ESTADO DO ESPÍRITO SANTO PODER JUDICIÁRIO Juízo de Serra - Comarca da Capital - Vara da Fazenda Pública Municipal Avenida Getúlio Vargas, 250, Fórum Dr. João Manoel Carvalho , Serra Centro, SERRA - ES - CEP: 29176-090 Telefone:(27) 32911011 PROCESSO Nº XXXXX-30.2023.8.08.0048 MANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL (120) IMPETRANTE: CASAMORADA ENGENHARIA LTDA COATOR: SECRTÁRIO DA FAZENDA MUNICIPAL DA SERRA/ES, MUNICIPIO DE SERRA Advogados do (a) IMPETRANTE: LUDMILLA RAMOS PEDREIRA - ES31774, VICTOR QUEIROZ PASSOS COSTA - ES12506 SENTENÇA Vistos em inspeção 2024. Cuidam os autos de Mandado de Seguraça impetrado por Casamorada Engenharia Ltda contra ato praticado pelo Secretário da Fazenda do Município de Serra/ES, objetivando a concessão provimento jurisdicional para que seja declarada a ilegalidade do lançamento de ITBI referente à compra e venda do imóvel descrito na exordial, ao fundamento de que o Fisco utilizou os mesmos parâmetros para o cálculo de IPTU, além de desconsiderar o valor do negócio jurídico declarado pelo contribuinte. Sustenta que o entendimento da Fazenda Municipal viola o entendimento firmado pelo STJ no Tema Repetitivo 1113, segundo o qual o valor da compra e venda goza de presunção de veracidade. Por tais razões, requer que o lançamento do ITBI seja realizado de acordo com o valor do negócio jurídico. A petição inicial veio instruída com documentos. O pedido liminar foi deferido (ID XXXXX). Após notificado, a autoridade tida coatora ofertou informações (ID XXXXX), suscitando, preliminarmente, a ausência de direito líquido e certo, ao fundamento de que a verificação dos fatos alegados demanda cognição exauriente. No mérito, sustenta a legalidade do lançamento impugnado sob a alegação de que a base de cálculo do tributo está fundamentada na avaliação efetuada pelo Fisco com base na planta genérica de valores, conforme art. 1º da Lei 3.673/2010, motivo pelo qual pugna pela denegação da segurança. O Ministério Público na manifestação ID XXXXX afirma que inexiste na lide interesse público a justificar sua atuação. É o que interessa relatar. Decido. FUNDAMENTAÇÃO. - DA PRELIMINAR DE AUSÊNCIA DE DIREITO LÍQUIDO E CERTO. Como relatado, a autoridade requer a extinção do feito sem a resolução do mérito, ao argumento de que não de que o impetrante não comprovou a existência de direito líquido e certo. Em que pesem as razões tecidas pela autoridade coatora, tenho que a preliminar suscitada não merece acolhimento, uma vez que se confunde com o próprio mérito da demanda. Ademais, pelo que se depreende da causa de pedir deduzida na exordial, vejo que a questão controvertida restringe-se à matéria de direito. Dessa modo, rejeito a preliminar arguida. MÉRITO. O ponto nodal da demanda reside em verificar se a base de cálculo do ITBI lançado pelo Fisco está correta, conforme representa o documento juntado no evento XXXXX55723482337. Pois bem. Após detida análise dos autos, entendo que o direito socorre a pretensão autoral, tendo se vista que o seu pleito encontra guarida em entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça no Tema 1.113, quando do julgamento do REsp 1.937.821 , vejamos: TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. IMPOSTO SOBRE TRANSMISSÃO DE BENS IMÓVEIS (ITBI). BASE DE CÁLCULO. VINCULAÇÃO COM IMPOSTO PREDIAL E TERRITORIAL URBANO (IPTU). INEXISTÊNCIA. VALOR VENAL DECLARADO PELO CONTRIBUINTE. PRESUNÇÃO DE VERACIDADE. REVISÃO PELO FISCO. INSTAURAÇÃO DE PROCESSO ADMINISTRATIVO. POSSIBILIDADE. PRÉVIO VALOR DE REFERÊNCIA. ADOÇÃO. INVIABILIDADE. 1. A jurisprudência pacífica desta Corte Superior é no sentido de que, embora o Código Tributário Nacional estabeleça como base de cálculo do Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) e do Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis (ITBI) o "valor venal", a apuração desse elemento quantitativo faz-se de formas diversas, notadamente em razão da distinção existente entre os fatos geradores e a modalidade de lançamento desses impostos. 2. Os arts. 35 e 38 do CTN dispõem, respectivamente, que o fato gerador do ITBI é a transmissão da propriedade ou de direitos reais imobiliários ou a cessão de direitos relativos a tais transmissões e que a base de cálculo do tributo é o "valor venal dos bens ou direitos transmitidos", que corresponde ao valor considerado para as negociações de imóveis em condições normais de mercado. 