TJ-GO - XXXXX20218090051
ementa lançados no evento nº 225 não correspondem ao presente feito. Assim, faço constar no arquivo em anexo o voto e acórdão correto que corresponde ao resultado da votação expresso no extrato da ata de julgamento: "DECISÃO: RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO, A UNANIMIDADE, NOS TERMOS DO VOTO DO RELATOR." Por conseguinte, o prazo de recursal será reiniciado. Intimem-se. Cumpra-se. Goiânia, datado e assinado eletronicamente. Fernando Moreira Gonçalves Juiz de Direito Relator PODER JUDICIÁRIO 1ª TURMA RECURSAL DOS JUIZADOS ESPECIAIS Avenida Olinda com Avenida PL-3, Qd. G, Lt. 04, Parque Lozandes, Goiânia-GO ? A-2 6230186994 gab1recursaljuiz1@tjgo.jus.br Processo nº: XXXXX-68.2021.8.09.0051 Natureza: Recurso Inominado Origem: 6º Juizado Especial Cível ? Goiânia/GO Recorrente (s): Etir Antonelli, Waldomiro Antonelli e Vilmar Antonelli Advogado (a)(s): Yssao Yamaguchi Ribeiro Recorrido (a)(s): Jhonata Rodrigo dos Reis Advogado (a)(s): Guilherme Correia Evaristo Relator: Fernando Moreira Gonçalves EMENTA: RECURSO INOMINADO. JUIZADO ESPECIAL CÍVEL. AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL C/C DEVOLUÇÃO DE QUANTIAS PAGAS C/C TUTELA ANTECIPADA E DANO MORAL E MATERIAL. CONTRATO DE COMPRA E VENDA DE DIREITO DE USO E FRUIÇÃO DE LOJA EM CENTRO COMERCIAL. CARACTERIZAÇÃO DO EMPREENDIMENTO COMERCIAL COMO SHOPPING CENTER. CESSÃO DE DIREITO DE USO DA INFRAESTRUTURA TÉCNICA. RESTITUIÇÃO DOS VALORES DESPENDIDOS A TÍTULO DE ?RES SPERATA?. INSUCESSO DO EMPREENDIMENTO. RESTITUIÇÃO PARCIALMENTE DEVIDA. UTILIZAÇÃO DO BEM POR CINCO ANOS. SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. 1. Admissibilidade. O recurso é adequado. A intimação do decisum em embargos de declaração fora efetivada em 31/01/2023 (eventos 201, 202 e 203). O recurso inominado fora tempestivamente interposto em 13/02/2023 (evento 207), com deferimento do benefício da gratuidade da justiça (evento 212). Contrarrazões apresentadas no evento 210. Satisfeitos os pressupostos recursais, deve ser conhecido o recurso. 2. Exordial. Narra na inicial que no dia 28/11/2018 o autor firmou com os requeridos Contrato de Compra e Venda de Res Sperata de Direito de Uso e Fruição de Loja no Centro de Compras Noroeste, por meio do qual adquiriu o direito de uso e fruição, pelo período de 10 (dez) anos, da Loja Comercial nº 175 e 176, de m² no Centro de Compras Noroeste, pelo valor total de R$ 23.000,00 (vinte e três mil reais). Afirma que as negociações que antecederam a concretização do negócio foram prometidas pelos requeridos, o qual, por ocasião da apresentação das ofertas, garantiu ao autor que: a) o próprio empreendimento seria responsável pela locação e administração da sala comercial, cujo valor do aluguel poderia variar entre R$ 900,00 a R$ 1.500,00 por mês; b) a entrega da sala se daria em até 03 (três) meses após a assinatura do contrato; c) o empreendimento contaria com a implantação de atrativos (lojas âncora), tais como, VaptVupt, lanchonetes, Agência Lotérica e bancos; d) os clientes poderiam contar com a comodidade de um estacionamento ao lado do empreendimento. Informa que em razão disso, especialmente da promessa de que o próprio empreendimento realizaria a locação e administração das salas comerciais, garantindo retorno certo aos compradores, acreditando na boa-fé dos requeridos, dispôs de suas reservas financeiras e fechou o negócio. Alega que nenhuma das ofertas fora cumprida. A sala comercial, por exemplo, demorou a ser entregue, assim extrapolando os prazos do contrato. Além disso, o próprio empreendimento ainda não foi inaugurado oficialmente. Ressalta que os pouquíssimos lojistas que já se encontram trabalhando no local têm reclamado da falta de estrutura, da total falta de atrativos e dos prejuízos financeiros que vem tendo em decorrência disso. Informa ainda que no dia 02/05/2019 não apareceu mais ninguém para trabalhar junto ao condomínio, e que as portas do empreendimento estavam fechadas. Alega que o pessoal de limpeza e segurança estão sem receber há mais de 03 (três) meses e que não estão indo trabalhar. Ademais as contas de energia e água estão atrasadas e os lojistas estão fazendo ?vaquinhas? para continuar operando no estabelecimento. Por fim, destaca que diversos outros compradores se encontram na mesma situação: adquiriram