APELAÇÃO CÍVEL. CONTRATOS AGRÁRIOS. CÉDULA PRODUTO RURAL. EMBARGOS À EXECUÇÃO.NULIDADE. SENTENÇA. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO. CITRA/INFRA PETITA. Conforme o princípio da motivação todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário devem ser necessariamente motivados, sob pena de nulidade (art. 93 , IX , da CF e art. 489 do CPC ). Na hipótese dos autos, analisando detidamente a decisão hostilizada, depreende-se que não foram analisadas todas as questões suscitadas. Com efeito, não houve qualquer manifestação judicial acerca da alegação de nulidade da garantia imobiliária e de abusividade da multa de 50% constante da cláusula \'d\' do contrato de compra e venda. Diante de tal quadro, impõe-se o reconhecimento da nulidade da sentença, por citra petita. POSSIBILIDADE DE JULGAMENTO IMEDIATO PELO TRIBUNAL. Estando a causa madura, possível o julgamento das demais questões de mérito sem o retorno dos autos ao juízo de primeiro grau (art. 1.013 do CPC ).NULIDADE. CITAÇÃO. Nos termos do art. 277 do CPC , quando a lei prescrever determinada forma, o juiz considerará válido o ato se, realizado de outro modo, lhe alcançar a finalidade. Trata-se de positivação do princípio da instrumentalidade das formas, pelo qual não será decretada a nulidade dos atos processuais quando o vício não causar prejuízo aos fins de justiça do processo nem infringir direito fundamental ao processo justo. No caso concreto, independentemente da forma em que realizada a citação, fato é que não implicou sequer dificuldade na defesa e que foi tempestivamente apresentada. Nulidade rejeitada. CEDULA DE PRODUTO RURAL . INAPLICABILIDADE DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR - CDC - LEI N. 8.078 /90. Consoante o art. 2º do CDC , consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final. De outro modo, fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviço. Na hipótese, a autora não é destinatária final de um produto adquirido nem o réu fornecedor do produto, motivo pelo qual inaplicável as normas protetivas destinas ao consumidor - CDC . Com efeito, não está sob a égide do CDC a aquisição de grãos por produtor rural. Precedentes. CEDULA DE PRODUTO RURAL . EXECUTORIEDADE. Consoante o artigo 4º da Lei n. 8.929 /94 a Cédula de Crédito Rural é título líquido e certo, exigível pela quantidade e qualidade de produto ou pelo valor nela previsto, no caso de liquidação financeira. No caso, presentes os requisitos legais à executividade da cedula de produto rural em execução. Irrelevante traçar debate acerca da executividade da Nota Promissória vinculada à obrigação assumida, na medida em que a execução vem lastreada pela própria CPR . De modo igual, não procedem as alegações genéricas de violação ao princípio da boa-fé, de desvirtuamento da CPR , de incidência do instituto da exceção de contrato não cumprido e de onerosidade excessiva pela verificação do instituto da lesão, previsão normativa do artigo 157 do CC . Descabe a alegação de nulidade das cédulas de produto rural, pois não pode a parte embargante beneficiar-se de sua própria torpeza. De mais a mais, não houve a alteração da natureza da dívida originária, tampouco modificação da finalidade das Cédulas de Produto Rural, estabelecida pela Lei específica, ao menos nada foi demonstrado pela parte executada/embargante. Quanto à alegação de ausência de repasse do valor representado pelo título a sustentar a alegação de incidência do instituto da exceção de contrato não cumprido (art. 476 CC ), cabia à embargante a descaracterização da presunção de que goza o título executivo no qual se funda a ação executiva, ônus do qual não se desincumbiu. No que concerne à alegação de vício de consentimento e onerosidade excessiva -, tem-se também a improcedência da tese veiculada por ausência de comprovação. Por fim, as intempéries climáticas são riscos inerentes à produção agrícola, motivo pelo qual não se aplica a Teoria da Imprevisão, devendo permanecer íntegras as bases contratuais inicialmente ajustadas entre as partes. Enfim, as alegações levadas a efeito pela parte executada, precipuamente porque desprovidas de substrato probatório, não são suficientes para retirar a liquidez, certeza e