TJ-RS - Apelação Crime: ACR XXXXX RS
APELAÇÕES. DELITOS DE ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA ARMADA MAJORADA, DE OBSTRUÇÃO DA PERSECUÇÃO PENAL DE INFRAÇÃO NO ÂMBITO DE ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA E DE LAVAGEM DE DINHEIRO e BENS, MAJORADO PELA REITERAÇÃO. 1. QUESTÕES PRELIMINARES: 1.1 - NULIDADE. INCOMPETÊNCIA DO JUÍZO. O magistrado da 2ª Vara Criminal de Alvorada já estava prevento para analisar e julgar os casos ora analisados desde o mês de abril de 2016, quando deferiu a quebra do sigilo bancário e fiscal dos acusados na operação Mercado Jean , nos autos do processo nº 003/2160000466-1, não havendo o que se falar em incompetência por violação à regra da prevenção. A questão relativa à prevenção, inclusive, já foi apreciada por este Colegiado quando do julgamento do habeas corpus nº 70073559536 e dos embargos de declaração nº 70073917163. A alegação de incompetência do juízo de origem para o julgamento dos crimes narrados nos fatos 02 e 04 da denúncia do processo nº 003/2170001589-4 também não comporta acolhimento, pois há nítida conexão probatória (artigo 76 , inciso III , do CPP ) entre os fatos denunciados, na medida em que as provas de cada infração influem diretamente sobre as demais, ainda que tenham sido praticadas Comarcas distintas, especialmente porque todos os supostos delitos foram descobertos a partir dos... elementos probatórios colhidos na mesma investigação. Ademais, nos moldes do artigo 80 do CPP , é facultado ao magistrado avaliar, em casos de conexão e continência, a conveniência da separação dos processos. O mesmo ocorre com a alegação de que não está verificada qualquer conexão do fato 01 com os fatos 05, 06, 08 e 09 da peça inaugural do processo nº 003/2170001589-4, mormente porque as condutas narradas nos fatos 05 e 06 da denúncia foram supostamente praticadas para tentar embaraçar a investigação dos crimes de organizações criminosas (fatos 01, 02, 03 e 04), sendo aqui também caracterizada a conexão objetiva sequencial (artigo 76 , inciso II , do CPP ), ao passo que as imputações contidas nos fatos 08 e 09 da inicial estão íntima e estreitamente ligadas com os delitos de organizações criminosas, na medida em que as narrativas dizem sobre as condutas de lavagem dos capitais obtidos a partir dos próprios financiamentos de tais grupos criminosos. 1.2 - NULIDADE. INVESTIGAÇÃO REALIZADA DIRETAMENTE PELO MINISTÉRIO PÚBLICO. A alegação de que a investigação foi indevidamente realizada de forma direta pelo Ministério Público, quando havia indícios da participação de policial nos crimes, sendo imprescindível a instauração de inquérito policial pela Corregedoria da Polícia, não... merece acolhida. Primeiro, porque houve, sim, a participação ativa de membros da Corregedoria de Polícia durante as investigações, o que pode ser facilmente observado a partir da análise dos documentos encartadas aos autos. Segundo, porque o Ministério Público, órgão que possui a função de também exercer o controle externo da atividade policial (artigo 129 , inciso VII , da CF/88 ), dispõe de competência de instaurar e conduzir investigações criminais, sobretudo para firmar seu convencimento para efeitos da opinio delicti. Logo, resta claro que ao Parquet também competia a instauração e condução da investigação do caso concreto. Ainda que assim não fosse, a suposta nulidade, além de não ter o condão de contaminar o feito, estaria alcançada pela preclusão, porquanto não arguida no momento oportuno. 1.3 - NULIDADE. PRINCÍPIO ACUSATÓRIO. A condenação dos réus veio alicerçada em diversos elementos de convicção, tais como, interceptações telefônicas, quebras de sigilo bancários e fiscais, buscas e apreensões, provas estas irrepetíveis, mas que foram submetidas ao contraditório e, portanto, foram judicializadas, bem como por depoimentos prestados pelas testemunhas em juízo. Logo, não se pode afirmar que a condenação dos acusados se deu exclusivamente com base nos elementos... informativos colhidos durante a investigação policial, violando o disposto no artigo 155 do CPP . Devemos lembrar que vige no sistema de valoração das provas o princípio do livre convencimento motivado, estando o juiz livre para decidir e apreciar as provas que lhe são apresentadas, desde que o faça de forma motivada (art. 93 , inciso IX , da CF/88 ). 1.4 - NULIDADE. PROVA EMPRESTADA. A prova emprestada é aceita pela doutrina e jurisprudência e sua admissibilidade decorre da aplicação dos princípios da economia processual e da unidade da jurisdição, almejando máxima efetividade do direito material com mínimo emprego de atividades processuais, aproveitando-se as provas colhidas de forma idônea perante outro juízo ( AgRg no Ag no REsp XXXXX/MG , 5ª Turma, do STJ). Não há qualquer nulidade, pois a medida foi judicialmente autorizada. A somar, os documentos juntados constituem prova lícita, com observância aos princípios do contraditório e da ampla defesa. A prova emprestada só constituiria nulidade processual se fosse ilícita ou se a condenação fosse baseada única e exclusivamente nela, o que incorreu no caso em espécie. 