TJ-DF - : XXXXX20178070000 DF XXXXX-63.2017.8.07.0000
DIREITO CIVIL. CONSUMIDOR. AGRAVO DE INSTRUMENTO. CONTRATO DE MÚTUO FINANCEIRO COM AMORTIZAÇÃO EM CONTA BANCÁRIA. DESCONTO DA INTEGRALIDADE DOS VALORES DEPOSITADOS A TÍTULO DE REMUNERAÇÃO. LIMITAÇÃO EM TRINTA POR CENTO. POSSIBILIDADE. DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. CONSTITUCIONALIZAÇÃO DO DIREITO CIVIL. EFICÁCIA HORIZONTAL DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS. MÍNIMO EXISTENCIAL. FIXAÇÃO DE MULTA DIÁRIA EM RAZÃO DE EVENTUAL DESCUMPRIMENTO. DEVOLUÇÃO DE VALORES JÁ DESCONTADOS. IMPOSSIBILIDADE EM SEDE DE AGRAVO DE INSTRUMENTO. INSTABILIDADE. RISCO À SEGURANÇA JURÍDICA. 1. O presente caso vincula-se ao princípio da dignidade da pessoa humana, com status de fundamento da República, cujos efeitos, na linha da interpretação contemporânea, não se limitam ao âmbito das relações entre cidadãos e Estado, mas repercutem também na esfera das relações privadas. É a chamada eficácia horizontal dos direitos fundamentais, teoria abraçada pela jurisprudência pátria desde o emblemático julgamento do Recurso Extraordinário nº 201.819/RJ pelo Supremo Tribunal Federal. 2. Ainda que se suscite a eventual ausência de regramento próprio disciplinando a limitação de percentual de desconto a ser efetuado em contratos de empréstimo contraídos diretamente sobre a conta bancária, não se afigura razoável, num Estado Democrático de Direito, admitir que um indivíduo seja reduzido à miséria com o fim de satisfazer credores. 3. Com constitucionalização do direito civil, o princípio da autonomia privada deixa de ser tido como absoluto e passa a ser lido a partir da nova tábua axiológica que condiciona todo o sistema jurídico através da consagração de princípios como o da função social do contrato, o da boa-fé objetiva, e, especialmente, o da dignidade da pessoa humana. 4. Privilegiando a interpretação que confere maior efetividade aos direitos fundamentais da pessoa humana, deve-se reconhecer, em face das peculiaridades do caso concreto, a possibilidade de limitação dos descontos efetuados na conta bancária do agravante a trinta por cento dos valores ali depositados a título de remuneração. 4. Impossível deferir, em sede de agravo de instrumento, a devolução dos valores que já foram descontados anteriormente à decisão liminar, o que poderia causar instabilidade e risco à segurança jurídica a depender da sorte final da pretensão deduzida na origem. 5. Recurso conhecido e parcialmente provido.