TRIBUTÁRIO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO FISCAL EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE. FUNDAMENTAÇÃO LEGAL E ORIGEM DO DÉBITO. INFORMAÇÕES CONSTANTES DA CDA. AUSÊNCIA DE PREJUÍZO. AMPARO LEGAL NA INCIDÊNCIA DE JUROS DE MORA. NULIDADE DA CDA. INEXISTÊNCIA. MULTA MORATÓRIA. PRINCÍPIO DO NÃO-CONFISCO. LIMITAÇÃO A 20% (VINTE POR CENTO). INCIDÊNCIA SOBRE MULTA PUNITIVA. NÃO CONFIGURAÇÃO DE BIS IN IDEM. DECISÃO REFORMADA EM PARTE. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. I. “Conforme preconiza os arts. 202 do CTN e 2º , § 5º da Lei nº 6.830 /80, a inscrição da dívida ativa somente gera presunção de liquidez e certeza na medida que contenha todas as exigências legais, inclusive, a indicação da natureza do débito e sua fundamentação legal, bem como forma de cálculo de juros e de correção monetária. (...) A finalidade desta regra de constituição do título é atribuir à CDA a certeza e liquidez inerentes aos títulos de crédito, o que confere ao executado elementos para opor embargos, obstando execuções arbitrárias. (...) A pena de nulidade da inscrição e da respectiva CDA, prevista no artigo 203 , do CTN , deve ser interpretada cum granu salis. Isto porque o insignificante defeito formal que não compromete a essência do título executivo não deve reclamar por parte do exequente um novo processo com base em um novo lançamento tributário para apuração do tributo devido, posto conspirar contra o princípio da efetividade aplicável ao processo executivo extrajudicial. (...) Destarte, a nulidade da CDA não deve ser declarada por eventuais falhas que não geram prejuízos para o executado promover a sua a defesa, informado que é o sistema processual brasileiro pela regra da instrumentalidade das formas (pas des nullités sans grief), nulificando-se o processo, inclusive a execução fiscal, apenas quando há sacrifício aos fins da Justiça” (STJ - REsp n. 660.623/RS , relator Ministro Luiz Fux , Primeira Turma, REPDJ de 05/09/2005, p. 241, DJ de 16/5/2005, p. 252.). II. In casu, nota-se que a própria Recorrente afirmou na Exceção de Pré-Executividade apresentada nos autos de origem que “trata-se de ação de execução fiscal ajuizada pelo MUNICÍPIO DE VITÓRIA em face da empresa Executada, em razão dos créditos tributários e multa relativos ao período de 07/2017 a 03/2019 lançados através do Termo de Inscrição nº 47996/2020, e inscritos em dívida ativa em 05/02/2020, devido ao processo administrativo 349/2019, que consubstanciaram na CDA nº 3095/2021”. III. Na espécie, considerando que tais informações foram extraídas da CDA, as quais, por conseguinte, revelam a origem do débito e a constituição do tributo especificado no referenciado título (ISSQN), inclusive com expressa referência ao Processo Administrativo em que apurado, além da especificação do período da exação, não há se falar em nulidade e tampouco em eventual prejuízo à defesa da Recorrente. IV. Quanto à tese de que a CDA amparou-se em Lei revogada para autorizar a incidência de juros de mora, é possível constatar no referido título que a observação de que os “Juros aplicáveis sobre as receitas inscritas em Dívida Ativa conforme art. 3º da Lei 4165 /94, a partir de 01/01/1995 e calculados a partir da data de inscrição do débito em Dívida Ativa com as alterações determinadas pela Lei 4452 /97”. V. Quando se examina a referenciada legislação, nota-se que o artigo 3º , da Lei Municipal nº 4165 /1994 foi, de fato, revogado pela Lei Municipal nº 4452/1997, a qual, por sua vez, dispõe no seu artigo 3º que “os tributos devidos ao Município, quando não pagos nos prazos previstos na legislação tributária, serão acrescidos de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, a contar da ocorrência do fato gerador até a sua inscrição na Dívida Ativa”. Por conseguinte, na medida em que a própria CDA fez a ressalva “com as alterações determinadas pela Lei 4452/97”, não subsiste qualquer omissão ou ausência de respaldo legal para incidência dos juros de mora. VI. Na esteira da valiosa lição do Eminente Ministro LUIS ROBERTO BARROSO , não se pode ignorar que “no direito tributário, existem basicamente três tipos de multas: as moratórias, as punitivas isoladas e as punitivas acompanhadas do lançamento de ofício. As multas moratórias são devidas em decorrência