EMENTA: RECURSO INOMINADO. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/ INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. INSERÇÃO DO NOME DO DEVEDOR NO CADASTRO SCR. AUSÊNCIA DE NOTIFICAÇÃO PRÉVIA AO REGISTRO. DESCUMPRIMENTO AO ART. 11 DA RESOLUÇÃO Nº 4.571/17 DO BACEN. DANO MORAL IN RE IPSA. SÚMULA 385 DO STJ. INSCRIÇÃO PREEXISTENTE. INEXISTÊNCIA. REDUÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO. MONTANTE RAZOÁVEL E PROPORCIONAL. AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO DO DÉBITO. MANUTENÇÃO DA RESTRIÇÃO. NECESSIDADE RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. SENTENÇA REFORMADA. I. Conforme a inicial, a Reclamante alega que ao tentar realizar compras a crédito, foi surpreendida com a notícia de que seu nome estava na ?lista negra? dos bancos e financeiras, ou seja, no SISBACEN (SCR), com a indicação de ?prejuízos/vencido?, o que lhe dá a pecha de má pagadora. Narra que jamais foi notificada sobre o apontamento e foi cerceado o seu direito à informação, bem como a correção de eventual erro ou excesso. Diante da narrativa, requereu a condenação do Reclamado nos danos morais no importe de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), o qual alega in re ipsa (mov.1). Citado, o Reclamado ofertou contestação na mov.18, na qual requereu a improcedência dos pedidos formulados, ao argumento de que, diferentemente dos cadastros restritivos de crédito, o SCR é um banco de dados administrado pelo Banco Central, cuja alimentação pelas instituições financeiras é obrigatória. Aduz que as informações lançadas não são desabonadoras ao consumidor, bem como, que a notificação prévia à inscrição é responsabilidade do Banco Central, o que afasta os danos morais alegados. No mais, arguiu existentes apontamentos anteriores no cadastro do SPC em nome da Reclamante, o que reforça a inexistência dos danos morais. Impugnação na mov.22. Após, o magistrado extinguiu o processo com a resolução do mérito, julgou parcialmente procedentes os pedidos da inicial e condenou o Reclamado ao cancelamento da anotação do nome da Reclamante no cadastro SCR e nos danos morais quantificados em R$ 3.000,00 (três mil reais) (mov.24). Irresignado, o Reclamado interpôs o Recurso Inominado de mov.30, em cujas razões requereu a reforma da sentença, revolvendo matéria lançada em peça contestatória. Subsidiariamente, requereu a redução dos danos morais quantificados. Contrarrazões na mov.33. Após, o recurso foi recebido na mov.35. II. Superado este breve relato, razão não assiste à insurgência recursal. III. Obtempere-se inicialmente que a relação entre as partes é regida pelo Código de Defesa do Consumidor , cujas normas são de ordem pública e interesse social, nos termos do art. 5, inc. XXXII e 170, V, ambos da CF/88 e o art. 1º do CDC e aliada à súmula nº 297 do Superior Tribunal de Justiça que assim dispõe:? O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras?. IV. O Sistema de Informações de Crédito (SCR) é um instrumento de registro de fatos dos créditos tomados pelos consumidores junto às instituições integrantes do Sistema Financeiro Nacional, cujo gestor é o Banco Central do Brasil (BACEN). Cumpre às instituições financeiras alimentar o sistema com os dados acerca das operações de crédito e, eventualmente, corrigir ou excluir informações imprecisas, em cumprimento à Resolução n.º 2.724/00 do BACEN. Deste modo, igualmente cumpre às instituições financeiras originadoras dos créditos, comunicarem previamente os consumidores acerca da inscrição no SCR, comando expressamente previsto no art. 11 da Resolução nº 4.571/17 do BACEN, in verbis: Art. 11. As instituições originadoras das operações de crédito devem comunicar previamente ao cliente que os dados de suas respectivas operações serão registrados no SCR. § 1º Na comunicação referida no caput devem constar as orientações e os esclarecimentos relacionados no art. 14. § 2º As instituições referidas no caput devem manter a guarda da comunicação de que trata este artigo, em meio físico ou eletrônico que permita comprovar a sua autenticidade, por um período de cinco anos, contado da data de emissão do documento, sem prejuízo de outras disposições que fixem prazo maior para a sua guarda. Por esse excerto é de se notar que a Resolução nº 4.571/17 do BACEN vai ao reforço do art. 43 , § 2º do Código de Defesa do Consumidor : Art. 43. O consumidor, sem prejuízo do disposto no art. 86, terá acesso às informações existentes em cadastros, fichas, registros e dados pessoais e de consumo arquivados sobre ele, bem como sobre as suas respectivas fontes. § 1º Os cadastros e dados de consumidores devem ser objetivos, claros, verdadeiros e em linguagem de fácil compreensão, não podendo conter informações negativas referentes a período superior a cinco anos. § 2º A abertura de cadastro, ficha, registro e dados pessoais e de consumo deverá ser comunicada por escrito ao consumidor, quando não solicitada por ele. V. Nesse diapasão, é irrelevante perquirir se o SCR é ou não um cadastro restritivo. Basta que o cadastro permita aos credores inferirem informações positivas ou negativas dos créditos