PROCESSO Nº XXXXX-44.2019.8.05.0256 ÓRGÃO: 1ª TURMA RECURSAL DO SISTEMA DOS JUIZADOS CLASSE: RECURSO INOMINADO RECORRENTE: JULIANA SILVA TRINDADE ADVOGADO: JULIANA SILVA TRINDADE RECORRIDO: ENJOEI ADVOGADO: ANA LAURA MORENO GALESCO ORIGEM: 2ª Vara do Sistema Juizados - Teixeira de Freitas RELATORA: JUÍZA NICIA OLGA ANDRADE DE SOUZA DANTAS JUIZADO ESPECIAL. DIREITO DO CONSUMIDOR. RECURSO INOMINADO. OFERTA DE BLAZER COM FRETE GRÁTIS. COBRANÇA DO FRETE NO MOMENTO DA SOLICITAÇÃO DE DEVOLUÇÃO DO PRODUTO. BOA FÉ DO CONSUMIDOR QUE SE VISLUMBRA. DOCUMENTOS QUE COMPROVAM O DESCUMPRIMENTO DA OFERTA. VÍCIO DO SERVIÇO. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA VINCULAÇÃO DA OFERTA. ART. 30 DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR . DANOS MORAIS IN RE IPSA CONFIGURADOS E ARBITRADOS EM R$ 3.000,00. 1. O fornecedor deve observar os requisitos do art. 20 , do CDC , sendo de sua responsabilidade a prova inequívoca da perfeita execução do serviço contratado. Não pode, portanto, prestar serviços sem a necessária segurança, sob pena de se caracterizar vício do serviço, cuja responsabilidade pela reparação independe de culpa, como reza o art. 14 , do CDC . 2. A inesperada cobrança do valor do frete no momento da devolução do produto, viola o Princípio da Vinculação da Oferta, previsto no art. 30 do Código de Defesa do Consumidor , e implica em quebra do princípio da boa-fé e da confiança, gerando direito a indenização por danos morais em valor suficiente a inibir a repetição da conduta lesiva. 4. No caso dos autos o autor acostou ao evento 01 prints da tela do site e comprovante de pagamento comprovando que o produto foi ofertado com frete grátis, contudo, foi cobrado acrescido com o valor do frete quando tentou realizar a devolução 4. Arbitra-se o quantum indenizatório em R$ 3.000,00 (três mil reais) adequado para a reparação do dano suportado pelo consumidor. RECURSO PROVIDO. SENTENÇA REFORMADA. RELATÓRIO Trata-se de AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS decorrente de compra realizada junto ao site da Promovida, com frete grátis, que teria sido cobrado no momento da devolução de um dos produtos adquiridos. Requer (i) restituição integral da quantia paga pelo produto, de R$ 64,57 (sessenta e quatro reais e cinquenta e sete centavos) com disponibilidade de autorização de postagem para devolução, (ii) indenização por danos morais na quantia de R$ 8.000,00 (oito mil reais), além de inversão do ônus da prova. A Promovida apresentou contestação (evento 9) alegando que a cobrança do frete padrão na devolução do produto está prevista nos termos e condições do site, condições aceitas pela parte Autora; que a Autora se beneficiou do frete promocional na compra, aceitando os termos; que não encaminhou o produto no prazo de 7 dias; ausência de danos a reparar. A sentença a quo julgou o pedido procedente condenando a acionada a ressarcir a quantia de R$ 64,57 (sessenta e quatro reais e cinquenta e sete centavos) e indeferiu danos morais. Insatisfeita, recorreu a parte autora. Foram ofertadas contrarrazões. VOTO A inesperada cobrança do valor do frete no momento da devolução do produto, viola o Princípio da Vinculação da Oferta, previsto no art. 30 do Código de Defesa do Consumidor , e implica em quebra do princípio da boa-fé e da confiança, gerando direito a indenização por danos morais em valor suficiente a inibir a repetição da conduta lesiva. No caso dos autos o autor acostou ao evento 01 prints da tela do site e comprovante de pagamento comprovando que o produto foi ofertado com frete grátis, contudo, foi cobrado acrescido com o valor do frete quando tentou realizar a devolução Como se sabe, conforme estabelece