Tribunal de Justiça do Estado da Bahia PODER JUDICIÁRIO QUARTA TURMA RECURSAL - PROJUDI PADRE CASIMIRO QUIROGA, LT. RIO DAS PEDRAS, QD 01, SALVADOR - BA ssa-turmasrecursais@tjba.jus.br - Tel.: 71 3372-7460 Ação: Procedimento do Juizado Especial Cível Recurso nº XXXXX-91.2021.8.05.0080 Processo nº XXXXX-91.2021.8.05.0080 Recorrente (s): GERALDO DA SILVA DE MAGALHAES Recorrido (s): BANCO PAN S A VOTO-EMENTA RECURSO INOMINADO. CONSUMIDOR. INDENIZAÇÃO. DANOS MORAIS E MATERIAIS. SERVIÇOS BANCÁRIOS. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. DESCONTOS INDEVIDOS NO BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO DO AUTOR. CONSTITUIÇÃO DE EMPRÉSTIMO ATRAVÉS DE CARTÃO DE CRÉDITO. RMC. VIOLAÇÃO À INSTRUÇÃO NORMATIVA Nº 28 DO INSS. INEXISTÊNCIA DE PROVA DE UTILIZAÇÃO DO CARTÃO DE CRÉDITO PELO AUTOR. LIBERAÇÃO DE QUANTIA ATRAVÉS DE TELE SAQUE. ENDIVIDAMENTO PERPÉTUO DO CONSUMIDOR. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA TRANSPARÊNCIA DOS CONTRATOS E DA BOA FÉ OBJETIVA. MÁ PRESTAÇÃO DE SERVIÇO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA ¿ ART. 14 , DO CDC . DECLARAÇÃO DE NULIDADE DO CONTRATO OBJETO DA LIDE. RESTITUIÇÃO DOS VALORES INDEVIDAMENTE DESCONTADOS NA FORMA SIMPLES. AUTORIZAÇÃO À RÉ PARA COMPENSAÇÃO DO VALOR CREDITADO NA CONTA DA PARTE AUTORA. AUSÊNCIA DE OFENSA A DIREITOS DA PERSONALIDADE OU À DIGNIDADE HUMANA. DANOS MORAIS NÃO CONFIGURADOS. SENTENÇA REFORMADA. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. 1. Presentes os requisitos de admissibilidade do recurso, dele o conheço. 2. A sentença hostilizada julgou improcedente o pedido. 3. Alega a parte autora ter contratado junto ao banco réu empréstimo consignado, sob a informação de que seriam lançados descontos mensais em seu benefício previdenciário, conforme sistemática de pagamento de empréstimos consignados, sendo surpreendida, após a celebração do contrato, com o desconto denominado ¿RESERVA DE MARGEM DE CARTÃO DE CRÉDITO¿ em seu benefício, que se refere a débito efetuado no Cartão de Crédito Consignado, na modalidade margem consignada (RMC), independente do envio, do desbloqueio ou da utilização do cartão, sendo descontado mensalmente pelo valor mínimo da fatura do cartão de crédito ou o limite da reserva da margem consignável. 4. A ré, por sua vez, defende a regularidade da contratação, com a aquiescência da parte autora quanto aos termos e condições de utilização do cartão, tendo a parte acionante realizado um saque, cuja quantia foi creditada na conta de titularidade da parte autora mediante transferência eletrônica. 5. O magistrado de origem julgou improcedentes os pedidos constantes na inicial, considerando que a contratação se deu de maneira lícita dentro da normatização exigida para empréstimo RMC. 6. Da análise dos autos, verifica-se não se tratar de hipótese de empréstimo contratado de forma fraudulenta, haja vista que o próprio demandante reconhece ter contratado empréstimo consignado com desconto das parcelas em seu benefício previdenciário, havendo, contudo, a contratação de empréstimo vinculado a cartão de crédito, o qual a parte autora jamais possuiu, desbloqueou ou utilizou. 7. Nesse sentido, nota-se que o cartão de crédito em questão nunca foi utilizado pela parte autora para compras, tendo sido disponibilizado saque no valor contratado (-), o que não é permitido, diante do teor do art. 16, § 3º da Instrução n. 28 do INSS. 8. Constata-se, ainda, do contrato juntado pela ré no evento 21, que embora inexista qualquer evidência de utilização do cartão de crédito pelo autor, o mesmo se viu vinculado à contratação excessivamente onerosa, tendo a ré disponibilizado o valor do empréstimo através de tele saque, não havendo informação clara e expressa de que o empréstimo estava vinculado a cartão de crédito, operação financeira manifestamente desvantajosa e prejudicial à parte autora. 