uma sala no Centro Comercial Noroeste, atraídos pelas mesmas promessas e, agora, estão sendo cobrados e ameaçados a perder seu direito e todos os valores investidos. Assim, afirma que não restou alternativa a não ser recorrer à Justiça, com a finalidade de obter a justa rescisão contratual, com a devida restituição das importâncias pagas, considerando que os requeridos não cumpriram com suas ofertas, não instalaram as lojas âncoras no empreendimento, entregam as salas com atraso e não possuem nenhuma disposição para resolver a questão amigavelmente. Pugna, liminarmente, pela suspensão da cobrança de condomínio, a suspensão na inserção nos órgãos de proteção, a manutenção da posse do imóvel e a autorização de restrição de imóveis para garantia do recebimento da indenização. No mérito, requer seja julgado procedente o pedido de indenização por danos morais, e seja a parte requerida condenada ao pagamento de indenização no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais). Requer também a restituição do valor de R$ 23.000,00 (vinte e três mil reais) com correção e juros da data do contrato; bem como, a inversão do ônus da prova com base no art. 6º , VII do CDC . 3. Contestação ? evento 99. A parte promovida alegara, preliminarmente, irregularidades na representação, informando que o patrono do autor encontra-se suspenso na OAB/GO; a inexistência ou nulidade da citação; a inépcia da inicial, tendo em vista as contradições na peça inicial; a ilegitimidade do casal Antonelli, já que não houve participação de Etir e Maria Luiza nos contratos; a falta de interesse de agir e a falta de pagamento das custas finais em outra ação ajuizada com a mesma petição em que não compareceu à audiência de conciliação e foi condenado nas custas finais. No mérito alegara que as alegações são mentirosas, já que o contrato é diferente do que afirma a inicial. Afirma que não existe participação ou benefício a Etir Antonelli e Maria Luiza Antonelli nos negócios com o Autor. Quanto as alegações de promessas feitas e não cumpridas, afirma que foram cumpridas. Ademais, alega que a parte autora encontra-se inadimplente há anos, não havendo direito de exigir o cumprimento das obrigações pendentes, assumidas pelo empreendimento. Defende a não aplicabilidade do CDC , por não se tratar de relação de consumo. Por fim, impugnou os documentos juntados pelo autor e formulou pedido contraposto para condenar o Autor a pagar o débito comprovado no valor de R$ 48.480,00 (quarenta e oito mil e quatrocentos e oitenta reais) devido ao valor de alçada dos Juizados Especiais; e a rescisão do contrato por inadimplência contumaz, e o direito de imitir-se na posse, como de fato já o fizeram diante do abandono da sala pelo Autor, e de alugar a sala antes pertencente a parte autora. 4. Impugnação à contestação ? evento 109. A parte autora reitera os termos da inicial, rechaçando os argumentos da contestação e requer, ainda, a condenação dos reclamados por litigância de má fé, tendo em vista que alteraram a verdade dos fatos, tentaram induzir o juízo em erro e pleitearam benefícios que sabidamente não tem direito. Pugna pela devolução do valor pago conforme na inicial, condenando todos os requeridos como solidários no presente empreendimento. 5. Sentença ? evento 183. Prolatada pelo MM. Juiz de Direito do 6º Juizado Especial Cível da Comarca de Goiânia/GO, Dr. Vanderlei Caires Pinheiro, que julgou parcialmente procedentes os pedidos inicias para declarar a rescisão do contrato, sem ônus para o requerente; condenar a parte ré solidariamente ao pagamento de indenização pelos danos materiais, no valor total de R$ 23.000,00 (vinte e três mil reais), cujo valor deverá ser atualizado monetariamente pelo INPC, desde a data do desembolso acrescidos de juros de mora 1% ao mês, a partir da data da citação. Indeferiu o pedido de danos morais, bem como julgou improcedente o pedido contraposto. 6. Embargos de Declaração. Opostos pela parte requerida no evento 194 e rejeitados no evento 199. 