TJ-SP - Apelação Criminal XXXXX20198260228 São Paulo
APELAÇÃO DEFENSIVA. FURTO DUPLAMENTE QUALIFICADO, PELA DESTREZA E PELO CONCURSO DE AGENTE. (1) AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS. (2) FUNDAMENTAÇÃO "PER RELATIONEM". POSSIBILIDADE. (3) RÉ QUE CONFESSOU A PRÁTICA DO CRIME. (4) RECORRENTE SURPREENDIDA NA POSSE DA "RES", O QUE EXIGE EXPLICAÇÃO SOBRE A POSSE ESPÚRIA DO BEM. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. (5) QUALIFICADORAS DA DESTREZA E DO CONCURSO DE AGENTES COMPROVADAS. (6) CRIME DE FURTO TENTADO, EMBORA INVERTIDA A POSSE DO BEM. (7) DOSIMETRIA. PENA-BASE EXASPERADA EM RAZÃO DE CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS DESABONADORAS E DA EXISTÊNCIA DE DUAS QUALIFICADORAS, SENDO UMA PARA INAUGURAR A PENA-BASE E A OUTRA PARA EXASPERÁ-LA. (8) RÉ REINCIDENTE. IMPOSSIBILIDADE DE COMPENSAÇÃO ENTRE A CONFISSÃO ESPONTÂNEA E A REINCIDÊNCIA. PRECEDENTES. (9) REGIME FECHADO. (10) INCABIVEL A SUBSTITUIÇÃO DA PENA CORPORAL POR RESTRITIVAS DE DIREITOS OU "SURSIS". (11) IMPROVIMENTO DO RECURSO DEFENSIVO. 1. Autoria e materialidade comprovadas com relação ao crime de furto duplamente qualificado e tentado, sobretudo pela confissão da ré e pelas demais provas exibidas nos autos. 2. A confissão, de fato, não é prova dotada de caráter absoluto (aliás, no sistema processual penal em vigor, nenhuma prova tem esse caráter). Todavia, é importante elemento a ser considerado pelo julgador na formação do seu convencimento. Quando a confissão estiver em conformidade com os demais elementos dos autos, como ocorre neste caso, serve, sim, de supedâneo à prolação do edito condenatório, sobretudo se coligida em sede judicial. No caso, nada existe a indicar que a confissão não tenha sido firme e sincera. 3. A remissão feita pelo Magistrado – referindo-se, expressamente, aos fundamentos (de fato e/ou de direito) que deram suporte a anterior decisão (ou, então, a Pareceres do Ministério Público ou, ainda, às informações prestadas por Órgão apontado como coator)– constitui meio apto a promover a formal incorporação, ao ato decisório, da motivação a que o juiz se reportou como razão de decidir, tal como se verifica na espécie. Fundamentação "per relationem". Inexistência de afronta à norma constitucional insculpida no art. 93 , IX , da Constituição Federal . Precedentes do STF ( RHC 221.785 -AgR/RS – Rel. Min. NUNES MARQUES – Segunda Turma – j. em 22/02/2023 – DJe de 07/03/2023; ARE 1.370.438 -ED/PR – Rel. Min. GILMAR MENDES – Segunda Turma – j. em 22/02/2023 – DJe de 28/02/2023; HC 222.534 -AgR/RS – Rel. Min. LUIZ FUX – Primeira Turma – j. em 13/02/2023 – DJe de 17/02/2023; HC 210.700 -AgR/DF – Rel. Min. ANDRÉ MENDONÇA – Segunda Turma – j. em 08/08/2022 – DJe de 09/09/2022; HC 186.720 -AgR/SP – Rel. Min. ROSA WEBER – Primeira Turma – j. em 29/08/2022 – DJe de 31/08/2022; HC 213.388 -AgR/RS – Rel. Min. ALEXANDRE DE MORAES – Primeira Turma – j. em 27/04/2022 – DJe de 28/04/2022 e HC 207.155 -AgR/PR – Rel. Min. ROBERTO BARROSO – Primeira Turma – j. em 14/12/2021 – DJe de 07/02/2022). 4. Encontro da "res furtiva" em poder da ré, a lhe impor o ônus, do qual não se desincumbiu, de explicar tal posse, de início muito comprometedora. Precedentes do STJ ( AgRg no HC XXXXX/SC - Rel. Min. Antonio Saldanha Palheiro - Sexta Turma - j. em 08/06/2021 - DJe de 16/06/2021 e HC XXXXX/SC - Rel. Min. Ribeiro Dantas - Quinta Turma - j. em 01/06/2017 - DJe de 09/06/2017) e do TJSP (Ap. XXXXX-95.2015.8.26.0161 – Rel. Des. Ruy Alberto Leme Cavalheiro – 3ª Câmara de Direito Criminal – j. em 02/03/2023 – DJe de 02/03/2023; Ap. XXXXX-84.2021.8.26.0482 – Rel. Des. Farto Salles – 6ª Câmara de Direito Criminal – j. em 01/02/2023 – DJe de 01/02/2023 e Ap. XXXXX-64.2021.8.26.0228 – Rel. Des. Camilo Léllis – 4ª Câmara de Direito Criminal – j. em 08/11/2021 – DJe de 08/11/2021). 