Tribunal de Justiça do Estado da Bahia PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA TURMA RECURSAL - PROJUDI PADRE CASIMIRO QUIROGA, LT. RIO DAS PEDRAS, QD 01, SALVADOR - BA ssa-turmasrecursais@tjba.jus.br - Tel.: 71 3372-7460 RECURSO INOMINADO. JUIZADOS ESPECIAIS. DECISÃO MONOCRÁTICA. DIREITO DO CONSUMIDOR. SERVIÇO DE FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA. ALEGAÇÃO AUTORAL DE COBRANÇA INDEVIDA. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. A COMPANHIA DE ENERGIA NÃO SE DESINCUMBIU DE PROVAR INEXISTÊNCIA DO FATO. COBRANÇA EXCESSIVA. CONSUMO NÃO RECONHECIDO. AUMENTO INJUSTIFICADO. REFATURAMENTO DA FATURA QUESTIONADA. INOCORRÊNCIA DE SUSPENSÃO DOS SERVIÇOS OU INSCRIÇÃO DO NOME NOS CADASTROS DE RESTRIÇÃO AO CRÉDITO. DANOS MORAIS NÃO CONFIGURADOS. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. DECISÃO MONOCRÁTICA Trata-se de recurso inominado interposto pela parte ré em face da r. sentença prolatada nos autos do processo em epígrafe. Em síntese, a parte autora questiona as faturas vencidas em abril/20 (R$ 499,94), maio/20 (R$ 979,26), junho/20 (R$ 306,12), julho/20 (R$ 213,40), agosto/20 (R$ 221,40), setembro/20 (R$ 199,48) e outubro/20 (R$ 212,97), porque seria muito superior à sua média de consumo, que sempre gravitou em torno de 131kwh/mês. O Juízo a quo, em sentença, julgou procedente em parte o pedido autoral para condenar a ré ao refaturamento das contas vencidas em abril/20 (R$ 499,94), maio/20 (R$ 979,26), junho/20 (R$ 306,12), julho/20 (R$ 213,40), agosto/20 (R$ 221,40), setembro/20 (R$ 199,48) e outubro/20 (R$ 212,97), aplicando às mesmas o valor da média de consumo do autor, qual seja, R$ 109,12 (cento e nove reais e doze centavos). A parte ré interpôs recurso inominado (ev. 79). É o breve relatório, ainda que dispensado pelo artigo 38 da Lei Nº 9.099 /95 e Enunciado nº 162 do FONAJE. DECIDO Inicialmente, destaque-se que esta magistrada, no exercício da cooperação que foi designada para atuação nesta Primeira Turma Recursal, em prestígio à segurança jurídica, estabilidade da jurisprudência, bem como, diante da inexistência de aplicabilidade da técnica de julgamento do art. 942 CPC em sede de julgamento de Recurso Inominado, curvo-me ao entendimento consolidado desta Turma sobre a matéria discutida nestes autos, pelo que passo ao julgamento nos seguintes termos. O novo Regimento Interno das Turmas Recursais (Resolução nº 02/2021 do TJBA), estabelece a competência do relator para julgar monocraticamente as matérias em que já estiver sedimentado entendimento pelo colegiado ou já com uniformização de jurisprudência, em consonância com art. 15 , incisos XI e XII, da mencionada Resolução e artigo 932 do Código de Processo Civil . Conheço do recurso, porquanto preenchidos os pressupostos de admissibilidade. Inicialmente, cumpre esclarecer ainda que demanda não apresenta complexidade que desborde a alçada cognitiva do Sistema dos Juizados Especiais, porquanto não demanda prova complexa. Igualmente, a argumentação posta na exordial não reclama a resolução de questões factuais complexas, não necessitando de produção de prova pericial. A lide tem, pois, plena condição de ser conhecida e julgada em acordo com o procedimento sumariíssimo. Analisados os autos observa-se que a matéria já se encontra sedimentada no âmbito da 1ª Turma Recursal. Precedentes desta turma: XXXXX-46.2019.8.05.0103 ; XXXXX-07.2019.8.05.0080 . No caso concreto, entendo que a insurgência da Recorrente não merece prosperar, como veremos a seguir. Com efeito, tem-se que a relação travada entre as partes é de natureza consumerista, aplicando-se, portanto, as regras do CDC (Lei no 8.078 /90). Fazendo uma análise do histórico das faturas trazidas, verifica-se que o consumo das faturas contestadas na inicial mostra-se destoante da média apurada. No caso em testilha, que versa sobre cobrança excessiva, deve ser esclarecido inicialmente que não gozam de presunção de absoluta verdade os débitos imputados aos consumidores pelas concessionárias de serviço público, cabendo a estas a efetiva demonstração de utilização dos serviços ou produtos ofertados. Ora, apesar da presunção de legitimidade do ato administrativo, tendo o consumidor alegado o excesso do faturamento, caberia ao Réu demonstrar a exatidão da medição bem como apresentar a causa justificadora do aumento do consumo de energia elétrica, a exemplo de um desvio intencional sob pena de responder objetivamente pelos danos ocasionados ao consumidor. No caso em tela, não há nenhuma dúvida quanto à vulnerabilidade e hipossuficiência do consumidor, considerando que é a Ré quem possui conhecimentos do serviço fornecido, não dispondo o consumidor dos meios para comprovar que efetivamente não consumiu a energia elétrica cobrada. Portanto, caberia à parte acionada provar a regularidade das cobranças, o que não ocorreu. À propósito, trazemos à baila jurisprudência neste sentido: A presunção de legitimidade dos atos praticados por concessionárias de serviço público cessa no momento em que o suposto tomador, vulnerável e hipossuficiente, insurge-se contra a obrigação que lhe é dirigida, pois tal quadro transfere à fornecedora a obrigação de proceder a minucioso levantamento sobre a mencionada irregularidade, de modo a não colocar em dúvida o espírito do consumidor (TJSP ¿ AC XXXXX.95.2009.8.26.0224. Rel Des. Ferreira da Cruz, j. 9/11/2011). (TJSC ¿ AC XXXXX-47.2015.8.24.0090 , Relator: Álvaro Luiz Pereira de Andrade, Data de Julgamento: 29/08/2019, Sétima Câmara de Direito Civil) A conduta do fornecedor afronta claramente as normas estabelecidas nos incisos V e X , do art. 39 , do Código de Defesa do Consumidor , abaixo transcritos, encontrando-se também em rota de colisão com os princípios basilares da confiança e boa-fé contratual, merecendo ser rechaçada pelo Poder Judiciário. Art. 39. É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas: V - exigir do consumidor vantagem manifestamente excessiva; X - elevar sem justa causa o preço de produtos ou serviços. In casu, a Ré NÃO obteve sucesso em desvencilhar-se do ônus de provar fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito afirmado pela parte autora, nos moldes do art. 373 , II , do CPC , uma vez que apresentou defesa frágil, sem comprovar o efetivo de energia pela parte autora. Verifico que o Juízo a quo examinou com acuidade a demanda posta à sua apreciação, tendo cotejado os documentos constantes dos autos, de modo a afastar a tese de improcedência sustentada pela recorrente. Ante o exposto, voto no sentido de CONHECER O PRESENTE RECURSO E NEGAR-LHE PROVIMENTO, mantendo a sentença por seus próprios fundamentos nos termos do artigo 46 da Lei 9.099 /95. Custas e honorários arbitrados em 20% sobre o valor atualizado da condenação pelo recorrente sucumbente. Acaso beneficiário da assistência judiciária gratuita, fica provisoriamente isento. Salvador, data registrada no sistema. Ana Conceição Barbuda Ferreira Juíza Relatora