a Lei 8.078 /1990, os serviços devem ser prestados de forma a satisfazer a legítima expectativa do consumidor, com presteza, qualidade, confiança e assunção de responsabilidades no caso de danos. O sistema do CDC estabeleceu a garantia de adequação (mais do que a garantia de vícios redibitórios), de forma intrínseca ao produto ou serviço, tendo como desígnio sua funcionalidade e adequação. Descumprido este dever, é quebrada a relação de confiança entre as partes. Com a inadequação do produto ou serviço aos fins que deles se esperam, surgirá a obrigação de reparar os danos decorrentes. Assim, torna-se exigível que o serviço seja minuciosamente testado para que não venha a apresentar vícios que o tornem inadequado para o fim a que se destina, sob pena de se responsabilizar objetivamente os fornecedores. Abusiva, portanto, a conduta da ré, que não prestou adequadamente os serviços contratados pelo consumidor. Neste sentido, arca com as consequências jurídicas da má prestação do serviço, e a apuração da responsabilidade se dá, levando-se em consideração alguns pressupostos, dentre os quais sublinhamos a objetividade da reparação e a vulnerabilidade técnica, jurídica e econômica do consumidor. Dos danos morais. A doutrina e a jurisprudência estão apoiadas na assertiva de que o prejuízo imaterial é uma decorrência natural (lógica) da própria violação do direito da personalidade ou da prática do ato ilícito. Assim, o dano moral é in re ipsa, ou seja, deriva inexoravelmente do próprio fato ofensivo, de modo que, provada a ofensa, está demonstrado o dano moral1. Em outras palavras, o dano moral in re ipsa se configura quando é desnecessária a comprovação do direito, pois este se presume existente em virtude da ocorrência de determinado fato, a exemplo, como o ocorrido. Citam-se arestos nesse sentido: RESPONSABILIDADE CIVIL. CONSUMIDOR. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. ABORDAGEM CONSTRANGEDORA E REVISTA NA PRESENÇA DE OUTROS CONSUMIDORES. DANO MORAL CONFIGURADO. MAJORAÇÃO DO QUANTUM ANTE AS PECULIARIDADES DO CASO CONCRETO. Aduz a autora, que ao sair da loja requerida, o alarme antifurto disparou, oportunidade na qual os funcionários a abordaram, a levaram próximo ao caixa e começaram a revistá-la. Informou que tal situação só terminou quando outro funcionário informou que estavam trocando o sistema de segurança, havendo falha das operadoras do caixa por não retirarem devidamente as etiquetas das roupas. Discorreu sobre os danos morais suportados, a dor, a humilhação e o vexame de ser exposta na loja como uma ladra. A requerida salientou que nenhuma abordagem violenta ou vexatória foi realizada em relação à autora e esclareceu que o procedimento de praxe, nestas circunstâncias, é encaminhar o cliente ao caixa e conferir a nota fiscal. Todavia, pela declaração da testemunha arrolada pela autora, verifica-se a verossimilhança com as alegações postas na inicial. Restou evidente que os prepostos da requerida revistaram as roupas, o casaco e a bolsa da autora na presença de outros consumidores. As alegações genéricas da requerida quanto à inexistência de agressões físicas ou verbais não afastam o dever de indenização pelos transtornos causados. Os danos morais, no presente caso, decorrem da própria situação constrangedora que a autora foi obrigada a suportar, por culpa exclusiva da ré, que não agiu de forma a minimizar o constrangimento da cliente. Portanto, correta a sentença no ponto em que reconheceu a ocorrência de danos morais a serem indenizados. No entanto, o quantum arbitrado pelo Juízo de origem está muito inferior aos parâmetros adotados em casos semelhantes e não será capaz de confortar a autora pelos transtornos