RECURSO DE EMBARGOS. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. PROVOCAÇÃO DO PODER EXECUTIVO MUNICIPAL PARA A IMPLEMENTAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS DE COMBATE AO TRABALHO INFANTIL E PROFISSIONALIZAÇÃO DE ADOLESCENTES. COMPETÊNCIA MATERIAL DA JUSTIÇA DO TRABALHO. 1 . A Eg. 1ª Turma negou provimento ao recurso de revista do Ministério Público do Trabalho. Concluiu que "não se inscreve na competência material da Justiça do Trabalho o julgamento de ação civil pública em que o MPT postula que ente federativo implemente políticas públicas relacionadas à profissionalização de adolescentes e jovens, bem como à prevenção e erradicação do trabalho infantil". 2. O "Parquet", na presente ação civil pública, formula duas linhas de pedidos contra o Município, à luz do princípio da proteção integral da criança e do direito ao não trabalho: obrigação de fazer para suprir omissão na elaboração e implementação de políticas públicas de prevenção e erradicação do trabalho infantil e de educação e profissionalização de crianças e adolescentes. 3. Na lição de Canotilho, são princípios relacionados à distribuição de competência: indisponibilidade e tipicidade (Constitucional e Teoria da Constituição. 6ª ed. Lisboa: Almedina, 2002, p. 542-543). A tipicidade, no caso da Justiça do Trabalho, está inscrita no art. 114 da CF, que , em seu inciso I , dispõe que "compete à Justiça do Trabalho processar e julgar: as ações oriundas da relação de trabalho, abrangidos os entes de direito público externo e da administração pública direta e indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios". Já o inciso IX enuncia serem de igual competência "outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho, na forma da lei". Trata-se, sem dúvida, de cláusula de abertura. Nos termos do art. 83, III, da Lei Complementar 75/93: "Compete ao Ministério Público do Trabalho o exercício das seguintes atribuições junto aos órgãos da Justiça do Trabalho: promover a ação civil pública no âmbito da Justiça do Trabalho, para defesa de interesses coletivos, quando desrespeitados os direitos sociais constitucionalmente garantidos". 4. Já é clássica a doutrina acerca da existência de poderes implícitos ("implied powers") na Constituição, entendidos como aqueles que não são expressamente mencionados na Carta, mas adequados à prossecução dos fins e tarefas constitucionalmente atribuídos aos órgãos de soberania. O enquadramento nas hipóteses dos incisos do art. 114 da CF faz-se, segundo a teoria da substanciação, pela análise da causa de pedir em cotejo com a descrição dos fatos e dos fundamentos jurídicos do pedido. 5. Se é da competência da Justiça do Trabalho coibir a prática do trabalho infantil, bem como o julgamento de ações envolvendo atos irregulares dos entes da administração pública municipal, estadual e federal, também é de sua competência o julgamento da inércia do poder público em adotar políticas públicas constitucionalmente previstas visando erradicar o trabalho infantil (art. 227 da CF). 6. Assim, a competência inscrita no art. 114 não se limita a casos de relação de trabalho existente. É o direito subjetivo das crianças ao não trabalho que está sendo tutelado pelo pedido de criação e implementação de políticas públicas. O Judiciário não se pode furtar à provocação do Executivo quanto à omissão inconstitucional constatada pelo Ministério Público, no que tange a direito fundamental tão caro, nacional e internacionalmente (Convenção 182 da OIT). 7. Por outro lado, salvo quanto a programas de aprendizagem, não se vislumbra a competência desta Especializada para impor ao Município a elaboração e implementação de políticas públicas acerca da educação e profissionalização de crianças e adolescentes (pedidos 2, 3, 4, 5, 6, 10, 11 e 13), pois, embora necessárias, não dizem respeito, diretamente, à relação de trabalho. Recurso de embargos conhecido e parcialmente provido.