contudo, a mesma legislação estabelece que o juízo poderá dispensar o depósito do valor controvertido, nos termos do § 4º, quando presente "relevante razão de direito e risco de dano irreparável ao autor, por decisão fundamentada na qual serão detalhadas as razões jurídicas e fáticas da ilegitimidade da cobrança no caso concreto". 12. No caso, observa-se que a apelante depositou o valor das parcelas em atraso (66ª à 69ª parcelas) e vem depositando as parcelas mensais em valores muito próximos aos constantes da planilha apresentada pela CEF antes do expurgo dos juros capitalizados. Além disso, restou configurada a cobrança ilícita de juros capitalizados mensais por parte da CEF. Se for indeferido o depósito neste momento, serão cobrados multa e juros sobre todo o período, que talvez até superem o montante que será estornado em virtude da cobrança indevida dos juros capitalizados, o que resultará, na prática, na ineficácia do provimento que reconhece a ilicitude da cobrança. Apenas não se faz cabível a concessão da tutela de urgência, nesse momento processual. 13. Descabe majoração dos honorários recursais, visto que não foi fixada verba sucumbencial em desfavor da CEF na origem 14. Apelação da CEF improvida. Apelação da autora parcialmente provida, apenas para reconhecer que devem ser considerados os depósitos judiciais para o pagamento do débito. [6] EMENTA: CIVIL. CONTRATOS BANCÁRIOS. AÇÃO REVISIONAL. CAPITALIZAÇÃO DE JUROS MENSAL. AUSÊNCIA DE PREVISÃO CONTRATUAL. CDC . APLICABILIDADE. DEPÓSITO DOS VALORES INCONTROVERSOS. 1. Apelações interpostas contra sentença que julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados no bojo de ação revisional, para condenar a CEF na obrigação de afastar a cobrança de capitalização mensal de juros do contrato e a devolver a diferença dos valores pagos e incluídos nas prestações mensais desde a sua incidência, devidamente corrigido pela TR, a ser apurado em liquidação de sentença. (Valor da causa - R$ R$ 184.000,00). Honorários advocatícios fixados em 10% (dez por cento) do valor atribuído à causa, nos termos da norma do § 2º do art. 85 do CPC/2015 , sob condição suspensiva de exigibilidade ( § 3º do art. 98 do CPC/2015 ). 2. JANAINA GONCALVES DE GOIS FERREIRA alega que, inobstante alguns atrasos pontuais, sempre quitou as parcelas do financiamento. Contudo, após o pagamento da 60ª parcela, ou seja, após pagar mais de R$ 100.000,00 (cem mil reais), verificou que o saldo devedor reduziu apenas R$ 10.000,00 (dez mil reais). Afirma que apesar de reconhecer a capitalização mensal indevida, a sentença não afastou a mora no pagamento. Afirma que vem depositando os valores das prestações em conta aberta na CEF à disposição do Juízo. Pede que seja determinada a inversão do ônus da prova, a proibição de inscrição em cadastros restritivos ou de qualquer ato de execução extrajudicial. Pede a concessão da tutela antecipada a fim de; a) permitir o depósito os valores incontroversos das parcelas do financiamento habitacional ; b) obstar qualquer procedimento de execução extrajudicial do débito, enquanto tramitar a presente ação revisional, e c) a proibição de inclusão de seu nome no SPC, SERASA e CADIN. 3. A CEF, por sua vez, assevera que não procede a alegação de cobrança de juros de forma capitalizada. Defende a inépcia da inicial, aduz que a apelada depositou os valores incontroversos sem que houvesse decisão judicial neste sentido. Sustenta que aplica o sistema SAC previsto no contrato e que não há anatocismo na espécie. Defende a força vinculante dos contratos, refuta a aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor ( CDC ) e a inversão do ônus da prova. 4. De plano, rejeita-se a alegação de inépcia da inicial, visto que na peça atrial a autora descreve e especifica claramente os pontos do contrato contra os quais demonstra irresignação (capitalização mensal de juros, onerosidade excessiva das parcelas, etc..), quantifica o valor incontroverso, e apresenta o pedido, preenchendo as exigências previstas no art. 330 , parágrafo 2º do CPC . 