APELAÇÃO. CRIMES DE TORTURA, DE ABUSO DE AUTORIDADE, DE PECULATO E DE CONCUSSÃO. (1) INEXISTÊNCIA DE PREVENÇÃO DA 3ª CÂMARA DE DIREITO CRIMINAL. A MERA E EVENTUAL PRÁTICA DOS MESMOS CRIMES NÃO INDUZ À CONEXÃO QUANDO A PROVA DE UM CRIME NÃO INFLUI NA DE OUTRO E AS VÍTIMAS SÃO DIFERENTES. A INOBSERVÂNCIA DA REGRA DA COMPETÊNCIA POR PREVENÇÃO TRADUZ-SE EM NULIDADE RELATIVA, QUE DEPENDE DA COMPROVAÇÃO DE PREJUÍZO. PRECEDENTES. (2) RECONHECIMENTO PESSOAL. INOBSERVÂNCIA DAS FORMALIDADES PREVISTAS NO ART. 226 , II, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL . RECOMENDAÇÃO. OUTROS ELEMENTOS PROBATÓRIOS. POSSIBILIDADE DE RECONHECIMENTO FOTOGRÁFICO DOS RÉUS, SEM MÁCULA ALGUMA, DESDE QUE SEJA ELE RATIFICADO E CORROBORADO POR OUTRAS PROVAS. NULIDADE. INOCORRÊNCIA. AUSÊNCIA DE PREJUÍZO. (3) MATERIALIDADES E AUTORIAS COMPROVADAS . (4) PALAVRAS DAS VÍTIMAS. VALIDADE. (5) DEPOIMENTOS DE POLICIAIS. VALIDADE. (6) INDÍCIOS. CIRCUNSTÂNCIAS DO CASO CONCRETO EVIDENCIAM A PRÁTICA DOS CRIMES NARRADOS NA DENÚNCIA. (7) CRIME DE "TORTURA-PROVA" CONSUMADO. (8) DESNECESSIDADE DE REALIZAÇÃO DE PERÍCIA PARA A COMPROVAÇÃO DO CRIME. (9) CAUSA DE AUMENTO PREVISTA NO ART. 1º , § 4º , I , DA LEI N. 9.455 /97. CRIMES PRATICADOS POR AGENTES PÚBLICOS E MEDIANTE SEQUESTRO. (10) CRIME DE ABUSO DE AUTORIDADE. (11) CRIME DE PECULATO. (12) CRIME DE CONCUSSÃO. (13) DOSIMETRIA DAS PENAS. MANUTENÇÃO DAS PENAS-BASE EM PATAMAR ACIMA DO MÍNIMO LEGAL, EM RELAÇÃO AOS CRIMES DE TORTURA, E DAS BASILARES EM SEUS PATAMARES MÍNIMOS, EM RELAÇÃO AOS CRIMES DE ABUSO DE AUTORIDADE, DE PECULATO E DE CONCUSSÃO. POSSIBILIDADE DO MAGISTRADO AGREGAR E APRESENTAR NOVOS FUNDAMENTOS. (14) CIRCUNSTÂNCIA AGRAVANTE PREVISTA NO ART. 61 , II , G, DO CÓDIGO PENAL (CRIME PRATICADO COM ABUSO DE PODER OU VIOLAÇÃO DE DEVER INERENTE A CARGO, OFÍCIO, MINISTÉRIO OU PROFISSÃO). (15) REGIME PRISIONAL MANTIDO NO FECHADO PARA OS CRIMES PUNIDOS COM PENA DE RECLUSÃO (CRIMES DE TORTURA, DE PECULATO E DE CONCUSSÃO). (16) REGIME PRISIONAL REDIMENSIONADO PARA O SEMIABERTO PARA O CRIME PUNIDO COM PENA DE DETENÇÃO (CRIME DE ABUSO DE AUTORIDADE). (17) PERDA DO CARGO PÚBLICO E INTERDIÇÃO PARA O EXERCÍCIO PELO DOBRO DO PRAZO DA PENA. MANUTENÇÃO. PRECEDENTES. (18) AFASTAMENTO DAS PRELIMINARES ARGUIDAS E, NO MÉRITO, NEGADO PROVIMENTO AOS RECURSOS DEFENSIVOS, REDIMENSIONANDO, DE OFÍCIO, PARA O CRIME DE ABUSO DE AUTORIDADE, O REGIME PRISIONAL PARA O SEMIABERTO, EM RAZÃO DE SER PUNIDO COM DETENÇÃO. 1. Ausência de prevenção da 3ª Câmara de Direito Criminal. Somente haveria prevenção da Câmara na hipótese de processos originários conexos e para todos os recursos, na causa principal, cautelar ou acessória, incidente, oriunda de outro, conexa ou continente, derivadas do mesmo ato, fato, contrato ou relação jurídica, e nos processos de execução dos respectivos julgados. No caso concreto, além de não se tratar de processo originário conexo, não se trata de recurso na causa principal, cautelar ou acessória, incidente, oriunda de outro, conexa ou continente derivadas do mesmo ato ou fato, mas sim de processo-crime distribuído livremente, conforme prevê o art. 181, do RITJSP. Além disso, o fato dos réus também terem sido processados pela