AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI 2.900 /1998 DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO. ALTERAÇÃO DOS LIMITES TERRITORIAIS DOS MUNICÍPIOS DE SEROPÉDICA E DE ITAGUAÍ. AUSÊNCIA DE CONSULTA PLEBISCITÁRIA PRÉVIA. VIOLAÇÃO AO ARTIGO 18 , § 4º , DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL . EVENTUAL VÍCIO NO PROCESSO DE EMANCIPAÇÃO MUNICIPAL NÃO PODE SER CORRIGIDO POR MERA RETIFICAÇÃO LEGISLATIVA, SEM O ATENDIMENTO AOS REQUISITOS PREVISTOS NO ARTIGO 18 , § 4º , DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL . AUSÊNCIA DE CONVALIDAÇÃO PELA EMENDA CONSTITUCIONAL 57 /2008. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE CONHECIDA E JULGADA PROCEDENTE. 1. Lei estadual que dispõe sobre criação, incorporação, fusão ou desmembramento de municípios possui natureza normativa e abstrata, desafiando o controle concentrado. 2. A Lei 2.900 /1998 do Estado do Rio de Janeiro, em virtude da generalidade dos efeitos que irradia e a força prospectiva que ostenta, é passível de impugnação mediante ação direta de inconstitucionalidade, porquanto inova no sistema jurídico pátrio e reveste-se da abstração que caracteriza a norma legal. Precedentes. 3. Lei estadual que altera os limites territoriais de municípios sem a realização de consulta prévia, mediante plebiscito, às populações envolvidas contraria o disposto no artigo 18 , § 4º , da Constituição Federal . 4. A alteração dos limites geográficos de municípios jamais prescinde da consulta plebiscitária prevista no artigo 18 , § 4º , da Constituição Federal , qualquer que seja a extensão da alteração territorial verificada. Precedentes: ADI 2.921 , Rel. Min. Ayres Britto, Red. p/ o acórdão: Min. Dias Toffoli, Plenário, DJ de 22/3/2018; ADI 1.262 , Rel. Min. Sydney Sanches, Plenário, DJ de 12/12/1997; ADI 1.034 , Rel. Min. Marco Aurélio, Plenário, DJ de 25/2/2000; ADI XXXXX/RS , Rel. Min. Carlos Velloso, DJ de 28/11/2003; ADI 2.967 , Rel. Min. Sepúlveda Pertence, Plenário, DJ de 19/3/2004; ADI 3.149 , Rel. Min. Joaquim Barbosa, Plenário, DJ de 1º/4/2005. 5. O processo de emancipação municipal viciado não pode ser corrigido por mera retificação legislativa, sem a observância do artigo 18 , § 4º , da Constituição Federal . Deveras, uma vez criada a nova entidade federativa, não se admite a alteração da lei que a formalizou sem novo processo de incorporação, fusão ou desmembramento, com prévia consulta plebiscitária às populações envolvidas. 6. O plebiscito consultivo conflui para concretizar o princípio da soberania popular, da cidadania e da autonomia federativa, de forma que as populações afetadas possam exercer efetivamente suas prerrogativas de autogoverno. A criação, fusão, incorporação ou desmembramento municipal produz efeitos de ordem social, política e econômica, com sensíveis ressonâncias tributárias e institucionais, as quais afetaram de forma direta e imediata a população envolvida. Nesse prisma, a consulta plebiscitária é verdadeira condição de procedibilidade da norma que altera limites municipais, constituindo relevante meio de exercício da soberania popular. 7. A Emenda Constitucional 57 , de 2008, que acrescentou o artigo 96 ao Ato das Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição Federal , não é apta a convalidar o desmembramento municipal previsto na Lei 2.900 /1998 do Estado do Rio de Janeiro. É que a indigitada emenda somente convalidou aqueles atos de criação, fusão, incorporação e desmembramento de municípios cuja lei tenha sido publicada até 31 de dezembro de 2006, atendidos os requisitos estabelecidos na legislação do respectivo Estado à época. 8. In casu, a lei impugnada não observou a legislação do Estado do Rio de Janeiro vigente no período do desmembramento do Município de Seropédica, que exigia a realização de consulta prévia, mediante plebiscito, às populações diretamente interessadas. 9. A presente demanda reclama uma análise precisa quanto ao efeito repristinatório que poderá provir de eventual declaração de inconstitucionalidade da Lei fluminense 2.900 /1998. É que esta lei revogou parcialmente a Lei estadual 2.446/1995, a qual foi declarada parcialmente inconstitucional pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro. Destarte, há fato-jurídico processual, consolidado em coisa julgada, que deve ser resguardado em eventual efeito repristinatório. 10. A declaração de inconstitucionalidade da Lei estadual 2.900/1998 não desconstitui a coisa julgada que se formara na decisão do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro. Consectariamente, declarada a nulidade da lei ora impugnada, subsiste a coisa julgada material que assentou a inconstitucionalidade parcial da lei de criação do Município de Seropédica (Lei fluminense 2.446 /1995) e que fixou a demarcação territorial municipal vigente hodiernamente. 11. Os limites que atualmente dividem os Municípios de Seropédica e Itaguaí são justamente aqueles fixados no bojo do acórdão prolatado pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro. O presente julgamento, desta feita, não importa em alterações fáticas dos limites territoriais vigentes nas municipalidades. 12. Ação direta conhecida e julgada procedente, para declarar a inconstitucionalidade da Lei 2.900 /1998 do Estado do Rio de Janeiro.