5. Qualificadora da destreza reconhecida e bem delineada (art. 155 , § 4º , II , do Código Penal ). As provas orais dão conta de que a ré e sua comparsa, munidas de elevada habilidade que a ação exigia, subtraíram o telefone móvel da vítima, sem que ela se desse conta da subtração, o que somente foi percebido pela vítima posteriormente. Inteligência da doutrina de Cezar Roberto Bitencourt . 6. Concurso de agentes. A qualificadora prevista no art. 155 , § 4º , IV , do Código Penal , está presente, porque no crime em testilha houve a participação de mais de um indivíduo, todos vinculados psicologicamente para a prática criminosa, em prévia divisão de tarefas, tal como restou claro pela prova oral judicial. 7. Crime tentado. Entendeu o Juízo "a quo" que o bem subtraído, embora tivesse saído da esfera de vigilância da vítima, não se consumou, haja vista que os dois guardas metroviários estavam de prontidão na plataforma do trem, prontos para coibir a prática criminosa. Entretanto, era caso de se reconhecer a consumação, porque a ré e a sua comparsa foram detidas quando já estavam distantes da vítima e com o aparelho de telefone celular junto às vestes da apelante, como afirmaram as testemunhas oculares, perante o contraditório, invertendo, assim, a posse desse bem. É sempre oportuno lembrar que o crime de furto, que é crime contra o patrimônio, consuma-se com a mera posse da coisa alheia móvel, não interessando se o agente a retirou da esfera de disponibilidade da vítima ou se teve a posse tranquila e desvigiada, menos ainda se foi perseguido pela vítima ou mesmo por agentes da Lei Precedentes do STF ( HC XXXXX/PE - Rel. Min. RICARDO LEWANDOWSKI - Segunda Turma - j. 27/07/2016 - DJe 13/10/2016; HC XXXXX/RS - Rel. Min. ROBERTO BARROSO - Primeira Turma - j. 01/10/2013 - DJe 18/10/2013; HC XXXXX/SP - Rel. Min. ROSA WEBER - Primeira Turma - j. 05/02/2013 - DJe 19/03/2013; HC XXXXX/RS - Rel. Min. MARCO AURÉLIO - Primeira Turma - j. 19/05/2009 - DJe 12/03/2010 e HC XXXXX/RS - Rel. MIN. CÁRMEN LÚCIA - Primeira Turma - j. 04/08/2009 - DJe 04/09/2009) e do STJ ( AgRg no REsp n. 1.988.080/CE - Rel. Min. Messod Azulay Neto - Quinta Turma – j. em 13/3/2023 - DJe de 27/3/2023; AgRg no HC n. 778.116/SP - Rel. Min. Laurita Vaz - Sexta Turma – j. em 13/3/2023 - DJe de 23/3/2023; AgRg no HC XXXXX/SP - Rel. Min. Ribeiro Dantas - Quinta Turma - j. 25/10/2022 - DJe 04/11/2022; AgRg no REsp XXXXX/RJ - Rel. Min. Sebastião Reis Júnior - Sexta Turma - j. 11/10/2022 - DJe 14/10/2022; AgRg no HC n. 755.713/SP – Rel. Min. Antonio Saldanha Palheiro - Sexta Turma – j. em 27/9/2022 - DJe de 4/10/2022; AgRg no REsp XXXXX/GO - Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca - Quinta Turma - j. 09/08/2022 - DJe 16/08/2022; AgRg no HC XXXXX/SP - Rel. Min. Joel Ilan Paciornik - Quinta Turma - j. 25/05/2021 - DJe 31/05/2021). A propósito, no que diz respeito ao STJ, ele firmou a tese jurídica, para os fins do art. 543-C, do Código de Processo Civil : "Consuma-se o crime de furto com a posse de fato da ?res furtiva?, ainda que por breve espaço de tempo e seguida de perseguição ao agente, sendo prescindível a posse mansa e pacífica ou desvigiada" (REsp XXXXX/RJ – Rel. Min. Nefi Cordeiro - j. 14.10.2015). 