prática de crimes semelhantes aos destes autos em outro processo-crime (analisado e julgado pela 3ª Câmara de Direito Criminal), não implica, por si só, em conexão probatória, haja vista que as condutas imputadas aos réus e as vítimas destes autos são distintas daquelas analisadas pela 3ª Câmara de Direito Criminal. Precedentes do STJ ( CC XXXXX/PR – Rel. Min. Laurita Vaz – Terceira Seção – j. em 23/08/2023 – DJe de 30/08/2023 e CC XXXXX/SP – Rel. Min. Antonio Saldanha Palheiro – Terceira Seção – j. em 26/04/2023 – DJe de 02/05/2023). 2. Reconhecimento pessoal. O art. 226 , II, do Código de Processo Penal , dispõe que, para o reconhecimento pessoal, o réu será, se possível, colocado ao lado de outras pessoas que com ele tiverem qualquer semelhança. Trata-se, portanto, de mera recomendação, afinal, em se tratando da expressão "se possível", o legislador registrou que a aplicabilidade da referida norma depende das possibilidades fáticas que lhe subjazem, sobretudo porque, muitas vezes, pode-se mostrar difícil (ou mesmo impossível) encontrar pessoas de traços semelhantes àquele que será reconhecido. Precedentes do STF ( RHC 214.211 -AgR/MS – Rel. Min. ANDRÉ MENDONÇA – Segunda Turma – j. em 22/02/2023 – DJe de 28/02/2023; RHC XXXXX/SC – Rel. Min. LUIZ FUX – j. em 31/03/2023 – DJe de 04/04/2023; HC 207.000 -AgR/SP – Rel. Min. ALEXANDRE DE MORAES – Primeira Turma – j. em 04/11/2021 – DJe de 11/11/2021 e RHC XXXXX/PR – Rel. Min. GILMAR MENDES – Segunda Turma – j. em 25/02/2014 – DJe de 05/09/2014) e do STJ ( AgRg no HC XXXXX/MS – Rel. Min. Joel Ilan Paciornik – Quinta Turma – j. em 22/02/2022 – DJe de 02/03/2022; AgRg no HC XXXXX/RJ – Rel. Min. Joel Ilan Paciornik – Quinta Turma – j. em 23/11/2021 – DJe de 26/11/2021 e AgRg no AREsp XXXXX/SP – Rel. Min. Jesuíno Rissato – Quinta Turma – j. em 14/09/2021 – DJe de 27/09/2021). Ainda, é possível o reconhecimento fotográfico do réu, sem mácula alguma, desde que seja ele ratificado e corroborado por outras provas. Precedentes do STF ( HC 221.667 -AgR/SP – Rel. Min. CÁRMEN LÚCIA – Primeira Turma – j. em 05/12/2022 – DJe de 07/12/2022 e HC 217.826 -AgR/RS – Rel. Min. DIAS TOFFOLI – Primeira Turma – j. em 03/10/2022 – DJe de 28/11/2022). Ainda que assim não fosse, as condenações dos réus levaram em conta outros elementos de prova colhidos sob o crivo do contraditório (as vítimas afirmaram, em Juízo, que reconheceram, por intermédio de fotografia, os réus, na Delegacia de Polícia, como sendo os autores dos crimes). Em Juízo, tornaram a reconhecê-los (dois deles) e o fizeram presencialmente. O Delegado de Polícia, testemunha arrolada pela acusação, em Juízo, confirmou os respectivos reconhecimentos fotográficos realizados na Delegacia de Polícia. Tais circunstâncias, na trilha do entendimento jurisprudencial acima mencionado, afastam a alegação de nulidade pela inobservância do art. 226 , II, do Código de Processo Penal , que se ocorrente, à evidência, não maculou o todo probatório. Assim, não há falar-se em nulidade do reconhecimento fotográfico dos réus, até porque não há dúvidas de que eles praticaram os crimes narrados na denúncia. Por fim, não houve demonstração de qualquer prejuízo concreto à