sofridos, bem como não será suficiente para impedir que a ré pratique novamente as mesmas condutas. Assim, perfeitamente cabível no caso em apreço a majoração dos danos morais para o montante de R$ 2.500,00. RECURSO DA AUTORA PROVIDO E CONSEQUENTEMENTE, IMPROVIDO O RECURSO DA REQUERIDA. ( Recurso Cível Nº 71004788055 , Quarta Turma Recursal Cível, Turmas Recursais, Relator: Glaucia Dipp Dreher, Julgado em 25/04/2014) RESPONSABILIDADE CIVIL. CONSUMIDOR. ABORDAGEM CONSTRANGEDORA POR FUNCIONÁRIO DO ESTABELECIMENTO COMERCIAL DEMANDADO. SITUAÇÃO DE ABALO MORAL VERIFICADA. DEVER DE INDENIZAR RECONHECIDO. QUANTUM INDENIZATÓRIO MANTIDO EM R$ 3.000,00 (TRÊS MIL REAIS). NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO. UNÂNIME. ( Recurso Cível Nº 71005287651 , Quarta Turma Recursal Cível, Turmas Recursais, Relator: Léo Romi Pilau Júnior, Julgado em 27/03/2015) A lei não prevê critérios para o arbitramento da indenização por danos morais. A doutrina e a jurisprudência vêm fixando determinados aspectos a servirem de parâmetro: a gravidade do dano cometido, o grau de culpa do agente, a capacidade econômica das partes, a função punitiva da indenização, seu caráter pedagógico e as consequências dos danos na personalidade do sujeito de direito. Portanto, a definição do valor fica, em última análise, a critério do Magistrado, que deverá decidir evitando o subjetivismo, sempre atento às peculiaridades do caso concreto, que auxiliam a garantia ao ofendido do direito de receber um valor que compense a lesão e as perdas sofridas, principalmente observando a leniência dos fornecedores quanto à natureza dos postulados normativos o Código de Defesa do Consumidor . O seu valor deve ser suficiente para coibir a conduta abusiva e moderado a ponto de gerar satisfação compensatória no destinatário da indenização, como se constata dos precedentes jurisprudenciais: AgRg-AREsp XXXXX/MS , Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, 3ª Turma, Julgado em 25.03.2014, DJe 31.03.2014; AgRg-REsp XXXXX/CE , Rel. Min. Herman Benjamin, 2ª Turma, Julgado em 20.03.2014, DJe 27.03.2014; AgRg-REsp XXXXX/RJ , Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, 1ª Turma, Julgado em 25.02.2014, DJe 10.03.2014; REsp XXXXX/SP , Rel. Min. Mauro Campbell Marques, 2ª Turma, J. em 04.06.2009, DJe 23.06.2009. Nesse sentido, há que se atentar que a lesão de ordem moral é, em essência, incomensurável, porém, deve o magistrado avaliar a intensidade do sofrimento da vítima em face da gravidade do dano e considerar a personalidade e o grau do poder econômico do ofensor ante a conjuntura do país. Só assim, poder-se-á estabelecer o valor da indenização dentro da razoabilidade e equidade, evitando-se uma situação de exorbitância que represente perigo de ruína financeira do devedor, ou que, por outro lado, fixe valor tão irrisório que a pena deixará de cumprir com seu caráter pedagógico. A quantia de R$3.000.00 (três mil reais), relativa aos danos morais experimentados pela parte, se mostra justa e adequada pois fixada em observância aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, sendo suficiente para reparar dano, como se extrai do art. 944 , caput do Código Civil , observando, ainda, a peculiaridade de cada caso. Diante do quanto exposto, VOTO no sentido de DAR PROVIMENTO AO RECURSO PARA REFORMAR A SENTENÇA condenando a parte acionada ao pagamento do valor de R$3.000.00 (três mil reais) a título de danos morais, acrescido de juros de 1% desde a citação e correção monetária desde o arbitramento. Sem custas e honorários. NICIA OLGA ANDRADE DE SOUZA DANTAS Juíza Relatora 1 http://www.stj.gov.br/portal_stj/publicacao/engine.wsp?tmp.area=398&tmp.texto=106255#.