?Na valoração da prova, o juiz poderá aceitar como verdadeira toda a confissão ou apenas parte dela, o que demonstra sua divisibilidade, autorizada expressamente no art. 200 do CPP . A título de exemplo, se o acusado confessar a autoria de um furto e alegar, na mesma ocasião, que agiu em estado de necessidade, finda a instrução, ao cotejar as provas o juiz poderá concluir que a confissão está em consonância com outras provas colhidas, quanto à autoria, e que a alegada excludente não restou provada. (...) A confissão pode ser retratada pelo acusado. Uma vez feita, o confitente poderá voltar atrás; desdizer-se e apresentar, ou não, elementos de convicção a respeito dessa nova versão. (?) A credibilidade da retratação está submetida à livre apreciação judicial, e não é por outra razão que a parte final do art. 200 do CPP admite a retratação 'sem prejuízo do livre-convencimento do juiz, fundado no exame das provas em conjunto'. Em regra, na prática forense a retratação é feita de maneira pura e simples, desacompanhada de qualquer elemento de convicção, o que no mais das vezes inviabiliza sua credibilidade. Não raras vezes o acusado, acompanhado de advogado, confessa a autoria delitiva na fase de inquérito, perante a autoridade policial, e depois se retrata em juízo. Em casos tais, se a confissão extrajudicial estiver corroborada por outras provas colhidas em juízo e a retratação judicial se apresentar isolada nos autos, será conferida maior credibilidade àquela.? (Curso de processo penal. 4. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2018, pp. 514/515.) Quanto a ODAIR, o acusado não chegou a ser ouvido em Juízo, mas na Delegacia apresentou versão diferente dos corréus, alegando que MARCELO adquirira o aparelho celular dentro de sua loja, mas a compra fora realizada diretamente de um terceiro, que fora até o local para vender o celular. Vejamos: ?(...) QUE, há cerca de um ano o declarante e sua esposa JEANE possuem uma loja de manutenção, compra e venda de celulares usados, denominada J.O. DIGITAL CELULARES e ACESSÓRIOS, localizada na rua José Bonifácio, Qd, 19, loja 1, Parque Estrela Dalva I, Luziânia/GO; QUE, perguntado pela Autoridade se o declarante e JEANE venderam um aparelho de telefone celular marca LENOVO de cor preta com dourado para MARCELO (primo de Jeane ), ao que o declarante respondeu que não, acrescentando que NÃO se recorda a data, mas já se passarem uns nove meses, um rapaz chegou em sua loja querendo vender um celular LENONO dourado com a frente preta, tamanho pequeno, ao que o declarante questionou o rapaz acerca dos documentos do referido aparelho, e o rapaz disse que estava na casa dele e saiu; QUE, neste momento MARCELO estava em sua loja, com um celular Moto G3 para conserto e saiu logo atrás do referido rapaz; QUE, logo MARCELO retomou com o tal celular LENOVO na mão, acompanhado do tal rapaz, dizendo que ia comprar o referido celular LENOVO e pedindo o aval do declarante e JEANE, ao que o declarante disse que: se o rapaz trouxesse a caixinha e a nota do celular... sua loja se responsabilizaria... QUE, contudo, MARCELO negociou diretamente com o tal rapaz e em seguida MARCELO deixou o aludido celular LENOVO em sua loja, sem chip, para que o declarante habilitasse o acesso as redes sociais no aparelho; QUE, o referido celular LENOVO ficou em sua loja mais ou menos por uma semana, mas o tal rapaz nunca trouxe a nota e a caixinha do aludido celular até sua loja; QUE, perguntado pela Autoridade se o declarante registrou a entrada/saída do celular LENOVO em sua loja, ao que o declarante respondeu negativamente, acrescentando que neste dia, MARCELO discutiu muito com o declarante por conta do conserto do celular Moto G3 que não deu certo e ficou quase só do lado de fora da loja fumando, e falou quase só com JEANE, e foi embora antes que o declarante registrasse a entrada do CELULAR LENOVO; QUE, perguntado pela Autoridade por qual motivo sua esposa JEANE declarou ter vendido o celular LENOVO supracitado para MARCELO , ao que o declarante respondeu que: acredita que devido ao tempo transcorrido, JEANE não se recorda direito do teor da conversa/negociação da compra/venda do citado celular LENOVO, e se confundiu... QUE, perguntado pela Autoridade se o declarante costuma registrar os dados dó cliente, quando um celular é deixado em sua loja para conserto, ao que a declarante respondeu que sempre é registrado a entrada dos celulares, cadastrando dados do celular, nome e endereço do cliente; QUE, perguntado pela Autoridade se o declarante faz uso dos celulares que são deixados em sua loja para conserto, ao que o declarante respondeu que sim, acrescentando que faz uso quando fica sem nenhum aparelho