7. Recurso Inominado ? evento 207. Inconformada a parte requerida interpusera recurso inominado. Repisara os argumentos da defesa, ressaltando que a sentença é extra petita, tendo em vista que não houve pedido de rescisão contratual. Alega que a sentença é teratológica. Afirma também que há contradição em relação à publicidade e às provas e que as provas emprestadas não podem ser usadas, pois configura-se cerceamento de defesa, e julgamento extra petita. Informa que quem descumpriu primeiro o contrato foi o autor, que não fez funcionar sua loja e que foram ignoradas as provas juntadas pela defesa. Destaca que o autor já comprou sua loja com o empreendimento em funcionamento, e tudo que foi planejado para o local, já estava lá. Pugna pelo conhecimento e provimento do presente recurso, a fim de reformar a sentença extra petita, pois não há pedido de rescisão na inicial. Requer a rejeição da prova emprestada usada de ofício, pois esses réus nem são partes naqueles processos, e o autor deste processo já comprou a loja como empreendimento em pleno funcionamento, diferenciando seu caso dos outros, conforme seu contrato e vários outros detalhes; o julgamento dos pontos omissos; o reconhecimento de que a sentença é teratológica, e sua reforma, pois o contrato apresentado pelo autor diz que ele comprou a res esperata com o empreendimento em pleno funcionamento (item III-PRAZOS do contrato), e ele é quem tinha o prazo de 45 dias para abrir sua loja, o que não cumpriu; a reforma também porque as declarações com relação à não publicidade do empreendimento, e os demais descumprimentos alegados não se justificam, e as provas nos autos são contrárias a isso; a reforma da decisão pois houve cerceamento de defesa ao ignorar as provas jungidas, não julgar o pedido de exibição de documentos, contradizer o contrato res esperata do autor, e não possibilitar a audiência de instrução e nem a produção de outras provas; a reforma, pois houve descumprimento de preceitos e princípios constitucionais, ampla defesa e contraditório, art. 5º , LV da CF , cerceando a defesa em nome do direito do magistrado de escolher quais provas produzir, ou de não realizar a instrução. Por fim, que seja o processo julgado conforme a contestação apresentada no evento 99. 8. Contrarrazões ? evento 210. A parte recorrida defendera a manutenção da sentença repisando os argumentos tecidos durante a instrução processual. 9. Fundamentos do reexame 9.1. Inicialmente, cumpre mencionar que Shopping Center é um empreendimento caracterizado por um planejamento mercadológico que envolve a distribuição do espaço e a definição de ramos de atividades, com organização de ações publicitárias e promocionais conjuntas. Desta forma, o empreendimento Centro de Compras Noroeste pode ser classificado como tal. 9.2. Insta salientar, por oportuno que o objeto contratual encontra tratamento específico na Lei nº 8.245 /1991, uma vez que o contrato celebrado entre as partes releva que a parte autora adquiriu o direito de uso e fruição de loja para o desenvolvimento de atividade comercial, emergindo, daí, uma relação empresarial entre as partes, e não consumerista, além do fato de que a circunstância fática ? devolução de res sperata ? enquadra-se na lei do inquilinato , o que afasta a incidência do Código de Defesa do Consumidor . Nesse ínterim, a relação existente entre as partes é de natureza civil, e não de consumo. 9.3. A cessão de uso da estrutura técnica avençada entre as partes é denominada de res sperata, luvas ou cessão de direito de uso, que consiste na retribuição referente às vantagens do lojista instalar-se no complexo comercial, sendo lícita sua cobrança em face da autonomia da vontade reconhecida pelo artigo 54 da Lei nº 8.245 /1991. 9.4. É firmado na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça que a res sperata é legal e pode ser cobrada no primeiro vínculo contratual, havendo ilegalidade apenas se cobrada para a renovação. Nesse sentido: ?Com a vigente Lei do Inquilinato , não há mais vedação quanto à exigência de luvas tratando-se de contrato inicial. A proibição existe apenas no caso de renovação do ajuste. É o que se conclui do seu art. 45, que tem por nulas, entre outras, as cláusulas que afastem o direito à renovação, na hipótese do art. 51, ou que imponham obrigações pecuniárias para tanto. Sabe-se que, no direito privado, é lícito tudo o que a lei não proíbe (ao contrário do direito público, em que é lícito somente o que a lei autoriza) de modo que se tem, com segura conclusão, que é admitida a cobrança de luvas na primeira contratação da locação não residencial.? ( REsp XXXXX/RJ , Ministro Arnaldo Esteves Lima, DJE de 02/02/2009). 