9. Cumpre destacar ademais que não há indicação do custo efetivo, com e sem a incidência de juros, não constando também o número e valor das parcelas, data de início e de término das prestações a serem pagas em decorrência do empréstimo, em evidente violação aos termos expressos da Instrução Normativa n. 28 do INSS. 10. Destaque-se que este tipo de prática comercial enseja evidente prejuízo ao consumidor, e endividamento, algumas vezes, perpétuo, pois suscetível de gerar parcelas infindáveis e pagamentos que ultrapassam facilmente quatro, cinco vezes o valor inicialmente contratado no empréstimo, causando vantagem excessiva ao Banco e situação extremamente desvantajosa ao consumidor. 11. A conduta da acionada, realizada ao arrepio da Lei 10.820 /03 que disciplina a matéria afigura-se ilegal, além de haver ofendido expressamente o CDC , art. 39 , III . 12. A abusividade da conduta da ré mostra-se inequívoca e deve ser duramente reprimida em face da hipossuficiência acentuada da parte autora. A posição de extrema vantagem da ré na relação contratual entabulada mostra-se excessiva e desproporcional. 13. Em se tratando de contratação tão onerosa para o contratante, a cientificação do consumidor sobre os encargos, número de prestações, e demais cláusulas contratuais, constitui obrigação indisponível. 14. No que tange à restituição dos valores descontados indevidamente, a QUARTA TURMA entendia que o mesmo devia ocorrer na forma dobrada, consoante estabelece o art. 42 , parágrafo único , CDC , contudo, revendo entendimento, fixou-se que a devolução deva ocorrer da forma simples. 15. No entanto, uma vez que o autor narra na inicial que efetivamente efetuou o contrato de empréstimo, contestando apenas a forma de contratação, autorizo que a acionada deduza o valor efetivamente creditado na conta da parte autora, quando da devolução dos valores indevidamente descontados. 16. Em relação à indenização por danos morais, entendo que, apesar dos transtornos causados à parte autora em razão dos aborrecimentos comumente existentes em situações desse jaez, estas por si só, sem outras implicações ou consequências, não acarretam dano ao patrimônio subjetivo do usuário, não podendo tal situação ser elevada à condição de dano extrapatrimonial, sob pena de banalização do instituto. 17. PROVIMENTO PARCIAL DO RECURSO, para reformar a sentença fustigada, declarando a nulidade do contrato de cartão de crédito consignado e imediata suspensão da reserva da margem consignável da parte autora, sob pena de multa diária de R$50,00, bem como condenar o réu a restituir, na forma simples, os valores indevidamente descontados do benefício da parte acionante, acrescido de correção monetária a partir do efetivo desembolso e juros de mora, na base de 1% (um por cento) ao mês a partir da citação, autorizando que a acionada deduza o valor efetivamente creditado na conta da parte autora, quando da devolução dos valores indevidamente descontados. 18. Sem condenação em custas processuais e honorários advocatícios diante da sucumbência parcial. 19. Acórdão integrativo proferido nos termos do art. 46 da Lei 9.099 /95. 20. Julgamento Realizado com fundamento no art. 4º do Ato Conjunto nº 08/2019, do E. Tribunal de Justiça da Bahia, considerando que não houve pedido de sustentação oral após inclusão em pauta no dia 05 de maio de 2022, consoante evento nº 51. ACÓRDÃO Realizado Julgamento do Recurso do processo acima epigrafado, A QUARTA TURMA, composta dos Juízes de Direito, informadas no sistema, decidiu à unanimidade, DAR PROVIMENTO PARCIAL ao recurso, reformando a sentença nos termos acima. Sem custas e honorários. Salvador, Sala das Sessões, em 21 de MARÇO de 2022. MARTHA CAVALCANTI SILVA DE OLIVEIRA Relatora Presidente