APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PROCESSUAL CIVIL E DIREITO DO CONSUMIDOR. AÇÃO DECLARATÓRIA ANULATÓRIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. SENTENÇA JULGADA IMPROCEDENTE. CONTRATAÇÃO DE CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO. AUTOR INDUZIDO A ERRO, POIS PRETENDIA FIRMAR EMPRÉSTIMO CONSIGNADO CONVENCIONAL. PECULIARIDADES DO CASO CONCRETO QUE DEMONSTRAM VERACIDADE DA ALEGAÇÃO AUTORAL. CARTÃO NÃO UTILIZADO PARA FAZER COMPRAS. CRÉDITO DISPONIBILIZADO NA CONTA DO AUTOR QUE NÃO TEM O CONDÃO, POR SI SÓ, DE CONVALIDAR O NEGÓCIO JURÍDICO. CONTRATO DE CARTÃO DE CRÉDITO QUE SE MOSTRA DESVANTAJOSO EM RELAÇÃO AO EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. AUSÊNCIA DE INFORMAÇÃO CLARA E ADEQUADA. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. VÍCIO DE VONTADE CONFIGURADO. NULIDADE DO CONTRATO E DEVER DE INDENIZAR QUE SE IMPÕE. RESTITUIÇÃO NA FORMA SIMPLES, E EM DOBRO EM RELAÇÃO AOS DESCONTOS EVENTUALMENTE REALIZADOS APÓS 30/03/2021. COMPENSAÇÃO DO VALOR TRANSFERIDO. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. SENTENÇA REFORMADA. 1. Tratam-se os autos de Apelação Cível interposta contra sentença que julgou improcedente a de Ação Declaratória Anulatória de Débito c/c Indenização Por Danos Morais e Materiais. 2. No caso em tela, a controvérsia recursal consiste em saber se o contrato de cartão de crédito com reserva de margem consignável (RCM), supostamente celebrado entre a instituição financeira e a parte autora, ora apelante, é válido ou não, em consonância com as provas produzidas na origem e se, desse contrato, existe dano passível de indenização. 3. Feitas essas considerações, cumpre, inicialmente, esclarecer que nas ações que versam sobre empréstimo consignado ou descontos provenientes de cartão de crédito consignado em benefício previdenciário, a prova da contratação e do proveito econômico do consumidor diante da operação bancária/transferência/depósito do valor contratado são elementos essenciais ao deslinde dos fatos e à procedência ou improcedência da demanda. 4. Nesse contexto, o contrato devidamente assinado e o comprovante do repasse do crédito decorrente do empréstimo na conta do consumidor, são documentos indispensáveis para à apreciação da demanda e, por consequência, para a demonstração da regular contratação. Logo, tendo o promovente/apelante juntado aos autos, comprovante dos descontos realizados em seu benefício previdenciário, caberia a instituição financeira apresentar provas concretas acerca da anuência da parte autora quanto a estes descontos, por meio de instrumento contratual devidamente assinado e o repasse do crédito decorrente do empréstimo na conta do consumidor. 5. De outro lado, da análise acurada dos fólios, percebe-se que não há evidência de movimentações realizadas com o cartão de crédito supostamente contratado. Isto porque, o demandante/apelante sequer efetuou compras com o cartão de crédito, conforme se extrai das faturas de fls. 80/136, anexadas pela própria instituição financeira, desde a data da inclusão do empréstimo impugnado em 2018 a 10/02/2023, fato que corrobora para a alegação da parte recorrente de não ter contratado um empréstimo consignado por via de Cartão de Crédito, visto que em nenhum momento fez uso dele. Neste passo, tal circunstância leva a crer que, no máximo, a demandante realmente tinha a intenção de contratar um empréstimo consignado convencional ao receber o crédito, esperando, a partir de então, sofrer os descontos mensais correspondentes, e não descontos relativos ao pagamento mínimo da fatura mensal do cartão, cujo valor aumenta a cada mês em razão dos encargos correspondentes. 6. In casu, o agente financeiro não se desincumbiu do ônus de comprovar que teria esclarecido a natureza da operação cartão de crédito consignado, com seus respectivos encargos, ferindo o direito do consumidor quanto à informação clara e precisa sobre o produto (art. 6º , III , do CDC ). 7. Ressalte-se que o fato de ter sido feito depósito na conta do autor não tem o condão, só por si, de convalidar o negócio, mormente porque constitui providência similar à adotada no empréstimo consignado, portanto, a transferência/depósito não serve para evidenciar a adesão válida da autora ao cartão de crédito. Na verdade, a forma de execução do contrato foi um fator que levou a induzir a autora em erro, haja vista que em ambos há descontos no benefício previdenciário. 8. Reconhecida a falha na prestação do serviço, consubstanciada na falta de informação prévia, clara e precisa que levou o consumidor a se submeter a contrato mais oneroso, resta configurado o ato ilícito, o dano moral e o dever de indenizar, posto que os fatos ultrapassaram o mero aborrecimento. 9. Levando-se em consideração as circunstâncias do caso concreto, tenho que o valor a título indenizatório a ser arbitrado é de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), quantia que guarda proporcionalidade com o ocorrido, além de se encontrar em consonância com os parâmetros médios utilizados pela jurisprudência deste E. Tribunal, em demandas análogas. 10. Recurso conhecido e parcialmente provido. Sentença reformada. ACÓRDÃO: Vistos, relatados e discutidos estes autos, acorda a 1ª Câmara Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, por unanimidade, em conhecer do recurso interposto para dar-lhe parcial provimento, nos termos do voto do Relator. Fortaleza, data da assinatura eletrônica. DESEMBARGADOR EMANUEL LEITE ALBUQUERQUE Presidente do Órgão Julgador DESEMBARGADOR CARLOS AUGUSTO GOMES CORREIA Relator