PENAL E PROCESSO PENAL. TRÁFICO DE DROGAS COM A CAUSA DE AUMENTO DE PARTICIPAÇÃO DE ADOLESCENTE (ART. 33 C/C ART. 40 , VI , AMBOS DA LEI Nº. 11.343 /06) C/C PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO DE USO PERMITIDO (ART. 14 DA LEI Nº 10.826 /03). 1. RECURSO MINISTERIAL. PEDIDO DE REFORMA DO DECRETO ABSOLUTÓRIO DO DELITO DE CORRUPÇÃO DE MENORES (244-B DO ECA ) EM RELAÇÃO AO PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO DE USO PERMITIDO. REJEIÇÃO. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE COMPARTILHAMENTO DA ARMA DE FOGO ENTRE OS CORRÉUS E A ADOLESCENTE. MERA CIÊNCIA DA EXISTÊNCIA DO ARTEFATO. VÍNCULO SUBJETIVO INEXISTENTE. IN DUBIO PRO REO. ABSOLVIÇÃO QUE SE IMPÕE. 2. RECURSO DA DEFESA. 2.1. PLEITO ABSOLUTÓRIO DOS CRIMES DE TRÁFICO, ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO, PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO E CORRUPÇÃO DE MENORES. PRETENSÃO PARCIALMENTE CONHECIDA. AUSÊNCIA DE INTERESSE RECURSAL QUANTO À ABSOLVIÇÃO DA ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO E CORRUPÇÃO DE MENOR. PRETENSÃO CONTEMPLADA NA SENTENÇA. NÃO CONHECIMENTO DESTES TÓPICOS. 2.2. PORTE COMPARTILHADO DE ARMA DE FOGO. NÃO CONFIGURADO. PEDIDO DE ABSOLVIÇÃO. ACOLHIDO. 2.3. NARCOTRAFICÂNCIA. ABSOLVIÇÃO POR INSUFICIÊNCIA PROBATÓRIA. DESCABIMENTO. EXISTÊNCIA DE PROVAS SUFICIENTES AO DECRETO CONDENATÓRIO. DEPOIMENTOS DOS POLICIAIS MILITARES, LOCAL E CONDIÇÕES DA AÇÃO DELITIVA. TRANSPORTE, VARIEDADE E FORMA DE ACONDICIONAMENTO DOS ENTORPECENTES COMPROVAM A AUTORIA DELITIVA. 2.4. CAUSA ESPECIAL DE AUMENTO PREVISTA NO ART. 40 , VI , DA LEI DE DROGAS . MENORIDADE. COMPROVAÇÃO POR DOCUMENTO DOTADO DE FÉ PÚBLICA. PROVA DA IDADE. QUALQUER DOCUMENTO IDÔNEO. TEMA 1052 DO STJ. MANTIDA A MAJORANTE. 3. DOSIMETRIA. PRETENSÃO DE REDIMENSIONAMENTO E MODIFICAÇÃO DE REGIME. NÃO ACOLHIDA. 4. PLEITO PARA RECORRER EM LIBERDADE. IMPOSSIBILIDADE. REQUISITOS DA PRISÃO PREVENTIVA. PRESENTES. RECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO CONHECIDO E DESPROVIDO. RECURSO DE CÍCERO CÉLIO PEREIRA DA SILVA PARCIALMENTE CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. 1. O cerne da controvérsia do recurso ministerial reside em aferir se existem, nos autos, provas suficientes à demonstração da autoria para condenar os réus nas penas do art. 14 da Lei 10.826 /03 c/c art. 244-B do ECA . Já o recurso da defesa de Cícero Célio Pereira da Silva postula pela absolvição quanto aos crimes de tráfico, associação para o tráfico, porte ilegal de arma de fogo e corrupção de menor, ante a ausência de provas de que tenha concorrido para os aludidos tipos penais, razão pela qual deve incidir o princípio do in dubio pro reo. Em sede de pedido subsidiário, roga pelo redimensionamento das penas, fixando-as no mínimo legal; a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, em virtude de o acusado ser primário e possuidor de bons antecedentes, além de requerer a detração da pena em 10 (dez) meses, a modificação do regime de cumprimento de pena para o semiaberto e o direito de apelar em liberdade. 2. Inicialmente, cumpre consignar ser ausente o interesse recursal da defesa na obtenção de provimento jurisdicional quanto à absolvição pelos crimes de associação para o tráfico e corrupção de menor, porquanto tal pretensão já fora alcançada na sentença. Pleito de absolvição dos crimes de associação para o tráfico e corrupção de menor não conhecido. 