exigibilidade da CPR conferida pela Lei nº 8.929 /1994.EXCESSO DE EXECUÇÃO. MORA. JUROS E MULTA.Consoante o caput do art. 397 do CCB “o inadimplemento da obrigação, positiva e líquida, no seu termo, constitui de pleno direito em mora o devedor”. No caso, as CPR são revestidas de liquidez e possuem prazo de vencimento certo, motivo pelo qual são exigíveis de forma imediata, constituindo-se a mora com o simples vencimento. Outrossim, muito embora alegue excesso de execução, traz alegações genéricas, sem pontuar especificamente os excessos eventualmente cometidos pela exequente. Ainda, embora tenha trazido cálculo de atualização do valor, não demonstra de que maneira realizou o cálculo do débito total encontrado, ônus que lhe cabia.MULTA. ABUSIVIDADE. Nos termos do artigo 408 do CC , incorre de pleno direito o devedor na cláusula penal, desde que, culposamente, deixe de cumprir a obrigação ou se constitua em mora. De outro modo, dispõe o art. 413 do CC , que a penalidade deve ser reduzida equitativamente pelo juiz se a obrigação principal tiver sido cumprida em parte, ou se o montante da penalidade for manifestamente excessivo, tendo-se em vista a natureza e a finalidade do negócio. Desse modo, é possível juridicamente a redução da cláusula penal desde que caracterizada a vantagem exagerada ao contratante beneficiado. No caso, considerando a natureza, a finalidade e as peculiaridades do contrato rural, deve ser reconhecida que a penalidade de 50% sobre a quantidade total de mercadoria é manifestamente excessiva, razão pela qual se impõe a redução do percentual da cláusula penal para 20%, percentual que se apresenta razoável no caso concreto.PENHOR. MAQUINÁRIOS AGRÍCOLAS. IMPENHORABILIDADE. Nas dívidas garantidas por penhor, o bem dado em garantia fica sujeito, por vínculo real, ao cumprimento da obrigação, conforme dispõe o art. 1.419 do Código Civil - CC . No caso, a parte embargante, em verdadeira confusão conceitual, alega que os bens "não poderiam ser alvo de penhora, pela sua natureza e pela impossibilidade de constrição". Diz que os maquinários são impenhoráveis, "pois são utilizados para trabalhar e produzir". Sem razão. Primeiro, porque lícito a oferta, pelo próprio devedor, de bens em garantia de contrato de produto rural. Outrossim, ao oferecer os bens em garantia, o devedor renuncia à proteção legal. Com efeito, a impenhorabilidade não é oponível à execução de dívida relativa ao próprio bem, inclusive àquela contraída para sua aquisição, nos termos do artigo 833 , § 1º , do CPC . Com efeito, não cabe ao executado que oferece o bem em penhora - ou, como no caso, em garantia -, posteriormente sustentar que o bem oferecido é impenhorável por se tratar de máquina agrícola necessária ao exercício da sua profissão, na medida em que ordenamento jurídico proíbe comportamentos contraditórios que atentem contra a ética e a boa-fé.PENHOR. BEM DE TERCEIRO. NULIDADE. O artigo 1.419 do CC dispõe que, nas dívidas garantidas por penhor, anticrese ou hipoteca, o bem dado em garantia fica sujeito, por vínculo real, ao cumprimento da obrigação. O artigo 1.420 do CC , por sua vez, disciplina que "Só aquele que pode alienar poderá empenhar, hipotecar ou dar em anticrese; só os bens que se podem alienar poderão ser dados em penhor, anticrese ou hipoteca". Processualmente, para postular em juízo é necessário ter interesse e legitimidade (art. 17 do CPC/2015 ). Na hipótese, inobstante a alegação de ausência de autorização expressa do proprietário do imóvel, somente ao terceiro é dada a possibilidade de defender seu direito, resultando inviável que a defesa seja exercida pela apelante, porquanto desprovida de legitimidade para “pleitear direito alheio”, na dicção do já citado art. 18 do CPC .ÔNUS DA SUCUMBÊNCIA. REDIMENSIONAMENTO. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. A alteração da sentença prolatada pelo juízo a quo implica o redimensionamento da sucumbência. Na hipótese dos autos, tratando-se de sucumbência recíproca, as despesas devem ser proporcionalmente distribuídas na forma do art. 86 do CPC/2015 . Sucumbência redimensionada. Honorários advocatícios fixados sobre o valor atualizado da causa.APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA.