APELAÇÃO-CRIME. MINISTÉRIO PÚBLICO E DEFESA. ROUBO DUPLAMENTE MAJORADO. EMPREGO DE ARMA DE FOGO. CONCURSO DE AGENTES. 1. ÉDITO CONDENATÓRIO. RÉU JANDER. MANUTENÇÃO. Prova amplamente incriminatória, firmada na palavra convincente e coerente do ofendido, em ambas as fases da ausculta, narrando que aguardava um cliente no interior de seu automóvel quando os réus pararam ao seu lado, em um veículo Voyage antigo, o acusado Jander dele desembarcando, apontando uma arma e mandando-o sair do carro, os agentes deixando o local na posse da res furtivae (automóvel, equipamentos da empresa, seu celular e outros pertences). Referiu, ainda, que o fato ocorreu por volta das 14h30min e, posteriormente, em torno de 16h30min, foi informado pelos policiais militares acerca da recuperação do automóvel, os quais lhe encaminharam fotografias dos suspeitos, comparecendo ao local e reconhecendo o inculpado Jander como sendo o indivíduo que o abordou armado, enquanto o réu Douglas era o condutor do veículo Voyage, em juízo reconhecendo os acusados, sem qualquer dúvida, em ato formal que observou o disposto no art. 226 do CPP , confirmando a certeza que externara no indigitamento realizado na fase policial. O reconhecimento fotográfico, apesar da precariedade que lhe é inerente, mostra-se apto a integrar o acervo probatório, apenas devendo ser corroborado por outros elementos de prova, como ocorrido no caso. A palavra da vítima assume especial relevo probatório, porque não se acredita que imputasse a outrem, que sequer conhecia previamente, crime tão grave como este, somente ao fim de prejudicá-lo, indemonstrada qualquer razão para falsa inculpação. Relato vitimário corroborado pela palavra do policial militar, que confirmou o flagrante na forma descrita na denúncia, esclarecendo que, após atenderem ao comunicado do roubo e deixarem a vítima na Delegacia de Polícia, realizaram diligências que culminaram com a localização do automóvel e dos agentes, que visualizou desembarcando do veículo subtraído, abordando-os, a vítima reconhecendo-os como os autores do crime. O depoimento do agente de segurança pública tem valor probante igual ao de qualquer outra testemunha e, como tal, pode e deve ser considerada para efeito probatório, não havendo qualquer indicação concreta de que o policial tivesse interesse em prejudicar os inculpados. A apreensão do produto do roubo na posse dos agentes, pouco tempo após a rapina, é circunstância que gera presunção de autoria, provocando a inversão do onus probandi, cabendo aos flagrados, nos termos do art. 156 do CPP , comprovar a licitude da posse, encargo do qual não se desincumbiram a contento, porquanto, na fase policial, ambos permaneceram em silêncio e, no contraditório, apresentaram a incomprovada versão de que teriam sido presos injustamente pela polícia, ao localizarem o automóvel roubado, sendo que apenas se encontravam nas proximidades do veículo, o que resultou contrariado pela robustez da prova acusatória, sobretudo, os certeiros apontes efetuados pela vítima. O julgador pode formar sua convicção baseado nos elementos informativos coligidos na fase policial e aqueles produzidos em pretório, desde que respeitada a preponderância da prova judicializada, porquanto o art. 155 do CPP veda apenas a condenação fundada, exclusivamente, em elementos informativos inquisitoriais. Prova segura à condenação do réu Jander, que vai mantida. 2. ÉDITO ABSOLUTÓRIO. RÉU DOUGLAS. REFORMA. Materialidade e autoria suficientemente demonstradas pela prova produzida. Ofendido que reconheceu ambos os acusados, tanto por fotografia, quanto pessoalmente, ainda que de modo informal, em sede inquisitorial, tornando a reconhecer a ambos em pretório, em ato que observou o disposto no art. 226 do CPP . Ausência de indícios de induzimento no indigitamento, a vítima desde sempre declarando que o veículo Voyage utilizado na prática do roubo era conduzido pelo réu Douglas, sendo que tal automóvel, do qual desembarcou, armado, o acusado Jander, parou ao lado do seu veículo, de modo que efetivamente pode visualizar as dois agentes que o assaltaram, em momento algum demonstrando incerteza quanto a este aspecto. O fato de a arma e o automóvel utilizados na prática do crime não terem sido localizados, ou mesmo, parte dos pertences que a vítima afirmou não ter recuperado, não retira a certeza que se extrai dos firmes apontes, mormente porque os agentes foram presos em flagrante cerca de duas horas após o cometimento da infração, de sorte que tiveram tempo de sobra para se desfazer de tais objetos. Prova segura à condenação do réu Douglas. Sentença absolutória reformada. 