RECURSO INOMINADO. JUIZADO ESPECIAL CÍVEL. CONSUMIDOR. EFEITO SUSPENSIVO NEGADO. INSTITUIÇÃO BANCÁRIA. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. CARTÃO DE CRÉDITO. QUITAÇÃO DE DÉBITOS DA FATURA. LIMITE DE CHEQUE ESPECIAL. OFENSA AO PRINCÍPIO DA INFORMAÇÃO ( CDC , ARTIGO 6º , INCISO III ). DANO MORAL. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. 1. Trata-se de Recurso Inominado interposto pela parte requerida em face da sentença exarada pelo Juízo do 4º Juizado Especial Cível de Brasília que julgou parcialmente procedente os pedidos contidos na inicial a fim de: a) condenar o Banco réu a pagar para o autor a quantia de R$ 2.000,00 (dois mil reais), a título de danos morais; b) declarar a nulidade da operação efetuada pelo Banco réu em 08/06/2021, ao quitar a dívida do autor no valor de R$ 15.975,34 com a utilização do fundo do cheque especial, determinando ao Banco réu que restaure a dívida que o autor tinha no seu cartão de crédito (R$ 15.975,34 em 10/05/2021), aplicando a partir de então os encargos previstos anteriormente em tal modalidade de crédito (8% ao mês) e cancelando os encargos que foram lançados na conta do autor após a referida data, no importe de R$ 37.919,79 e c) determinar ao Banco réu que registre os depósitos efetuados na conta do autor entre 21/07/2021 e 14/09/2021, no valor de R$ 3.600,00, como pagamento da referida dívida no cartão de crédito. 2. Na origem, o autor ajuizou ação requerendo a declaração de nulidade de débito no valor de R$ 31.997,98, repetição de indébito no valor de R$ 7.200,00 e indenização por danos morais no valor de R$ 9.000,00. O autor informou que é correntista da Instituição Financeira requerida, usufruindo dos serviços bancários para transações comuns, com uso de cartão de crédito com limite de R$ 16.500,00. Afirmou que, em razão de dificuldades financeiras, ficou inadimplente com as dívidas que contraiu por meio do cartão de crédito fornecido pela requerida, no mês de janeiro de 2020, no valor de R$ 1.378,43 e, nos meses seguintes, teve condições de pagar apenas parcialmente as faturas vincendas. Ressaltou que a dívida foi se acumulando, com a aplicação das taxas de cartão de crédito de 8% ao mês, até alcançar R$ 15.975,34 em maio de 2021. Alegou que a partir de junho de 2021, sem sua anuência, foram quitadas as faturas do cartão de crédito, por meio da utilização do limite do cheque especial. Sustentou que o débito do cartão de crédito foi quitado utilizando modalidade com juros que ultrapassam 348% ao ano, fazendo o débito chegar ao valor de R$ 37.919,79, no mês de março de 2022. Aduziu que foi depositado em sua conta corrente nos meses de julho a setembro de 2021, o valor total de R$ 3.600,00, o qual foi automaticamente absorvido para abatimento no montante do débito de cheque especial. Defendeu que todos os dias recebe inúmeras ligações de cobrança, que acontecem a qualquer hora do dia, inclusive, em horário em que as agências bancárias se encontram fechadas e sem atendimento, o que lhe causa transtornos e danos de ordem moral pelos quais busca ser indenizado. 3. Recurso tempestivo e adequado à espécie. Preparo regular (ID XXXXX e ID XXXXX). Foram ofertadas contrarrazões (ID XXXXX). 4. Nos termos do art. 43 da Lei nº 9.099 /95, o recurso terá somente efeito devolutivo, podendo o Juiz dar-lhe efeito suspensivo, para evitar dano irreparável para a parte, não verificado no presente caso. Não está evidenciada a situação excepcional que possa acarretar dano irreparável ou de difícil reparação ao recorrente, uma vez que o pedido de cumprimento provisório da sentença sequer foi apresentado e, se o caso, depende de caução suficiente e idônea o levantamento de eventuais valores (artigo 520 , inciso IV , CPC ). Efeito suspensivo negado. 5. A questão devolvida ao conhecimento desta Turma Recursal consiste na ausência de ato ilícito, em razão da possibilidade de utilização do cheque especial para pagamento de dívida e inexistência de dano moral passível de indenização. Em suas razões recursais, o Banco réu sustentou que a utilização do limite do cheque especial se baseou em previsão contratual válida, inexistindo qualquer ato ilícito nas providências adotadas pelo recorrente. Afirmou que o correntista aderiu aos limites do Crédito Flex no valor de R$16.150,00 quando da abertura da conta NEXT em 06/02/2019. Alegou que por meio do Crédito Flex, o cliente fica livre para utilizar o limite de crédito, que está disponível em sua conta corrente, seja por meio do cheque especial, do crédito pessoal, do cartão de crédito ou do uso conjugado dessas modalidades de crédito. Alegou que o correntista utilizava o cartão de crédito NEXT, porém não depositava o valor em conta NEXT