STJ - AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL: AgRg no REsp XXXXX MG XXXX/XXXXX-0
PENAL. PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. NEGATIVA DE AFETAÇÃO DO RECURSO COMO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. MULTIPLICIDADE DE RECURSOS INEXISTENTE. LEI MARIA DA PENHA . ALTERAÇÃO LEGISLATIVA. LEI N. 14.550 /2023. PREVISÃO DE UMA FASE PRÉ-CAUTELAR NA DISCIPLINA DAS MEDIDAS PROTETIVAS DE URGÊNCIA. MANUTENÇÃO DA NATUREZ A CAUTELAR PENAL DAS MEDIDAS PREVISTAS NOS INCISOS I , II E III , DO ARTIGO 22 DA LEI 11.340 /2006. DISCIPLINA DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL - CPP . REVISÃO DO JULGADO ORIGINÁRIO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. Não estão devidamente preenchidos os requisitos para a afetação do presente recurso especial ao rito dos repetitivos, consoante dispõem os arts. 1.036 , caput e § 6º , do Código de Processo Civil - CPC e 257-A, § 1º, do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça - RISTJ. Não se vislumbra a multiplicidade de recursos, capaz de ensejar a afetação do processo para julgamento pelo sistema dos recursos repetitivos à Seção, caso em que deve ser rejeitada, por ora, a sugestão do órgão ministerial. 2. Registra-se que após a interposição deste agravo regimental passou a vigorar a Lei n. 14.550 /2023 (20/4/2023), responsável por incluir três novos parágrafos ao art. 19 da Lei n. 11.340/2023, relativamente à disciplina das medidas protetivas de urgência.2.1. A referida alteração legislativa veio a reforçar que a concessão da medida protetiva, ou seja, o ato inicial, urgente e imediato de se deferir a medida para tutelar a vida e a integridade física e psíquica da vítima, prescinde de qualquer formalidade e repele qualquer obstáculo que possa causar morosidade ou embaraço à efetividade da proteção pretendida. Assim, não se deve perquirir, neste primeiro momento, se há perfeita compatibilidade entre a conduta narrada pela vítima como praticada pelo agressor e alguma figura típica penal. Tampouco se deve exigir o registro de boletim de ocorrência, e menos ainda a existência de inquérito ou de ação cível ou penal. O que se busca é a celeridade da tutela estatal e, com ela, a efetividade da medida protetiva, que cumpre sua finalidade ao impedir a concretização da ameaça, a continuidade da prática ou o agravamento do ato lesivo contra a mulher.2.2. Nesse cenário, as medidas protetivas deferidas nos termos do § 5º do art. 19 da Lei n. 11.343 /2006 devem ser consideradas como pré-cautelares, pois precedem a uma cautelar propriamente dita, e tem como objetivo a paralisação imediata do ato lesivo praticado ou em vias de ser praticado pelo agressor. Enquanto pré-cautelares, as medidas protetivas podem ser concedidas em caráter de urgência, de forma autônoma e independente de qualquer procedimento, podendo até mesmo ser deferidas pelo próprio delegado ou pelo policial, na hipótese do art. 19-C da Lei n. 11.343 /2006.3. A inovação legislativa não apresenta nenhuma repercussão, seja quanto à natureza jurídica de cautelar das medidas protetivas de urgência, seja quanto ao caráter criminal das medidas previstas nos incisos I , II e III , do art. 22 da Lei n. 11.340 /2006.3.1. As medidas protetivas de urgência não perdem a natureza cautelar, mesmo depois da Lei n. 14.450/2023, mas apenas ganham uma fase pré-cautelar, à luz do art. 19 , § 5º, da Lei n. 11.343 /2006.Após o momento inicial de cessação do risco imediato, as medidas seguem o procedimento cautelar tal como antes. 3.2. Ademais, estão mantidos os aspectos das medidas protetivas de urgência que denotam a sua natureza penal (incisos I, II e III do art. 22): o envolvimento de valores fundamentais da vítima (vida, integridade física, psicológica e mental) e do suposto autor (liberdade de ir e vir); a possibilidade de decretação de prisão em caso de renitência no descumprimento das medidas protetivas pelo agressor; o paralelismo existente entre as medidas protetivas da Lei Maria da Penha e as medidas cautelares penais alternativas à prisão previstas no art. 319 , II e III , do Código de Processo Penal - CPP .3.3. Ainda, a vítima, nos termos do § 4º do art. 19 , introduzido também pela Lei n. 14.550 /23, pode pedir à autoridade policial o deferimento das medidas protetivas. De outro lado, o art. 12-C, introduzido pela Lei n. 13.827 de 2019, com redação de seu caput alterada em 2021, prevê a possibilidade de o delegado de polícia ou, na sua ausência, de o policial determinar o afastamento imediato do agressor do lar, em face de risco atual ou iminente à vida ou à integridade física da vítima. 4. Portanto, mantém-se a orientação há muito firmada nesta Corte - e reiterada no julgamento do REsp n. 2.009.402/GO - no sentido de que as medidas protetivas de urgência previstas no art. 22 , incisos I , II e III , da Lei n. 11.340 /06 são medidas cautelares de natureza criminal, devendo a elas ser aplicado o procedimento previsto no CPP , com aplicação apenas subsidiária do CPC . 5. No caso dos autos, as medidas deferidas referem-se à proibição de aproximação da ofendida e das testemunhas e proibição de estabelecer contato com a ofendida, seus familiares e testemunhas, previstas no art. 22 , II e III , da Lei n. 11.340 /2006, todas de cunho penal, de modo que o recurso de apelação defensivo deve ser revisado sob o prisma do direito processual penal. 6. Agravo regimental desprovido.