Tribunal de Justiça do Estado da Bahia PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA TURMA RECURSAL - PROJUDI PADRE CASIMIRO QUIROGA, LT. RIO DAS PEDRAS, QD 01, SALVADOR - BA ssa-turmasrecursais@tjba.jus.br - Tel.: 71 3372-7460 RECURSO INOMINADO Nº XXXXX-42.2020.8.05.0032 RECORRENTE: THIAGO RIBEIRO MACEDO ADVOGADO: WAGNER VELOSO MARTINS E OUTRO RECORRIDO: GENERAL MOTORS DO BRASIL LTDA. ADVOGADO: DIOGO DANTAS DE MORAES FURTADO RECORRIDO: TOPVEL ADVOGADO: WILLAME JUNIOR GOMES RANGEL JUÍZO DE ORIGEM: Vara do Sistema dos Juizados - BRUMADO JUIZ RELATOR: ALBENIO LIMA DA SILVA HONORIO EMENTA RECURSO INOMINADO. CONSUMIDOR. VEÍCULO ZERO QUILÔMETROS ADQUIRIDO PELO AUTOR APRESENTOU DIVERSOS DEFEITOS NO PERÍODO DE MENOS DE UM ANO DA COMPRA. FRUSTRAÇÃO CONSTATADA, UMA VEZ QUE O VEÍCULO NÃO FUNCIONA COMO NOVO. QUEBRA DE EXPECTATIVA ENSEJADORA DE DANOS MORAIS. ARBITRAMENTO DA INDENIZAÇÃO EM VALOR RAZOÁVEL E PROPORCIONAL. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. RELATÓRIO Trata-se de recurso inominado interposto contra a sentença prolatada no processo em epígrafe nos seguintes termos: ¿Rejeito a preliminar de ausência de interesse de agir, uma vez que, não obstante a parte ré afirme que não existe lide, porque não houve pedido de anulação administrativa do contrato, ela apresentou contestação, defendendo a existência do negócio, razão pela qual existe um conflito a ser solucionado, fato que demonstra a necessidade e utilidade do provimento jurisdicional. De acordo com o art. 14 da Lei n. 8.078 /90, o fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos. Por sua vez, o § 1º do citado artigo dispõe que o serviço é defeituoso quando não fornece a segurança que o consumidor dele pode esperar, levando-se em consideração as circunstâncias relevantes, entre as quais o modo de seu fornecimento, o resultado e os riscos que razoavelmente dele se esperam e a época em que foi fornecido. No caso dos autos, verifico que a parte autora não faz prova mínima de sua pretensão, deixando de apresentar qualquer indício de prova com o condão de firmar o convencimento deste Juízo de que houve falha na prestação dos serviços pela parte acionada. Deve-se ressaltar que a Segunda Seção do Superior Tribunal, no julgamento do Resp XXXXX/MG , Rel. Paulo de Tarso Sanseverino, DJ de 21/09/2011, pacificou o entendimento de que, em demanda que trata da responsabilidade pelo fato do produto ou do serviço (arts. 12 e 14 do CDC ), a inversão do ônus da prova decorre da lei, não dependendo da demonstração da vulnerabilidade ou hipossuficiência do consumidor. Assim, no caso em debate, a parte ré logrou êxito em comprovar que não houve falha na prestação dos serviços por ela prestado, restando demonstrado que em todas as idas da parte acionante no estabelecimento da acionada foram atendidas as solicitações. Nesse contexto, sem a prova da ocorrência do suposto ilícito, não há que se falar em indenização por danos morais vez que não houve evento danoso para a parte autora. Assim, ante a ausência de ato lesivo, danos ou fato que constituía o pleito autoral, não há prova da falha na prestação dos serviços pela parte ré. Ante o exposto, e considerando tudo que dos autos consta, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos da parte autora.¿ Sorteados, coube-me a função de relatar, cujo voto apresento. É breve o relatório VOTO Inicialmente, da análise dos requisitos de admissibilidade, cumpre-me anotar que o presente recurso preenche os requisitos legais, razão pela qual o conheço. É fato que quando compramos um carro novo esperamos que ele não dê defeito e tenha utilidade por vários anos. No caso em tela, o veículo Novo Onix Plus LT Turbo Chevrolet foi diversas vezes para a concessionária fazer serviços necessários à sua utilidade. A 2ª demandada (TOPVEL) afirma que os dois primeiros serviços foram a convite por meio de RECALL, mas não faz prova disto. Ademais, nota-se que o veículo precisou ir à concessionária