3. A possibilidade de dimensionar o valor dos imóveis no mercado, segundo critérios, por exemplo, de localização e tamanho (metragem), não impede que a avaliação de mercado específica de cada imóvel transacionado oscile dentro do parâmetro médio, a depender, por exemplo, da existência de outras circunstâncias igualmente relevantes e legítimas para a determinação do real valor da coisa, como a existência de benfeitorias, o estado de conservação e os interesses pessoais do vendedor e do comprador no ajuste do preço. 4. O ITBI comporta apenas duas modalidades de lançamento originário: por declaração, se a norma local exigir prévio exame das informações do contribuinte pela Administração para a constituição do crédito tributário, ou por homologação, se a legislação municipal disciplinar que caberá ao contribuinte apurar o valor do imposto e efetuar o seu pagamento antecipado sem prévio exame do ente tributante. 5. Os lançamentos por declaração ou por homologação se justificam pelas várias circunstâncias que podem interferir no específico valor de mercado de cada imóvel transacionado, circunstâncias cujo conhecimento integral somente os negociantes têm ou deveriam ter para melhor avaliar o real valor do bem quando da realização do negócio, sendo essa a principal razão da impossibilidade prática da realização do lançamento originário de ofício, ainda que autorizado pelo legislador local, pois o fisco não tem como possuir, previamente, o conhecimento de todas as variáveis determinantes para a composição do valor do imóvel transmitido. 6. Em face do princípio da boa-fé objetiva, o valor da transação declarado pelo contribuinte presume-se condizente com o valor médio de mercado do bem imóvel transacionado, presunção que somente pode ser afastada pelo fisco se esse valor se mostrar, de pronto, incompatível com a realidade, estando, nessa hipótese, justificada a instauração do procedimento próprio para o arbitramento da base de cálculo, em que deve ser assegurado ao contribuinte o contraditório necessário para apresentação das peculiaridades que amparariam o quantum informado (art. 148 do CTN ). 7. A prévia adoção de um valor de referência pela Administração configura indevido lançamento de ofício do ITBI por mera estimativa e subverte o procedimento instituído no art. 148 do CTN , pois representa arbitramento da base de cálculo sem prévio juízo quanto à fidedignidade da declaração do sujeito passivo. 8. Para o fim preconizado no art. 1.039 do CPC/2015 , firmam-se as seguintes teses: a) a base de cálculo do ITBI é o valor do imóvel transmitido em condições normais de mercado, não estando vinculada à base de cálculo do IPTU, que nem sequer pode ser utilizada como piso de tributação; b) o valor da transação declarado pelo contribuinte goza da presunção de que é condizente com o valor de mercado, que somente pode ser afastada pelo fisco mediante a regular instauração de processo administrativo próprio (art. 148 do CTN ); c) o Município não pode arbitrar previamente a base de cálculo do ITBI com respaldo em valor de referência por ele estabelecido unilateralmente. 9. Recurso especial parcialmente provido. ( REsp n. 1.937.821/SP , relator Ministro Gurgel de Faria , Primeira Seção, DJe de 3/3/2022.) Como visto, o valor da transação declarada pelo contribuinte goza da presunção de que é condizente com o valor de mercado, a qual somente pode ser afastada pelo Fisco mediante regular instauração de processo administrativo próprio (art. 148 do CTN ), sendo certo que a base de cálculo do ITBI não pode ser arbitrada previamente pela Fazenda Municipal com respaldo em valor de referência por ele estabelecido unilateralmente. In casu, e como dito pela própria defesa, a Fazenda Municipal utilizou como parâmetro os valores fornecidos pela planta genérica de valores, isto é, utilizou a mesma base de cálculo para o lançamento do IPTU, o que se revela ilegal ( REsp n. 1.937.821/SP ). Dessa forma, tendo a impetrante (contribuinte) declarado o valor de mercado do bem, esta goza da presunção de que é condizente com o valor de mercado, circunstância esta do qual o Fisco não logrou êxito em infirmar. DISPOSITIVO. Ante o exposto, CONCEDO SEGURANÇA para declarar o direito da impetrante de recolher o ITBI utilizando como base de cálculo o valor descrito no contrato de compra e venda do imóvel indicado na exordial. Confirmo a liminar no ID XXXXX. Resolvo o mérito da lide na forma do inc. I do art. 487 do CPC . Sem honorários advocatícios, na forma do art. 25 da Lei 12.016 /2009. Eventuais custas remanescentes pela Autoridade Coatora. Sem remessa necessária com fundamento no inc. III do § 4º do art. 496 do CPC . Publique-se e intime-se. Oportunamente, arquivem-se. Serra-ES, data conforme lançado no sistema. Telmelita Guimarães Alves Juíza de Direito