TRF-3 - APELAÇÃO CÍVEL: ApCiv XXXXX20174036113 SP
E M E N T A ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. VIABILIDADE DO JULGAMENTO MONOCRÁTICO. SENTENÇA: INEXISTÊNCIA VÍCIO “ULTRA PETITA”. AGRAVO INTERNO. AÇÃO ORDINÁRIA ONDE MUNICÍPIO QUESTIONA A TRANSFERÊNCIA DO SISTEMA DE ILUMINAÇÃO PÚBLICA REGISTRADO PELA EMPRESA DISTRIBUIDORA DE ELETRICIDADE COMO ATIVO IMOBILIZADO EM SERVIÇO (AIS), PARA O SEU PATRIMÔNIO, COM OS CONSEQUENTES ENCARGOS. NÍTIDO AÇODAMENTO DA BUROCRACIA, FEITO POR MEIO DA RESOLUÇÃO NORMATIVA ANEEL Nº 414/2010, EDITADA POR AUTARQUIA QUE NÃO TEM QUALQUER PODER DISCRICIONÁRIO "SOBRE" OS MUNICÍPIOS. DISPOSITIVO QUE NÃO TEM FORÇA DE LEI. INEXISTÊNCIA DE VIOLAÇÃO À RESERVA DE PLENÁRIO. RECURSOS DESPROVIDOS. 1. A possibilidade de maior amplitude do julgamento monocrático - controlado por meio do agravo - está consoante os princípios que se espraiam sobre todo o cenário processual, tais como o da eficiência (art. 37 , CF ; art. 8º do NCPC) e da duração razoável do processo (art. 5º , LXXVIII , CF ; art. 4º do NCPC). Eficiência e utilitarismo podem nortear interpretações de normas legais de modo a que se atinja, com rapidez sem excessos, o fim almejado pelas normas e desejado pela sociedade. 2. A sentença não é ultra petita, pois apenas afastou os efeitos das Resoluções Normativas nº 414/2010 e 479/2012, expedidas pela ANEEL, no tocante à imposição ao Município da obrigação de receber os ativos de iluminação pública, determinando à CPFL que continue a prestar o serviço de iluminação pública nos exatos termos da concessão, o que decorre da causa de pedir, ao contrário do que sustenta a CPFL. 3. O Município agravado ajuizou ação ordinária em face da ANEEL e da CPFL objetivando o reconhecimento da ilegalidade/inconstitucionalidade da Instrução Normativa nº 414, com redação da Instrução Normativa nº 479, ambas expedidas pela ANEEL, de forma a desobriga-lo de receber o sistema de iluminação pública registrado como Ativo Imobilizado em Serviço – AIS. 4. À instância da ANEEL os Municípios brasileiros devem se tornar materialmente responsáveis pelo serviço de iluminação pública, realizando a operação e a reposição de lâmpadas, de suportes e chaves, além da troca de luminárias, reatores, relés, cabos condutores, braços e materiais de fixação, além de outras atividades necessárias a perfeição desse serviço público. É que os ativos imobilizados a serem transferidos aos Municípios são compostos por: lâmpadas, luminárias, reatores, bulbos, braços, e em alguns casos os postes desde que estes sejam exclusivos para iluminação pública (e não fornecimento de energia e iluminação). 3. Não há dúvida alguma de que o novo encargo que a ANEEL pretende impingir aos Municípios (em relação os quais não tem qualquer vínculo de supremacia ou autoridade) exige recursos operacionais, humanos e financeiros para operacionalização e manutenção dos mesmos, que eles não possuem. A manutenção do serviço de iluminação pública há muito tempo foi atribuída a empresas distribuidoras de energia elétrica; essa situação se consolidou ao longo de décadas, especialmente ao tempo do Regime Autoritário quando a União se imiscuiu em todos os meandros da vida pública e em muitos da vida privada. De repente tudo muda: com uma resolução de autarquia, atribui-se aos Municípios uma tarefa a que estavam desacostumados porque a própria União não lhes permitiu exercê-la ao longo de anos a fio. 4. Efeito do costumeiro passe de mágica da burocracia brasileira: pretende-se, do simples transcurso de um prazo preestabelecido de modo unilateral e genérico - como de praxe a burocracia ignora as peculiaridades de cada local - que o serviço continue a ser prestado adequadamente, fazendo-se o pouco caso de sempre com a complexidade das providências a cargo não apenas das distribuidoras de energia elétrica, mas acima de tudo aquelas que sobraram aos Municípios, a grande maioria deles em estado de penúria. 5. A quem interessa a transferência dos Ativos Imobilizados em Serviço da distribuidora para os Municípios? A distribuidora perde patrimônio; o Município ganha material usado (e em que estado de conservação?) e um encargo; o munícipe será tributado. Quem será o beneficiário? 6. Se algum prejuízo ocorre, ele acontece em desfavor dos Municípios, e não das empresas distribuidoras de energia que até agora, com os seus ativos imobilizados, vêm prestando o serviço sem maiores problemas. Também não sofrerá qualquer lesão a ANEEL, que por sinal não tem nenhuma ingerência nos Municípios; não tem capacidade de impor-lhes obrigações ou ordenar que recebam em seus patrimônios bens indesejados. 7. Reconhece-se que a ANEEL excedeu de seu poder regulamentar com a edição da Resolução ANEEL nº 414 /2010, bem assim das Resoluções nº 479/2010 e 587/2013, no que tange à imposição de transferência às municipalidades do sistema de iluminação pública e do ativo imobilizado em serviço (AIS) vinculado ao sistema de iluminação pública gerido pelas concessionárias de distribuição de energia. 8. Está claro que apenas a lei poderia ordenar a transferência do sistema de iluminação pública registrado como Ativo Imobilizado em Serviço – AIS ao Município. O mero afastamento da obrigação de recebimento dos ativos, como defende a CPFL, não supre a ilegalidade da resolução, já que permanece a imposição aos Municípios da administração do sistema, o que demanda lei em sentido estrito (art. 5º , II , e 175 da CF ). 9. Por fim, registra-se que a decisão agravada reconheceu que a ANEEL “excedeu de seu poder regulamentar com a edição da Resolução ANEEL nº 414 /2010, bem assim da Resolução nº 479 /2012 e 587/2013, no que tange à imposição de transferência às municipalidades do sistema de iluminação pública e do ativo imobilizado em serviço (AIS) vinculado ao sistema de iluminação pública gerido pelas concessionárias de distribuição de energia”. Destarte, não houve declaração de inconstitucionalidade de lei, sequer o afastamento de sua incidência. Ademais, "é certo que a exigência de observância à cláusula de reserva de plenário não abrange os atos normativos secundários do Poder Público, uma vez não estabelecido confronto direto com a Constituição , razão pela qual inaplicável a Súmula Vinculante 10 /STF à espécie" ( REsp XXXXX/MG , Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 13/12/2010, DJe 17/12/2010 - recurso repetitivo; RMS XXXXX/MS , Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 15/02/2011, DJe 13/04/2011; AR XXXXX/MG , Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 28/09/2011, DJe 05/10/2011). 10. Agravos internos improvidos.