defesa, não se podendo falar na existência de nulidade processual, mesmo porque vigora no Direito Processual Penal pátrio o princípio "pas de nullité sans grief", pelo qual não se declara nulidade se desta não houver resultado prejuízo, concreto, para uma das partes. Precedentes do STF ( HC 226.309 -AgR/MT – Rel. Min. LUIZ FUX – Primeira Turma – j. em 03/05/2023 – DJe de 12/05/2023; HC 204.853 -AgR/AC – Rel. Min. NUNES MARQUES – Segunda Turma – j. em 18/04/2023 – DJe de 03/05/2023; Rcl 57.391 -AgR-segundo/CE – Rel. Min. ALEXANDRE DE MORAES – Primeira Turma – j. em 01/03/2023 – DJe de 02/03/2023; HC 221.838 -AgR/PE – Rel. Min. ROBERTO BARROSO – Primeira Turma – j. em 19/12/2022 – DJe de 06/02/2023; HC 186.720 -AgR/SP – Rel. Min. ROSA WEBER – Primeira Turma – j. em 29/08/2022 – DJe de 31/08/2022; RHC 208.338-AgR/SP – Rel. Min. DIAS TOFFOLI – Primeira Turma – j. em 09/05/2022 – DJe de 29/06/2022 e HC 198.937 -AgR/DF – Rel. Min. EDSON FACHIN – Segunda Turma – j. em 18/12/2021 – DJe de 24/02/2022). 3. Materialidades e autorias comprovadas com relação aos crimes de tortura, de abuso de autoridade, de peculato e de concussão. Circunstâncias do caso concreto comprovam os dolos adequados às espécies. 4. Palavras das vítimas. Validade. As palavras das vítimas assumem fundamental importância, eis que, em sede de crimes de tortura, de abuso de autoridade, de peculato e de concussão, normalmente tocados de clandestinidade, é a única na qual pode a autoridade judiciária fiar-se, à falta de testemunhas presenciais. Precedentes do STJ ( AgRg no HC XXXXX/PE – Rel. Min. Joel Ilan Paciornik – Quinta Turma – j. em 05/06/2023 – DJe de 09/06/2023 e AgInt no AREsp XXXXX/SP – Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz – Sexta Turma – j. em 07/03/2017 – DJe de 22/3/2017). 5. Validade dos depoimentos de policiais. Os depoimentos judiciais de policiais, militares ou civis e de guardas civis, têm o mesmo valor dos depoimentos oriundos de quaisquer outras testemunhas estranhas aos quadros policiais. Entendimento contrário seria e é chapado absurdo, porque traduziria descabido e inconsequente preconceito, ao arrepio, ademais, das normas Constitucionais e legais. No duro, inexiste impedimento ou suspeição nos depoimentos prestados por policiais, militares ou civis, ou por guardas civis, mesmo porque seria um contrassenso o Estado, que outrora os credenciara para o exercício da repressão criminal, outorgando-lhes certa parcela do poder estatal, posteriormente, chamando-os à prestação de contas, perante o Poder Judiciário, não mais lhes emprestasse a mesma credibilidade no passado emprestada. Logo, são manifestas a ilegalidade e mesmo a inconstitucionalidade de entendimentos que subtraíssem, "a priori", valor dos sobreditos depoimentos judiciais pelo simples fato de terem sido prestados por pessoas revestidas da qualidade de policiais "lato sensu". Precedentes do STF (HC 223.425-AgR/RJ – Rel. Min. LUIZ FUX – Primeira Turma – j. 01/03/2023 – DJe de 08/03/2023; HC XXXXX/PR – Rel. Min. MARCO AURÉLIO – Primeira Turma – j. 27/04/2021 – DJe de 13/05/2021; HC XXXXX-5/PE – Rel. Min. CARLOS AYRES BRITTO – Primeira Turma – j. 05/09/2006 – DJU de 16/02/2007; HC XXXXX/SP – Rel. Min. CARLOS VELLOSO – Segunda Turma – j. 14/06/1998 – DJU de 14/08/1998 e HC XXXXX-5/SP – Rel. Min. CELSO DE MELLO – Primeira Turma – j. 26/03/1996 – DJU de 18/10/96) e do STJ (AgRg no AREsp XXXXX/MG – Rel. Min. Ribeiro Dantas – Quinta Turma – j. 14/03/2023 – DJe de 17/03/2023; AgRg no HC XXXXX/SP – Rel. Min. Messod Azulay Neto – Quinta Turma – j. 06/03/2023 – DJe de 14/03/2023; AgRg no HC XXXXX/RJ – Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca – Quinta Turma – j. 22/11/2022 – DJe de 28/11/2022; AgRg no HC XXXXX/MG – Rel. Min. Laurita Vaz – Sexta Turma – j. 25/10/2022 – DJe de 03/11/2022; AgRg no HC XXXXX/SP – Rel. Min. Jesuíno Rissato – Quinta Turma – j. 02/08/2022 – DJe de 16/08/2022; AgRg no AREsp XXXXX/PR – Rel. Min. Ministro Joel Ilan Paciornik – Quinta Turma – j. 26/04/2022 – DJe de 03/05/2022; AgRg nos EDcl no AREsp XXXXX/PR – Rel. Min. Joel Ilan Paciornik – Quinta Turma – j. 29/03/2022 – DJe de 04/04/2022 e AgRg no HC XXXXX/SP – Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca – Quinta Turma – j. 26/10/2021 – DJe de 03/11/2021). 6. Os indícios são as circunstâncias conhecidas e provadas a partir das quais, mediante um raciocínio lógico, pelo método indutivo, se obtém a conclusão, firme, segura e sólida de outro facto; a indução parte do particular para o geral e, apesar de ser prova indireta, tem a mesma força que a testemunhal, a documental ou outra. Validade da utilização dos indícios como prova da autoria criminosa. Precedentes do STF ( AP XXXXX/MG – Pleno – Voto Min. CEZAR PELUSO – j. em 28/08/12 – Revista Trimestral de Jurisprudência – Volume 225 – Tomo II – pág. 1.218/1.220 e AP XXXXX/MG – Pleno – Voto Min. LUIZ FUX – j. em 28/08/12 – Revista Trimestral de Jurisprudência – Volume 225 – Tomo II – pág. 838/842). 7. Crime de tortura. As circunstâncias do caso concreto comprovaram a prática da conduta típica da "tortura-prova" (art. 1º , I , a , da Lei n. 9.455 /97), tendo em vista que os réus impuseram à vítima, com emprego de violência e grave ameaça, intenso sofrimento físico e mental, com o fim de obter dela informação, declaração ou confissão. Precedente do STJ (REsp XXXXX/RJ – Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz – Sexta Turma – j. em 22/8/2023 – DJe de 28/8/2023). O crime restou consumado, uma vez que o crime de "tortura-prova" se aperfeiçoa no momento em que a violência ou a grave ameaça é realizada pelo sujeito ativo, podendo ser de ordem física ou moral, pouco importando ter o torturador alcançado o seu objetivo. 8. Crime de tortura x desnecessidade de realização de perícia. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que não é necessária a realização da perícia para se comprovar a prática criminosa, porque é admitido no nosso ordenamento jurídico a sua comprovação por outros meios de prova, inclusive oral. Precedentes (AgRg no REsp XXXXX/MG – Rel. Min. Ribeiro Dantas – Quinta Turma – j. em 27/11/2023 – DJe de 1/12/2023). 9. Crime de tortura x majorantes. Presentes as causas especiais de aumento de pena previstas no art. 1º , § 4º , I e III , da Lei n. 9.455 /97, uma vez que o crime foi praticado por agentes públicos e mediante sequestro. 