para seu uso, e que quando passa de 30 (trinta) dias e o cliente não busca o celular, o declarante vende; QUE, perguntado pela Autoridade se depois que MARCELO adquiriu o celular LENOVO, JEANE fez uso do referido aparelho, ao que o declarante respondeu que para habilitar o aparelho nas redes sociais precisaram colocar um chip, e que em sua loja costumam usar dois chip da operadora Claro, ambos em seu nome, números (61) 9128-5539 não se recordando o número do outro, e também tinham um em nome de JEANE que há cerca de oito meses foi extraviado (mas não sabe declinar o número), e nos testes ligam de um número para outro; QUE, perguntado pela Autoridade se JEANE já tomou algum celular de MARCELO emprestado para fazer uso, ao que a declarante respondeu negativamente.?. (fls. 187/190 do volume 2). Todavia, conforme se extrai das linhas anteriores, a versão apresentada não é capaz de infirmar o restante do conjunto probatório, que é sólido o suficiente para conduzir à condenação pela receptação. Com efeito, as declarações das testemunhas foram uníssonas e corroboradas pelas informações prestadas por JEANE e MARCELO. A dinâmica dos fatos restou devidamente comprovada, sendo certo que o aparelho celular subtraído estava na loja de eletrônicos de JEANE e ODAIR, fora adquirido por MARCELO e vendido por ele para Letícia , por meio de redes sociais. Tais elementos comprovam que os réus incorreram na prática do crime de receptação, pois, mesmo que eventualmente JEANE e ODAIR não tenham adquirido o celular, mantiveram em depósito e venderam o objeto no exercício da atividade comercial. Ademais, MARCELO também adquiriu o bem e o vendeu, em seguida, todos agindo sabendo, ou devendo saber, que se tratava de produto crime. No ponto, devo salientar que é da Defesa o ônus de provar a origem lícita do bem apreendido em poder do acusado, de acordo com o art. 156 do CPP e com o entendimento sedimentado do colendo Superior Tribunal de Justiça. Entretanto, após toda a análise, com a devida vênia ao Ministério Público, entendo a qualificadora do art. 180 , § 1º, não deve ser atribuída a MARCELO . Isso porque ficou claro que JEANE e ODAIR agiram no exercício da atividade comercial, realizando toda a negociação dentro da loja de eletrônicos de propriedade deles, no entanto, MARCELO apenas adquiriu o aparelho do estabelecimento comercial, efetuando sua venda por meio de grupo na rede social Facebook, não havendo qualquer indício de que tenha agido em concurso com os corréus, em nome da loja ou de outra forma classificada como atividade comercial para fins da qualificadora. Portanto, o enquadramento correto com relação a ele deve ser feito no art. 180 , caput, do Código Penal , aplicando-se o art. 383 do CPP (emendatio libelli). Assim, diante do vasto conjunto probatório acima delineado, não há dúvidas quanto ao cometimento, por JEANE , ODAIR e MARCELO dos crimes de receptação qualificada e receptação simples, respectivamente. Os réus eram, na data dos fatos, imputáveis, tinham plena consciência da ilicitude de suas condutas, não havendo quaisquer excludentes de ilicitude ou de culpabilidade que possam beneficiá-los. Comprovadas a materialidade e a autoria, impõe-se a condenação. DISPOSITIVO Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido formulado na denúncia para CONDENAR JEANE LIMA DA SILVA e ODAIR JOSE RIBEIRO DA CONCEIÇÃO como incursos no art. 180 , § 1º , do Código Penal e CONDENAR MARCELO FERREIRA DE LIMA nas penas do delito previsto no art. 180 , caput, do mesmo diploma legal. Passo à dosimetria das penas, observando o mandamento constitucional da individualização (art. 5º, XLVI), bem como o sistema trifásico previsto no art. 68 , caput, do CP . 1 ? Da ré JEANE Na primeira fase, examinando as circunstâncias judiciais arroladas no art. 59 do diploma penal, tenho que o condenado agiu com culpabilidade normal para a espécie delitiva. Quanto aos antecedentes, trata-se de ré primária (fls. 113 e 119/120 do PDF). Não há elementos que caracterizem a má conduta social nem a personalidade da condenada. Os motivos, as circunstâncias e as consequências do crime não destoam do esperado em atos dessa natureza. Quanto ao comportamento da vítima, obviamente não é possível afirmar que contribuiu para o cometimento do delito. Nesse quadro, inexistindo circunstância judicial desfavorável, fixo a pena-base em 03 anos de reclusão e 10 dias-multa. Na segunda etapa da dosimetria, tem lugar a atenuante da confissão (art. 65 , III , ?d?, do CP ), no entanto, mantenho a reprimenda no mínimo legal, em consonância com a Súmula nº 231 do colendo Superior Tribunal de Justiça. Na terceira etapa, ausentes causa de aumento e diminuição de pena. Assim, torno a PENA DEFINITIVA, então, em 03 (três) anos de reclusão e 10 (dez) dias-multa. 