tomados pelos consumidores junto às instituições financeiras, sem que os próprios consumidores tenham consentido com o compartilhamento destas informações. O cerne da questão é a violação aos direitos básicos do consumidor à informação e à transparência (art. 4º ?caput? c/ 6º, III, ambos do CDC ) sobretudo no tocante ao tratamento dos seus dados pessoais (art. 2º , III c/ 7º, X, ambos da Lei 13.709 /18 - LGPD ). É notório que o inadimplemento do consumidor acerca de uma obrigação tomada com uma instituição financeira, quando compartilhado com outras instituições, é, por si só, desabonador ao consumidor. Ora, é por intermédio das informações contidas no SCR que as instituições financeiras avaliam o risco da concessão do crédito com base na pontuação conferida ao consumidor avaliado, cuja estatística, com alta nota de risco do crédito, inegavelmente desestimulará as demais instituições financeiras a realizarem operações de crédito com o consumidor avaliado. VI. Firme nessa premissa, nota-se que o Reclamado não se desincumbiu de comprovar que notificou a Reclamante antes do registro do seu débito no SCR, apartando-se do ônus que lhe atribui o art. 373 , II do CPC . O crédito vencido no valor de R$ 2.841,76 (dois mil, oitocentos e quarenta e um reais e setenta e seis centavos) foi inserido na data-base de 03/2022 (mov.1, extratoscr.pdf, p.43) do SCR, quando inexistia qualquer indicação de outro crédito vencido em nome da Reclamante. Com isso, o dano moral independe de prova e se verifica in re ipsa, consoante o precedente a seguir colacionado: EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C INDENIZAÇÃO. INSCRIÇÃO NOS CADASTROS DO SISBACEN/SCR SEM PRÉVIA NOTIFICAÇÃO. NATUREZA RESTRITIVA DE CRÉDITO. DANOS MORAIS. QUANTUM INDENIZATÓRIO. JUROS DE MORA. I. As informações fornecidas ao SISBACEN possuem a natureza restritiva de crédito, uma vez que as instituições financeiras o utilizam para consulta prévia de operações de crédito realizadas pelos consumidores. II. Nos termos do artigo 11 da Resolução nº 4.571/2017 do Banco Central do Brasil, as instituições originadoras das operações de crédito devem comunicar previamente ao cliente que os dados de suas respectivas operações serão registrados no SCR. III. A injusta inserção de dados da parte em sistema de proteção ao crédito viola a sua esfera moral, sendo desnecessária prova material do prejuízo emocional impingido, vez que se trata de dano moral in re ipsa. IV. O valor indenizatório fixado a título de danos morais deve atender aos requisitos da razoabilidade e da proporcionalidade, além de observar as particularidades do caso, a condição social da vítima e o caráter pedagógico, pelo qual se pretende coibir a reiteração de condutas reprováveis. Na espécie, a importância de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) revela-se adequada. V. Por tratar-se de ilícito praticado no âmbito de relação contratual estabelecida entre as partes, os juros de mora de 1% (um por cento) ao mês incidem a partir da citação (art. 405 , Código Civil ). APELAÇÃO CÍVEL CONHECIDA E DESPROVIDA. (TJGO, PROCESSO CÍVEL E DO TRABALHO -> Recursos -> Apelação Cível XXXXX-18.2022.8.09.0011 , Rel. Des (a). ALICE TELES DE OLIVEIRA , 11ª Câmara Cível, julgado em 16/11/2023, DJe de 16/11/2023) VII. A despeito da inscrição do nome da consumidora ter sido promovida nos órgão de proteção ao crédito (SPC) somente na data de 29/03/2022, quando preexistia a inscrição da Caixa Econômica Federal, incluída no dia anterior, data de 28/03/2022 (mov.18, spcbsignb1e5.pdf), repisa-se que a lesão extrapatrimonial aos direitos da Reclamante é anterior até mesmo à inscrição do crédito no SPC, porquanto, sem notificar previamente a consumidora, e em clara violação ao art. 11 da Resolução nº 4.571/17 do BACEN, o Reclamado registrou o débito na data-base de 03/2022 (mov.1, extratoscr.pdf, p.43) do SCR, quando inexistia qualquer indicação de outro crédito vencido e ativo em nome da Reclamante, o que atrai a aplicação da súmula 385 do STJ e enseja a sua condenação nos danos morais aferíveis in re ipsa. VIII. Nessa toada, presentes os requisitos previstos no artigo 186 do Código Civil e 14 do Código de Defesa do Consumidor , necessário se faz a imposição de condenação por danos morais sofridos pela recorrida. Observar-se-á a extensão do dano e os princípios da razoabilidade e proporcionalidade para fixação de importe a título de danos morais, com intento de reprimir que novos atos ilícitos surjam a partir da mesma conduta da companhia recorrente (caráter pedagógico), bem assim que a parte lesionada seja recompensada pelo abalo sofrido (caráter repressivo). Sendo assim, deve ele ser minorado de R$ 3.000,00 (três mil reais) para o importe de R$ 500,00 (quinhentos reais). IX. Por derradeiro, verifica-se que a Reclamante não contestou o débito, admitindo implicitamente a sua inadimplência, deste modo, o cadastro no SISBACEN (SCR) deverá ser mantido, reformando-se a sentença neste ponto. X. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO, para reformar a sentença guerreada, nos termos da fundamentação supra. Sem custas e honorários advocatícios.