3. No tocante ao recurso ministerial, para o crime de corrupção de menores, torna-se indispensável a comprovação da menoridade. Acerca da prova do estado das pessoas, o Superior Tribunal de Justiça consolidou o entendimento segundo o qual ¿para efeitos penais, o reconhecimento da menoridade do réu requer prova por documento hábil¿ (Súmula 74 do STJ). Entende-se por documento hábil, por óbvio, o documento de registro civil, assim como outros dotados de fé pública, tais quais se apresentam o boletim de ocorrência ou o termo de depoimento ou declaração, firmado em sede policial. 4. Nesse contexto, cumpre consignar que, no que se refere ao delito de corrupção de menores e da causa de aumento pela participação da inimputável no tráfico de drogas, segundo a tese firmada no Tema Repetitivo 1052 do STJ, é imprescindível que na qualificação da menor, constante no boletim de ocorrência ou em seu termo de declaração, existam dados indicativos quanto a sua idade, assim como elementos a possibilitar a consulta de documento hábil, tais como número de CPF, requisitos estes observados nos presentes autos. 5. No que concerne ao argumento do recurso ministerial de ser possível a condenação dos réus pelo crime autônomo de corrupção de menores, verifico que não há, nos autos, evidências a demonstrar o porte ilegal de arma de fogo de uso permitido compartilhado. 6. O fato de o revólver ter sido localizado dentro de uma bolsa preta, envolto por roupas femininas, e no interior do veículo não inclui os demais na imputação do crime de porte de arma compartilhado, configurando este quando o armamento estiver apto ao uso por qualquer um dos agentes, além de preenchidos os requisitos gerais da coautoria, o que não restou demonstrado nos autos. Explico. 7. Não constam nos autos provas de que houve compartilhamento do porte da arma de fogo com os corréus, o que seria imprescindível para que se configurasse a coautoria delitiva, o que impõe a absolvição do apelante Cícero Célio quanto ao porte ilegal de arma de fogo (art. 14 da Lei nº 10.826 /03) e, consequentemente, a rejeição do pleito de condenação em relação ao art. 244-B do ECA , porquanto, não obstante a sacola preta seja da adolescente e todos tivessem ciência dos entorpecentes, o recorrente fora contratado para fazer o transporte das drogas, não se tendo notícia de que o mesmo teria sequer ciência da existência do artefato. Assim, em razão da ausência de comprovação segura do compartilhamento da arma de fogo entre os corréus e a adolescente, deve ser mantida a sentença que deixou de condenar os réus pelo delito de corrupção de menores, uma vez que reconhecida a causa de aumento de pena quanto ao crime de tráfico de drogas, evitando, assim, um bis in idem. 8. Em relação ao pleito defensivo, não obstante a negativa de autoria dos réus, verifica-se a existência de provas suficientes ao decreto condenatório nas sanções do tráfico de drogas, consistentes nos depoimentos dos policiais militares participantes das diligências da prisão em flagrante, prestados em juízo. De acordo com a dinâmica dos fatos, os policiais receberam denúncia específica noticiando o transporte de drogas e armas, seguindo no sentido da residência da adolescente chamada M.C. e, chegando próximo a Lagoa de Santo Antônio, visualizaram os acusados em um bar em mesas separadas e dentro do veículo foram encontradas a arma, revólver calibre 32 com três munições, e os entorpecentes. 9. Não merece acolhimento o pleito de absolvição alegado pela defesa do apelante. A materialidade foi comprovada pelo auto de apresentação e apreensão, além dos laudos provisórios e definitivos, nos quais se observa a conclusão de que as amostras apreendidas e encaminhadas continham 25g de cocaína e 996g de maconha. 10. Dosimetria. Na primeira fase do cálculo penalógico crime de tráfico de drogas, negativou-se o vetorial de maus antecedentes de forma justificada, já que as condenações criminais transitadas em julgado, não consideradas para caracterizar a reincidência, podem ser valoradas, na primeira etapa da dosimetria, a título de antecedentes criminais. No caso, o Juízo a quo utilizou para fins de exasperar a pena-base, a condenação do réu nos autos da ação penal nº XXXXX-67.2017.8.06.0148 , pelo Juízo da Vara Única Criminal de Ararendá, pelo crime de porte ilegal de arma de fogo de uso permitido (art. 14 do Estatuto do Desarmamento ), com trânsito em julgado em 20/08/2021. 11. Nos moldes do art. 42 da Lei nº 11.343 /06, verifico que a quantidade apreendida das citadas substâncias entorpecentes, assim como a variedade são aptas à exasperação da pena-base. Dessa forma, havendo duas circunstâncias judiciais negativadas na primeira fase da dosimetria e, sendo o recurso exclusivo da defesa, mantenho a basilar em 07 (sete) anos de reclusão, sob pena de reformatio in pejus. 12. No segundo estágio, afigurou-se a existência da agravante da reincidência, em razão de o réu possuir condenação por fato e trânsito e julgado anteriores (ação penal nº XXXXX-95.2015.8.06.0148 ); preservando-se a pena intermediária fixada em 08 (oito) anos e 02 (dois) meses de reclusão. 13. Na última fase, inexistente causa de diminuição, mas presente a causa de aumento prevista no art. 40 , VI , da Lei nº 11.343 /06, impõe-se a exasperação da sanção em 1/6 (um sexto), fixando-a em 09 (nove) anos, 06 (seis) meses e 10 (dez) dias de reclusão, além de 960 (novecentos e sessenta) dias-multa. 14. No tocante ao pleito de detração referente ao período da prisão cautelar, cumpre consignar que, com o advento da Lei n. 12.736 /2012, o Juiz processante, ao proferir sentença condenatória, deverá detrair o período de custódia cautelar para fins de fixação do regime prisional, nos termos do art. 387 , § 2º , do CPP . Ocorre, contudo, que, no caso em concreto, não é possível proceder à detração do tempo de prisão cautelar visando modificar o regime de pena imposto, uma vez que a fixação da forma inicial de cumprimento se deu em razão da reincidência e da negativação de duas circunstâncias judiciais, razão pela qual o tempo de prisão provisória não terá o condão de modificar o regime prisional imposto na sentença. 15. O regime de cumprimento de pena deve permanecer no fechado, a teor do art. 33 , § 3º do CP e da reincidência do acusado, pelo que se rejeita o pleito de abrandamento do regime. Em razão da ausência de preenchimento dos requisitos autorizadores do art. 44 do CP , não se mostra possível a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direito. 16. Quanto ao pedido de recorrer em liberdade, pudemos observar que o apelante teve a sua custódia cautelar decretada pelo Juízo a quo em 12/12/2022, por ocasião da homologação do flagrante e mantida na sentença condenatória. Assim, inviável o pleito de recorrer em liberdade formulado pela defesa, diante da ausência de fato novo que modifique a situação de permanência dos motivos da prisão cautelar. 17. Recurso do Ministério Público conhecido e desprovido. Recurso da defesa parcialmente conhecido e parcialmente provido. Sentença reformada para absolver o apelante quanto ao crime de porte ilegal de arma de fogo, assim como redimensionar a pena do delito de tráfico de drogas. ACÓRDÃO: Vistos, relatados e discutidos os presentes autos, ACORDAM os Desembargadores integrantes da 3ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Ceará, por unanimidade, em CONHECER do apelo ministerial, para NEGAR-LHE PROVIMENTO e CONHECER PARCIALMENTE do recurso da defesa e DAR-LHE PARCIAL PROVIMENTO, nos termos do voto da Relatora. Fortaleza, 21 de maio de 2024. DESEMBARGADORA ÂNGELA TERESA GONDIM CARNEIRO CHAVES Relatora