HABEAS CORPUS. PENAL E PROCESSUAL PENAL. ART. 121 , § 1º , I E IV, DO CÓDIGO PENAL . PRISÃO PREVENTIVA. EXCESSO DE PRAZO NA CUSTÓDIA PROVISÓRIA QUE PERDURA POR MAIS DE 04 ANOS E MEIO SEM A FORMAÇÃO DA CULPA. MOTIVOS DA DEMORA NÃO ATRIBUÍVEIS À DEFESA. EXCESSO DE PRAZO CONFIGURADO. MITIGAÇÃO DAS SÚMULAS 21 DO STJ E SÚMULA 63 DO TJCE. CIRCUNSTÂNCIAS FÁTICAS INDICANDO A SUJEIÇÃO DO PACIENTE A MEDIDAS CAUTELARES MENOS GRAVOSAS. ORDEM CONHECIDA E CONCEDIDA. #BNMP 1. Trata-se de habeas corpus, com pedido de liminar, impetrado em favor de VALDINEY DA SILVA HOLANDA contra ato do Juiz de Direito da Vara Única Criminal da Comarca de Eusébio. Segundo a inicial, fls. 01/09, o paciente foi preso pela prática, em tese, do delito descrito no art. 121 , parágrafo 2º , incisos I e IV , do Código Penal . 2. Em síntese, busca-se com a presente ação mandamental a revogação da prisão preventiva, ao argumento de que existe excesso de prazo para a formação da culpa, uma vez que o paciente se encontra preso preventivamente há mais de quatro anos, sem expectativa de ser submetido ao julgamento do Júri em data breve. 3. Desde logo, é importante destacar que o paciente responde a outras duas ações penais em andamento, ambas versando sobre homicídio. Além disso, registra uma condenação definitiva pela prática do crime de roubo, atraindo a aplicação do entendimento consagrado na Súmula nº 63/TJCE: ¿Condenações criminais em outros processos podem, excepcionalmente, justificar a manutenção da prisão preventiva, ainda que reconhecido o excesso de prazo na formação da culpa, em razão da aplicação do princípio da proibição deficiente do Estado, vertente da proporcionalidade¿. 4. Acrescente-se que, com a prolação da sentença de pronúncia nos autos da ação penal nº XXXXX-49.2014.8.06.0075 , torna-se aplicável o entendimento consolidado na Súmula nº 21/STJ, segundo a qual: "Pronunciado o réu, fica superada a alegação do constrangimento ilegal da prisão por excesso de prazo na instrução". 5. Diante desse cenário, parece-me que o ponto focal da controvérsia reside na possibilidade de mitigação casuística das Súmulas nº 63/TJCE e nº 21/STJ; se as particularidades fáticas e processuais justificam, ou não, o afastamento dos referidos entendimentos sumulados. Fixadas essas premissas, convém salientar que o postulado da razoável duração do processo se projeta para além do plano aritmético, devendo ser compreendido sob o prisma da proporcionalidade, observadas as especificidades do caso concreto. 6. Compulsando os autos primevos, verifico que o feito primeiramente dormitou por mais de dois anos, em razão da demora para o julgamento do Recurso em Sentido Estrito. Após o indeferimento do recurso, ficou paralisado por dois anos e oito meses, sem que o Juízo de Primeiro Grau justificasse tamanha demora para o julgamento do Júri Popular. Diante desse ritmo de desenvolvimento, e tendo em vista que a defesa não concorreu para os hiatos processuais em questão, claro está que o paciente se encontra à mercê de um processo demasiadamente prolongado, no qual a morosidade foi a tônica. 7. Oportuno pontuar que a sentença que pronunciou o paciente e manteve sua segregação cautelar foi proferida no dia 17/01/2018. Todavia, em consulta ao SAJPG, não é possível identificar a data inicial da prisão preventiva em comento, pois o correspondente decreto prisional não foi juntado aos autos digitalizados (o processo tramitou inicialmente em autos físicos), dificultando uma aferição exata do tempo transcorrido desde a decretação da prisão preventiva nos autos da ação penal nº XXXXX-49.2014.8.06.0075 , objeto desta impetração. 