1.5 - LITISPENDÊNCIA. Ao contrário do que sustenta a defesa de Jair, não há litispendência entre o processo nº 003/2170000140-0, no qual o acusado foi... denunciado pela suposta prática dos delitos de lavagem de dinheiro e organização criminosa, e o de nº 139/2160000804-6, no qual o réu foi denunciado pelo cometimento, em tese, dos crimes de roubo, receptação e tráfico de drogas. Ausente a identidade de parte, pedido e a causa de pedir. Ademais, supostamente verificada a litispendência entre as ações, o pedido deve ser levantado no feito tombado sob o nº 139/2160000804-6, cuja ação foi deflagrada e ainda está em trâmite em momento posterior ao do presente processo. 1.6 - ATIPICIDADE DA CONDUTA LEI Nº 12.850 /2013. A alegação de atipicidade da conduta, sob a alegação de que à época dos fatos inexistia a definição jurídica do delito de organização criminosa, não merece trânsito. A denúncia oferecida no processo nº 003/2170001589-4 imputa aos acusados a conduta de, desde o ano de 2011 até o mês de fevereiro de 2017, promover, integrar, constituir e especialmente financiar organizações criminosas destinadas à prática de diversos crimes, cujos aportes financeiros, em sua grande maioria, foram supostamente realizados nos anos de 2014, 2015 e 2016, tendo o édito condenatório se limitado às condutas praticadas nesse período. Em se tratando de crime de natureza permanente, cuja consumação se protrai no tempo, mostram-se... típicas as condutas relativas ao crime de organização criminosa na forma da Lei nº 12.850 /2013, pois, segundo o enunciado nº 711 da Súmula do Supremo Tribunal Federal, A Lei penal mais grave aplica-se ao crime continuado ou ao crime permanente, se a sua vigência é anterior à cessação da continuidade ou da permanência . Resta esvaziada, assim, a alegação de que os crimes imputados aos acusados são atípicos sob a alegação de que, à época dos fatos, inexistia a definição jurídica do delito. De igual forma, a alegação no sentido do não-preenchimento do tipo penal objetivo, diante da ausência do número de 04 (quatro) ou mais pessoas, também não encontra respaldo no caso dos autos. Além de tal matéria já ter sido alvo de apreciação deste Colegiado quando do julgamento dos habeas corpi nºs. XXXXX e XXXXX, deve ser lembrado que aos acusados Omar Abud e Luiz Armindo foi imputada as condutas de promover, integrar, constituir e especialmente financiar diversas organizações criminosas, as quais eram compostas por diversos agentes denunciados em outros feitos, estando adimplido, assim, o requisito previsto no artigo 1º , § 1º , da Lei nº. 12.850 /2013. No caso, embora nem todos os componentes das ditas organizações criminosas sejam réus na presente ação penal, a narrativa... dos fatos 01, 02, 03 e 04 da denúncia descreve a participação de outros indivíduos nos grupos criminosos, ainda que estes estejam respondendo penalmente em outros expedientes criminais. 1.7 - NULIDADE. INÉPCIA DA DENÚNCIA. Não resta verificada a inépcia da inicial. Analisando o conteúdo integral da descrição contida na denúncia acostada ao feito nº 003/2170001589-4 tem-se a clara compreensão acerca dos fatos imputados a cada acusado, estando o local, a época e o modus operandi perfeitamente delimitados, inclusive com o detalhamento da conduta e da posição ocupada por cada agente nas supostas organizações criminosas, permitindo o exercício da ampla defesa. 1.8 - AUSÊNCIA DE CORRELAÇÃO ENTRE DENÚNCIA E SENTENÇA. A alegação de ausência de correlação entre denúncia e a sentença, sob o prisma da incompatibilidade dos verbos nucleares do tipo penal de organização criminosa, é descabida. O édito condenatório possui extensa fundamentação concreta quanto ao (suposto) ato de financiar organizações criminosas, tanto em relação ao réu Omar Abud, como no que tange a Luiz Armindo, não havendo violação ao princípio da congruência. Ademais, o verbo nuclear de integrar organização criminosa abarca todos os demais (financiar, promover e constituir). Também não há qualquer irregularidade... ou nulidade no fato de o nome dos acusados Omar Abud e Luiz Armindo não constarem no rol dos integrantes das organizações criminosas apontadas na denúncia do presente feito ou nos processos em tramitação, mormente porque, no presente expediente está sendo tratada somente a célula econômica das supostas organizações (conduta de financiar), enquanto que os demais membros dos grupos criminosos estão sendo processados em expedientes criminais apartados. 1.9 - QUEBRA DA CADEIA DE CUSTÓDIA DA PROVA. A alegação no sentido de que houve quebra na cadeia de custódia da prova, o que a torna nula, na medida em que os elementos probatórios indicados pelo Ministério Público na denúncia não se encontram arrolados no auto de apreensão ou em qualquer outro termo, somente surgindo, no decorrer do processo, sem se conhecer a procedência, não comporta guarida. As provas referidas, dado o volume da apreensão, de fato não foram arroladas no auto, mas foram consignadas