TRF-3 - AGRAVO DE INSTRUMENTO: AI XXXXX20204030000 MS
E M E N T A AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXCEÇÃO DE SUSPEIÇÃO DE PERITO. PERÍCIA ANTROPOLÓGICA. AÇÃO DECLARATÓRIA. TERRA INDÍGENA. AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DO INTERESSE CONCRETO DO EXCEPTO EM FAVORECER UMA DAS PARTES. NÃO VERIFICADA NENHUMA HIPÓTESE DE SUSPEIÇÃO. RECURSO IMPROVIDO. 1. De início, observa-se que o Sindicato Rural de Sete Quedas suscitou exceção de suspeição do perito Ledson Kurtz de Almeida, nomeado para a realização de perícia antropológica; nos autos de demanda que visa à declaração de que "as propriedades envolvidas no processo de demarcação da TI Sombrerito, situada no Município de Sete Quedas-MS, que consigam demonstrar a titularidade em período anterior ao marco temporal situado pelo STF no julgamento do caso Raposa Serra do Sol, não poderão ser objeto de demarcação indígena, nos termos do art. 231 da CF/88”. O excipiente fundamentou sua impugnação no art. 135 , V , do CPC/73 (atual art. 145 , IV , do CPC ), argumentando a vinculação ideológica do perito com comunidades indígenas. 2. A exceção foi rejeitada pelo D. Juízo, ocasionando a interposição do presente recurso. Sustenta o agravante que a impugnação à nomeação do perito ocorreu com base nos seguintes elementos e provas trazidas ao processo: a) participação em trabalhos, inclusive para o Governo Federal, em prol de direitos de comunidades indígenas, incluindo questões relacionadas à demarcação de terras; b) estudos e publicações de artigos em prol de comunidades indígenas; e c) filiação à Associação Brasileira de Antropologia (ABA), que, por sua vez, firmou convênio com o MPF para o fornecimento de profissionais para a defesa dos interesses das comunidades indígenas. 3. De fato, por força do art. 148 , II , do CPC , as hipóteses de suspeição do perito são as mesmas previstas para o juiz, estando estas elencadas no art. 145 do CPC , in verbis: "Art. 145 . Há suspeição do juiz: I - amigo íntimo ou inimigo de qualquer das partes ou de seus advogados; II - que receber presentes de pessoas que tiverem interesse na causa antes ou depois de iniciado o processo, que aconselhar alguma das partes acerca do objeto da causa ou que subministrar meios para atender às despesas do litígio; III - quando qualquer das partes for sua credora ou devedora, de seu cônjuge ou companheiro ou de parentes destes, em linha reta até o terceiro grau, inclusive; IV - interessado no julgamento do processo em favor de qualquer das partes". 4. Ademais, nos termos do § 1º do art. 148 supramencionado, a suspeição do perito deve ser suscitada na primeira oportunidade em que couber à parte se manifestar nos autos, ou seja, logo após a nomeação, sob pena de preclusão, não se admitindo que esta venha a ser alegada somente após a apresentação de laudo pericial desfavorável ao excipiente. Precedentes. 5. Além disso, para a caracterização da hipótese de suspeição constante no inciso IV do artigo 145 supra, é necessário que se demonstre, no caso específico, o interesse concreto do excepto no julgamento em favor de uma das partes, não bastando para infirmar a sua imparcialidade a existência de trabalhos previamente realizados ou a manifestação anterior de opinião, em abstrato, em sentido contrário à pretensão do excipiente. 6. Sobre o tema a autora Patricia Miranda Pizzol ensina que "o juiz não se torna suspeito por ter obra que trate, em abstrato, da matéria objeto da demanda" (In: ALVIM, Angélica Arruda et al. Comentários ao Código de Processo Civil . 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 2017, p. 239). Outrossim, Nelson Nery Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery, versando sobre o inciso V do artigo 135 do CPC/73 (atual inciso IV do artigo 145 do CPC ), esclarecem que tal norma não se aplica nos casos em que o excepto "exteriorizou opinião científica sobre matérias ou teses jurídicas, em entrevistas, artigos, dissertação de mestrado, teses de doutorado, livre-docência e de professor titular, livros etc., matérias essas que estão sendo discutidas na causa. O que torna o juiz suspeito de parcialidade não é o conhecimento prévio que a parte e/ou o interessado possam ter sobre opinião jurídica, política, religiosa ou filosófica já exteriorizada pelo juiz, mas sim o adiantamento de sua opinião sobre o caso concreto que está ou estará sob julgamento (prejulgamento)" (In: Código de Processo Civil comentado e legislação extravagante. 11. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010, p. 421). 7. No caso, verifica-se que o perito, em sua manifestação nos autos da exceção de suspeição, esclareceu todos os pontos da impugnação do Sindicato. 8. Diante de tais informações e de todo o exposto, não se vislumbra qualquer interesse do perito no julgamento do processo em favor das agravadas. Ademais, o agravante sequer apontou qual seria a vantagem concreta que adviria ao excepto por favorecer a comunidade indígena no feito. 9. Assim, nenhum dos fatos apresentados neste recurso enquadra-se nas hipóteses de suspeição do perito. Ressalte-se, ainda, que, nos termos dos artigos 479 e 371 do CPC , o juiz não está adstrito às conclusões do laudo pericial, podendo, inclusive, deixar de considerá-las para a formação de sua convicção, desde que o faça de forma fundamentada. 10. Agravo de instrumento não provido.