10. Crime de abuso de autoridade. De acordo com o art. 22 , da Lei n. 13.869 /19, é típica a conduta daquele agente público, servidor ou não, que, no exercício de suas funções ou a pretexto de exercê-las, invade ou adentra, clandestina ou astuciosamente, ou à revelia da vontade do ocupante, imóvel alheio ou suas dependências, ou nele permanece nas mesmas condições, sem determinação judicial ou fora das condições estabelecidas em lei. Assim, para a configuração do crime de abuso de autoridade é preciso existir uma finalidade específica ou, ainda, a possibilidade de obter benefícios para si ou para terceiros. Em alguns casos, o crime de abuso de autoridade também pode ocorrer quando o agente deseja obter algum tipo de satisfação pessoal ou por mero capricho. 11. Crime de peculato. O crime de peculato pressupõe a posse, pelo funcionário público, em razão do cargo, de bens ou valores, tanto que se caracteriza exatamente quando da inversão da natureza dessa posse, mediante apropriação ou desvio em benefício próprio ou de terceiros. Definido pelo art. 312 , do Código Penal , como apropriação, por parte de um funcionário público, de um bem a que ele tenha acesso por causa do cargo que ocupa, é mister que deve ocorrer o descumprimento do dever funcional e o dano patrimonial (particular ou público) para a configuração do crime. Ainda, o crime previsto no art. 312 , do Código Penal , enquadra-se no rol dos crimes pluriofensivos, atingindo, além dos próprios bens que compõem o patrimônio estatal, outros valores, tais como a probidade, a lisura e a retidão reclamadas no trato da coisa pública. Inteligência da doutrina de Nelson Hungria . Precedente do STF ( Inq XXXXX/DF – Rel. Min. ALEXANDRE DE MORAES – Primeira Turma – j. em 11/02/2020 – DJe de 23/06/2020). 12. Crime de concussão. O crime de concussão ocorre quando o servidor exige alguma coisa em razão de seu cargo. Consiste em exigir, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida. Crime próprio de servidores públicos, podendo certas categorias terem suas condutas valoradas de forma mais grave em razão de seu "munus". Precedente do Superior Tribunal de Justiça ( AgRg nos EDcl no AgRg nos EDcl no AREsp XXXXX/PR – Rel. Min. Antonio Saldanha Palheiro – Sexta Turma – j. em 6/6/2023 – DJe de 14/6/2023). No caso de que se está a tratar, haja vista a denúncia ter imputado aos réus a prática do crime tipificado no art. 316 , "caput", do Código Penal , tem-se a figura da chamada concussão típica, que de um jeito ou de outro, é crime próprio, formal, uma vez que não exige, para a sua consumação, qualquer resultado naturalístico, consistente no efetivo benefício auferido pelo agente, caso em que se estaria diante da figura do exaurimento. A propósito, sem que se tenha maior discrepância quanto ao que se está a afirmar, tem-se o crime de concussão como consumado com a efetiva exigência da vantagem indevida, tanto assim que o posterior recebimento daquilo que foi exigido, insista-se, constitui mero exaurimento do crime. Crime de concussão consumado, até porque não importa que os réus não tivessem recebido o dinheiro da vítima, pois o recebimento da quantia exigida seria o mero exaurimento do crime. Precedente do STJ (AgRg no AREsp XXXXX/PR – Rel. Min. Ribeiro Dantas – Quinta Turma – j. em 12/12/2023 – DJe de 19/12/2023). 