8. Dosimetria da pena. Pena-base fixada acima do mínimo legal. Possibilidade. Na dosimetria da pena da ré devem ser levadas em consideração as diretrizes do art. 59, "caput", do Código Penal , a saber: culpabilidade, antecedentes, conduta social, personalidade do agente, motivos do crime, as suas circunstâncias e consequências, comportamento da vítima e tudo para que se possa calibrar as penas em conformidade com a necessidade e suficiência para a reprovação e prevenção do crime específico. Assim, considerada para fins de exasperação da basilar a presença de circunstância judicial desabonadora e da maior culpabilidade da ação, aferida pela presença de duas qualificadoras (destreza e concurso de agentes), sendo aplicável apenas uma para fins de exasperação da pena e a outra para inaugurar a qualificadora. Doutrina de Guilherme de Souza Nucci e Victor Eduardo Rios Gonçalves , bem como Precedentes do STF ( RHC XXXXX/SP - Rel. Min. RICARDO LEWANDOWSKI - Segunda Turma - j. 08/09/2020 - DJe 17/09/2020 e AgR HC XXXXX/SP - Rel. Min. ALEXANDRE DE MORAES - Primeira Turma - j. 04/04/2018 - DJe 17/04/2018) e do STJ ( AgRg no REsp XXXXX/RS - Rel. Min. Ribeiro Dantas - Quinta Turma - j. 11/10/2022 - DJe 18/10/2022 e HC XXXXX/TO - Rel. Min. Joel Ilan Paciornik - Quinta Turma - j. 14/05/2019 - DJe 21/05/2019). 9. Reincidência. Não há que se falar da não recepção do art. 61 , I , do Código Penal pela Carta Magna . A aplicação da reincidência como agravante da pena em processos criminais (art. 61 , I , do Código Penal ) foi declarada constitucional, em Repercussão Geral, por unanimidade, pelo Plenário do SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL ( RE 453.000 -RG/RS – Rel. Min. MARCO AURÉLIO – Tribunal Pleno – j. em 04/04/2013 – DJe de 03/10/2013). 10. Reincidência e confissão. A Origem entendeu por bem compensar a condenação utilizada para fins de agravamento da pena com a atenuante da confissão espontânea. Fê-lo mal. Isso porque, a circunstância agravante da reincidência deve preponderar sobre a circunstância atenuante da confissão espontânea, em estrita observância ao disposto no art. 67 , do Código Penal . Precedentes do STF (HC XXXXX/SP – Rel. Min. MARCO AURÉLIO – Primeira Turma – j. em 11/05/2020 – DJe de 22/06/2020; HC XXXXX/MS – Rel. Min. ROBERTO BARROSO – Primeira Turma – j. em 26/05/2014 – DJe de 27/05/2014; RHC XXXXX/MG – Rel. Min. TEORI ZAVASCKI – Segunda Turma – j. em 29/05/2014 – DJe de 30/05/2014; RHC XXXXX/SP – Rel. Min. RICARDO LEWANDOWSKI – Segunda Turma – j. em 01/04/2014 – DJe 02/04/2014 e RHC XXXXX/DF – Rel. Min. CÁRMEN LÚCIA – Segunda Turma – j. em 02/04/2013 – DJe de 17.04.2013). Inteligência da doutrina de Luiz Flávio Gomes , Alice Bianchini e Victor Eduardo Rios Gonçalves . 11. Regime fechado. O regime fechado é o que melhor se ajusta ao caso dos autos, devendo ser mantido, porque a ré ostenta circunstância judicial desabonadora e é reincidente pelo grave crime de narcotráfico, o que enseja a imposição do regime prisional mais gravoso, a impedir a fixação de outro regime, segundo previsão do art. 33 , § 3º , combinado com o art. 59 , "caput", ambos do Código Penal . Precedentes do STF e do STJ (AgR no HC XXXXX/SP - Rel. Min. ROBERTO BARROSO - Primeira Turma - j. 28/11/2022 - Dje em 30/11/2022 e AgRg no REsp XXXXX/SP - Rel. Min. Antonio Saldanha Palheiro - Sexta Turma - j. 13/03/2023 - DJe de 16/03/2023). 12. Incabível a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, mercê da vedação constante no art. 44 , II e III , do Código Penal , bem como do benefício do "sursis", segundo vedação do art. 77 , I e II , do mesmo Estatuto repressor. 13. Recurso defensivo que não comporta provimento.