8. Sob esse enfoque, merece relevo a certidão de fl. 291 (autos nº XXXXX-49.2014.8.06.0075 ), lavrada no dia 02/02/2024, informando que o paciente se encontra recolhido na UP-Aquiraz, com data de entrada em 17/01/2020. Dessa forma, tem-se que o paciente se encontra custodiado há, pelo menos, quatro anos e três meses. Todavia, a se considerar a data da sentença que o pronunciou paciente e manteve sua segregação cautelar, é possível que ele esteja preso por período bem maior. 9. Nesse contexto, a continuidade da prisão preventiva traduz inequívoco constrangimento ilegal, por violação à razoável duração do processo. 10. É certo que não se está diante de um caso trivial, porquanto destinado a apurar crime de homicídio praticado em concurso de agentes, envolvendo paciente que responde a outras ações penais em andamento (que também versam sobre homicídio) e registra uma condenação definitiva pelo crime de roubo. Todavia, apesar de a ação penal recair sobre três acusados (tendo um deles sido impronunciado), observo, em análise apurada, que a complexidade do caso não destoa do usual e não justifica dilação temporal tão anômala. 11. Ademais, não se pode ignorar que a razoável duração do processo constitui garantia individual, prevista na Constituição, impondo celeridade e vedando procrastinações injustificadas no processo. Tal garantia se reflete, igualmente, na custódia preventiva, impondo que esta não se estenda indevidamente. 12. Fixadas essas premissas, é forçoso concluir que, no presente caso, a duração da prisão preventiva e a delonga da ação penal ultrapassam largamente os parâmetros de celeridade adotados por esta Corte de Justiça em casos semelhantes, revestindo-se de excepcionalidade suficiente para mitigar a aplicação das Súmulas nº 63/TJCE e nº 21/STJ. 13. Assim, muito embora a gravidade concreta do delito e o histórico criminal do paciente sinalizem a necessidade de mantê-lo segregado, há de se reconhecer que a medida extrema não pode perdurar indefinidamente, dada a sua finalidade processual, e não sancionatória, pois não opera juízo de certeza acerca da responsabilidade penal do paciente, que se encontra preso há, pelo menos, 04 anos e 03 meses, em razão de um processo excessivamente moroso, sem perspectiva de designação da Sessão do Júri para data breve. 14. Em suma: a tutela ad cautelam da ordem pública, ainda que justificada pela periculosidade do paciente, não pode legitimar um sacrifício desmedido e irrazóavel do seu status libertatis. 15. Esclareça-se que a revogação da prisão preventiva não pressupõe a concessão de liberdade irrestrita ao paciente, cuja periculosidade recomenda a aplicação de medidas cautelares diversas, que asseguram a ordem pública e a instrução criminal com o rigor necessário, podendo ser substituídas por nova prisão preventiva caso sejam descumpridas. 16. Ordem conhecida e concedida.#BNMP ACÓRDÃO: Vistos, relatados e discutidos estes autos, acorda a 3ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, em conhecer do writ para conceder a ordem de liberdade, com aplicação das seguintes medidas cautelares: I ¿ comparecimento periódico em juízo, no prazo e nas condições fixadas pelo juiz, para informar e justificar atividades; IV ¿ proibição de ausentar-se da Comarca quando a permanência seja conveniente ou necessária para a investigação ou instrução; V ¿ recolhimento domiciliar no período noturno e nos dias de folga quando o investigado ou acusado tenha residência e trabalho fixos; IX ¿ monitoração eletrônica. Fortaleza, 14 de maio de 2024 DESEMBARGADORA ROSILENE FERREIRA FACUNDO Relatora