da impontualidade injustificada no adimplemento da obrigação tributária. As multas punitivas visam coibir o descumprimento às previsões da legislação tributária. Se o ilícito é relativo a um dever instrumental, sem que ocorra repercussão no montante do tributo devido, diz-se isolada a multa” (STF - Agravo Regimental no Agravo de Instrumento nº 727.872/RS). VII. Em relação às multas punitivas, cuja aplicação ocorre na hipótese de descumprimento de uma obrigação principal, o Excelso Supremo Tribunal Federal possui reiterados julgados assentando a sua inconstitucionalidade quando excederem ao patamar de 100% (cem por cento) do valor do tributo (STF - RE XXXXX AgR, Relator (a): DIAS TOFFOLI , Segunda Turma, julgado em XXXXX-09-2015, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-224 DIVULG XXXXX-11-2015 PUBLIC XXXXX-11-2015; STF - ARE XXXXX AgR, Relator (a): ROBERTO BARROSO , Primeira Turma, julgado em XXXXX-07-2023, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-s/n DIVULG XXXXX-08-2023 PUBLIC XXXXX-08-2023). VIII. No que concerne às multas isoladas, que se aplicam em virtude do descumprimento de uma obrigação acessória, a Suprema Corte, por ocasião do julgamento do RE XXXXX (Relator Ministro LUIS ROBERTO BARROSO ), submetido à sistemática da Repercussão Geral (Tema 487), fixou a tese de que “a multa isolada, em razão do descumprimento de obrigação acessória, não pode ser superior a 20% (vinte por cento) do valor do tributo devido, quando há obrigação principal subjacente, sob pena de confisco”, estando o respectivo Acórdão pendente de publicação. IX. No que tange às multas moratórias – objeto do presente recurso –, fez-se possível constatar que a questão acerca da definição do seu percentual máximo em cumprimento do princípio do não-confisco teve a Repercussão Geral reconhecida pelo Excelso Supremo Tribunal Federal, consistindo no Tema 816, que será apreciada quando do julgamento do RE XXXXX/MG (Relator Ministro DIAS TOFOLLI ). X. Enquanto não concluído o julgamento do referido paradigma, tem-se por pertinente adotar o percentual prevalecente no âmbito daquela Corte Suprema, no sentido de que não possui efeito confiscatório a multa moratória no importe de 20% (vinte por cento) do débito tributário (STF - AI XXXXX AgR, Relator (a): ROBERTO BARROSO , Primeira Turma, julgado em XXXXX-04-2015, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-091 DIVULG XXXXX-05-2015 PUBLIC XXXXX-05-2015). XI. Na hipótese dos autos, a despeito de a Legislação Municipal prever que “a inscrição do crédito fiscal na Dívida Ativa sujeita o devedor à multa moratória de 30% (trinta por cento) calculado sobre o valor do crédito não pago no vencimento” (§ 1º, do artigo 25, da Lei nº 3112/1983), certo é que tal percentual, por ter sido fixado em Diploma Legal anterior à Constituição Federal de 1988, não foi recepcionado pela ordem constitucional vigente quanto ao excedente ao patamar de 20% (vinte por cento) reconhecido pelo Excelso Supremo Tribunal Federal à luz do princípio constitucional do não-confisco. Logo, tal limitação deve ser imposta à CDA de origem. XII. Dispensa-se a submissão da matéria à cláusula de reserva de plenário (artigo 97 , da Constituição Federal ), não só porque se está diante de hipótese de não recepção de norma à luz do novo texto constitucional (STF – AI XXXXX AgR, Ministro LUIZ FUX ), como também porque o Excelso Supremo Tribunal Federal já analisou matéria constitucional equivalente em outros julgados (artigo 481, parágrafo único, do Código do Processo Civil; e STF – Rcl XXXXX/PE – Ministro LUIS ROBERTO BARROSO ). XIII. Não configura bis in idem a incidência de multa moratória sobre multa punitiva, porquanto ambas possuem fatos geradores distintos. É que enquanto a última, por decorrer do cometimento de sonegação, passa a integrar o montante do crédito tributário, a primeira incide em virtude da impontualidade no recolhimento deste, cujo atraso sujeita-se à incidência dos encargos dele decorrentes. Precedente. XIV. Recurso conhecido e parcialmente provido para acolher em parte a Exceção de Pré-Executividade manejada pela Recorrente tão somente para ordenar que a multa moratória seja limitada a 20% (vinte por cento) do crédito tributário, devendo o excedente ser decotado da CDA objeto da Ação de Execução Fiscal de origem.