pelo menos quatro vezes no período de menos de um ano da compra. Assim, quanto à indenização por danos morais, razão assiste ao Recorrente, pois restou demonstrado que, desde a aquisição do veículo zero quilômetro, diversas foram as idas e vindas até a concessionária na tentativa de solucionar os defeitos apresentados. É inegável a frustração do Autor ao adquirir um veículo zero quilômetros que, na verdade, não funcionava como novo. Nesse sentido, colaciono alguns julgados deste Tribunal: AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. VÍCIO DO PRODUTO. VEÍCULO ZERO QUILÔMETRO. MAU FUNCIONAMENTO. DANOS MORAIS. CARACTERIZAÇÃO. DECISÃO MANTIDA. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO. 1. Consoante a jurisprudência desta Corte, "é cabível indenização por dano moral quando o consumidor de veículo zero quilômetro necessita retornar à concessionária por diversas vezes para reparo de defeitos apresentados no veículo adquirido" ( AgRg no AREsp XXXXX/MT , Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, QUARTA TURMA, julgado em 04/02/2016, DJe de 12/02/2016). 2. Agravo interno não provido. ( AgInt no REsp XXXXX/SP , Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 31/08/2020, DJe 23/09/2020) APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. VÍCIOS. VEÍCULO AUTOMOTOR. PRELIMINAR DE NULIDADE POR AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO. REJEIÇÃO. NULIDADE DE ALGIBEIRA E VEDAÇÃO AO VENIRE CONTRA FACTUM PROPRIUM. PRELIMINAR DE CERCEAMENTO DE DEFESA E NÃO INCIDÊNCIA DE PRECLUSÃO REJEITADAS. DANOS MORAIS INDENIZÁVEIS CARACTERIZADOS. VEÍCULO ADQUIRIDO NOVO. DEFEITOS. SUCESSIVAS IDAS À OFICINA. VALOR DA INDENIZAÇÃO RAZOÁVEL. 1. No tocante a preliminar de nulidade do processo desde as fls. 288, entendo que, pela vedação do venire contra factum proprium e da nulidade de algibeira, deve ser rejeitada. 2. Em que pese o advogado da apelante não tenha sido intimado ou notificado, através de publicação, dos atos desde a fl. 288, o vício foi sanado às fl. 391 até a sentença, sem que a parte tenha, por qualquer modo, arguido nulidade, tendo feito, somente, após a sentença contrária aos seus interesses. 3. Nesse sentido, o padrão de conduta adotado pela defesa técnica violou a boa-fé processual (nulidade de algibeira ou de bolso), havendo ainda a preclusão temporal da matéria (vício não alegado no primeiro momento e que teve ciência). 4. De igual forma, na esteira do entendimento esposado acima, não é possível se falar em cerceamento de defesa ou de não preclusão do direito à produção de prova pericial, uma vez que incide, na hipótese, preclusão temporal em razão da caracterização da nulidade de algibeira. 5. Desse modo, aproveitando a fundamentação do tópico anterior, inexiste cerceamento de defesa ou nulidade da sentença por vício desse jaez, não cabendo ao Poder Judiciário amparar a parte que, mesmo tendo oportunidade anterior de arguir a nulidade, não o fez no momento adequado. 6. Com efeito, a relação contratual em discussão tem natureza de consumo, e, por isso, esta sujeita às normas do Código de Defesa do Consumidor ( CDC ). De outra banda, é incontroverso que, ao optar pela compra de veículo novo, o consumidor tem a legítima expectativa de que o bem esteja em perfeitas condições de uso e não apresente qualquer vício. Entretanto, no caso dos autos, restou comprovado que o veículo adquirido pelo autor apresentou os primeiros vícios poucos meses após a sua aquisição, de modo que se tal fato não fosse verdadeiro sequer haveria razão de serem feitos reparos e tentativas. 7. Como já decidido pelo C. STJ, "se o veículo zero-quilômetro apresenta, em seus primeiros meses de uso, defeitos em quantidade excessiva e capazes de reduzir substancialmente a utilidade e a segurança do bem, terá o consumidor direito à reparação por danos morais, ainda que o fornecedor tenha solucionado os vícios do produto no prazo legal" ( REsp XXXXX/MG , Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 10/12/2002, DJ 28/04/2003, p. 198). 