2 ? Do réu ODAIR Na primeira fase, examinando as circunstâncias judiciais arroladas no art. 59 do diploma penal, tenho que o condenado agiu com culpabilidade normal para a espécie delitiva. Quanto aos antecedentes, trata-se de réu primário (fls. 118 e 121/122 do PDF). Não há elementos que caracterizem a má conduta social nem a personalidade da condenada. Os motivos, as circunstâncias e as consequências do crime não destoam do esperado em atos dessa natureza. Quanto ao comportamento da vítima, obviamente não é possível afirmar que contribuiu para o cometimento do delito. Nesse quadro, inexistindo circunstância judicial desfavorável, fixo a pena-base em 03 anos de reclusão e 10 dias-multa. Na segunda etapa da dosimetria, não há atenuante ou agravante. Na terceira etapa, ausentes causa de aumento e diminuição de pena. Assim, torno a PENA DEFINITIVA, então, em 03 (três) anos de reclusão e 10 (dez) dias-multa. 3 ? Do réu MARCELO Na primeira fase, examinando as circunstâncias judiciais arroladas no art. 59 do diploma penal, tenho que o condenado agiu com culpabilidade normal para a espécie delitiva. Quanto aos antecedentes, trata-se de réu tecnicamente primário (fls. 114/117 e 123 do PDF). Não há elementos que caracterizem a má conduta social nem a personalidade da condenada. Os motivos, as circunstâncias e as consequências do crime não destoam do esperado em atos dessa natureza. Quanto ao comportamento da vítima, obviamente não é possível afirmar que contribuiu para o cometimento do delito. Nesse quadro, inexistindo circunstância judicial desfavorável, fixo a pena-base em 01 ano de reclusão e 10 dias-multa. Na segunda etapa da dosimetria, tem lugar a atenuante da confissão (art. 65 , III , ?d?, do CP ), no entanto, mantenho a reprimenda no mínimo legal, em consonância com a Súmula nº 231 do colendo Superior Tribunal de Justiça. Na terceira etapa, ausentes causa de aumento e diminuição de pena. Assim, torno a PENA DEFINITIVA, então, em 01 (um) ano de reclusão e 10 (dez) dias-multa. Considerando a ausência de informações sobre a capacidade econômica dos réus, fixo o valor do dia-multa em 1/30 (um trigésimo) do salário-mínimo vigente à época do fato. Não houve prisão provisória, não havendo que se falar em DETRAÇÃO. À título de esclarecimento, a prisão de MARCELO chegou a ser decretada ainda em fase de investigação criminal, mas a cautelar foi decretada em razão da suspeita de seu envolvimento no crime de roubo, e não pela receptação. Fixo o REGIME INICIAL ABERTO para todos os sentenciados, em conformidade com o disposto no art. 33 , § 2º , do Código Penal . Com relação ao sentenciado MARCELO , com base nos arts. 43 e 44 , § 2º , do CP , substituo a pena privativa de liberdade por 01 (uma) pena restritiva de direitos, qual seja, PRESTAÇÃO PECUNIÁRIA. Com esteio no art. 45, § 1º, do diploma penal, fixo em 03 (três) salários mínimos o valor da prestação pecuniária, em favor do Fundo da Execução Penal desta Comarca, nos termos a serem definidos no processo de execução. Já no tocante a JEANE e ODAIR, substituo a pena privativa de liberdade por 02 (duas) restritivas de direito, sendo PRESTAÇÃO PECUNIÁRIA, no valor de 05 (cinco) salários mínimos para cada réu, também em favor do Fundo da Execução Penal desta Comarca, e LIMITAÇÃO DE FINAL DE SEMANA, nos termos a serem definidos no processo de execução. Diante disso, resta prejudicada a aplicação do sursis (art. 77, III). Não há que se falar em segregação cautelar. Condeno os réus ao pagamento, pro rata, das custas processuais. Com base no Item PROCESSOS PENAIS - 2, ?a?, do Anexo da Portaria nº 77/2016 da Secretaria de Estado de Governo do Estado de Goiás, fixo em 04 (quatro) UHD a remuneração do Dr. Deuel Gontijo Fernandes , que atuou desde a resposta à acusação até a instrução, e 02 (duas) UHD ao Dr. Cleber Viana , nomeada à fl. 105 do PDF. Após o trânsito em julgado, expeçam-se as certidões necessárias ao pagamento. Após o trânsito em julgado: a) expeçam-se as guias de execução definitiva;b) comunique-se ao egrégio Tribunal Regional Eleitoral deste Estado acerca da condenação da ré, para cumprimento da suspensão de seus direitos políticos, nos termos do art. 15, III, da Constituição Federal ;c) cumpra-se o disposto no art. 809 , § 3º , do CPP , para o devido registro no SINIC, Sistema Nacional de Identificação Criminal;d) proceda-se ao devido cadastramento no sistema INFODIP. Publicada e registrada eletronicamente. Intimem-se. Oportunamente, não restando providências pendentes, arquive-se. Luziânia, data e hora da assinatura eletrônica. Katherine Teixeira RuellasJuíza de Direito em Substituição