para que o sistema realizasse o pagamento, desta forma, foi utilizado o cheque especial para o pagamento da fatura, destacando tratar-se de procedimento que ocorre de forma automática. Defendeu que a negativação era devida e não poderia, por isso, ter causado algum aborrecimento ou dissabor ao seu titular, de forma que não configurado o dano moral alegado. Aduziu que o valor fixado a título de indenização por danos morais (R$ 2.000,00) mostra-se desarrazoável para o prejuízo sofrido pelo recorrido. Requereu que o recurso fosse provido, a fim de reformar a sentença para julgar improcedentes os pedidos autorais. Subsidiariamente, caso fosse mantida a procedência parcial do pedido, pugnou pela exclusão da indenização por danos morais, ou que fosse minorado o valor fixado, sugerindo-se o valor máximo de R$ 1.000,00 (mil reais). 6. A relação jurídica estabelecida entre as partes é de natureza consumerista, estando as partes inseridas nos conceitos de fornecedor e consumidor previstos no Código de Defesa do Consumidor (arts. 2º e 3º da Lei 8.078 /90). Aplicam-se ao caso em comento as regras de proteção do consumidor, inclusive as pertinentes à responsabilidade objetiva na prestação dos serviços. 7. O dever de informação é preceito basilar do direito do consumidor, devendo o fornecedor prestar informações claras e precisas a respeito dos produtos ou serviços colocados no mercado de consumo. No caso em exame, o fornecedor deixou de atender aos aludidos direitos básicos do consumidor estabelecidos no art. 6º , III do CDC . 8. Na presente demanda, do conjunto probatório juntado aos autos, verifica-se que não constou informação expressa quanto à possibilidade de se utilizar o limite do cheque especial para quitação das faturas do cartão de crédito, no contrato bancário ao qual o correntista aderiu (ID XXXXX até 45051855). Ademais realizar a quitação de fatura de cartão de crédito utilizando o limite do cheque especial, impõe uma onerosidade excessiva ao consumidor, porquanto as taxas de juros contratados para o cartão de crédito são inferiores às do contrato de cheque especial, nos termos do artigo 39 , inciso V , do CDC . Precedente: Acórdão XXXXX, XXXXX20198070016 , Relator: ARNALDO CORRÊA SILVA, Segunda Turma Recursal, data de julgamento: 11/12/2019, publicado no PJe: 22/1/2020. Pág.: Sem Página Cadastrada. 9. Nos termos do inciso VI , do artigo 39 do CDC é vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas, executar serviços sem a prévia elaboração de orçamento e autorização expressa do consumidor, ressalvadas as decorrentes de práticas anteriores entre as partes. Na hipótese, o recorrente não acostou aos autos documento com autorização expressa do consumidor quanto à utilização do limite do cheque especial para quitação das faturas de cartão de crédito, não podendo se extrair tal autorização da previsão contratual contida na cláusula 01, do Termo de Adesão a Produtos e Serviços (ID XXXXX - Pág. 1). 10. Configurada a falha na prestação de serviços, posto que indevidamente e sem autorização expressa do consumidor, o Banco réu promoveu descontos automáticos do limite do cheque especial para pagamento de faturas do cartão de crédito do correntista. A falha na prestação de serviço não importa, por si só, em dano moral passível de indenização, entretanto, nesta demanda, foi apta a ensejar transtornos que ultrapassaram o mero aborrecimento cotidiano. Conforme destacado na sentença, embora existisse dívida pendente de pagamento por parte do autor ao Banco réu, o substancial aumento do valor do débito, em razão da aplicação dos juros referentes ao contrato de cheque especial, além de se revelar conduta abusiva, se mostra capaz de gerar frustração e retirar a paz do requerente que já possuía situação financeira delicada, conforme afirmado na inicial. Tal situação é suficiente a abalar a psique do consumidor e ensejar a reparação a título de danos morais. 11. Para fixação da indenização por danos morais deve ser analisada a gravidade do dano, o nível de reprovação do ato e as condições pessoais e econômicas das partes envolvidas. Deve ser observada a função pedagógico-reparadora da medida, apta a desestimular novos comportamentos semelhantes. O ?quantum debeatur? fixado pelo juízo singular é adequado e proporcional ao ilícito cometido e ao dano sofrido e atende à função pedagógica do instituto em face do porte da fornecedora. 12. Recurso conhecido e não provido. 13. Custas recolhidas. Condenado o recorrente vencido ao pagamento de honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor da condenação, nos termos do art. 55 da Lei 9.099 /95. 14. A súmula de julgamento servirá de acórdão, com fulcro no art. 46 da Lei n.º 9.099 /95.