5. No que atine à utilização do SAC como sistema de amortização e ao anatocismo (amortização negativa), resta ausente o interesse recursal da CEF, visto que a sentença expressamente consignou que “o sistema SAC, cuja metodologia consiste no valor regressivo das prestações, composta de parcela fixa de amortização do principal acrescida dos juros e correção do mês em sua integralidade, sem apresentar saldo residual de juros para ser incorporado ao saldo devedor, pelo que incabível a alegação de ocorrência de anatocismo.” 6. É tranquila a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, inclusive sumulada no enunciado 297, de que o CDC se aplica às instituições financeiras. 7. Quanto à inversão do ônus da prova, o juiz pode determinar sempre que achar necessário, diante da necessidade de produção da prova e da hipossuficiência do consumidor. Ocorre que as provas trazidas aos autos são suficientes para apreciação da matéria, exclusivamente de direito, mostrando-se desarrazoada a discussão. Ademais, o ônus probatório sequer foi abordado na sentença. 8. Noutro giro, o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp XXXXX/PR , sob a égide dos recursos repetitivos, sedimentou o entendimento de que "nos contratos de mútuo bancário, celebrados após a edição da MP XXXXX-17/00 (reeditada sob o nº 2.170-36/01), admite-se a capitalização mensal de juros, desde que expressamente pactuada". Na hipótese, o contrato firmado (nº 1.4444.0185331-7) não prevê a capitalização mensal de juros. 9. No que concerne às parcelas em atraso e aos depósitos em consignação, observa-se que a autora, na inicial, pediu para realizar o depósito em juízo dos valores incontroversos e de R$ 6.152,16 (seis mil, cento e cinquenta e dois reais e dezesseis centavos), montante referente aos valores da 66ª à 69ª parcelas. Tal requerimento foi apenas apreciado por ocasião da prolação da sentença e embora não tenha havido decisão anterior neste sentido, desde o início a apelante vem acostando aos autos as guias com os valores depositados na CEF em conta à disposição do Juízo. 10. Com a edição da Lei nº 10.931 /2004, (§§ 1º e 2º do seu art. 50), para concessão da tutela antecipada nas demandas concernentes à empréstimo, financiamento ou alienação imobiliária, a parte tem que continuar pagando o valor incontroverso, sendo certo que a suspensão da exigibilidade da dívida controvertida está condicionada ao depósito do respectivo montante, nos termos em que contratado. 11. Contudo, a mesma legislação estabelece que o juízo poderá dispensar o depósito do valor controvertido, nos termos do § 4º, quando presente “relevante razão de direito e risco de dano irreparável ao autor, por decisão fundamentada na qual serão detalhadas as razões jurídicas e fáticas da ilegitimidade da cobrança no caso concreto”. 12. No caso, observa-se que a apelante depositou o valor das parcelas em atraso (66ª à 69ª parcelas) e vem depositando as parcelas mensais em valores muito próximos aos constantes da planilha apresentada pela CEF antes do expurgo dos juros capitalizados. Além disso, restou configurada a cobrança ilícita de juros capitalizados mensais por parte da CEF. Se for indeferido o depósito neste momento, serão cobrados multa e juros sobre todo o período, que talvez até superem o montante que será estornado em virtude da cobrança indevida dos juros capitalizados, o que resultará, na prática, na ineficácia do provimento que reconhece a ilicitude da cobrança. 13. Também se encontra presente o risco de dano irreparável à autora, que pode vir a perder o seu imóvel neste momento de pandemia, além das restrições ao crédito que vêm lhe sendo impostas em virtude da negativação no SERASA, a justificar a concessão da tutela pretendida para: a) afastar a inscrição em cadastros de restrição ao crédito; b) deferir o depósito consignado em conta judicial, afastando-se o valor do juros mensais capitalizados, até o trânsito em julgado da sentença; c) obstar a execução extrajudicial do bem, com base em inadimplemento fundado nas parcelas depositadas. 14. Descabe majoração dos honorários recursais, visto que não foi fixada verba sucumbencial em desfavor da CEF na origem 15. Apelação da CEF improvida. Apelação da autora parcialmente provida, para deferir a antecipação de tutela nos termos da fundamentação. [6]