PENAL. PROCESSUAL PENAL. AGRAVO DE EXECUÇÃO PENAL. RECURSO DEFENSIVO. PLEITO DE REFORMA DA DECISÃO CONCESSÓRIA DE PRISÃO DOMICILIAR CULMINADA COM MONITORAMENTO ELETRÔNICO EM REGIME ABERTO A SER CUMPRIDO PELO AGENTE. PEDIDO PELA RETIRADA DA TORNOZELEIRA ELETRÔNICA. PLEITO CONCEDIDO. PRINCÍPIO DA INDIVIDUALIZAÇÃO DA PENA. INEXISTÊNCIA DE ASPECTOS JUSTIFICADORES DA MANUTENÇÃO DO MONITORAMENTO. BOM COMPORTAMENTO DO AGENTE RECONHECIDO PELO MAGISTRADO. NECESSIDADE DE FUNDAMENTAÇÃO PARA JUSTIFICAR A EXCEPCIONALIDADE DA RESTRIÇÃO. AUSÊNCIA DE PERICULUM LIBERTATIS. RESTRIÇÃO EM DESCONFORMIDADE COM OS PARÂMETROS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. DETERMINAÇÃO PELA RETIRADA DA TORNOZELEIRA ELETRÔNICA. AGRAVO CONHECIDO E PROVIDO. 1. Trata-se de Agravo em Execução interposto por José Marques de Oliveira em desfavor de decisão proferida pelo Juízo da 1ª Vara de Execução Penal da Comarca de Acopiara, que concedeu prisão domiciliar ao apenado sob o cumprimento da fiscalização com o uso da tornozeleira eletrônica. 2. Aduz o agravante que a manutenção do monitoramento eletrônico do apenado no regime aberto não se compatibiliza com as perspectivas esperadas pela progressão para esse regime. Sob o argumento de que esse posicionamento subverte a lógica do cumprimento progressivo de pena previsto na LEP , haja vista seguir o apenado na condição de monitoramento da mesma forma que alguns indivíduos beneficiados com tal aspecto mesmo em regime semiaberto, o requerente dispõe que não há previsão legal para o uso da tornozeleira eletrônica nos casos de regime semiaberto. Alega, ainda, que a continuidade desse instrumento fiscalizatório compromete o principal objetivo do regime aberto, qual seja, a reinserção do apenado na sociedade, pois resta comprometida tal integração com a permanência do sistema segregador da tornozeleira eletrônica. Da mesma forma, reforça a ausência do periculum libertatis, de forma que se conclui pela inadequação da medida. 3. Não obstante a Portaria nº 04/2019, expedida pelo Juízo da 1º Vara de Acopiara, que tem por objetivo uniformizar a situação dos apenados entre si naquela comarca, na qual todos os presos que cumprem pena no regime domiciliar utilizam o monitoramento eletrônico, não se verificam, na decisão do magistrado da Execução Penal, peculiaridades do caso concreto a ensejarem a discricionaridade do juiz no sentido de determinar condições específicas além das dispostas de forma geral e obrigatória em lei, conforme o art. 115 da LEP . 4. A Constituição Federal , em seu art. 5º , inciso XLVI , consagra a individualização da pena como direito fundamental do indivíduo, de modo que a pena deve ser individualizada nos planos legislativo, judiciário e executório, evitando-se a padronização da sanção penal, haja vista esta variar de acordo com as circunstâncias de cada caso concreto. 5. Não são demonstradas razões, no caso concreto, a justificarem a aplicação do monitoramento eletrônico, mesmo em prisão domiciliar no regime aberto. O juiz limita-se a fundamentar a referida restrição à Portaria expedida e aplicada à Comarca de Acopiara, sem mencionar eventuais peculiaridades do cenário factual que ensejem tal medida, o que fere o princípio da individualização da pena, vez que se aplica uma condição a todos os apenados em situações executórias semelhantes sem, em contrapartida, analisar os pormenores do processo de cada agente. 6. Nessa seara, a imposição do uso de tornozeleira eletrônica no caso em questão demonstra-se como uma medida exagerada, que obsta a progressiva da reintegração do apenado em sociedade. Ferindo a individualização da pena, haja vista inexistir motivos para a determinação de tal restrição, a vigilância eletrônica, nesse caso, acaba por desrespeitar à dignidade da pessoa a que está submetida a tal observação. 7. O art. 36 do Código Penal aponta ser o regime aberto baseado na autodisciplina e senso de responsabilidade do condenado, de modo que permite, fora do estabelecimento e sem vigilância, o trabalho, a frequência em curso ou o exercício de atividades autorizadas por parte do apenado. Nesse diapasão, se o magistrado possibilitou tal conjuntura ao agente, considerando o comportamento que não impede o benefício à progressão de regime, não se configura coerente a imposição de medidas que mitiguem a formação da autodisciplina e do senso de responsabilidade do apenado. 8. Há entendimento nas Cortes Superiores que se posicionam no sentido de inexistir ilegalidade na monitoração eletrônica junto à prisão domiciliar no regime aberto a ser cumprido pelo agente, vez que a possibilidade de recolhimento domiciliar configura-se medida alternativa às hipóteses em que se verifica a ausência de vaga em casas de albergado ou outros estabelecimentos adequados, sendo o monitoramento eletrônico um meio a mais para auxiliar na fiscalização da execução da pena. Todavia, como também é possível denotar-se, a imposição da referida restrição afigura-se como medida excepcional a ser justificada a depender das circunstâncias do caso concreto. Precedentes 9. Ademais, a tornozeleira eletrônica materializa-se como medida cautelar, subsistindo-se tão somente quando presentes os requisitos inerentes à aplicação de eventuais restrições, quais sejam, o fumus comissi delicti e o periculum libertatis. Ausentes estes aspectos, a medida de monitoração pode ser revogada, consoante o art. 146-D da Lei de Execução Penal . 10. Portanto, a medida de imposição da monitoração eletrônica encontra-se em desconformidade com os parâmetros da razoabilidade, da proporcionalidade e da adequação, vislumbrando-se, no caso em questão, uma incompatibilidade da restrição imposta com o regime ao qual está submetido o apenado. 11. Recurso conhecido e provido. ACÓRDÃO: Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Desembargadores da 1ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, por unanimidade, em conhecer do Agravo em Execução interposto para dar-lhe provimento, determinando a retirada da tornozeleira eletrônica do apenado, tudo nos termos do voto da relatora. Fortaleza, 16 de agosto de 2022. DESEMBARGADORA LÍGIA ANDRADE DE ALENCAR MAGALHÃES Relatora