13. Dosimetria das penas. Na dosimetria da pena dos réus devem ser levadas em consideração as diretrizes do art. 59, "caput", do Código Penal , a saber: culpabilidade, antecedentes, conduta social, personalidade do agente, motivos do crime, as suas circunstâncias e consequências, comportamento da vítima e tudo para que se possa calibrar as penas em conformidade com a necessidade e suficiência para a reprovação e prevenção do crime específico. Doutrina de Guilherme de Souza Nucci , Juan Carlos Ferre Olivé , Miguel Ángel Núnez Paz , William Terra de Oliveira e Alexis Couto de Brito . Manutenção das penas-base em patamar acima do mínimo legal, em relação ao crime de tortura, e das basilares em seus patamares mínimos, em relação aos crimes de abuso de autoridade, de peculato e de concussão. Possibilidade do Juízo "ad quem", por ocasião da análise das circunstâncias do art. 59 , "caput", do Código Penal (mas não só), agregar e apresentar novos fundamentos, diferentes dos apresentados pelo Juízo "a quo", para justificar o exasperamento da pena (mas também não só), desde que não se ultrapasse aquela fixada anteriormente pelo Magistrado singular, ainda que se trata de recurso exclusivo do réu. Precedentes do STF ( HC XXXXX/MT – Rel. Min. CÁRMEN LÚCIA – Primeira Turma – j. em 18/10/2011 – DJe de 01/02/2012 e HC XXXXX/SP – Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE – Primeira Turma – j. em 31/03/1998 – DJ de 08/05/1998) e do STJ ( AgRg no AREsp XXXXX/RS – Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca – Quinta Turma – j. em 04/10/2022 – DJe de 10/10/2022 e AgRg no AgRg no HC XXXXX/SC – Rel. Min. Laurita Vaz – Sexta Turma – j. em 05/04/2022 – DJe de 08/04/2022). Doutrina de Eugênio Pacelli , Douglas Fischer , José Frederico Marques , Ada Pellegrini Grinover , Antonio Magalhães Gomes Filho e Antonio Scarance Fernandes . 14. Circunstância agravante prevista no art. 61 , II , g , do Código Penal (crimes praticados com abuso de poder ou violação de dever inerente a cargo, ofício, Ministério ou profissão). Cabimento. 15. Regime fechado para todos os crimes punidos com pena de reclusão. Em relação ao crime de tortura, as mesmas razões que levaram ao exasperamento da pena-base servem de fundamento para justificar a imposição do regime prisional fechado, nos exatos termos do art. 33 , § 3º , do Código Penal . Precedentes do STF ( HC 222.163 -AgR/MS – Rel. Min. ROBERTO BARROSO – Primeira Turma – j. em 19/12/2022 – DJe de 06/02/2023; HC 209.906 -AgR/PR – Rel. Min. DIAS TOFFOLI – Primeira Turma – j. em 04/04/2022 – DJe de 26/05/2022 e HC 203.078 -AgR/SP – Rel. Min. CÁRMEN LÚCIA – Segunda Turma – j. em 03/08/2021 – DJe de 09/08/2021) e do STJ ( AgRg no HC XXXXX/SP – Rel. Min. Antonio Saldanha Palheiro – Sexta Turma – j. em 13/03/2023 – DJe de 16/03/2023; AgRg no HC XXXXX/SP – Rel. Min. Jesuíno Rissato – Sexta Turma – j. em 07/03/2023 – DJe de 10/03/2023 e AgRg no HC XXXXX/PB – Rel. Min. Messod Azulay Neto – Quinta Turma – j. em 06/03/2023 – DJe de 14/03/2023). Ainda, o regime fechado era mesmo de rigor, medida esta estabelecida em perfeita harmonia com o