PROCESSUAL CIVIL, CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA. PRELIMINAR DE NÃO CABIMENTO. REJEIÇÃO. MÉRITO. CONCURSO PÚBLICO PARA SOLDADO DA PMCE, REGIDO PELO EDITAL Nº 01/2008. ILEGALIDADE DA REGRA EDITALÍCIA QUE DISPÕE ACERCA DA EXIGÊNCIA DE AVALIAÇÃO OBJETIVA AO FINAL DO CURSO DE FORMAÇÃO. CONTRARIEDADE À PREVISÃO LEGAL VIGENTE À ÉPOCA DA PUBLICAÇÃO DO EDITAL DO CERTAME. INCIDENTE ACOLHIDO. 1. Cuida-se de Incidente de Uniformização de Jurisprudência, suscitado no bojo da Apelação Cível nº XXXXX-22.2010.8.06.0001 , em razão da existência de divergência jurisprudencial sobre a legalidade da prova objetiva eliminatória realizada no Curso de Formação Profissional para o cargo de Soldado da Polícia Militar do Estado do Ceará, prevista no Edital nº 001 ¿ PMCE, de 09 de junho de 2008. 2. DA PRELIMINAR SUSCITADA PELA PROCURADORIA-GERAL DE JUSTIÇA. 2.1. Ab initio, cumpre enfrentar a questão preliminar trazida pela Procuradoria-Geral de Justiça, que opinou pelo não cabimento de incidente de uniformização de jurisprudência e pela conversão deste em incidente de assunção de competência. 2.2. Não se ignora que o Incidente de Uniformização de Jurisprudência (IUJ), tratado no art. 476 do revogado Código de Processo Civil de 1973 , deixou de ter previsão no novel diploma processual ( CPC/2015 ), que inovou na implementação do denominado sistema de precedentes, com a finalidade de garantir coerência, segurança jurídica, estabilidade e celeridade às decisões judiciais. 2.3. A despeito disso, o IUJ tem previsão no Regimento Interno deste Sodalício, no art. 14 , I, ¿k¿, alínea esta incluída pelo Assento Regimental nº 02/2017, bem como no Capítulo XI (arts. 286 e ss), não se podendo ignorar, outrossim, que já na vigência do CPC/2015 foi deliberada pela 2ª Câmara de Direito Público, sem divergência de votos, a instauração do presente incidente, com fundamento no RITJCE. 2.4. Não se mostra possível transmudar-se, neste momento processual, o presente incidente de uniformização de jurisprudência para o de assunção de competência, haja vista o caso não se enquadrar nos requisitos previstos no art. 947 , caput, do CPC/2015 , especialmente em razão da inexistência de relevante questão de direito e de grande repercussão social. 2.5. Preliminar afastada. Precedentes desta Seção de Direito Público. 3. DO MÉRITO. 3.1. No mérito, cumpre pacificar entendimento acerca da legalidade da prova objetiva eliminatória realizada no Curso de Formação Profissional para o cargo de Soldado da Polícia Militar do Estado do Ceará, prevista nas cláusulas 1.3 e 1.3.3, ¿d¿, do Edital nº 001 ¿ PMCE, de 09 de junho de 2008. 3.2. In casu, à época da publicação do edital do referido certame não havia autorização legal expressa na legislação estadual que possibilitasse ao regramento infralegal a aplicação, em caráter eliminatório, da prova objetiva no Curso de Formação Profissional. De fato, a Lei Estadual nº 13.729/2006 (Estatuto da Polícia Militar do Estado do Ceará), já com a redação conferida pela Lei Estadual nº 14.113/2008, prevê a realização de concurso público para ingresso na PM e explicita, taxativamente, as etapas do certame, não fazendo qualquer referência à aplicação de prova objetiva no curso de formação. Tanto é assim que somente com a edição da Lei Estadual nº 16.010/2016, o Estatuto da PMCE passou a exigir expressamente do candidato a pontuação mínima na Avaliação de Verificação de Aprendizagem, para aprovação no Curso de Formação Profissional. 3.3. A jurisprudência pátria já firmou o entendimento de que, em função de limitarem o acesso aos cargos públicos oferecidos, as exigências e condições impostas pela Administração aos participantes do concurso público não se perfazem apenas com a previsão no edital do certame, mas devem guardar estreita correlação com a expressa previsão legal. Quanto a isso, vale frisar que ¿Não pode o edital limitar o que a lei não restringiu.¿ (STF- AI XXXXX AgR, Relator (a): Min. CARLOS VELLOSO, Segunda Turma, julgado em 20/09/2005, DJ XXXXX-10-2005 PP-00016 EMENT VOL-02209-07 PP-01245). 3.4. Para ser considerada válida, a realização de qualquer tipo de prova ou avaliação de natureza eliminatória ou restritiva deve estar prevista expressamente em lei em sentido formal, não sendo legítima a imposição de critério limitante por meio unicamente de regulamento ou edital do certame. Nessa linha, o Superior Tribunal de Justiça firmou o entendimento de que, ¿Em virtude do princípio da legalidade previsto no art. 37 da CF , os requisitos para investidura em cargo público devem estar previstos em lei (em sentido amplo), que abrange todas as espécies normativas do artigo 59 da Constituição Federal .¿ (STJ - RMS XXXXX/MS , Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, QUINTA TURMA, julgado em 25/09/2008, DJe 20/10/2008). 3.5. A Constituição Federal de 1988 positivou o princípio da legalidade como um dos lastros fundamentais da atuação do Poder Público. Em seu art. 37 , caput e §§ 1º e 2º , a Constituição Cidadã estabeleceu que os cargos públicos são acessíveis segundo o preenchimento dos requisitos estabelecidos em lei, e que a investidura depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei. 3.6. O Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça já se manifestaram especificamente quanto à ilegalidade da norma editalícia ora discutida, ao julgar recursos oriundos deste Tribunal de Justiça do Estado do Ceará. 4. Incidente de uniformização de jurisprudência acolhido, para firmar entendimento no sentido de que é ilegal a exigência da prova objetiva eliminatória realizada no Curso de Formação Profissional para o cargo de Soldado da Polícia Militar do Estado do Ceará, prevista nas cláusulas 1.3 e 1.3.3, ¿d¿, do Edital nº 001 ¿ PMCE, de 09 de junho de 2008. ACÓRDÃO: Vistos, relatados e discutidos estes autos, acorda a Seção de Direito Público do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, à unanimidade de votos, em rejeitar a questão preliminar suscitada pela Procuradoria-Geral de Justiça, para conhecer do presente incidente de uniformização de jurisprudência, firmando entendimento no sentido de que é ilegal a exigência da prova objetiva eliminatória realizada no Curso de Formação Profissional para o cargo de Soldado da Polícia Militar do Estado do Ceará, prevista nas cláusulas 1.3 e 1.3.3, ¿d¿, do Edital nº 001 ¿ PMCE, de 09 de junho de 2008, na conformidade do voto do Relator. Fortaleza, data e hora indicadas pelo sistema. Presidente do Órgão Julgador DESEMBARGADOR LUIZ EVALDO GONÇALVES LEITE Relator