9.5. O valor pago a título de luvas não é passível de devolução quando do rompimento do vínculo locatício, salvo se comprovado que a frustração da res sperata se deu por culpa do empreendedor do shopping, na medida em que o pagamento tem como causa subjacente a reserva feita pelo lojista interessado em participar do empreendimento. Confira-se, nesse sentido, o excerto seguinte precedente: ?A res sperata tem por função remunerar o locador empreendedor pelos custos com a formação do fundo de empresa do shopping center, sendo inviável a restituição do valor quando findo o contrato de locação (AC n. 2002.012858-4, Desa. Maria do Rocio Luz Santa Ritta)? (TJSC ? Apelação Cível n. 2003.025061-1 ? Rel. Des. Luiz Cézar Medeiros ? julgado em 13/07/2006). 9.6. Adentrando ao caso, verifica-se que uma controvérsia gira em torno da alegação da parte autora de que os Recorrentes, não teriam cumprido a publicidade veiculada, mais precisamente quanto a instalação de atrativos (lojas âncoras), construção de grande estacionamento, possibilidade de locação da unidade por valor mensal entre R$ 900,00 (novecentos reais) e R$ 1.500,00 (mil e quinhentos reais), além da entrega do espaço em 03 (três) meses. 9.7. Da prova emprestada colhida dos autos nº 5307882.06, tem-se que o empreendimento não teve a adesão planejada pelos empreendedores, o que inviabilizou o cumprimento das promessas feitas à parte autora. Com efeito, restou claro que o empreendimento não atraiu os investimentos planejados e que seus empreendedores não lograram a instalação das lojas âncoras com possibilidade para atrair clientela e sequer houve o lançamento oficial do empreendimento. 9.8. Acrescenta-se que o contrato foi firmado entre as partes com as seguintes condições de pagamento: i) um cheque no valor de R$10.000,00 (dez mil reais); ii) outro cheque no valor de R$1.000,00 (mil reais); iii) prestação de serviços em permuta para complementação de R$12.000,00 (doze mil reais). 9.9. Denota-se do recibo de quitação (evento nº 1, arquivo 26), que os recorrentes receberam da parte autora, os cheques e a prestação de serviços. Logo, não há que se falar em inadimplência do recorrido. 9.10. Ademais, em análise aos elementos constantes nos autos, vislumbra-se que apesar da narrativa autoral quanto a inutilização do bem imóvel, diante do descumprimento das melhorias sociais a serem instaladas, requereu expressamente a manutenção da posse do imóvel até o julgamento da lide. Ora, diante da formulação de tal pedido, é forçoso concluir que o reclamante utilizou a sala comercial até a prolação da sentença, o que determina uma reanálise quanto ao dano material. 9.11. O contrato foi firmado entre as partes em fevereiro de 2018, com a expressa anotação de que o empreendimento comercial já estava em funcionamento. Portanto, é crível destacar que o autor usufruiu do imóvel até janeiro de 2023 (data de publicação da sentença), totalizando quase cinco anos. 9.12. Em face do exposto, aplicando o princípio da primazia do julgamento de mérito, e da melhor solução em face das particularidades do caso, previstos no artigo 6º do Código de Processo Civil , não é razoável a restituição do valor integral do contrato para a parte autora, mas apenas de 50% (cinquenta por cento), perfazendo R$11.500,00 (onze mil e quinhentos reais), sendo proporcional ao tempo de utilização do bem. 9.13. Por fim, quanto à suposta ausência de pedido de rescisão contratual na petição inicial, elucido que apesar de o pedido não constar expressamente no tópico específico, decorreu de forma lógica de toda a narrativa da inicial e até mesmo pelo tipo de ação manejada. 10. Dispositivo. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO, para reformar a sentença quanto à condenação imposta a título de danos materiais, fixando o dever de restituição na proporção de 50% (cinquenta por cento) do valor fixado no contrato, perfazendo R$11.500,00 (onze mil e quinhentos reais). 11. Em razão do parcial provimento do recurso, inexiste condenação ao pagamento de custas e honorários advocatícios (art. 55 , caput, Lei nº 9.099 /95). 12. Advirto que se opostos embargos de declaração com caráter protelatório, será aplicada multa com fulcro no art. 1.026 , § 2º do Código de Processo Civil , se houver nítido propósito de rediscutir o mérito da controvérsia.