PENAL E PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. DECISÃO MANTIDA. TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES E ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO DE DROGAS. INVASÃO À DOMICÍLIO. AUSÊNCIA DE MANDADO JUDICIAL. RECONHECIMENTO DE NULIDADE. AUSÊNCIA DE INDÍCIOS PRÉVIOS DA SITUAÇÃO DE FLAGRÂNCIA. DENÚNCIA DE MERO USUÁRIO DE DROGAS. BUSCA DOMICILIAR SEM AUTORIZAÇÃO DOS MORADORES. TEORIA DOS FRUTOS DA ÁRVORE ENVENENADA. NULIDADE DAS PROVAS OBTIDAS. ABSOLVIÇÃO DOS RÉUS QUANTO AOS DELITOS IMPUTADOS. CONSTRANGIMENTO ILEGAL EVIDENCIADO. AGRAVO DO MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL DESPROVIDO. 1. O art. 5º , inciso XI , da Constituição Federal - CF assegura a inviolabilidade do domicílio. No entanto, cumpre ressaltar que, consoante disposição expressa do dispositivo constitucional, tal garantia não é absoluta, admitindo relativização em caso de flagrante delito. Acerca da interpretação que deve ser conferida à referida norma, o Supremo Tribunal Federal, por ocasião do julgamento do RE n. 603.616/RO , Rel. Min. Gilmar Mendes, assentou o entendimento de que "a entrada forçada em domicílio sem mandado judicial só é lícita, mesmo em período noturno, quando amparada em fundadas razões, devidamente justificadas a posteriori, que indiquem que dentro da casa ocorre situação de flagrante delito, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente ou da autoridade e de nulidade dos atos praticados". 2. No mesmo sentido, esta Corte Superior possui o entendimento de que as hipóteses de validação da violação domiciliar devem ser restritivamente interpretadas, mostrando-se necessário, para legitimar o ingresso de agentes estatais em casa alheia, a demonstração, de modo inequívoco, do consentimento livre do morador ou de que havia fundadas suspeitas da ocorrência do delito no interior do imóvel. A Suprema Corte, no julgamento do Recurso Extraordinário n. 1.342.077/SP , de relatoria do Ministro Alexandre de Moraes, declarou a nulidade do referido "tão somente na parte em que entendeu pela necessidade de documentação e registro audiovisual das diligências policiais, determinando a implementação de medidas aos órgãos de segurança pública de todas as unidades da federação".No caso em apreço, verifica-se que não foram observados os pressupostos exigidos para que o ingresso no domicílio seja reputado legal, sendo evidente a irregularidade na atuação dos agentes estatais. Isso porque, consoante consta dos autos, os policiais militares abordaram um usuário de drogas durante patrulhamento, o qual informou aos agentes que adquiria maconha no domicílio dos agravados, apesar de não estar na posse de nenhum entorpecente.Chegando ao local, avistaram os acusados no pátio da residência e os abordaram, encontrando as drogas no interior de um vidro e na geladeira - 28 porções de maconha, pesando 56,70g, e um tablete de maconha, pesando 88g. 3. Ve-se que não há qualquer informação de que havia indícios de traficância além da denúncia de um usuário de drogas e do nervosismo aparente dos agravados ao serem abordados pelos policiais militares, sendo certo que "conforme tem reiteradamente decidido esta Corte Superior de Justiça, atitude considerada suspeita e nervosismo do indivíduo ao avistar os policiais não constituem justa causa a autorizar o ingresso em domicílio alheio sem prévia autorização judicial. Da mesma forma, a fuga do réu para o interior da residência, ao avistar os policiais, também não constitui uma situação justificadora do ingresso em seu domicílio" ( AgRg no HC n. 772.582/SP , relator Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, DJe de 14/12/2022). 4. Ademais, não há nenhum registro de consentimento dos moradores, ora agravados, para a realização de busca domiciliar, contrariando a atual jurisprudência deste STJ ( AgRg no RHC n. 162.394/DF , relator Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, DJe de 20/5/2022). 5. Aplicada a teoria dos frutos da árvore envenenada, tem-se que as demais diligências e buscas realizadas após a entrada indevida dos policiais devem ser tidas como nulas por decorrência conforme a pacífica jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça. 6. Concedida a ordem de habeas corpus para que fosse reconhecida a nulidade das provas obtidas mediante a busca e apreensão domiciliar, bem como a delas decorrentes, e, em consequência, absolver os ora agravados das imputações feitas na Ação Penal n. XXXXX-15.2019.8.21.0068, sob os mesmos fundamentos do Magistrado sentenciante, determinando a expedição do respectivo alvará de soltura em favor dos acusados. 7. Agravo regimental do Ministério Público do Rio Grande do Sul desprovido.