tratamento diferenciado e mais rígido conferido pela própria Constituição Federal aos crimes hediondos e equiparados (art. 5º, XLIII), lembrando que por força da Lei n. 8.072 /90, o crime previsto no art. 1º , I , a , da Lei n. 9.455 /97, é equiparado ao crime hediondo. Precedente do STF ( RHC 218.462 -AgR/PR – Rel. ALEXANDRE DE MORAES – Primeira Turma – j. em 26/09/2022 – DJe de 30/09/2022). Por fim, o "quantum" da pena final também recomendaria o regime fechado. Inteligência do art. 33 , § 2º , a, do Código Penal . Em relação aos crimes de abuso de autoridade, de peculato e de concussão, embora as penas-base tenham sido balizadas nos mínimos legais, isso não torna obrigatória a fixação de regime menos severo, desde que, por meio de elementos extraídos da conduta delitiva, seja demonstrada a gravidade concreta do crime, de forma a autorizar a imposição de regime mais rigoroso do que aquele permitido pelo "quantum" da pena. É medida de rigor, portanto, a manutenção da imposição de regime inicial fechado para o cumprimento da pena de cada réu, tendo em vista as peculiaridades das circunstâncias que cercaram as práticas das ações delituosas, a revelar-se imperiosa. Precedentes do STF ( HC XXXXX/SP – Rel. Min. ALEXANDRE DE MORAES – j. em 03/02/2023 – DJe de 06/02/2023; HC XXXXX/SP – Rel. Min. ROBERTO BARROSO – j. em 19/10/2022 – DJe de 20/10/2022) e do STJ ( AgRg no AREsp XXXXX/SP – Rel. Min. Laurita Vaz – Sexta Turma – j. em 14/3/2023 – DJe de 24/03/2023; AgRg no HC XXXXX/SP – Rel. Min. Antonio Saldanha Palheiro – Sexta Turma – j. em 13/03/2023 – DJe de 16/3/2023; AgRg no HC XXXXX/SP – Rel. Min. Ribeiro Dantas – Quinta Turma – j. em 28/11/2022 – DJe de 2/12/2022 e AgRg no AgRg no AREsp XXXXX/SP – Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca – Quinta Turma – j. em 18/10/2022 – DJe de 24/10/2022). 16. Regime semiaberto para o crime punido com pena de detenção. Em relação ao crime de abuso de autoridade, por ser apenado com detenção, ele não poderia ter o seu regime inicial fixado no fechado, nos termos do art. 33 , "caput", do Código Penal , devendo neste ponto ser revisto, o que faço de ofício, modificando-o para o regime prisional semiaberto, ante as peculiaridades das circunstâncias que cercaram a prática da ação delituosa, intrinsicamente relacionada com o gravíssimo crime de tortura, tudo a impedir um regime mais benéfico. Inteligência do § 3º , do art. 33 , do Código Penal . 17. Perda do cargo público. A jurisprudência do SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL é torrencial no sentido de que a perda do cargo público e a interdição para o seu exercício pelo dobro do prazo da pena aplicada são efeitos extrapenais automáticos automático da sentença penal condenatória. Precedentes ( ARE XXXXX/SC – Rel. Min. ALEXANDRE DE MORAES – j. em 20/02/2024 – DJe de 22/02/2024; Rcl XXXXX/SC – Rel. Min. CELSO DE MELLO – j. em 18/08/2020 – DJe de 04/09/2020 e AR XXXXX/RN – Rel. Min. GILMAR MENDES – j. em 12/09/2018 – DJe de 17/09/2018). 18. Afastamento das preliminares arguidas e, no mérito, improvimento aos recursos defensivos, redimensionando, de ofício, para o crime de abuso de autoridade, o regime prisional para o semiaberto.