8. Levando-se em consideração as condições pessoais das partes, em especial das rés, bem como os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, e atento ainda às demais peculiaridades do caso em tela, notadamente quanto à duração do litígio e a intensidade do dano impingido, e o veículo objeto dos problemas, entendo que o quantum indenizatório fixado em R$ 30.000,00 é razoável para assegurar ao lesado uma justa reparação, sem incorrer em enriquecimento ilícito, considerando-se ainda o caráter punitivo e pedagógico da medida. 9. Preliminares rejeitadas e apelo improvido. (Classe: Apelação,Número do Processo: XXXXX-41.2010.8.05.0001 , Relator (a): Maurício Kertzman Szporer, Segunda Câmara Cível, Publicado em: 27/05/2019 ) (TJ-BA - APL: XXXXX20108050001 , Relator: Maurício Kertzman Szporer, Segunda Câmara Cível, Data de Publicação: 27/05/2019) APELAÇÃO CÍVEL ¿ VÍCIO DE FABRICAÇÃO EM VEÍCULO IDENTIFICADO POR PROVA PERICIAL JUDICIAL ¿ DEFESA DAS RÉS QUE SUSTENTA A INEXISTÊNCIA DE DEFEITO E QUE A FALHA DECORRIA DO CONSUMIDOR NÃO LIGAR O AUTOMÓVEL NA FORMA PRESCRITA NO MANUAL DO USUÁRIO ¿ VEÍCULO QUE NÃO LIGAVA EM TODAS AS OPORTUNIDADES EM QUE ERA ACIONADO - ATRIBULAÇÕES OCASIONADAS PELA NÃO SOLUÇÃO DOS PROBLEMAS QUE ULTRAPASSA O MERO ABORRECIMENTO ¿ LESÃO À BOA-FÉ OBJETIVA ¿ DANOS MORAIS CUJA QUANTIFICAÇÃO SE MAJORA ¿ PRECEDENTES DO STJ ¿ APELO PROVIDO EM PARTE 1. O veículo adquirido pelo autor zero-quilômetro apresentava falha na ignição e desligava sozinho, o que trazia desconforto e insegurança no uso do mesmo que, a qualquer momento, poderia deixar o proprietário parado porque não ligava. 2. Levado a concessionária do fabricante apenas vinte e oito dias após a compra, foi indicado que o veículo não apresentava qualquer defeito, sendo a falha ocasionada por não proceder o consumidor com a ignição na forma indicada no manual do proprietário. 3. Prova pericial judicial requerida pelas próprias rés que identificou a existência de defeito de fabricação e falha na ignição independente de serem seguidos os procedimentos indicados no manual do proprietário, que tornavam o veículo impróprio para o uso. 4. Apelo provido em parte para majorar os danos morais deferidos em primeira instância para o valor de R$ 15.000,00 (quinze mil reais) em vista do caráter pedagógico da indenização, em vista da ação das rés de acordo com a boa-fé que devem reger as relações de consumo ao negarem o defeito administrativa e judicialmente. 5. Juros sobre os danos morais que devem incidir desde a citação, não se adequando ao caso em tela a súmula 54 , do STJ, que se refere a responsabilidade extracontratual. (TJ-BA - APL: XXXXX20188050001 , Relator: MAURICIO KERTZMAN SZPORER, SEGUNDA CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 12/11/2019) Importa comentar que o autor não fez prova que os defeitos continuam e isto deve ser levado em consideração para o arbitramento dos danos morais, uma vez que o direito não visa estimular o enriquecimento sem causa (art. 884 , do Código Civil e art. 84 § 4º , do CDC ). Nos autos, também é possível constatar que as Recorridas não colocaram veículo reserva à disposição do autor de forma imediata. Nesse contexto, a fixação do valor indenizatório há que observar as circunstâncias do caso, bem como a finalidade da reparação, que deve ser estabelecida de modo a desencorajar o infrator a reeditar sua conduta ilícita. Assim, diante das circunstâncias do caso sob exame, tenho como razoável, no tocante ao valor, R$ 12.000,00 (doze mil reais), para a reparação do dano moral e desestimulante a eventuais ações da parte ré. Por todo o exposto, voto no sentido de CONHECER E DAR PROVIMENTO AO RECURSO, para condenar as Recorridas solidariamente ao pagamento de R$ 12.000,00 (doze mil reais) de danos morais ao Autor, ora Recorrente. Sem custas nem honorários, ante o resultado. ALBENIO LIMA DA SILVA HONORIO Juiz Relator