3. MAJORANTES. EMPREGO DE ARMA DE FOGO. MANUTENÇÃO. À luz do entendimento firmado pelo E. STF e pelo E. STJ, prescindível a apreensão da arma utilizada na prática subtrativa e laudo atestando seu grau de lesividade, para fins de configuração da majorante, se demonstrado o emprego do artefato por outros elementos de prova. Caso concreto em que não impressiona que a arma utilizada no crime não tenha sido apreendida, considerando que os réus não foram presos em flagrante imediatamente após a subtração. Emprego de arma de fogo comprovado pelo relato da vítima, que confirmou a utilização de artefato bélico, para ameaçá-la. Majorante mantida. CONCURSO DE PESSOAS. Concurso de pessoas demonstrado pela prova oral coligida aos autos, evidenciando a ação conjunta de ambos os acusados, em clara divisão de tarefas, igualmente relevantes ao êxito da empreitada criminosa. Coautoria configurada. Conjugação de vontades destinadas a um fim comum. Prescindibilidade de prova do prévio ajuste entre os agentes. Majorante confirmada. 4. AGRAVANTE DA CALAMIDADE PÚBLICA. AFASTAMENTO. Não restou demonstrado nos autos que os agentes tenham se prevalecido da situação de calamidade pública ocasionada pela pandemia do novo coronavírus (SARS-COV2) para praticar o ilícito, o reconhecimento da referida agravante demandando que haja alguma contribuição concreta da situação de calamidade à conduta perpetrada, o que não ocorreu na hipótese. A tão só prática do delito em contexto de pandemia, não é suficiente para fazer incidir a agravante da calamidade pública (art. 61 , II , j do CP ), se deste cenário não se valeram os agentes para o cometimento do crime. Precedente do E. STJ. Agravante afastada. 5. PENAS. DOSIMETRIA. RÉU JANDER. PENA-BASE. Pena-base fixada em 1º Grau, em 4 anos de reclusão, a sentenciante, não emprestando tom desfavorável a nenhuma moduladora prevista no art. 59 do CP . Despontam desfavoráveis, todavia, as circunstâncias do crime, que, efetivamente, desbordaram da previsão típica, porquanto, o crime foi praticado em concurso de agentes. Embora o concurso de agentes também constitua causa majorativa devidamente reconhecida, sua valoração deve ser deslocada para esta 1ª fase do processo dosimétrico, ao invés de constar na 3ª fase, porque, como se verá adiante, será aplicada apenas a adjetivadora de maior intensidade – emprego de arma de fogo -, como forma de preservar o sistema trifásico. Alteração do posicionamento desta Relatora, que, reiteradamente vinha, em inúmeros julgados, entendendo pela impossibilidade de se exasperar a pena basilar em recurso exclusivo da defesa, tendo restado vencida, tanto no âmbito da 8ª Câmara Criminal, quanto no 4º Grupo Criminal, sendo este igualmente o posicionamento do E. STJ a respeito do tema, o entendimento ficando isolado. Observância do princípio da colegialidade e da efetividade do processo. Adoção da posição vigorante, no sentido de ser possível a elevação da pena-base em razão do deslocamento de uma das majorantes reconhecidas na sentença para a 1ª fase da aplicação da pena, elevando a basilar, desde que a reprimenda definitiva observe os limites da sanção aplicada na sentença, deles não podendo ultrapassar, não constituindo, assim, reformatio in pejus. Ainda que a sentenciante não tenha tisnado a diretriz circunstâncias, nada impede que assim o entenda o Colegiado, no âmbito recursal. Tribunal ad quem, que, em recurso exclusivo da defesa, está vinculado ao quantum de pena aplicado, e não aos critérios de fixação dela eleitos pelo sentenciante. Art. 617 , in fine do CPP . Precedentes do E. STJ e do E. STF. Pena-base, nesse contexto, que vai elevada para 5 anos de reclusão. AGRAVANTE DA REINCIDÊNCIA. APLICAÇÃO COGENTE, DECORRENTE DE DISPOSIÇÃO LEGAL. Recidiva corretamente reconhecida. O não reconhecimento da agravante da reincidência, prevista expressamente em lei – art. 61 , I do CP –, implica negativa de vigência à própria lei e violação aos princípios constitucionais da isonomia – porque, do contrário, seria conferir tratamento igual aos desiguais – e da individualização da pena – porque o legislador pretendeu dar tratamento mais rigoroso aos já condenados, mas que não compreenderam as finalidades da pena. Entendimento do E. STF reconhecendo a constitucionalidade da reincidência ( RE nº 453.000 ). Bis in idem, desproporcionalidade ou não recepção constitucional não configurados. Agravante mantida. Afastada a agravante da calamidade pública, o acréscimo pela reincidência deve ser reduzido, proporcionalmente, para 6 meses, a pena provisória restando graduada em 5 anos e 6 meses de reclusão. ÍNDICE DE AUMENTO PELA INCIDÊNCIA DE MAJORANTE. O índice de aumento da pena pela incidência de duas ou mais majorantes é questão que se insere na órbita de convencimento do magistrado, no exercício de seu poder discricionário de decidir a quantidade de aumento que julga conveniente na hipótese concreta, desde que observados os limites estabelecidos pela norma penal. Hipótese na qual a decisora singular aumentou as corporais em 1/3 para a adjetivadora do concurso de agentes, e 2/3 para a do emprego de arma, modo simultâneo, sem qualquer justificativa. Remanescendo agora apenas a majorante de maior intensidade (emprego de arma), a pena vai elevada em 2/3, resultando em 9 anos e 2 meses de reclusão, mantido o regime inicial fechado. RÉU DOUGLAS. Pena-base fixada em